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Mas ainda que esta diferença entre a experiência e as conclusões não fizesse parte da
mensagem do poema de Parmênides, utilizar este argumento seria uma grande
ingenuidade, pois este argumento deriva da observação direta do mundo real tal como
é percebido pelos sentidos e o raciocínio de Parmênides já não pertence mais a esta
esfera de conhecimento. Parmênides, e isto é o que o estudante deve perceber bem, ao
fazer suas deduções, logo de início destacou-se completamente de todo dado do
conhecimento sensível. Sua lógica não trata mais de objetos que pertencem ao mundo
dos objetos sensíveis, mas ao mundo dos seres considerados em sua estrutura
simplesmente enquanto seres, desconsideradas quaisquer qualidades sensíveis. Sua
lógica está no domínio da primeira estrutura do ser enquanto ser, um domínio onde
apenas a inteligência abstrata pode apreender alguma coisa. Contra argumentar que a
realidade sensível não corresponde à realidade que Parmênides descreve é o
argumento de quem tem a mente presa ao mundo dos objetos sensíveis e não consegue
elevar-se à região em que o raciocínio de Parmênides realmente se situa. É o
argumento de quem não entendeu nada do que Parmênides quis dizer, nem sequer de
que assunto ele realmente estava tratando. Podemos comparar esta situação à de um
cirurgião que tentasse explicar a um curandeiro como se realiza um transplante
cardíaco e este curandeiro não percebesse que o cirurgião não estava falando de uma
mandinga, mas de cirurgia. Se, posteriormente, por algum infortúnio, a cirurgia não tem
sucesso e o paciente falece, o curandeiro poderia utilizar-se deste fato para demonstrar
que ele é melhor cirurgião e que o outro nada entende de medicina, como todos podem
percebê-lo claramente, e que ninguém deve considerar com seriedade nada do que ele
diz. É exatamente isto o que fizeram os contemporâneos de Parmênides, mas com isto
simplesmente mostraram que não estavam habituados à contemplação das realidades
do mundo da inteligência.
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