QUESTÃO QUARTA.

Como na Encarnação o todo é dito Deus e o todo é dito homem, se estas duas naturezas não são partes daquela pessoa?

SOLUÇÃO.

Diz-se isto por semelhança, porque as duas naturezas são unidas em Cristo como partes no todo, mas diversamente. De fato, a pessoa de Cristo não possui ser pela união da humanidade com a divindade, como o todo possui ser pela conjunção das partes. A pessoa de Cristo não possui novo ser pela união de ambas as naturezas. Estas naturezas não são partes da pessoa, o que é manifesto por uma delas poder ser predicada da pessoa, como quando se diz (vide Nota 1):

"Cristo é a natureza divina".

Da mesma forma, os nomes das naturezas se predicam entre si, como quando se diz:

"Deus é homem",

e também (vide Nota 2):

"o homem é Deus",

o que não ocorre no todo integral e em suas partes.

NOTA 1.

Santo Tomás de Aquino escreve também o seguinte, a este respeito, na Summa Theologiae:

"Em Deus existe identidade da pessoa com a natureza, e por causa desta identidade a natureza divina predica-se do Filho de Deus; todavia, o modo da significação não é o mesmo, e por isso algumas coisas podem ser predicadas do Filho de Deus que não podem ser ditas da natureza divina, como quando dizemos que o Filho de Deus é gerado, e não podemos dizer que a natureza divina seja gerada".

Summa Theologiae
IIIª Parte
Q. 16 a. 5 ad. 1

NOTA 2.

Santo Tomás de Aquino também tratou deste mesmo tema da predicação mútua das duas naturezas humana e divina de Cristo em dois artigos sucessivos da terceira parte da Summa Theologiae, nos quais ele se pergunta, respectivamente, se é verdade, no tocante ao mistério da Encarnação, dizer que "Deus é homem" e que "O homem é Deus" (cf. S. Tomás de Aquino: Summa Theologiae, IIIª. P., Q. 16 a. 1-2).