7. A Tunísia.

Embora o impacto de uma política de abortos sobre a taxa de crescimento populacional seja um fato bem conhecido entre os especialistas, com conseqüências evidentes sobre o desenvolvimento econômico, e embora estes dados estejam efetivamente sendo utilizados por vários países, apenas dois admitiram publicamente, até o fim da década de 70, ter sido esta a motivação que os havia levado à revogação de suas leis contra o aborto. Estes foram Singapura e a Tunísia.

De Singapura pouco sabemos, exceto que ela esteve sob a forte influência do trabalho da IPPF, cuja federação local é uma das mais antigas e ativas do mundo.

A Tunísia, pelo que sabíamos em 1978, estava sob a influência mais marcada do Conselho Populacional, e seu planejamento demográfico é um reflexo do modo de trabalhar desta entidade.

Tínhamos em mãos, em 1978, um livro publicado pelo Conselho Populacional de autoria de Maxwell Stamper, Population and Planning in Developing Nations, que analisa com certos graus de detalhe os programas de desenvolvimento para a década de 1970 de sessenta países subdesenvolvidos, detendo-se nas partes demográficas dos mesmos. Através desta obra ficamos sabendo que o governo da Tunísia calculou metodicamente que necessitaria de uma taxa de 30 mil abortos por ano no fim da década de 70 para atingir seus propósitos de desenvolvimento econômico e demográfico.

O IVe. Plan de Développement Economique et Social estima que a população da Tunísia em 1972 era de 5,4 milhões e crescendo a uma taxa de 2,6% ao ano. O plano apresenta uma estimativa do crescimento futuro da população por idade e sexo de 1971 até 1981. A estimativa calcula que a expectativa de vida ao nascimento aumente cada ano de mais seis meses, no período que vai de 1971 a 1981. O plano estima também que a população em idade de trabalho crescerá em um ritmo de 92 mil pessoas por ano e contém outras estimativas das populações em idade escolar na atualidade e nos próximos anos.

Um certo número de problemas populacionais são discutidos no plano. Aqueles que são vistos como mais sérios são os efeitos do crescimento populacional no desenvolvimento econômico e o rápido aumento do tamanho da população em idade de trabalho, resultando num posterior desemprego. Outros problemas discutidos incluem a crescente população em idade escolar e a pressão populacional sobre os serviços de saúde, habitação, produção de alimentos e o padrão de vida da unidade familiar.

A este respeito, porém, vamos reproduzir as próprias palavras do IVo. Plano de Desenvolvimento Econômico e Social:

"Os dados disponíveis são tais que deve ser claramente entendido que se torna impossível alimentar esperanças de que um dia no futuro próximo a taxa de crescimento econômico seja capaz de responder às conseqüências da explosão demográfica.

O crescimento da população entre 1970 e 1981 não será menor do que um milhão de pessoas e as incríveis necessidades de criação de novos empregos estão estimadas em 500 mil, ou 50 mil empregos novos por ano.

É importante para todos reconhecer que criar 50 mil novos empregos por ano é uma tarefa gigantesca, considerando que durante os 10 anos passados não mais de 14 ou 15 mil foram criados por ano. Estes fatos em toda a sua brutalidade deveriam ser conhecidos por cada tunisino, porque o controle do incremento demográfico se situa no coração do problema dos empregos. Com tais taxas e tais aumentos populacionais não se pode esperar colocar um fim ao desemprego, à miséria, à ignorância, à doença no futuro previsível. A explosão demográfica na Tunísia está no momento arriscando a aniquilação de todos os esforços de desenvolvimento social compatíveis com os objetivos da nação. Nenhuma política social ou econômica poderá resistir, a longo prazo, a um excessivo aumento da população".

Apresentado assim o problema, o plano a seguir apresenta uma política racionalmente concebida para reduzir a fertilidade baseado no reforço do programa de planejamento familiar, com ênfase crescente na educação e informação do povo, e na liberalização do aborto. Conforme segue o Plano,

"A evolução da estrutura etária da população durante os anos que virão exige um controle ainda mais vigoroso dos nascimentos. De fato, durante os anos 1970-1975, a porcentagem populacional entre as faixas etárias de 25 a 29 anos, correspondendo para as mulheres à idade de fertilidade máxima, é baixa. Cerca de 5,8% da população feminina está situada neste grupo de faixas etárias. Após 1976 e até 1980, esta porcentagem irá exceder uma média de 7,5% de tal maneira que a taxa geral da fertilidade e os conseqüentes nascimentos irão tender a aumentar em maiores proporções. Os esforços de planejamento familiar deverão, portanto, em primeiro lugar, contrabalançar este efeito de estrutura etária de tal maneira que a taxa de fertilidade não aumente. Este objetivo, porém, não poderá ser alcançado pelos meios atualmente em uso: DIU, pílula, etc.. De fato, o Escritório Nacional de População e Planejamento Familiar fixou como objetivo que 160 mil mulheres fossem protegidas por estes métodos em 1981, em contraposição com 50 mil em 1971, que irão impedir apenas 40 mil nascimentos em 1981. Os objetivos demográficos requerem um salvamento suplementar de nascimentos que deverá alcançar 15 mil ao ano em 1981. Por esta razão, outras medidas estão em mira.

As medidas que aumentariam a idade mínima do casamento foram rejeitadas por duas razões básicas", omitidas nesta transcrição. "As medidas que tratam sobre matérias fiscais e benefícios familiares" somente poderão ser estudadas nos próximos anos. "A última medida, que é muito eficaz, trata com a legislação relacionada com o aborto.

De acordo com a legislação atual, o aborto não é permitido a menos que a mulher já tenha cinco crianças vivas; no momento está havendo cerca de 5 mil abortos sociais não terapêuticos por ano. Para alcançar o salvamento adicional de 15 mil nascimentos ao ano acima mencionado, o número de interrupções de gestação necessárias em torno de 1981 será de 30 mil ao ano. A legislação corrente deverá ser então revista de tal maneira a permitir a realização de tal objetivo".

Assim, em 1973, seguindo-se à publicação deste plano, a lei do aborto foi modificada para permitir o aborto a pedido realizado por pessoal médico durante o primeiro trimestre de gestação. O texto da lei revogante mencionava explicitamente seus objetivos demográficos. Esta lei foi acompanhada por outras mudanças tais como a revogação da poligamia e do direito unilateral conferido apenas aos maridos em pedir o divórcio. A Union National des Femmes Tunisiennes foi promovida pelo governo, encorajando as mulheres a ingressarem nas forças de trabalho.