CAPÍTULO 174

O conclave realizado em 1555, narra Hughes,

"trouxe para o trono papal um velhinho de 79 anos que havia sido fundador da ordem religiosa dos Teatinos, João Pedro Carafa, o Papa Paulo IV.

O seu breve pontificado de quatro anos estendeu-se à feição de uma grande barreira.

Foi por seu intermédio que afinal conseguiu-se expulsar do Papado o paganismo da Renascença, e que se rompeu a última ligação do secularismo com aquele alto cargo.

Seu reinado assinalou o fim daquela mistura com as coisas mundanas que tanto havia empanado o brilho de outros Papas.

Se a Roma papal traz hoje, e o tem trazido durante séculos, algo da aparência de um mosteiro, se os Papas modernos, quaisquer que sejam as suas faltas como indivíduos ou como Papas, têm vivido, primeiramente, como sacerdotes, em um ambiente de oração e de decoro religioso, tal restauração é devida em grande parte a Paulo IV.

Ele rompeu, para sempre, com a simples violência de sua ira, toda aquela tradição em que as coisas mundanas no alto clero eram consideradas como que no rol de um sistema muito natural. A sua violência estampou tão profundamente um padrão de vida austero no material das coisas que nem mesmo os seus oponentes, inclinados para uma conduta mundana, ousaram-no destruir quando surgiu a inevitável reação.

Sua carreira havia começado nos tempos de Alexandre VI. Foi durante muito tempo núncio apostólico na Inglaterra e depois, por um período maior, na Espanha. Posteriormente foi também arcebispo de Nápoles, cargo ao qual renunciou para fundar, algum tempo depois, juntamente com São Caetano, uma ordem religiosa.

Como simples religioso trabalhou muitos anos nas partes pobres de Roma e Veneza, pregando, catequizando e ministrando os Sacramentos.

Foi o Papa Paulo III, aquele que por primeiro convocou o Concílio de Trento, quem decidiu nomeá-lo cardeal.

Jamais houve um homem de tão férrea vontade, firmeza e, é preciso acrescentar, de espírito intolerante. Para ele, ter tato significava traição.

Este vigoroso reformador não reuniu o Concílio de Trento que já dois Pontífices antes dele haviam conduzido. Ele julgava que eram inúteis os métodos utilizados pelo Concílio. Tinha outros métodos. Quando Cardeal não havia vacilado reprovar aos próprios Papas o que havia de mundano na vida que levavam. Com ele como Pontífice começaram a aparecer não leis novas,

- já havia bastante leis, havia declarado ele -,

mas ordens.

Cessou com as dispensas pela falta da idade necessária para os que haviam sido eleitos bispos e tornou nulas as vendas das propriedades da Igreja, sobre o que fêz severa preleção aos Cardeais logo nas primeiras semanas de seu pontificado.

Começou a haver a maior severidade na escolha dos bispos a serem nomeados. Num só dia o Papa rejeitou todos os que haviam sido propostos, num total de cinqüenta e oito.

Paulo IV atendeu à antiga queixa contra os religiosos que deixavam sua ordem para buscarem outro emprego clerical. Expediu um drástico decreto pelo qual os intimava a voltar para os seus mosteiros sob pena de suspensão imediata. A própria Roma foi cenário da incursão destes elementos, mas estes infelizes foram presos às dezenas. A sua categoria ou ofício não os salvou; alguns foram para a prisão, outros foram para as galeras.

Os bispos receberam ordem de renunciar a todas as rendas que não se relacionassem diretamente com o governo de suas dioceses, e foram postos em execução novos decretos que os obrigavam a viver nelas. Descobriu-se que viviam em Roma nada menos do que cento e treze bispos diocesanos, os quais não deram atenção à primeira ordem de seguirem para as suas jurisdições. Foi dada uma segunda, sob pena de deposição e castigo, para todo e qualquer monge errante, caso não obedecesse à ordem em menos de um mês. Dali a seis semanas todos os bispos haviam partido.

Se os bispos se portavam mal, eram tratados com mais severidade. Um deles, o bispo de Polignano, foi condenado à prisão perpétua com o castigo adicional de passar três meses por ano a pão e água.

Reviu-se todo o lado financeiro das nomeações. O fato de ter imediatamente perdido com isto dois terços das rendas da Santa Sé nada significou para ele e não deteve por isto a sua ação. Recusou peremptoriamente dar atenção aos desejos dos príncipes católicos em todas as nomeações que fazia.

Comunicou a todos os cardeais, mesmo àqueles que tinham sido os responsáveis pela sua eleição, que não havia nenhum deles em quem pudesse confiar. Ademais, exigiu de todos uma lista contendo uma declaração dos rendimentos que recebiam, de posse da qual cortou-lhes a maior parte dos mesmos.

O povo romano, com o tácito consentimento das autoridades, insultava a obra daquele ancião em seu leito de morte; mas ele estabeleceu tão firmemente as leis de um novo modo de vida que multidão alguma ousou mais derrubá-la".