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Igualmente, a caridade produz a perfeita paz. Pois acontece nas
coisas temporais que sejam desejadas com freqüência, mas obtidas as
mesmas, ainda a alma do que as deseja não repousa, antes, ao
contrário, obtida uma, outra apetece:
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"O coração do ímpio
é como um mar revolto,
que não pode repousar".
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E também, no mesmo lugar:
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"Não
há paz para o ímpio,
diz o Senhor".
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Mas não acontece assim na caridade para com Deus. Quem, de fato,
ama a Deus, tem a paz perfeita:
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"Muita paz aos que amam a Tua lei,
e não há tropeço para eles".
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E isto porque somente Deus é capaz de satisfazer o nosso desejo,
porquanto Deus é maior do que o nosso coração, como diz o
Apóstolo. E por isso diz Santo Agostinho no primeiro livro das
Confissões:
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"Fizeste-nos, ó Senhor,
para ti,
e o nosso coração está inquieto
enquanto não repousa em ti".
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E também:
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"O qual preenche de bens
o teu desejo".
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A caridade também torna o homem de grande dignidade. Com efeito,
todas as criaturas servem à própria majestade divina, e por ela foram
feitas, assim como as coisas artificiais servem ao artífice. Mas a
caridade faz do servo um livre e um amigo. De onde diz o Senhor:
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"Já não vos chamarei de servos,
mas de amigos".
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Mas porventura Paulo não é servo? E os outros apóstolos não
escreviam de si serem servos? Quanto a isto deve-se saber que há
duas servidões. A primeira é a do temor, e esta é penosa e não
meritória. Se, de fato, alguém se abstém do pecado somente pelo
temor da pena, não merece por isto. Ainda é servo.
A segunda servidão é a do amor. Se, na verdade, alguém opera
não pelo temor da justiça, mas pelo amor divino, não opera como
servo, mas como livre, porque voluntariamente, e é por isto que
Cristo diz:
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"Já não vos chamarei
mais de servos".
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E por que? A isto responde o Apóstolo:
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"Não recebestes o espírito de servidão
para recairdes no temor,
mas recebestes o espírito
de adoção de filhos".
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"Não há, de fato, temor na caridade", como diz I Jo. 4. O
temor tem, certamente, tormento, mas a caridade deleitação.
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