CAPÍTULO 9

Para que a fé, portanto, já experienciada, crescida, aumentada e já conduzida pela caridade, possa também inundar a tudo e a todas as coisas, como no céu o faz a visão beatífica, da qual ela é na terra um substituto temporário, e para que possa estender-se também para além da vida de oração, deve-se aprender a considerar, em primeiro lugar, que tudo o que se faz durante a atividade diária pode ser dividido em tempos em que tende a predominar a ação e em tempos em que tende a predominar a imaginação.

São tempos em que dizemos tender a predominar a ação aqueles em que realiza- se algo com conteúdo objetivo. São tempos de ação, neste sentido, aqueles em que realiza-se um trabalho, estuda-se, ora-se ou participa-se da liturgia.

São tempos em que dizemos tender a predominar a imaginação aqueles que consistem principalmente no estar-se em trânsito de um tempo de ação a outro. Nestes tempos a atividade dispersiva do imaginário, estimulada pela desordem de nossas paixões, tende a predominar.

Devemos procurar que, ao iniciar um tempo de imaginação, nossa atenção se dirija à recordação das Escrituras que nos alimentaram na oração, e desta à fé conduzida pelo amor, de tal modo que o amor, que deve assumir o controle e a direção da inteligência, cresça de dia a dia.

Devemos procurar também que, ao iniciar um tempo de ação, o façamos sempre explicitamente por um amor atual a Deus, evitando dispersar-se por outras coisas além da ação oferecida, quando esta dispersão estiver sendo gerenciada, em última análise, pelo próprio passional, ainda que se tratem de coisas inocentes.

Devemos aprender a considerar que a atividade externa, além de ter um objetivo próprio que pode indiretamente ser dirigido a Deus, deve ser em primeiro lugar um exercício para amarmos e recordar-nos de Deus.

O melhor modo e o melhor motivo pelo qual as coisas podem ordenar-se ao amor e à lembrança de Deus surge quando elas se ordenam ou constituem o próprio trabalho de ensinar. É neste sentido que ensinar foi-nos pedido por Cristo como a maior prova de amor (Jo. 21, 15-17; Mt. 25, 31-46; Mt. 28, 19-20; Mt. 5, 19; Dn. 12, 3). E neste sentido também se diz no livro de Provérbios:

"Nunca se afastem de ti a misericórdia e a verdade; põe-nas à roda de teu pescoço, e grava-as sobre as tábuas de teu coração".

Pr. 3, 3

E, no Cântico dos Cânticos:

"Despojei-me de minha túnica, e hei de vestí-la novamente? Lavei os meus pés, e hei de tornar a sujá-los?

Mas quando o meu amado meteu a sua mão pela abertura da porta, minhas mãos destilaram mirra, e meus dedos estavam cheios da mirra mais preciosa".

Cant. V, 4-5

E também, nos Atos dos Apóstolos:

"Nós, porém, ocupar-nos-emos totalmente na oração e no ministério da Palavra".

At. 6, 4