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Quanto à disposição dos tempos, seja suficiente a título de
exemplo o quanto já foi dito. Passemos a tratar agora daquela ordem
que pode ser considerada em cada coisa segundo a adequada disposição
de suas partes. Esta última é, na verdade, intrínseca; as
demais, segundo o lugar e o tempo, são extrínsecas. E aqui não
menos admirável é a eficácia da sabedoria que tão adequadamente
distribuiu em tudo cada coisa de tal modo que nunca a união das partes
gerasse a repugnância das qualidades.
Eis, para que ponhamos como exemplo um pouco do muito que
poderíamos, quanta sabedoria do Criador não resplandesce na
composição do corpo humano? Na sua parte superior o homem é
uniforme, na sua parte inferior, dividido em dois; pois é uniforme o
que há de principal na mente, isto é, a razão, que diz respeito
às coisas invisíveis, e gêmea é a concupiscência, a qualidade da
alma que se estende para baixo às coisas terrenas. Os braços se
estendem para os lados e as pernas para baixo, fixando a estatura do
corpo humano, porque a aplicação ao trabalho estende a alma,
enquanto que o afeto dos desejos a fixa. A extensão do corpo humano
termina pelas mãos ou pelos pés em cinco dedos; pois, tenda a alma
para o lado pela aplicação ao trabalho, ou fixe-se para baixo pelo
desejo do afeto, cinco são os sentidos pelos quais sai para o
exterior. Os dedos são divididos por três intervalos de
articulações, que nas mãos se originam de uma só palma, nos pés
se originam de uma só planta; pois de uma só sensualidade se originam
os cinco sentidos, nos quais por uma primeira divisão encontramos o
sentido, depois o sentir e finalmente o sensível. Em cada um dos
dedos a cabeça das extremidades das articulações são cobertas por
unhas, como se fossem capacetes, para que onde quer que as mãos ou os
pés encontrem obstáculo, protegidos pela sua presença, possam
permanecer ilesos. Semelhantemente, as coisas terrenas que nos
protegem nas necessidades, à semelhança das unhas que estão além
dos sentidos, quando não mais se fazem necessárias podem ser cortadas
sem que se as sintam como se estivessem para além da carne.
Eis a face humana; com que divisão racional lhe foram colocados os
instrumentos dos sentidos! O lugar supremo cabe à visão nos olhos.
Depois, a audição nos ouvidos; em seguida, o olfato no nariz; e
finalmente, o gosto na boca. Sabemos que todos os outros sentidos
vêm do exterior para o interior; somente a visão do interior sai para
o exterior, distinguindo-se entre os demais por discernir as coisas
situadas externamente com admirável agilidade. Como se fosse capaz de
especulação, é com justos motivos que detém entre todos o lugar
mais eminente, sendo capaz de prever, diante do perigo, aquilo que
está para acontecer aos demais sentidos. Depois dela, o segundo
lugar, pelo lugar e pela nobreza, pertence ao ouvido. Em seguida,
ao olfato. Quanto ao gosto, porém, que nada pode sentir a não ser
aquilo que toca, merecidamente, por ser o mais tardo entre todos os
sentidos, ocupa o ínfimo dos lugares. O tato não possui uma sede
especial, sendo universal porque coopera com todos os sentidos. De
onde que entre os dedos o polegar, que significa o tato, corresponde
sozinho a todos os demais dedos reunidos em um só todo, porque sem o
tato nenhum sentido pode existir.
Vê também como no corpo humano os ossos são colocados internamente,
na medida em que pela força deles o corpo é sustentado; em seguida,
a carne veste os ossos, para que a dureza deles seja percebida pelo
tato sem aspereza. Por último, a pele reveste a carne, e pela sua
tenacidade protege o corpo dos acidentes externos. Fazei atenção
também a como aquilo que é mole e enfermiço é posto no meio, como
que em lugar mais seguro, para que não se despedace nem por falta de
suporte interno, nem por falta de proteção externa.
Tudo isto que, porém, exemplificamos em uma só coisa, na verdade
pode ser encontrado em todos os gêneros de coisas. De fato, é assim
que a casca protege as árvores, as penas e bicos as aves, as escamas
os peixes, e para cada uma das coisas, segundo a competência de sua
natureza, a providência do Criador instituiu sua proteção.
Até aqui falamos da posição. Passemos agora ao movimento.
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