8. Se as virtudes morais podem existir sem a caridade.

Assim como explicamos, as virtudes morais, na medida em que são operativas do bem que se ordena a um fim que não excede a faculdade natural do homem, podem ser adquiridas pela obra humana. Assim adquiridas, podem existir sem a caridade, assim como existiram em muitos gentios.

Na medida, porém, em que são operativas do bem que se ordena ao fim último sobrenatural, perfeita e verdadeiramente possuem natureza de virtude, e não podem ser adquiridas por atos humanos, mas infundidas por Deus. Estas virtude morais não podem existir sem a caridade.

Dissemos acima que as virtudes morais não podem existir sem a prudência, e a prudência também não pode existir sem as virtudes morais, na medida em que as virtudes morais fazem com que o homem se ordene corretamente a certos fins, dos quais tem origem a razão da prudência.

Ora, para a reta razão da prudência muito mais se requer que o homem se ordene corretamente acerca dos outros fins, o que é feito pelas virtudes morais, assim como a reta razão nas coisas especulativas maximamente necessita do primeiro princípios indemonstrável, que é que dois contraditórios não podem ser simultaneamente verdadeiros. De onde que é manifesto que nem a prudência infusa pode ser sem a caridade, nem conseqüentemente as demais virtudes morais, que não podem existir sem a prudência.

É evidente pelo que foi dito que somente as virtudes infusas são perfeitas virtudes, e somente elas podem ser chamadas de virtudes de modo simples, porque somente elas ordenam, simplesmente falando, o homem ao seu fim último. As outras virtudes, as adquiridas, são virtudes sob um certo aspecto, não de modo simples. Ordenam corretamente o homem em relação a um fim último em algum gênero, não em relação ao fim último de modo simples. De onde que, a este respeito, lemos na Glosa de Agostinho, ao comentar a passagem da Epístola aos Romanos que diz

"tudo o que não provém da fé é pecado",

Rom. 14, 23

que

"onde falta o conhecimento da verdade falsa é a virtude mesmo nos bons costumes".