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Resta examinar agora o intelecto dos primeiros princípios dos
operáveis, que retifica a razão acerca dos fins últimos das virtudes
morais, que são os primeiros princípios das operações do homem.
Assim como há um hábito denominado intelecto, pelo qual o homem
conhece os princípios das demonstrações, cujo conhecimento não pode
ser retirado do homem, o qual conhece por natureza estes princípios
indemonstráveis, há também outro hábito segundo o qual o homem
conhece os princípios dos operáveis, ao qual chamamos igualmente de
intelecto.
Uma primeira diferença que há entre o intelecto que é acerca dos
princípios das demonstrações e o que é acerca dos princípios dos
operáveis está em que o primeiro é acerca do universal, enquanto que
o segundo é acerca do singular e do contingente. Estes singulares
podem ter razão de princípios porque é a partir deles, no que é
operável, que se alcança o universal; de fato, por causa desta erva
ter restituído a saúde a este homem, aceitou-se que esta espécie de
erva tem força curativa (143).
A segunda diferença entre estes hábitos está em que embora ambos
sejam hábitos naturais, o são de modos diferentes. O intelecto
acerca dos princípios das demonstrações é um hábito natural por
sê-lo totalmente pela natureza. Já o intelecto dos princípios dos
operáveis, por ser colocado acerca dos singulares, e sendo os
singulares conhecidos de modo próprio pelo sentido, necessita, de
algum modo, das virtudes sensitivas; não somente dos sentidos
exteriores, mas também daqueles sentidos interiores como a faculdade
estimativa e cogitativa (144).
Chama-se faculdade estimativa a um sentido interno existente em todos
os animais pelo qual, por exemplo, a ovelha foge do lobo não por
causa da indecência da cor ou da figura, mas pela percepção da
inimizade natural; para esta percepção é necessário algum
princípio sensitivo interno; mas enquanto os animais percebem estas
intenções apenas por um instinto natural, o homem as percebe pelo
sentidos internos também por modo de comparação entre diversas destas
percepções, de maneira que aquilo que nos animais é dito apenas
faculdade estimativa, no homem é dito cogitativa, também chamada de
razão do particular, embora seja algo que pertença aos sentidos
internos (145).
Ora, todas estas virtudes sensitivas operam pelos órgãos corporais,
de maneira que o hábito do intelecto dos primeiros princípios dos
operáveis é um hábito natural não à maneira do que é acerca dos
princípios das demonstrações, que é totalmente pela natureza, mas
pelo fato de que, por disposição natural do corpo, algumas pessoas
são prontas a este hábito, de modo que por uma pequena experiência
já se tornam perfeitos nele (146).
É sinal que o intelecto dos princípios dos operáveis esteja em alguns
homens segundo a natureza o fato de estimarmos que são conseqüência
da idade dos homens, segundo a qual a natureza corporal se transmuta.
Há, de fato, uma idade, que é a idade senil, que por causa da
quietação das transmutações corporais e animais o homem possui
intelecto dos princípios dos operáveis como se a natureza fosse causa
deles (147).
Assim se conclui que o intelecto que é dos princípios dos operáveis
se adquire pela experiência, pela idade, e se aperfeiçoa pela
prudência. Conseqüência disto é o ser necessário ouvir as coisas
que opinam e enunciam acerca dos agíveis os homens experientes, os
velhos e os prudentes. Embora estes homens não nos forneçam
demonstrações, todavia devem ser procurados não menos do que as
próprias demonstrações, e até mesmo mais. Isto porque tais
homens, pelo fato de possuírem experiência de coisas vistas, isto
é, um reto julgamento acerca dos operáveis, enxergam os princípios
operáveis os quais são mais certos do que as próprias conclusões das
demonstrações (148).
Referências
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(143) In libros Ethicorum Expositio, L. VI, l. 9, 1247-1249.
(144) Idem, L. VI, l. 9, 1249.
(145) Summa Theologiae, Ia, Q. 78 a.1.
(146) In libros Ethicorum Expositio, L. VI, l. 9, 1250.
(147) Idem, L. VI, l. 9, 1252. (148) Idem,
L. VI, l. 9, 1254.
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