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Na época em que nasceu Sócrates havia duas tradições gerais na
filosofia grega, aquela que se desenvolveu na Anatólia, a oriente da
atual Grécia, iniciada por Tales de Mileto, e aquela desenvolvida
a ocidente da Grécia, principalmente nas colônias gregas da
península itálica, iniciada por Pitágoras, sob a forma de escolas
de filosofia. O primeiro filósofo que chegou a Atenas foi
Anaxágoras, preceptor de Péricles, vindo do oriente. Mais
tarde, passaram por Atenas Parmênides e Zenão, vindos da
Itália, alunos de membros das escolas pitagóricas.
A doutrina de Parmênides, que ele costumava demonstrar apenas por
argumentos gerais e abstratos, dizia que não existia na realidade
senão um único ser, simples, indivisível e imutável, e que toda a
multiplicidade e vir a ser observada no cosmos era apenas uma ilusão.
Zenão desenvolveu copiosa lista de argumentos menos abstratos que
procuravam demonstrar, por redução ao absurdo, a impossibilidade da
existência do movimento e da multiplicidade no cosmos.
Um dos argumentos de Zenão contra a multiplicidade dos seres é o
seguinte: se existem muitos seres, o seu número terá que ser finito
ou infinito, porque nada pode ser ao mesmo tempo finito e infinito. É
fácil, porém, ver que a quantidade de seres existentes no cosmos
terá que ser finita em seu número, porque os seres que existem não
podem ser nem mais nem menos do que o número que são. Porém, ao
mesmo tempo, o número das coisas existentes tem que ser infinito,
porque a existência de cada coisa a que denominamos uma unidade e que
contamos como sendo um ser individual é, na realidade, não um, mas
um número infinito de seres, porque cada uma das coisas existentes
pode ser dividida em duas, e cada uma destas duas em outras duas e
assim por diante, até o infinito. Daqui se conclui que, se não
admitimos que exite na realidade apenas um único ser indivisível e que
toda a multiplicidade que vemos no cosmos é apenas uma ilusão, somos
obrigados a afirmar que o número dos entes que existem é ao mesmo
tempo finito e infinito. O que é impossível. Portanto, a
multiplicidade dos seres não existe e é apenas ilusão dos sentidos.
A reação dos atenienses diante deste e de muitos outros argumentos
desenvolvidos por estes filósofos foi entusiástica, não porque
aceitassem a doutrina que eles continham, mas pelo fascínio que esta
técnica de argumentação propiciava ao cenário político da
democracia ateniense, onde quem falasse mais convincentemente em
público curvaria a votação da maioria do povo a seu favor. E se
havia pessoas que possuíam técnicas de tornar verossímeis teses até
aquele momento inteiramente impensáveis pelo comum dos homens, quem
dominasse esta técnica seria detentor de um importante trunfo na
condução do destino político ateniense. Daí surgiu pouco tempo
depois uma corrente filosófica decadente característica do ambiente
ateniense a que se denominou de sofista.
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