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"Vai, porque este é para mim
um vaso de eleição,
para levar o meu nome
diante das gentes,
dos reis,
e dos filhos de Israel".
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O bem aventurado Paulo, que é chamado nestas palavras de "vaso de
eleição", foi como o vaso de que se fala no Eclesiástico:
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"Como um vaso de ouro maciço,
ornamentado de toda pedra preciosa".
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Paulo foi vaso de ouro por causa do fulgor da sabedoria, maciço pela
virtude do amor, ornamentado de toda pedra preciosa pelas diversas
virtudes que estas significam. E tal como ele próprio era, assim
também ele ensinou aos demais.
Ensinou excelentissimamente os mistérios da divindade, que pertencem
à sabedoria, coisa manifesta pelo que está dito na Primeira
Epístola aos Coríntios:
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"É a sabedoria
que nós pregamos
entre os perfeitos".
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Paulo também recomendou excelentissimamente a caridade, conforme
lemos no décimo terceiro capítulo da Primeira Epístola aos
Coríntios:
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"Ainda que eu fale
a língua dos anjos e dos homens,
ainda que eu tivesse o dom da profecia
e conhecesse todos os mistérios
e toda a ciência,
ainda que eu distribuísse
todos os meus bens,
ainda que entregasse o meu corpo
para ser queimado,
se não tivesse caridade,
nada disto me aproveitaria.
A caridade nunca há de acabar,
a maior de todas (as virtudes)
é a caridade".
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Paulo instruíu também os homens sobre as diversas virtudes, como é
evidente na Epístola aos Colossenses:
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"Como escolhidos de Deus,
santos e amados,
revesti-vos de entranhas de misericórdia,
de benignidade,
de humildade,
de modéstia,
de paciência,
sofrendo-vos uns aos outros
e perdoando-vos mutuamente,
assim como o Senhor vos perdoou a vós.
Sobretudo tende caridade,
que é o vínculo da perfeição,
e triunfe em vossos corações
a paz de Cristo".
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Este vaso foi destinado a um nobre uso. Era um vaso que deveria
levar, conforme diz o livro de Atos, "o nome divino", nome que era
necessário levar porque estava distante dos homens por causa do pecado
e da obscuridade da inteligência. Por isso, assim como os anjos nos
trazem as iluminações divinas por estarmos distantes de Deus, assim
também os Apóstolos nos trouxeram a doutrina de Cristo. E assim
como no Velho Testamento, depois da Lei de Moisés, liam-se os
profetas, que traziam ao povo a doutrina da Lei, assim também no
Novo Testamento, depois do Evangelho, lê-se a doutrina dos
Apóstolos, os quais trouxeram aos fiéis aquilo que ouviram do
Senhor.
O bem aventurado Paulo, portanto, levou o nome de Cristo, em seu
corpo primeiro, imitando sua vida e sua paixão, e também em seus
lábios, pois em suas epístolas nomeia freqüentissimamente a
Cristo. Pode, por isto mesmo, ser significado pela pomba, a qual,
diz o livro de Gênesis, após o dilúvio
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"veio até a arca
trazendo um ramo de oliveira
em sua boca".
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Como a oliveira significa a misericórdia, corretamente pelo ramo de
oliveira podemos entender o nome de Jesus Cristo, o qual também
significa a misericórdia porque, segundo diz o Evangelho de Mateus,
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"será chamado de Jesus,
porque salvará o seu povo
de seus pecados".
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Paulo trouxe este ramo verdejante de folhas até a arca, isto é, a
Igreja, quando lhe manifestou de múltiplos modos sua virtude e seu
significado, mostrando-lhe a graça e a misericórdia de Cristo. E
por isso, assim como entre as escrituras do Velho Testamento os
Salmos são maximamente freqüentados pela Igreja, assim também no
Novo Testamento são freqüentadas as Epístolas de São Paulo,
pois em ambas estas escrituras praticamente está contida toda a
doutrina teológica.
A matéria das Epístolas de São Paulo é, de fato, o nome de
Cristo, que é a plenitude deste vaso, porque todo o seu ensinamento
é sobre a doutrina de Cristo. Escreveu Paulo catorze epístolas das
quais nove ensinam a Igreja dos Gentios (Romanos, Coríntios 1 e
2, Gálatas, Efésios, Filipenses, Colossenses,
Tessalonicenses 1 e 2); quatro os prelados e os príncipes da
Igreja, isto é, os reis (Timóteo 1 e 2, Tito e Filêmon);
e uma o povo de Israel, isto é, a Epístola aos Hebreus.
Toda a sua doutrina é sobre a graça de Cristo, que pode ser
considerada de três modos.
De um primeiro modo, na medida em que está na própria cabeça (do
Corpo Místico que é e Igreja), isto é, em Cristo, e é deste
modo que ela é tratada na Epístola aos Hebreus.
De um segundo modo, na medida em que está nos membros principais do
Corpo Místico, e é deste modo que ela é tratada nas Epístolas
que se dirigem aos prelados.
De um terceiro modo, na medida em que está no próprio Corpo
Místico, que é a Igreja, e é assim que é tratada nas Epístolas
que são dirigidas aos gentios.
Cada uma destas epístolas pode ser distinguida do seguinte modo,
segundo que a própria graça de Cristo pode ser considerada de três
modos.
De um primeiro modo, em si mesma, e é deste modo que é tratada na
Epístola aos Romanos.
De um segundo modo, na medida em que está nos sacramentos da graça,
e é assim que é tratada nas duas Epístolas aos Coríntios, na
primeira das quais trata-se dos próprios sacramentos, e na segunda da
dignidade dos seus ministros. E na Epístola aos Gálatas, na qual
são excluídos os sacramentos supérfluos contra aqueles que queriam
acrescentar aos novos sacramentos também os antigos.
De um terceiro modo, a graça de Cristo pode ser considerada segundo
o efeito da unidade que ela produz na Igreja. O Apóstolo trata,
portanto, primeiramente da instituição da unidade da Igreja na
Epístola aos Efésios. Trata, em seguida, de sua confirmação e
adiantamento na Epístola aos Filipenses. Em terceiro lugar, de sua
defesa contra os erros na Epístola aos Colossenses; contra as
perseguições presentes na Primeira aos Tessalonicenses e contra as
futuras, principalmente aquelas que hão de vir no tempo do
Anticristo, na Segunda aos Tessalonicenses.
Quanto aos prelados, Paulo instrui tanto os prelados espirituais
quanto os temporais. Na Primeira a Timóteo instrui os prelados
espirituais sobre a instituição, a instrução e o governo da unidade
da Igreja. Na Segunda a Timóteo, sobre a firmeza contra os
perseguidores. Na Epístola a Tito, instrui-os sobre a sua defesa
contra os hereges. Quanto aos senhores temporais, instruíu-os na
Epístola a Filêmon.
Fica evidente, deste modo, a razão da distinção e da ordem de
todas estas Epístolas.
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