|
Este clima cultural que se espalhou pela sociedade do norte da Itália nos anos 1400 é
visível, ainda hoje, no século XX, em certos meios como, por exemplo, no interior de
uma grande empresa de Engenharia, aquela que tem que sobreviver produzindo os
melhores produtos, vencendo a concorrência ou mesmo trapaceando, mas com trapaças
feitas com competência. O engenheiro que quiser ascender profissionalmente em um
meio como este tem que ser um bom engenheiro, dotado do maior número possível de
qualidades, inclusive qualidades além de sua competência estritamente profissional.
Os empresários tem que ser excelentes empresários, e os executivos têm que ser
excelentes executivos.
É um ambiente muito diferente do que o que se encontra em muitas outras instituições,
como repartições públicas e mesmo na maioria das escolas, onde não há um
verdadeiro interesse, nem uma verdadeira necessidade, de se fazer melhor o que
deveria ser feito, bastando que seja feito de alguma maneira. Tratam-se de instituições
que se comportam como se existissem mais para preencherem um espaço dentro da
sociedade que não poderia ser deixado vazio do que para realizar efetivamente o
trabalho a que se destina. Comparadas com as primeiras, o ambiente encontrado nestas
instituições é tal que sugere a impressão que seus profissionais estão fingindo que
trabalham, que seus diretores estão fingindo que tudo está em ordem, que seus
beneficiários estão fingindo que não percebem o que realmente está acontecendo e que
todo o conjunto existe apenas para não deixar claro para a comunidade que na
realidade não está sendo feito o que deveria estar sendo feito.
Neste sentido, a descrição psicológica que Burckhardt faz da civilização renascentista
é exatamente aquela que se nota existir na cúpula de uma grande empresa de
Engenharia. Até mesmo o interesse pelas ciências ocultas, que começa a surgir
exatamente quando as pessoas começam, devido ao ambiente que criaram, a ter
motivos para acreditar que pertencem à elite da sociedade em que vivem. Todos eles
tem interesses culturais diversos e muito vivos, mas são geralmente interesses
superficiais, que não exigem um esforço sistemático de anos seguidos. Todos eles têm
e procuram ter uma razoável cultura geral, freqüentam os cinemas, os jornais, as
melhores revistas, praticam um certo número de atividades paralelas que
freqüentemente tem pouca ou nenhuma relação uma com a outra e, depois de alguns
anos, quando possuem um currículo que lhes dê um certo respaldo psicológico, falam
dos problemas do país, do mundo, da humanidade ou mesmo de seus empregados
dando a impressão de que o que eles aprenderam em suas vidas representa a visão
absoluta, exata e ontológica do cosmos.
Nestas empresas, à diferença da Renascença italiana, não se cortam os pescoços
daqueles que não vencem, mas existe o mesmo tipo de competição que conduz a um
mesmo tipo de interesse cultural.
|
|