|
Mais difícil é considerar o ensino positivo do Concílio de
Nicéia. O texto do Credo fornece algumas sugestões, afirmando que
enquanto gerado o "Filho" é "da substância do Pai" e
"consubstancial ao Pai" (`homoousios').
A dificuldade aqui está em que o termo "consubstancial" pode ser
interpretado de duas maneiras. De um primeiro modo, pode significar
que o Pai e o Filho possuem uma substância idêntica em seu gênero
sem especificar se se trata de uma só ou de duas substâncias. De um
segundo modo, "consubstancial" pode significar que o Pai e o Filho
possuem uma só e mesma substância.
Antes do Concílio, o termo "consubstancial" (`homoousios')
tinha sido empregado por Orígenes no sentido de identidade genérica.
Mais tarde, após o Concílio, é fora de questão que a teologia
católica passou a empregar o termo `homoousios' no sentido de `uma
só substância'. Cabe agora perguntar qual dos dois significados os
padres conciliares de Nicéia tiveram a intenção de dar ao termo.
Não há dúvida que, enquanto aplicado à divindade, o termo
`homoousios' é suscetível deste segundo significado e, em última
análise, exige tal significado. Como os teólogos posteriores
perceberam, já que a natureza divina é imaterial e indivisível,
segue-se que as Pessoas da Divindade que a compartilham devem ter,
ou ser, uma única e idêntica substância. Mas a questão é se esta
era a idéia proeminente nas mentes dos padres conciliares, ou pelo
menos do grupo a cuja influência se deve o Credo de Nicéia.
A grande maioria dos estudiosos tem respondido afirmativamente sem
hesitar, colocando que a doutrina da identidade numérica da
substância foi o ensinamento específico do Concílio de Nicéia.
Entretanto, temos as razões mais fortes possíveis para duvidar desta
afirmação.
A principal destas razões é a história do próprio termo
`homoousios', pois anteriormente ao Concílio de Nicéia tanto no
seu uso secular como no teológico sempre significou, de modo
primário, a identidade genérica. Em vista disso é paradoxal supor
que os padres de Nicéia repentinamente começassem a empregar o que
era uma palavra bastante familiar em um sentido inteiramente novo e
inesperado.
Além disso, o grande debate anterior ao Concílio, no que todas as
fontes concordam, não era a unidade da Divindade enquanto tal, mas a
co-eternidade do Filho com o Pai, que os arianos negavam, e Sua
plena divindade em contraste com a condição de criatura que os arianos
lhe atribuíam.
A inferência razoável é que, ao escolherem o terno `homoousios',
os padres conciliares pretenderam enfatizar, formal e explicitamente,
sua convicção de que o Filho era plenamente Deus, no sentido de
compartilhar a mesma natureza divina que o Seu Pai. A teologia do
Concílio, portanto, se este argumento for sólido, teve um objetivo
bem mais limitado do que algumas vezes foi suposto. Se do ponto de
vista negativo inequivocamente o Concílio condenou o Arianismo, do
ponto de vista positivo satisfez-se em afirmar a plena divindade do
Filho e a Sua igualdade com o Pai, de cujo ser Ele derivou e cuja
natureza conseqüentemente partilhou. O Concílio não tentou abordar
o problema estritamente relacionado da unidade divina, embora a
discussão agora estava inevitavelmente próxima.
|
|