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Para entender o que significa a constância da fé, convém examinar
primeiro uma observação dos "Mistérios da Fé Cristã", onde
Hugo de S. Vítor diz que crer é algo muito diferente do que apenas
não negar os ensinamentos da fé:
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"Há um gênero de homens",
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diz Hugo de S. Vítor,
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"para os quais crer significa apenas
não contradizer a fé".
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Ainda que não a contradigam não só pelas palavras, mas também
pelas obras, tais pessoas
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"são chamadas fiéis
mais pelo costume da vida
do que pela virtude de crer".
"Dedicados apenas às coisas do mundo
e às coisas que passam",
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continua Hugo,
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"nunca elevam a mente
ao pensamento das coisas futuras;
embora recebam os sacramentos da fé cristã
juntamente com os demais fiéis,
não atentam para o que significa ser cristão
ou que esperança há
na expectativa dos bens futuros.
Embora chamamos a estas pessoas fiéis pelo nome,
de fato e em verdade estão longe da fé".
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De fato, diz ainda Hugo em outra passagem dos Mistérios da Fé
Cristã, pela fé produz-se
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"uma tal pureza do coração
e da consciência"
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no homem que já
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"se começa a saborear interiormente
aquilo que se crê pela fé".
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Se isto ocorre não uma vez ou outra, mas sempre e cada vez mais
freqüente e constantemente, chamamos a isto de constância da fé, o
que fêz São Paulo dizer que os homens santos
De fato, na Epístola aos Hebreus, São Paulo cita o livro de
Habacuc, em que o profeta diz a mesma coisa:
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"O justo viverá da fé,
diz o Senhor,
mas,
se retroceder,
não será aceito à minha alma".
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O mesmo, porém agora com suas próprias palavras, São Paulo
escreve na Epístola aos Colossenses:
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"Já que ressuscitastes com Cristo,
procurai as coisas do alto,
pensai nas coisas do alto,
não vos interesseis pelas terrenas,
já que vós morrestes,
e vossa vida está escondida
com Cristo em Deus".
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Se nossa fé não for assim, embora sejamos chamados de fiéis, diz
Hugo de São Vítor,
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"de fato e em verdade
estaremos longe da fé".
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Outra era a fé do profeta Elias, de quem dizem as Escrituras que
vivia constantemente
Outra também era a fé dos salmistas, os quais, em suas orações,
quando se referiam ao tabernáculo ou à casa do Senhor,
freqüentemente era à fé que estavam se referindo:
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"Pudesse eu habitar para sempre
no teu tabernáculo,
ó Senhor,
e acolher-me à sombra
das tuas asas".
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"Bem aventurado, Senhor,
o homem que acolhes
e tomas para ti.
Ele habita nas tuas moradas,
sacia-se dos bens de tua casa,
da santidade do teu templo".
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"A minha alma suspira,
deseja os átrios do Senhor;
o meu coração e a minha carne
exultam pelo Deus vivo.
Bem aventurados, Senhor,
os que moram na tua casa,
eles te louvam sem cessar.
Ao passarem pelo vale mais árido,
o transformam em fonte,
e a primeira chuva o recobre de bênçãos.
Caminham com vigor sempre crescente,
verão o Deus dos deuses em Sião".
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Para entender o significado destas passagens, deve-se considerar
primeiramente que o maior mandamento do Cristianismo não é a fé,
mas o amor a Deus, conforme a sentença de Cristo:
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"Amar a Deus de todo o coração,
com todo o entendimento,
com toda a alma,
com todas as forças,
este é o primeiro",
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diz Jesus,
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"e o maior
de todos os mandamentos".
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Porém, para que Deus habite permanentemente em nós pelo amor,
devemos também construir em nós uma casa para a fé, e é desta casa
que falam os salmos acima. Pela constância da fé se constrói a casa
em que Deus vem habitar em nós pelo amor, e é desta constância que
também falava Ricardo de São Vítor no prefácio do De
Trinitate:
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" `O meu justo vive da fé'.
Esta sentença é ao mesmo tempo
apostólica e profética.
O Apóstolo diz o que o profeta prediz,
pois o justo vive da fé;
e se assim é,
ou melhor,
porque assim é,
devemos nos elevar com freqüência
aos mistérios de nossa fé.
Se somos filhos de Sião,
levantemos aquela sublime escada da contemplação,
tomemos asas como de águia,
pelas quais nos possamos destacar
das coisas terrenas
e nos levantar às coisas celestes.
Pensemos nas coisas do alto,
não nas coisas da terra,
onde Cristo está sentado à direita de Deus;
para isto de fato Cristo nos enviou o seu Espírito,
para que conduzisse o nosso Espírito de tal modo
que para onde Cristo ascendeu com o corpo,
ascendamos nós pela mente".
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