|
Em seu pontificado Gregório VII promulgou uma lei que se dirigia diretamente à raíz
dos males que tinham se alastrado na Igreja durante os últimos séculos.
Por determinação pontifícia, dali para a frente ficava proibida, sob pena de
excomunhão, que um leigo investisse um clérigo em cargos eclesiásticos.
Dada a tão grande relevância que uma medida como esta tinha diante dos problemas da
Igreja daquela época, cabe perguntar por que uma lei tão importante como foi esta não
havia sido promulgada muito tempo antes.
A resposta é que não teria bastado uma simples promulgação. Devia-se ter os meios
para fazê-la valer. Gregório VII enviou legados, dotados de plenos poderes, para as
diversas partes da Europa supervisionar a execução de seus decretos contra as
investiduras leigas e punir os desobedientes. A resistência dos senhores feudais e do
Imperador foi gigantesca. A impressão geral que se tinha era que desta vez o Papa
Gregório havia exagerado muito e temerariamente. Os detentores do poder civil se
consideraram roubados em um direito que, para as perspectivas da época,
consideravam legítimo. Obedecer a lei significava, para o poder temporal, além de
uma afronta a direitos considerados legítimos, perder uma copiosa fonte de rendas e
uma valiosíssima colaboração do clero nos assuntos temporais. Os senhores feudais
eclesiásticos no Sacro Império Romano Germânico eram os principais pilares da
autoridade imperial, a qual, devido ao sistema feudal, já não era forte. Obedecer aos
decretos de Gregório VII, do modo como foram promulgados, significava para o
Imperador perder repentinamente seu principal ponto de apoio político.
Em vista destas considerações, o que veio a suceder em seguida no Sacro Império foi
precisamente o que teria sido de se esperar. O Imperador desprezou abertamente os
decretos de Gregório VII e, mais ainda, acusou-o publicamente de pretender usurpar a
coroa imperial, de defender a heresia, de praticar o adultério, de cultivar a magia e de
ser um feroz sanguinário. Convocou, ademais, como não poderia ter deixado de o
fazer, as tropas do exército imperial para marcharem contra Roma e deporem um Papa
tão indigno, em sua opinião, de ocupar a sucessão de São Pedro.
O Imperador preparava-se para depor o Papa pela força armada, um papa o qual,
afinal de contas, do ponto de vista legal daquela época, não passava de um vassalo do
Sacro Império, quando Gregório VII, tendo sabido sobre o modo como o Imperador
havia acolhido os seus decretos, teve não apenas a coragem de excomungá-lo como
também, uma coisa não só inédita na história como totalmente impensável no contexto
daquela época, decretou a deposição do Imperador do trono do Sacro Império,
desobrigando a todos os seus súditos do juramento de fidelidade ao Imperador.
O aspecto mais assombroso deste decreto, além do fato de se tratar de coisa totalmente
sem precedentes, é que São Gregório não possuía poder militar algum para poder
impor a execução de uma determinação como esta.
Mas já há cinco pontificados que o prestígio e a fama de santidade dos Pontífices se
havia espalhado pela Europa. Para a surpresa do Imperador, assim que o decreto do
Papa Gregório ficou conhecido, não houve mais um único de seus súditos que
estivesse disposto a obedecê-lo. O Imperador se viu obrigado a peregrinar até o
castelo de Canossa na Toscana onde Gregório VII estava hospedado e passar três dias
e três noites do lado de fora, como simples peregrino, no meio da neve, até que o Papa
o absolvesse da excomunhão que lhe havia sido decretada.
|
|