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Respondo dizendo que a intenção geral de todos foi a de, na medida
do possível, reduzir a multidão à unidade, e a variedade à
uniformidade.
A. Os antigos, por isso, considerando a diversidade das ações nos
corpos inferiores, pensaram em reduzí-los a alguns poucos e simples
princípios, isto é, aos elementos, muitos ou mesmo um só, e às
qualidades elementares. Esta posição, porém, não é razoável.
As qualidades elementares, de fato, são encontradas nas ações das
coisas materiais como princípios instrumentais. Sinal disto é que
não possuem o mesmo modo de ação em todas as coisas, não podendo as
ações destas mesmas coisas chegar a um mesmo término. As qualidades
elementares possuem um efeito no ouro, outro na madeira, outro na
carne do animal, o que não aconteceria senão por agirem na medida em
que são regulados por outro. A ação do agente principal, porém,
não se reduz à ação do instrumento como ao seu princípio, mas
inversamente, assim como o efeito da arte não deve ser atribuído à
serra do artífice. De onde que os efeitos naturais não podem ser
reduzidos às qualidades elementares como a primeiros princípios.
B. De onde que outros, isto é, os platônicos, reduziram a
diversidade das ações nos corpos inferiores às formas simples e
separadas como a primeiros princípios, a partir das quais, conforme
diziam, proviria o ser e a geração nas coisas inferiores, assim como
toda a propriedade natural. Mas isto também não pode ser, pois de
uma causa que se encontra de um mesmo modo segue-se um efeito que se
encontra também do mesmo modo; estas formas, porém, eram colocadas
como sendo imóveis, de onde que seria necessário que a geração a
partir delas fosse sempre uniforme nos corpos inferiores. É o
contrário, porém, o que vemos pelos sentidos.
C. De onde que importa colocar que os princípios da geração e da
corrupção e dos outros movimentos que se seguem nos corpos inferiores
são algo que não se encontra sempre do mesmo modo. É necessário,
todavia, que os primeiros princípios da geração e da corrupção
sempre permaneçam, de tal maneira que a geração possa ser
contínua. É necessário, por isso, que eles sejam invariáveis
segundo a substância, e que se movam segundo o lugar para que, pela
aproximação e pelo afastamento e pelos movimentos vários e
contrários produzam efeitos contrários e diversos nos corpos
inferiores. Estes são os corpos celestes, e por isso é necessário
reduzir todos os efeitos a estes assim como a causas.
D. Mas nesta redução houve dois erros.
a. Alguns, de fato, reduziram os corpos inferiores aos celestes como
a causas primeiras simplesmente consideradas, pelo fato de julgarem
não existir nenhuma substância incorpórea. Diziam, por isso, que
os primeiros nos corpos seriam também os primeiros nos entes.
Isto, porém, é manifestamente falso. É necessário, de fato,
que tudo o que é movido seja reduzido a um princípio imóvel, já que
nada se move a si mesmo e não se pode prosseguir de causa em causa até
o infinito. O corpo celeste porém, embora não varie segundo a
geração e a corrupção ou segundo algum movimento que varie algo que
esteja em sua substância, é movido segundo o lugar. É necessário,
portanto, fazer-se a redução a algum primeiro princípio de maneira
que assim como as coisas que são alteradas podem ser reduzidas, por
uma certa ordem, a um alterante não alterado movido, todavia,
segundo o lugar, este também, ulteriormente, possa ser reduzido ao
que de nenhum modo é movido.
b. Alguns, porém, colocaram os corpos celestes serem causas dos
corpos inferiores não somente quanto ao movimento, mas também quanto
à sua primeira instituição. É assim que Avicenna diz na sua
Metafísica que a partir daquilo que é comum a todos os corpos
celestes, isto é, a natureza do movimento circular, é causado nos
corpos inferiores aquilo que lhes é comum, isto é, a matéria
primeira, e a partir daquilo em que os corpos celestes diferem entre si
é causada a diversidade das formas nos corpos inferiores, de modo que
os corpos celestes são intermediários entre Deus e os corpos
inferiores inclusive, de certa maneira, na criação.
Isto, porém, é alheio à fé, a qual coloca a natureza de todas as
coisas segundo a sua primeira instituição ter sido feita imediatamente
por Deus.
Que uma natureza, porém, seja movida por outra, pressupostas as
virtudes naturais de ambas as criaturas conferidas por obra divina,
não é contra a fé. Colocamos, por isto, os corpos celestes serem
causas dos corpos inferiores somente por via de movimento, sendo assim
intermediários na obra do governo, não, porém, na obra da
criação.
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