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"O Altíssimo santificou
o seu tabernáculo".
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O tabernáculo do Senhor, no sentido moral, é a alma. A alma,
que é dita tabernáculo do Altíssimo, possui as suas pedras, o seu
cimento, e todas as demais coisas que pertencem à construção da
Igreja, conforme o descrevemos no sermão precedente. As pedras
deste tabernáculo são cada uma das virtudes, bem polidas pelo seu
exercício, e estáveis pela sua imobilidade contra os vícios. O
cimento é a caridade, pelo qual todas as demais virtudes se abraçam,
se unem, se equiparam e em que estão contidas. O fundamento é
Cristo, conforme diz o Apóstolo:
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"Ninguém pode por outro fundamento
senão o que foi posto,
que é Jesus Cristo".
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Possui paredes pela contemplação dos bens celestes, pelas quais
inere mais proximamente a Cristo, seu fundamento, afastada dos afetos
terrenos. Possui também um teto pelas boas obras, pelas quais,
visando o que é eterno, administra aos necessitados o que é
temporal. Possui comprimento pela fé, pela qual crê ser verdade
tudo quanto Deus fêz ou fará por si mesmo, pelos anjos ou pelos
homens desde o início até o fim dos tempos. Possui atura pela
esperança, pela qual se ergue do que é terreno ao que é celeste, do
que é passageiro ao que é eterno, do que é visível ao que é
invisível, do que é corporal ao que é espiritual. Possui largura
pela caridade, pela qual se dilata à direita e à esquerda, à
direita para amar aos amigos em Deus, à esquerda para amar aos
inimigos por causa de Deus.
Possui sacrário, pelo qual foi feita à imagem de Deus. Assim como
no edifício da Igreja nada possui maior dignidade do que o sacrário,
assim também na alma nada é mais santo, mais nobre ou mais excelente
do que a divina imagem. Possui o seu coro, por ter sido feita à
semelhança de Deus. Assim como na Igreja, em que depois do
sacrário a primeira coisa que se encontra é o coro, assim também na
alma, depois da divina imagem entendemos nada haver de mais sublime do
que a divina semelhança. Possui a sua nave pela vida dos sentidos.
Assim como na nave da Igreja ficam os casados, assim também
encontramos na vida sensitiva os cinco sentidos do nosso corpo, que
podem ser chamados de casados porque se estendem às coisas terrenas
pelo exercício do conhecimento e às delícias dos prazeres pela
experiência natural. Possui o seu átrio pela carne, na qual os
impulsos de que se originam os vícios são como os cadáveres da
morte. Possui um altar em seu coração, do qual está escrito:
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"Não desprezarás, ó Deus,
um coração contrito e humilhado".
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Possui janelas vítreas em seus sentidos espirituais, pelos quais é
iluminada pelos raios do verdadeiro Sol e se liberta da cegueira de sua
ignorância. Possui uma torre no nome do Senhor, da qual está
escrito:
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"O nome do Senhor
é uma torre fortíssima,
a ele se acolhe o justo,
e encontra um refúgio elevado".
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Possui sinos pela pregação, pela qual chama ao culto divino os que
estão distantes. Possui uma pintura interior pela pureza do
coração, e outra exterior pela pureza do corpo. Possui doze velas,
pelas quais é iluminada segundo a doutrina dos doze apóstolos, pela
qual é enriquecida no conhecimento da fé pelas boas obras.
Seu pontífice é a Santíssima Trindade. O Pai circunda- a pela
potência, o Filho pela sabedoria, o Espírito Santo pela
benignidade. O Pai pela potência infundiu-lhe o temor, o Filho
pela sabedoria conferiu-lhe o conhecimento, o Espírito Santo pela
benignidade conferiu-lhe a consolação. O Pai lhe diz:
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"Eu fiz o céu e a terra,
o mar e todas as coisas que há neles.
Não poupei aos anjos pecadores.
Expulsei Adão do paraíso.
Fiz perecer a primeira humanidade pelo dilúvio.
Destruí Sodoma e Gomorra.
Submergi o Faraó com o seu exército.
Puni o povo de Israel ao ter pecado.
Abre-me a tua porta, pois,
para que assim também não aconteça contigo".
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O Filho lhe diz:
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"Eu sou a sabedoria de Deus,
saída da boca do Altíssimo.
Atinjo fortissimamente
desde uma extremidade a outra (Sab. 8,1).
Sou a palavra de Deus viva,
eficaz e mais penetrante
do que qualquer espada de dois gumes.
Abre-me, pois, a tua porta,
para que não suceda que não te poupe".
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O Espírito Santo lhe diz:
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"Eu procedo do Pai e do Filho,
sou o amor de ambos.
Levanto os que caem,
consolo os feridos.
Abre-me, pois, a tua porta;
se queres, farei a tua felicidade
pela alegria espiritual".
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Porém estes três são um só Deus, assim como são um único
pontífice. Deste modo a Santíssima Trindade santifica esta Igreja
internamente e externamente; internamente purificando-a das manchas do
espírito, externamente purificando-a das manchas da carne.
Esforçai-vos, portanto, irmãos caríssimos, cada um de vós
esforçai-vos, dizia eu, para que, segundo as coisas que acabamos de
mencionar, se construa um tabernáculo de Deus, para que nele Deus
se digne habitar. Grande, de fato, é a honra, grande a
segurança, grande é a glória de se possuir a Deus habitando em
nós. Seja para nós a maior de todas as obras fazer com que sejamos
tais interna e externamente, internamente pela fé, externamente pela
boa obra, para que o Deus da majestade se digne vir a nós e em nós
fazer a sua casa. Mas porque não poderemos ser assim sem a sua
graça, é necessário que a imploremos incessantemente pela oração.
O Senhor nos dará a graça, e não apenas a graça, como também a
glória: a graça nesta vida, a glória na pátria celeste; a graça
no mundo, a glória no céu; a graça no presente, a glória no
futuro; a graça no caminho, a glória na chegada; a graça no
tempo, a glória na eternidade; a graça na justificação, a glória
na bem aventurança; a graça no mérito, a glória no prêmio do
mérito, no qual Ele vive e reina por todos os séculos dos séculos.
Amén.
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