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Para além da atividade do sentido comum discernindo os diversos
sensíveis entre si temos a atividade da fantasia ou imaginação.
Aquilo que se denomina fantasia é algo que pertence ainda ao domínio
dos sentidos:
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"À vida do animal perfeito
requer-se não apenas a apreensão das coisas
em sua presença sensível,
mas também em sua ausência.
Se assim não fosse,
como o movimento e a ação do animal
seguem a apreensão,
o animal não se moveria à busca de algo ausente.
Observa-se, entretanto, o contrário,
principalmente nos animais perfeitos
que se movem por um movimento processivo
a alguma coisa que é apreendida como ausente.
É necessário, portanto,
que o animal pela potência sensitiva
não apenas receba as espécies sensíveis
ao ser imutado pela própria presença dos sensíveis,
mas que também as retenha e conserve" (34).
"A esta retenção e conservação de espécies sensíveis
se ordena a fantasia ou a imaginação,
que são a mesma coisa;
a fantasia e a imaginação são como um tesouro
de formas recebidas pelos sentidos" (35).
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A fantasia é um movimento causado pelo sentido quando este, movido
pelo sentido, passa da potencialidade ao ato de sentir, e que persiste
mesmo depois de removido o sensível (36).
Quando, ao dormir, sonhamos, as imagens que são vistas no sonho
nada mais são do que o movimento da fantasia; quando imaginamos
montanhas de ouro combinando imagens que nos chegaram anteriormente
pelos cinco sentidos, isto também é o que se chama de fantasia
(37).
Quando se passa dos sensíveis próprios para os comuns, e destes para
a fantasia, aumentam as possibilidades do homem se enganar acerca da
realidade (38).
Os sentidos, em relação aos sensíveis próprios, são quase sempre
verdadeiros, apresentando pouco de falsidade.
Já nos sensíveis comuns que se seguem aos sensíveis próprios os
sentidos costumam se enganar mais; mas na fantasia a possibilidade de
erro aumenta consideravelmente, porque os efeitos são mais débeis do
que as causas, e isto tanto mais quanto mais se afastam do primeiro
agente, menos recebendo sua força e semelhança (39). Desta
forma a fantasia, movida indiretamente pelos sensíveis através dos
sentidos próprios, é mais propensa à ocorrência de erros do que o
sentido próprio e comum. Geralmente o movimento da fantasia é
verdadeiro quando se dá simultaneamente ao movimento do sentido;
quando, porém, ocorre na ausência do sentido, o erro pode acontecer
com facilidade não apenas em relação aos sensíveis comuns como
também em relação aos sensíveis próprios (40).
A maioria dos animais operam apenas segundo a fantasia, que é, como
todo sentido, material. Nos animais brutos isto ocorre porque eles
estão privados totalmente de intelecto; mas no homem isto também
ocorre quando por diversas razões o intelecto é obscurecido em seu
funcionamento por causa de alguma paixão veemente, por causa de alguma
enfermidade, ou mesmo por causa do sono. Neste caso o intelecto não
prevalece sobre a fantasia, e o homem segue a apreensão fantástica
como verdadeira (41).
Os animais seguem a fantasia porque a fantasia persevera mesmo na
ausência do sensível. Como a fantasia é semelhante ao sentido em
ato, assim como o sentido em ato move o animal ao sensível presente,
assim também a fantasia o faz na ausência do sensível (42).
Aristóteles não se pronunciou a respeito da potência à qual
corresponde à fantasia; entretanto, na Summa Theologiae Tomás de
Aquino deixa claro que a fantasia pertence aos sentidos interiores do
homem (43).
Referências
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(34) Summa Theologiae, Ia, Q.78 a.4.
(35) Idem, loc. cit..
(36) In librum De Anima Commentarium, L. III, l. 6, 658-659.
(37) Idem, L. III, l. 4, 633. (38) Idem, L.
III, l. 6, 659-660. (39) Idem, L. III, l.
6, 664. (40) Idem, L. III, l. 6, 665. (41)
Idem, L. III, l. 6, 670. (42) Idem, L. III,
l. 6, 669.
(43) Summa Theologiae, Ia, Q.78 a.4.
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