CAPÍTULO XI

Teve o dom de profecia, e pelo espírito divino conhecia as faltas que faziam os seus monges, ainda que estivessem muito distantes, as tentações que padeciam e as perseguições que os seculares levantavam. Também é coisa certa que lhe apareciam as almas de alguns monges que morriam nos conventos de sua Ordem, pedindo-lhe a sua bênção e a sua permissão para se dirigirem à outra vida.

Certa vez veio a Claraval um monge do mosteiro Fusnaciense e, querendo voltar à sua casa, São Bernardo o chamou à parte e lhe disse:

"Diga a tal monge que se emende de tal e tal coisa, pois, se não se emendar, logo virá sobre ele o juízo de Deus".

Ficou assombrado o monge. São Bernardo havia nomeado pessoas e faltas muito ocultas. Disse então ao santo:

"Padre, quem foi que vos disse estas coisas?"

Respondeu-lhe Bernardo:

"Seja quem for, dize-lhe o que eu te digo. Se não o fizeres, serás participante do castigo".

Outra vez, ao dirigir-se a Catalanno, ganhou grande número de estudantes para Deus. Estes haviam sido discípulos de um grande doutor, chamado Estevão de Vitry. Estando um dia fazendo uma prática com eles antes de dar-lhes o hábito, o porteiro o avisa que Estevão, o mestre daqueles moços, estava esperando na porta e que com eles queria também receber o hábito. Alegraram-se muito os discípulos ao verem que seu mestre os seguia mas o santo, iluminado com a luz do céu, deu um grande grito e disse, de modo que todos o puderam ouvir:

"O espírito maligno o trouxe para cá. Veio só, e voltará só".

Ficaram todos espantados com aquelas palavras e o santo, para não ferir as novas plantas, ainda que de má vontade, o recebeu com os outros noviços e o exortou à perseverança. Ao cabo de seis meses, porém, acabou saindo, confessando ele mesmo que quando estava na cela dos noviços via um negrinho que o retirava do oratório. E, ainda que o demônio o tivesse trazido para que fosse um laço para os demais, não alcançou o seu objetivo, porque os demais, com a sua saída, foram confirmados na sua vocação e ele saíu só.

Um monge chamado Gofredo para quem, estando muito desconsolado e sem remédio, o santo havia alcançado com sua oração grande serenidade e singular alegria de consciência, sendo noviço e desejando ao extremo a salvação eterna de seu pai carnal, pediu ao santo com grande afeto que o encomendasse a Deus. São Bernardo lhe respondeu:

"Não duvides, meu filho, que teu pai há de ser um bom religioso e que eu o terei que enterrar com estas mãos".

E assim aconteceu, porque o velho entrou para a religião e, tendo progredido na virtude, caíu doente estando São Bernardo distante de Claraval. Passou cinco meses contínuos lutando contra a doença, até que voltou o santo que o encontrou em seu leito de morte e com suas mãos o enterrou, conforme o havia profetizado.

Estando em Claraval gravemente enfermo outro monge chamado Roberto, foi desenganado pelos médicos. São Bernardo estava em Roma, apareceu-lhe uma noite em espírito e o visitou amorosamente, cantando matinas na companhia dos outros monges. Naquela manhã Roberto ficou completamente curado.

Em outra ocasião enviou um monge alemão chamado Henrique às regiões mais remotas da Alemanha. Temendo que antes que pudesse voltar daquela longa jornada o santo padre passasse desta vida, pois estava muito fraco e debilitado, ia muito desconsolado pelo desejo de receber naquele momento a sua santa e última bênção. Entendeu São Bernardo o desejo e a pena de seu filho e, dando-lhe a bênção na partida, disse-lhe:

"Vás com alegria, porque voltarás são e me encontrarás vivo conforme desejas".

Sucedeu ao bom monge que, passando por um rio gelado perto da cidade de Argentina, caiu nele e, afogando-se, viu diante de si o santo abade, por intermédio do qual salvou-se e voltou ao convento são e alegre, encontrando o santo padre também são, como este o havia profetizado.

Tendo três moços entrado para o convento de Claraval e tomado o hábito, um deles, por instigação de Satanás, pouco depois o deixou. Temendo os monges que os outros dois noviços seus companheiros fizessem o mesmo, o santo, olhando-os na face, disse que um deles não teria jamais tentação grave e que o outro seria combatido por muitas mas que, no fim, prevaleceria e se sairia vencedor e, como o disse, assim aconteceu.

Em outra ocasião o rei de França, Luís, irritou-se contra alguns bispos e os removeu de suas igrejas, sem querer reconsiderar, nem com as muitas e graves cartas que escreveu São Bernardo para acalmá-lo, nem com a humildade dos próprios bispos os quais, lançando-se aos pés do rei, pediam-lhe o perdão. Disse-lhe o santo, ameaçando-o:

"Senhor, esta vossa obstinação custará a vida a Felipe, vosso filho primogênito e príncipe jurado".

O santo disse e Deus o cumpriu. O rei, reconhecendo a sua culpa, humilhou-se e reconsiderou.