QUESTÃO QUADRAGÉSIMA TERCEIRA.

Diz o Apóstolo:

"entregou-os Deus aos desejos de seu coração, às paixões da ignomínia, a um sentimento depravado".

Rom. 1, 24-28

Por estas autoridades, e muitas outras, como esta:

"Deu-lhes um espírito de torpor, para que vendo não vejam, e ouvindo não ouçam";

Rom. 11, 8

e também:

"Endureceu-se o coração do Faraó";

Ex. 7, 13

"Ele tem misericórdia de quem quer, e endurece a quem quer".

Rom. 9, 18

Por estas e por muitas outras passagens parece que muitos males podem realizar-se por obra de Deus. Santo Agostinho também reúne em um mesmo lugar muitas passagens para argumentar a este respeito, depois do que conclui que por elas fica manifesto que pertence a Deus operar no coração dos homens, nos bons inclinando pela sua misericórdia aos bens e nos maus inclinando aos males pelo seu julgamento, às vezes oculto, às vezes manifesto, sempre, todavia, justo.

Do mesmo modo, lemos no Apocalipse:

"Porventura não é justo que aquele que está na impureza se torne ainda mais impuro?"

De onde vem esta justiça? Não será de Deus, de quem provém toda justiça? De onde que parece que é Deus quem opera isto. Do mesmo modo, o pecado que é pena de um pecado precedente, de quem provém? Toda justiça provém de Deus, e este pecado é uma pena justa, de onde que parece que tem sua origem de Deus.

SOLUÇÃO.

Alguns respondem a isto dizendo que todo pecado provém de Deus, não apenas aquele que é pena de outro pecado, mas também aquele que é apenas culpa, os quais concedem que o furto, o latrocínio, o adultério, provém de Deus, conforme diz o profeta:

"Não há mal na cidade que não seja por disposição de Deus".

Amós 3, 6

Estes também pela razão procuram provar o mesmo: toda essência, de fato, provém de Deus. Ora, a vontade má e a ação má são pecado, e possuem essência, de onde que se conclui, segundo a opinião deles, que o pecado provém de Deus.

A estes pode-se objetar: o que é fazer o pecado, senão pecar? O que é fazer adultério, senão adulterar? O que é fazer o furto, senão furtar? De onde que se se concede que Deus faz o pecado segue-se que Deus peque, furte, adultere e mate, o que não apenas é nefando de se dizer, como também de se pensar.

Esta objeção sobre a vontade má e sobre a ação não boa, que são algo, e que, deste modo, procederiam de Deus, resolve-se deste modo: o pecado, considerado em si mesmo, é uma coisa distinta do pecado considerado segundo outro. O pecado, considerado em si mesmo, é uma certa desordenação ou privação da justiça. Neste sentido, ele nada mais é do que a ausência da justiça, de onde que não procede de Deus, por não ser nada. Deus, de fato, não pode ser o autor daquilo que nada é. A vontade má e a ação não boa são pecados segundo outro, isto é, segundo uma desordenação; são alguma coisa, mas são ditas pecado não pelo que possuem, mas pelo que não possuem. São, efetivamente, pecado, porque não possuem ordem nem modo.

Quanto à autoridade do profeta, a qual diz que

"Não há mal na cidade que não seja por disposição de Deus",

pode entender-se do mal da adversidade ou do mal da perversidade. Ou talvez nem sequer tenhamos que entendê-la do mal da adversidade, se examinarmos mais diligentemente a circunstância desta Escritura. Acrescenta, de fato, o profeta logo a seguir:

"porque o Senhor nada faz sem ter revelado antes o seu segredo aos profetas seus servos".

Amós 3, 7

Há alguns que levantam objeções semelhantes quanto ao poder de pecar, pois ele provém de Deus; sendo ele pecado, deste modo parece que o pecado provém de Deus. Mas este argumento de nada vale, porque o poder de pecar nem é pecado, nem é causa suficiente do pecado sem a vontade.