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Encontro, segundo o homem interior, três coisas em minha mente, pelas quais
lembro-me de Deus, vejo-o e desejo-o. Estas três são a MEMÓRIA, a inteligência e a
vontade ou amor. Pela MEMÓRIA lembro, pela inteligência admiro, pela vontade abraço.
Ao lembrar-me de Deus, encontro-O na MEMÓRIA, e nela dEle e nEle me deleito, segundo
o que Ele próprio se digna conceder-me. Pela inteligência admiro o que Deus é em si
mesmo, o que é nos anjos, o que é nos santos, o que é nas criaturas, o que é no homem.
Devemos amá-lo, porque Ele nos amou primeiro, e nos fêz à sua imagem e
semelhança, o que não quis conceder a nenhuma criatura. Fomos feitos à imagem de Deus,
isto é, à inteligência e conhecimento do Filho, pelo qual inteligimos e conhecemos o Pai e a
Ele temos acesso. Tanta afinidade há entre nós e Deus Filho que Ele é imagem de Deus e nós
fomos feitos à imagem de Deus, afinidade testemunhada pela própria semelhança, já que não
apenas segundo a imagem, mas também segundo a sua semelhança fomos feitos. É
necessário, portanto, que aquele que é segundo a imagem, convenha com a imagem, para que
não participe em vão do nome da imagem. Representemos em nós, portanto, a sua imagem no
desejo da paz, na admiração da verdade, no amor da caridade. Tenhamo-la na MEMÓRIA,
guardêmo-la na consciência e venerêmo-la em todo lugar. A nossa mente é sua imagem
porque é capaz dela, e pode tornar-se participante dela. Não é sua imagem porque se lembra
dele e em seguida o intelige e o ama, mas porque pode lembrar-se, intelegir e amar aquele de
quem foi feita e, ao fazê-lo, ela própria torna-se sábia. Nada, de fato, é tão semelhante
àquela suma sabedoria do que a mente racional que pela MEMÓRIA, inteligência e vontade
permanece naquela inefável Trindade. Não pode permanecer nela, porém, a não ser que dela
se lembre, intelija e ame. Lembre-se, portanto, de Deus, à cuja imagem foi feita, intelija-O,
ame-O e adore-O, com quem poderá ser sempre feliz. Bem aventurada a alma junto à qual
Deus encontra repouso e em cujo tabernáculo repousa. Bem aventurado o que puder dizer:
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"Aquele que me criou,
descansou no meu tabernáculo".
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Não lhe poderá negar, de fato, o repouso do céu.
Encontro, portanto, em minha mente uma imagem da Suma Trindade, e para
que esta Suma Trindade seja lembrada, contemplada e amada, para que dela me lembre, a
ame, a abrace e a contemple, a ela devo referir tudo aquilo que vivo. A mente é imagem de
Deus, na qual há estas três coisas: a MEMÓRIA, a inteligência e a vontade. À MEMÓRIA
atribuímos tudo aquilo que sabemos, ainda que nelas não pensemos. À inteligência
atribuímos tudo aquilo que encontramos cogitando, o que também confiamos à MEMÓRIA;
à vontade, tudo aquilo que é conhecido e inteligido e que intensamente desejamos por ser
bom e verdadeiro. Pela MEMÓRIA somos semelhantes ao Pai, pela inteligência ao Filho,
pela vontade ao Espírito Santo. Nada em nós é tão semelhante ao Espírito Santo quanto a
vontade ou o amor ou dileção, que é uma vontade mais excelente. O amor é um dom de Deus,
de modo que nenhum outro dom é mais excelente do que este. O amor que procede de Deus é
também Deus, e é propriamente dito Espírito Santo, pelo qual o amor de Deus é infundido
em nossos corações (Rom. 5, 5), e pelo qual toda a Trindade em nós habita.
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