2. A Santíssima Trindade segundo Santo Agostinho.

A exposição da doutrina trinitária em Santo Agostinho é inteiramente baseada nas Sagradas Escrituras.

Porém, em contraste com a tradição que fêz da Pessoa do Pai o seu ponto de partida, Santo Agostinho principia com a natureza divina em si mesmo. É esta simples e imutável natureza ou essência que é Trindade. A unidade da Trindade é assim colocada em primeiro plano, excluindo-se rigorosamente todo tipo de subordinacionismo. Tudo o que é afirmado de Deus é afirmado igualmente de cada uma das três Pessoas.

Diversas conseqüências se seguem desta ênfase na unidade da natureza divina.

Primeiro, tudo o que pertence à natureza divina como tal deve, numa linguagem exata, ser expresso no singular, já que esta natureza é única. Conforme mais tarde o Credo que já foi atribuído a Santo Atanásio dirá, Credo este que é totalmente agostiniano, embora cada uma das três Pessoas seja incriada, infinita, onipotente, eterna, etc., não há três incriados, infinitos, onipotentes e eternos, mas apenas um.

Segundo, a Trindade possui uma única e indivisível ação e uma única vontade. Sua operação é "inseparável". Em relação à ordem contingente as três Pessoas atuam como "um único princípio" e, como as Pessoas são inseparáveis,

"assim também operam inseparavelmente".

Como exemplo disto, Agostinho argumenta que as teofanias, manifestações de Deus registradas no Velho Testamento, não devem ser consideradas, como a tradição patrística primitiva tendia a considerar, como manifestações exclusivamente do Verbo. Algumas vezes as teofanias podem ser atribuídas ao Verbo, ou ao Espírito Santo, algumas vezes ao Pai, outras vezes a todos os Três; outras vezes ainda é impossível decidir a qual das três Pessoas atribuí-las.

A dificuldade óbvia que esta teoria sugere é que ela parece ignorar os diversos papéis das três Pessoas. A isto Agostinho responde que, embora seja verdade que o Filho, embora distinto do Pai, nasceu, sofreu e ressuscitou, é igualmente verdade que o Pai cooperou com o Filho na realização da Encarnação, paixão e ressurreição. Era conveniente para o Filho, entretanto, em virtude de sua relação com o Pai, manifestar-se e fazer-se visível.

Em outras palavras, já que cada uma das Pessoas possui a natureza divina de uma maneira particular, é apropriado atribuir a cada uma dElas, na operação externa da Divindade, o papel que Lhe é apropriado em virtude de Sua origem.

Referências:

Santo Agostinho : De Civitate Dei 11,10;
Idem :Epistola 120,17; 11,2-4;
Idem : De Trinitate 5,9; 5,10; 8,1; 2,9; 5, 15; 1,7; 2,3; 2,12-34; 3,4-27; 2,9; 2,18;
Idem : C. Ser. Ar. 4;
Idem : Enchirid. 38;
Idem : Sermo 52.