CAPÍTULO 82

Petrarca havia aconselhado Bocaccio a dedicar-se ao estudo dos clássicos gregos e latinos. Apesar disso, o próprio Petrarca não sabia ler grego. Ele possuía algumas cópias das poesias de Homero as quais, embora as guardasse com muito carinho, não era capaz de ler.

Este problema, no entanto, não era apenas de Petrarca. Na verdade, era dificílimo nos anos 1300 encontrar alguém na Itália que conhecesse a língua grega.

Nem sempre havia sido assim. No antigo Império Romano, embora no Oriente predominasse a língua grega e no Ocidente a latina, na cidade de Roma falava-se fluentemente ambas as línguas.

Na época do início do Cristianismo as crianças dos nobres romanos costumavam ser educadas por escravas gregas e, freqüentemente, por causa deste costume, aprendiam a língua grega antes da latina. Entre o povo romano a língua grega era tão comum que na própria Roma a Liturgia da Missa era celebrada em grego. Outro sinal do grau de difusão da língua grega na cidade de Roma é constituído pelo fato de que, quando o Apóstolo São Paulo quis escrever a sua Carta aos Romanos, redigiu-a em língua grega e não na latina. A mesma coisa fêz São Marcos quando, estando em Roma, baseando- se nos relatos de São Pedro que também lá estava, escreveu seu Evangelho para ser lido pela comunidade romana. O Evangelho de São Marcos foi escrito em grego, e não em latim.

Mas, aos poucos, o uso da língua grega foi diminuindo. Na Idade Média somente alguns poucos eruditos conheciam esta língua, e até mesmo uma pessoa como Santo Tomás de Aquino não sabia ler grego.

Nos decadentes anos de 1300 a situação ficou ainda pior. Encontrar na Itália alguém que soubesse grego era algo como procurar uma agulha em um palheiro.

Em 1342 Petrarca, em seu amor à literatura antiga, havia começado a estudar grego com um monge da Calábria. Logo em seguida, porém, este monge foi elevado à dignidade episcopal e teve que interromper as aulas. Com isto Petrarca nunca mais encontrou livros ou pessoas que pudessem lhe ensinar a língua grega.

Já o novo Bocaccio teve melhor sorte. Agora sob a orientação de Petrarca, conseguiu entrar em contato na cidade de Milão com Leôncio Pilatos, um ex aluno daquele monge calabrês que havia sido professor de Petrarca antes de se tornar bispo. Bocaccio levou Leôncio Pilatos para Florença e persuadiu a Universidade desta cidade a abrir uma cátedra de grego para ser ocupada por Pilatos. Petrarca ofereceu-se para pagar ele próprio o salário do novo professor e enviou-lhe cópias gregas da Ilíada e da Odisséia de Homero que ele próprio não conseguia ler para que fossem traduzidas para o Latim.