CAPÍTULO VIII

Não podendo, porém, sofrer os louvores dos homens e a reverência que toda a corte romana lhe fazia, ao fim de cinco dias pediu licença ao Papa para voltar à sua pobre casa, como o fêz, de onde enviou alguns religiosos ao Papa para que habitassem no mosteiro que Sua Santidade havia reparado no lugar das Três Fontes, que é onde Paulo foi decapitado e hoje em dia tem o título de São Vicente e Anastácio.

Entre os demais monges, para lá se dirigiu como abade Bernardo de Pisa, discípulo do santo abade, grande religioso e pessoa que havia sido muito estimada no século; o qual, morto Inocêncio, Celestino e Lúcio, seus sucessores, foi eleito com total aprovação como Sumo Pontífice. Chamou-se Eugênio III, e foi para ele que depois São Bernardo escreveu aqueles divinos livros conhecidos pelo nome De Consideratione.

Não pôde, porém, o amigo de Deus sossegar outra vez em seu mosteiro como anelava. Foi, ao contrário, necessário que saísse dali apressadamente para reprimir e confundir alguns hereges que se haviam levantado naquela ocasião, como já o havia feito com os cismáticos, vendo os membros desunidos e apartados da Igreja com sua cabeça. Um destes foi Pedro Abelardo, homem de agudo engenho, mas orgulhoso e vão. Enganado pelo pai da mentira, começou a disseminar novas doutrinas e algumas opiniões falsas e perniciosas. Avisou-o o santo benigna e secretamente para que as revogasse. Vendo que com os meios brandos não alcançava êxito, em um concílio que se celebrou em Sens, na França, na presença de muitos prelados e doutores, arguíu-o e convenceu-o de tal maneira que o pobre homem, cheio de vergonha e de confusão, não soube o que responder às objeções do santo.

Também teve outro encontro com Gilberto Porretano, bispo de Poitiers, homem muito versado nas Letras Divinas, mas temerário e arrogante, o qual com mais sutileza que verdade ensinava nova doutrina no mistério da Santíssima Trindade. Disputou com o santo dois dias no Concílio de Reims, celebrado pelo Papa Eugênio III, e o fêz retratar-se dos erros que havia ensinado.

Não foi de menor dano a impiedade de um falso e perverso mestre chamado Henrique, vilíssimo apóstata, que colocou sua boca no céu e declarou guerra contra Jesus Cristo, contestando os santos sacramentos e deitando por terra os antigos usos da hierarquia eclesiástica. E porque era falador e sagaz, havia feito grande progresso pelas partes da Gasgonha, onde por sua detestável doutrina viam-se as igrejas sem sacerdotes e sem a devida reverência e, para resumi-lo em uma palavra, os cristãos sem Cristo. Enviou o Papa um legado para remediar tão graves danos, o qual passou por Claraval, levando consigo a São Bernardo, que foi recebido com incrível devoção por todos aqueles povoados. Com sua vida, doutrina e milagres arrancou dos corações daquela gente enganada a semente má que o demônio , por intermédio de Henrique, seu ministro, havia semeado; e os que haviam sido pervertidos se submeteram à fé, prendendo e entregando o herege ao bispo.

Em outra ocasião teve que sair de seu recolhimento para apaziguar os cidadãos de Metz na Lorena e alguns príncipes da comarca, que faziam guerra crua e perigosa entre si, porque não pôde negar ajuda ao arcebispo de Treveris que, como bom pastor, desejava impedir os danos de suas ovelhas e os males que aquela discórdia poderia trazer; havia vindo a Claraval em pessoa e, atirando-se aos pés do santo abade, suplicou-o humildemente, pelas chagas de Jesus Cristo, que tomasse a iniciativa para pacificar os ânimos desunidos e ferozes que com suas inimizades tão fortes ameaçavam a Igreja. O santo achava-se já velho, próximo do final de sua vida e acamado devido à enfermidade. Deu, no entanto, pela sua caridade, maior importância à saúde espiritual de seus filhos do que à sua própria. Colocando-se imediatamente a caminho com o mesmo arcebispo, o Senhor concedeu-lhe subitamente novas forças para aquela jornada, porque feita para o seu serviço. E, embora tenha encontrado dois exércitos inimigos prontos para a guerra, aplacou-os de tal maneira que, deixadas as armas de comum acordo, colocaram todas as suas diferenças em suas mãos, e ele as julgou com grande paz e contentamento das partes que aquela tempestade e turbilhão converteu-se em uma serena concórdia e tranquilidade.

Coisa maravilhosa parecerá a alguns que um pobre religioso, vestido com um saco vil e desprezível, fizesse coisas tão grandes e tão insólitas, e que tivesse tão grande autoridade e força, não apenas para converter do século ao Senhor tantas pessoas de todos os estados, como também para unir a Igreja desunida, submeter os reis, atemorizar os príncipes, confundir os hereges e persuadir os povos em tudo o que ele queria, como se fosse o senhor dos corações.