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Para se ter uma idéia do que foi a extensão da
prática do aborto no Japão, mais do que das estatísticas,
podemos nos servir do relato de uma visita de um médico
americano especialista em abortos a seus colegas japoneses. O
Dr. Selig Neubardt, professor de Ginecologia e Obstetrícia em
uma Universidade particular de Nova York, fervoroso
propagandista e praticante do aborto legal, realizou esta
visita no final de 1970.
"O aborto voluntário é legal no Japão há cerca de
25 anos", escrevia o professor Neubardt logo após retornar de
sua visita à nação asiática. "Durante este tempo a
experiência induziu os japoneses a abandonar algumas técnicas
e a melhorar outras. Na atualidade o enfoque do aborto é
bastante uniforme em todo o país. Suas técnicas são rápidas e
eficazes. Em outubro de 1970 viajei três semanas pelo Japão
para estudar como encaram o aborto e comentar suas
experiências com eles.
Minha única reação negativa diante da ginecologia
japonesa foi a utilização da anticoncepção. Os ginecologistas
não a consideram parte de sua especialidade. Não tentavam
orientar as pacientes neste sentido nem realizam nenhum
esforço para prescrever anticoncepcionais. O problema se
ignora por completo.
Vi uma mulher que se internou em um excelente
hospital de Tóquio para seu quinto aborto em menos de cinco
anos. Receberam-na como uma velha amiga, praticaram-lhe o
aborto com a máxima perícia e horas depois deram-lhe alta com
uma reverência cheia de cortesia e com muitas manifestações
de boa sorte. Não se mencionou em nenhum momento a
possibilidade de uma prevenção para o sexto episódio. Quando
comentei esta circunstância com o médico, este respondeu com
um sorriso amigável que aquela mulher era solteira e que,
segundo parecia, algum de seus amigos não apreciava o uso de
preservativos. Não mencionou nenhuma outra técnica.
Os médicos japoneses rejeitam a anticoncepção oral
por uma ampla gama de razões, nenhuma delas, porém, válida. O
governo e as sociedades médicas se pronunciam contra o uso de
anticonceptivos orais. Disseram-me que produzem terríveis
efeitos colaterais nas mulheres que os usam. Vários médicos
opinaram que o uso dos anticonceptivos orais causaria câncer
endometrial. Embora não pudessem citar nenhum estudo em apoio
desta objeção, mencionaram isto como um fato concreto e em um
tom de voz direcionado a por um fim à discussão.
Nos grandes hospitais que visitei, os médicos
falavam com entusiasmo do anel de Ota, o dispositivo intra
uterino japonês que se encontra nas farmácias de todos os
hospitais, embora eu nunca tivesse encontrado uma clínica de
pacientes externos com um destes anéis estéreis pronto para
ser colocado e nunca conheci nenhum ginecologista que tivesse
introduzido em alguma paciente um só destes anéis durante o
mês anterior. Quanto às espumas de Delfen e EMKO sequer há
notícias delas entre os médicos japoneses. O Neo-Shampoon, um
tablete de espuma vaginal que apresenta mais ou menos a mesma
eficiência que nossas espumas e é muito fácil de usar, pode
ser encontrado nas farmácias japonesas, mas os médicos não a
recomendam porque, dizem eles, `não é cem por cento
eficaz'.
O preservativo é de longe o anticonceptivo que
mais se usa no Japão. A maioria dos médicos evitam a gravidez
de suas esposas através do preservativo, mas supõem que os
maridos de suas pacientes tenham que fazer o mesmo.
Foi apenas durante a minha última noite no Japão,
depois de uma boa ceia e de muitas garrafinhas de saki com um
jovem médico que muito me havia ajudado, que vim a descobrir
que a atitude japonesa diante da anticoncepção poderia ter um
motivo:
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`Todos os médicos com que o Sr.
falou pareceram que se
interessavam muito e lhe faziam
várias perguntas quando o Sr. lhes
falava a respeito de
anticoncepção', me disse este
médico, `porém gostaria de preveni-
lo para que não se engane a este
respeito. Eles nunca aceitarão
nada que o Sr. lhes diga sobre
anticoncepção. Nossos médicos não
querem evitar a gravidez. É o
governo que controla a maioria de
nossos honorários, e é o aborto
que nos deixa algum certo lucro, e
nós não vamos renunciar a isto'.
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De fato, pude observar que a maioria dos ginecologistas
começam o dia com um certo número de abortos e, se bem que
sejam baratos em comparação com os Estados Unidos, -custam
uns cinco dólares completos- , proporcionam uma fonte de
renda boa e constante.
No Japão as gestações precoces, de 8 a 10 semanas,
são interrompidas por dilatação e curetagem. Isto é feito com
as pacientes internadas. A mulher é admitida de manhã,
procede-se à curetagem e dá-se-lhe alta ao anoitecer. Os
abortos tardios hoje são raros no Japão, embora fossem comuns
nos primeiros anos da legalização do aborto. Quando terminou
a segunda guerra mundial, época em que se legalizou o aborto
no Japão, a maioria das mulheres vinham para abortar no
segundo trimestre da gravidez. Na atualidade as mulheres
japonesas estão acostumadas a abortar e, em geral, vem pedir
a interrupção da gravidez entre 8 e 10 semanas.
Ocasionalmente os médicos japoneses se deparam com alguma
mulher que mudou de parecer e decidiu abortar durante a
metade do segundo trimestre, geralmente por problemas
conjugais, algum problema financeiro súbito ou devido à morte
do marido. Os únicos casos de aborto no segundo trimestre
que vi ocorreram em Tókio e todos eram de mulheres norte
americanas. Ainda que a quantidade de casos tenha diminuído
muito desde que o Estado de Nova York liberalizou a sua
legislação referente ao aborto em 1970, vi mulheres cujos
médicos as haviam enviado até Tókio provenientes da Flórida,
do Missouri e do Vermont, assim como do Vietnam".
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