CAPÍTULO 10

Mas para que não se julgue que a dificuldade esteja apenas nos discursos proféticos, já que para todos é certo que o estilo profético está semeado de figuras e enigmas, o que deveremos dizer quando nos aproximamos do Evangelho? Não se esconde ali também um sentido interior, como que um sentido divino, que somente é revelado por aquela graça que a recebeu aquele que dizia:

"Nós, porém, temos o pensamento de Cristo, para que conheçamos as coisas que por Deus nos foram dadas. Falamos não com palavras aprendidas de humana sabedoria, mas na doutrina do Espírito".

I Cor. 2, 16-12-4

E quanto às coisas que foram reveladas a João, como não se admirará, quem as ler, de que haja ali ocultos tantos inefáveis mistérios, nos quais tão manifestamente também aqueles que não podem entender o que neles se esconde, entendem todavia que algo se esconde? Também as cartas dos apóstolos, as quais a alguns parecem que sejam mais fáceis, não estão elas igualmente repletas de sentidos tão profundos que, para aqueles que podem entender o sentido da sabedoria divina, parece que se lhes infunde, por um pequeno receptáculo, a claridade de uma luz imensa?

Já que estas coisas são assim e há tantos que erram nesta vida, julgo que não é coisa destituída de perigo que se declare facilmente que alguém as conhece ou as entende. Tratam-se de coisas que, para que possam ser abertas, é preciso usar a chave da ciência, chave que o Salvador dizia estar com os doutores da lei. Embora estejamos nos desviando de nosso tema, considero que deveria ser assunto de reflexão para aqueles que dizem que antes do advento do Salvador não havia verdade junto aos que eram versados na Lei, como é possível que Jesus Cristo, Nosso Senhor, diga que as chaves da ciência estejam junto aos que tinham os livros dos profetas e da Lei em suas mãos? De fato, é assim que ele diz:

"Ai de vós, doutores da Lei, que usurpastes a chave da ciência, e nem entrastes vós, nem deixastes entrar os que queriam entrar".

Lc. 11, 52