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Nas seções 105 a 111 do primeiro capítulo do Livro X das Instituições, finalmente,
Quintiliano mostra como, por mais que se aproxime dos filósofos, seu ideal está longe
do daqueles.
Ele descreve, na pessoa de Cícero, a quem ele admira como ao perfeito exemplo de
sábio e de orador, quem é aquele que ele deseja realmente formar:
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"Não me recuso a comparar Cícero
com qualquer orador grego.
Não ignoro a batalha
que com isto ser-me-á levantada,
se me apontarem a Demóstenes,
entre os gregos,
como o exemplo de perfeito orador.
Julgo semelhantes as virtudes
de ambos estes homens.
Há uma certa diferença na forma:
um é mais denso,
o outro mais prolixo;
a mesma frase de um é mais trabalhada,
a do outro é mais natural.
Pode ser também que o gênio
da língua latina nos dificultou
certos efeitos que admiramos
na língua grega.
Mas devemos ceder em um ponto:
Demóstenes veio primeiro na história e,
em grande parte,
é ele que fêz de Cícero
tudo o que ele é.
Parece-me que Cícero,
entregando-se inteiramente
à imitação dos Gregos,
apropriou-se da força de Demóstenes,
da abundância de Platão,
da jucundidade de Isócrates.
Todavia não foi apenas pelo estudo
que ele conseguiu
aquilo que há de melhor em cada um dos outros.
A maioria ou até mesmo todas as suas virtudes
foi em si próprio que ele as encontrou,
na felicíssima beleza de seu gênio imortal.
Conforme diz Píndaro,
Cícero não se limitou
a reunir as águas da chuva,
mas se tornou ele próprio
uma fonte viva e exuberante.
Ele foi como um dom gerado
pela providência
para permitir que a eloqüência
ensaiasse nele
todas as suas forças.
De fato, quem mais do que Cícero
pode ensinar com mais diligência ao ouvinte,
quem pode movê-lo com mais veemência?
Quem possuiria jamais
tamanha jucundidade no falar?
As próprias coisas que ele nos estorque
somos levados a pensar que ele as pede,
e mesmo quando ele impõe
o seu ponto de vista sem justificativas,
as pessoas parecem mais segui-lo
do que ceder à sua pressão.
Mais ainda, tudo o que ele diz
respira tamanha autoridade
que nos envergonhamos de discordar,
e não parece ser produto do estudo de advogado,
mas conter a segurança da testemunha
ou a confiabilidade do juiz,
e todas estas qualidades fluem naturalmente,
sem esforço, de tal modo que jamais
nada tão lindo se ouviu,
e o discurso traz consigo
uma felicíssima facilidade.
É por isto, a título justo,
que seus contemporâneos
o proclamaram o Rei dos Tribunais,
e a posteridade lhe conferiu
não um nome de homem,
mas o da própria eloqüência.
Que o tenhamos diante dos olhos,
portanto, e ele seja para nós
como um exemplo proposto,
e saiba alguém o quanto terá progredido
quando passar a admirar verdadeiramente
a Cícero".
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