CAPÍTULO 80

Francesco Petrarca era filho de um advogado de Florença que, por ocasião de uma revolta em 1302, tinha sido obrigado a fugir da cidade. Dois anos depois, no exílio, nascia Petrarca.

Quando Petrarca tinha aproximadamente 10 anos de idade, seu pai transferiu-se juntamente com a família para a cidade de Avinhão, na França. Nesta época a Cúria Romana estava em Avinhão e a cidade oferecia maiores oportunidades para o trabalho de um advogado.

Já adolescente, Petrarca foi mandado pelo seu pai para Bolonha, com a finalidade de estudar Direito. Segundo o historiador Will Durant, Petrarca adorou a cidade, mas odiou o Direito. Dizia ele que era contra o seu espírito

"adquirir tão penosamente uma arte que dificilmente poderia vir a praticar senão desonestamente".

Dos tratados de Direito tudo o que lhe interessava era a imensa quantidade de referências que havia neles a respeito da antiguidade romana.

Assim, em vez de estudar as leis, em Bolonha Petrarca punha-se a ler tudo o que podia encontrar sobre Virgílio, Cícero e Sêneca, os grandes poetas e oradores do mundo antigo. As poucas obras que ele pôde encontrar destes autores lhe abriram novas perspectivas quanto à arte literária. Petrarca começou a pensar como eles e esforçava- se a escrever também como eles. Em 1326, quando seus pais faleceram, Petrarca abandonou o estudo das leis, retornou a Avinhão e se dedicou à poesia.

Petrarca possuía suficientes recursos para permitir-se uma vida de lazer e de viagens. Durante a primeira metade da década de 1330 ele visitou Paris, a Bélgica, a Alemanha e Roma.

Retornando a Avinhão foi durante anos hóspede no palácio de um dos principais cardeais, onde podia encontra-se com os melhores estudantes, professores, homens da Igreja, advogados e estudiosos da Itália, da França e da Inglaterra, comunicando-lhes, continua ainda Will Durant, parte de seu entusiasmo pela literatura antiga.

Finalmente, Petrarca comprou uma chácara situada a quinze milhas de Avinhão, para onde se retirava e escrevia longas cartas não só para seus amigos, como também para Papas, reis, homens famosos da antigüidade já falecidos há séculos e também para a posteridade. De toda esta correspondência, escrita no melhor estilo latino de Cícero, ele tirava cópias que eram arquivadas e revisadas para serem publicadas após a sua morte.

Petrarca aceitava com sinceridade toda a doutrina religiosa proposta pela Igreja, mas vivia em espírito entre os grandes escritores romanos. Escrevia cartas para Homero, Cícero e Tito Lívio como se fossem seus amigos íntimos e lamentava-se que não tivesse nascido nos dias da antiga Roma.

Durante os estudos de sua juventude em Bolonha ele havia tido notícia da existência de numerosos clássicos da literatura antiga que haviam sido esquecidos ou perdidos. Uma de suas maiores paixões tornou-se a caçada a estas obras das quais se sabiam os nomes mas não se sabiam onde estavam os respectivos textos, no que foi favorecido por suas numerosas viagens.

Em 1340 Petrarca foi coroado com louros pelo Senado Romano em consideração pelos seus trabalhos poéticos; na mesma época foi hóspede da corte do Rei de Nápoles; passou depois aquela década viajando por Pisa, Bolonha e Verona. Quando veio a Peste Negra, Petrarca era hóspede da corte de Pádua; estêve também em Mântua e Ferrara.

Em 1350 visitou a cidade de Roma por ocasião do ano santo. Durante a viagem conheceu em Florença o seu futuro amigo Bocaccio, outro dos grandes nomes do Renascimento literário dos anos 1300.

Em 1351 já estava de volta em Avinhão. Em 1353 foi hóspede das cortes de Milão. Na década de 1360 morou em Veneza; em 1370 mudou-se novamente para Pádua, onde finalmente morreu.

Durante suas viagens Petrarca descobriu em 1333, em uma biblioteca da uma igreja em Liège, dois discursos perdidos de Cícero. Em 1345 descobriu em um mosteiro de Verona um manuscrito contendo várias cartas de Cícero a Ático, Quinto e Brutus.

Estas descobertas chamaram a atenção de Petrarca para o fato de que nas bibliotecas de muitos mosteiros da Europa havia cópias destas obras antigas. Na verdade elas eram desconhecidas apenas pelo fato de que não só os monges, mas toda a civilização medieval nunca lhes havia dado valor ou se interessado por elas mais do que por um exercício de gramática. Eram obras que primavam pela beleza do estilo latino com que estavam escritas, mas de muito pouco valor quanto ao seu conteúdo. Nos mosteiros em que havia cópias manuscritas estes textos às vezes eram utilizados como um exercício de gramática latina ou simplesmente estavam encostados em algum canto menos freqüentado da biblioteca.

Mas quando Petrarca descobriu que escondidas pelos mosteiros da Europa jaziam esquecidas muitas daquelas obras que há séculos não se dava mais valor, e das quais geralmente não se conheciam senão os nomes, passou a considerar, conforme cita Will Durant, aqueles textos

"como mercadoria mais valiosa do que qualquer coisa que lhe pudesse vir das Arábias ou da China".

Inspirou seus amigos a procurarem e a copiarem pela Europa manuscritos perdidos da literatura grega e latina, exigiu a abertura de bibliotecas públicas e, durante suas viagens, transcreveu ele próprio numerosos manuscritos. Quando em sua chácara em Avinhão, contratou copistas para viverem com ele e fazerem novas cópias daqueles manuscritos que ele havia juntado.