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Do fato de se dizer que a plenitude da realidade a que se chama de
contemplação é um objetivo comum para todas as escolas de vida
espiritual, e que é uma mesma e idêntica realidade para todas, não
se segue que todas elas expliquem o que seja a contemplação de uma
mesma maneira. Isto ocorre porque aquilo a que se chama de
contemplação, embora seja uma única e mesma realidade, possui uma
tamanha riqueza de conteúdo que pode ser abordada segundo uma
multiplicidade inesgotável de perspectivas e que, cada pessoa, ao
longo de toda a história humana, que se aproximar desta realidade, ao
tentar descrevê-la, sempre o fará de um modo novo e diverso do que o
fizeram todos aqueles que se tinham anteriormente já aproximado dela,
embora estejam todos descrevendo uma única e mesma realidade.
Nas aulas de que estas notas são uma pequena parte já se teve um
exemplo deste fato. Inicialmente dissemos que a contemplação era a
operação da inteligência cujo objeto era a sabedoria, a qual seria,
por sua vez, a mais elevada forma de conhecimento possível ao homem.
Depois, seguindo os comentários de Santo Tomás de Aquino a
Aristóteles, procurou-se definir o que, segundo Aristóteles,
seria mais precisamente aquilo a que se chama de sabedoria. Porém, o
próprio Santo Tomás de Aquino, quando não está escrevendo seus
comentários a Aristóteles, mas trata do assunto em seus livros de
Teologia onde ele tem por isso mesmo uma liberdade maior de
expressão, se utiliza de uma perspectiva mais ampla para explicar o
que é a contemplação. Se nos referirmos ao conjunto dos autores
situados ao longo de toda a tradição cristã, estes autores,
acrescidos à obra de Santo Tomás de Aquino, oferecem uma
perspectiva de horizontes extraordinariamente ainda mais amplos. Mas,
por mais que se tenha falado sobre o assunto ao longo de todos os
séculos, esta perspectiva se dilata ainda de um modo
surpreendentemente novo à medida em que os que estudam o assunto, em
vez de se limitarem apenas à leitura do que os sábios dizem a este
respeito, eles próprios se aproximam da mesma pela prática das
virtudes, do estudo e da própria contemplação. De fato, lemos no
Apocalipse a seguinte promessa de Jesus:
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"Ao vencedor darei um nome novo,
o qual ninguém conhece,
senão quem o recebe".
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Ora, na interpretação de Ricardo de S. Vitor, este "nome
novo, que ninguém conhece, senão quem o recebe", nada mais é do
que o conhecimento divino (Comm. in Apoc.; PL 196,
724), que, de fato, por mais ampla que seja a perspectiva pela
qual o conhecemos por meio de outros, se não o recebemos nós mesmos
é como se ainda não o conhecêssemos, sendo este o motivo pelo qual,
por mais que se tenha falado a respeito deste assunto, quando uma nova
pessoa se acrescenta ao número dos que já falaram, parece, como de
fato é, que novas coisas se estão falando que nunca antes haviam se
falado.
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