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Mas é coisa muitíssimo digna de investigação por que Deus teria
querido criar estas coisas que previa que não haveriam de ser
necessárias para o homem, se tudo fez por causa do homem? Saberemos
isto mais rapidamente se refletirmos sobre a causa e o modo da criação
do homem.
Deus fez o homem por causa de si mesmo, e criou todas as outras coisas
por causa dos homens. Fez o homem por causa de si mesmo, não porque
precisasse do homem, mas porque nada podendo dar de melhor, para que
se desse a si mesmo em fruiçao ao homem; as outras criaturas foram
feitas para que fossem sujeitas ao homem por condição e servissem à
sua utilidade. O homem, portanto, como que colocado em uma posição
intermediária, tem acima de si a Deus, e abaixo de si ao mundo.
Pelo corpo, está unido inferiormente ao mundo; pelo espírito, se
eleva a Deus. Foi, porém, necessário que a criação das coisas
visíveis fosse ordenada de tal modo que o homem nelas conhecesse
exteriormente qual seria bem invisível que deveria buscar
interiormente, isto é, que visse abaixo de si aquilo que deveria
apetecer acima. Não era, pois, conveniente que a multidão das
coisas sensíveis estivesse submetida em parte alguma ao defeito, já
que por causa disso foi principalmente instituída, para que anunciasse
a riqueza inestimável dos bens eternos. Por este motivo Deus quis
também criar aquelas coisas que previa que não seriam necessárias ao
uso do homem: se tivesse querido apenas o necessário, seria., de
fato, bom, mas não seria rico. Acrescentando, porém, às
necessárias também as cômodas, mostrou as riquezas de sua bondade;
as cômodas, agraciadas com o acréscimo das côngruas, demonstram a
abundância da divina bondade; mas ao depois acrescentar às côngruas
também as agradáveis, o que faz senão tornar conhecida a
superabundância das riquezas de sua bondade?
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