Capítulo 14

Se, porém, parece ser claro haver sido do exemplo de Sócrates que Platão tirou sua conclusão, examinado este exemplo mais atentamente, parecerá também que Platão tenha chegado à conclusão errada.

Se todos fossem justos como Sócrates, ou pelo menos, se os governantes fossem justos como Sócrates, haveria um término para os males humanos. Esta é a conclusão que parece ser correta.

Mas, examinando as palavras de Platão, verificamos que não foi esta a conclusão a que ele chegou.

Platão não disse:

"Não haverá término para os males humanos até que os homens justos como Sócrates recebam o poder soberano nas cidades",

mas sim que

"Não haverá um término para os males humanos até que aqueles que estão buscando a reta e verdadeira filosofia não recebam o poder soberano nas cidades".

Com isto, porém, Platão parece estar pedindo demais. Parece, na verdade, estar pedindo além do necessário.

Se os governantes fossem justos como Sócrates, isto não seria suficiente? Que necessidade haveria de que estivessem buscando

"a reta e verdadeira filosofia?"

Se, de fato, tivéssemos um Presidente da República correto como Sócrates e, além do Presidente da República, ministros de Estado corretos como Sócrates, deputados, senadores, magistrados, juízes, governadores, prefeitos, vereadores honestos, virtuosos e incorruptíveis como Sócrates, isto não seria já um sonho inimaginável para o povo de qualquer nação moderna? Não nos parece que isto seria suficiente para remediar os males da política? Iríamos então encontrar em homens deste porte defeitos irremediáveis e exigir que além disso eles tenham necessariamente que ser também filósofos para poderem governar? E se fossem filósofos, iria isto melhorar em algo o que eles fariam se não o fossem, isto é, se fossem apenas pessoas competentes em seus cargos e junto a esta competência tivessem também a virtude de Sócrates? Será mesmo tão necessário que se lhes exija que sejam filósofos? Não seria isto um exagero? Se um presidente da república for um homem justo e competente, mas não for um filósofo, deveremos removê-lo do cargo apenas por não ser filósofo? Parece claro que não. Os governantes devem ser removidos de seus cargos se forem incompetentes e desonestos, sejam eles filósofos ou não. Se tivermos governantes competentes e honestos até o heroísmo, não é o ser ou não filósofo que deverá pesar no mérito de uma deposição. Está se vendo, portanto, que a questão política parece ser outra que não a da Filosofia.

Mas se é assim, e se Platão era uma pessoa inteligente, capaz de compreender, por suposto, argumentos aparentemente tão evidentes, por que motivo então ele ainda assim insiste na Filosofia?