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As virtudes morais podem ser tomadas enquanto perfeitas ou
imperfeitas. A virtude moral perfeita, como a temperança ou a
fortaleza, nada mais é do que alguma inclinação existente em nós
para a prática da obra de algum gênero de bem, seja que tal
inclinação exista em nós pela natureza, seja que exista pelo
costume. Tomando as virtudes morais deste modo, elas não são
interligadas. Vemos, de fato, que alguém, pela sua compleição
corporal, ou por algum costume, seja pronto para a obra da
liberalidade, sem que todavia seja pronto para a obra da castidade.
A perfeita virtude moral é um hábito inclinante a bem realizar a boa
obra. Tomando as virtudes morais neste sentido, deve- se dizer que
elas são interligadas, como tem sido colocado por quase todos. Podem
ser apontadas para isto duas razões, conforme diversamente se
distingam as virtudes cardeais.
Conforme explicamos, alguns as distinguem segundo algumas condições
gerais das virtudes, de tal modo que a discrição pertença à
prudência, a retidão à justiça, a moderação à temperança e a
firmeza de ânimo à fortaleza, qualquer que seja a matéria em que
estas sejam consideradas. Neste sentido a razão da interligação é
manifesta: a firmeza não terá o louvor da virtude se não for
acompanhada da moderação, da retidão e da discrição, e a mesma
razão vale para as demais. Esta razão de interligação é apontada
por S. Gregório Magno no XXII Livro dos Morais, dizendo que
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"as virtudes, se são disjuntas,
não podem ser perfeitas",
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segundo a razão da virtude,
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"porque não é verdadeira prudência
aquela que não é justa,
temperante e forte",
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e o mesmo ele acrescenta quanto às demais virtudes. Santo Agostinho
também aponta um razão semelhante no VI De Trinitate. Outros,
porém, distinguem as virtudes acima segundo as suas matérias. Neste
sentido a razão da interligação é apontada por Aristóteles no seu
Sexto Livro da Ética. Assim como foi dito, nenhuma virtude moral
pode ser possuída sem a prudência, pelo fato de ser próprio da
virtude moral fazer a reta eleição, já que ela é um hábito
eletivo. Ora, para a reta eleição não é suficiente apenas a
inclinação ao fim devido, o que se consegue diretamente pelo hábito
da virtude moral; é necessário que alguém escolha também
diretamente as coisas que se ordenam para aquele fim, o que se consegue
pela prudência, que é aconselhativa, indicativa e preceptiva das
coisas que se ordenam ao fim. Semelhantemente também a prudência
não pode ser possuída sem as virtudes morais, pois a prudência é a
reta razão do que se age, a qual, como de certos princípios,
procede dos fins daquilo que se age, aos quais alguém se ordena
retamente através das virtudes morais. De onde que assim como a
ciência especulativa não pode ser possuída sem o intelecto dos
princípios, assim também nem a prudência sem as virtudes morais.
De onde que segue-se manifestamente que as virtudes morais são
interligadas.
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