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Terminada a defesa, e passado o caso à votação dos juízes, Sócrates foi condenado à
morte por pequena margem, conforme já sabemos. Mesmo assim, ao receber a
sentença, comportou-se com a dignidade que tinha sido a sua característica em vida.
Aos que o condenaram dirigiu estas palavras:
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"Eu já imaginava
que a decisão seria essa,
não por pequena, mas por grande margem;
no entanto, parece-me que
com a transposição de apenas 30 votos,
estaria absolvido.
Perdi-me, senhores,
não por falta de discursos
com que vos poderia convencer.
Perdi-me por falta não de discursos,
mas de atrevimento e descaramento,
por me recusar a proferir
o que mais gostais de ouvir:
lamentos, gemidos,
fazendo e dizendo uma multidão de coisas
que considero indignas de mim,
tais como costumais ouvir dos outros.
Ora, se em minha vida
sempre achei que o perigo
não justificava nenhuma indignidade,
tampouco me pesa agora
a maneira pela qual me defendi.
Ao contrário,
fico mais feliz em morrer
após a defesa que fiz,
do que ficaria em viver
após fazê-la daquele outro modo.
Quer no tribunal,
quer na guerra,
não devo eu,
não deve ninguém
lançar mão de todo e qualquer recurso
para escapar à morte.
De fato, é evidente que nas batalhas
muitas vezes pode escapar à morte
quem ousar tudo fazer e dizer.
Não se tenha por difícil escapar à morte.
Muito mais difícil é escapar à maldade".
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São Paulo, 15 de outubro de 1989.
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