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Para tratar de tantas e tais coisas não basta confiar a sumidade deste
assunto aos sentidos humanos e à inteligência comum, discorrendo,
por assim dizer, visivelmente sobre as coisas invisíveis. Devemos
tomar também, para a demonstração das coisas de que falamos, os
testemunhos das Divinas Escrituras. No entanto, para que estes
testemunhos possam oferecer-nos uma fé certa e indubitável, tanto
nas coisas que haveremos de dizer, como nas que já dissemos,
parece-nos ser necessário mostrar antes que as próprias Escrituras
são divinas, isto é, inspiradas pelo Espírito de Deus.
Mostraremos, tão brevemente quanto pudermos, o que as próprias
Escrituras nos dizem a este respeito e que nos possa mover
competentemente. Falaremos, pois, de Moisés, o primeiro
legislador do povo hebreu, e das palavras de Jesus Cristo, autor e
príncipe da religião e do dogma dos cristãos.
Entre gregos e bárbaros. de fato, existiram muitos legisladores e
também inúmeros doutores e filósofos afirmando oferecer a verdade.
Não nos lembramos, porém, de nenhum legislador que tenha podido
produzir tal afeto e dedicação nas almas dos povos estrangeiros a tal
ponto que estes aceitassem livremente as suas leis ou com toda a alma
defendessem as suas intenções. Ninguém houve também que tenha
podido sugerir ou dar a conhecer aquilo que lhe pareceu ser a verdade,
não digo a muitas nações estrangeiras, mas nem mesmo sequer a um só
povo, para que todos alcançassem a sua ciência ou a sua fé. E, no
entanto, não se pode duvidar que os legisladores gostariam que suas
leis fossem obedecidas por todos, se isto fosse possível, e que os
mestres apreciariam que aquilo que lhes pareceu ser a verdade fosse
também conhecido por todos. Sabendo, porém, que não seria de
nenhum modo possível que neles subsistisse tamanha virtude que fosse
capaz de convidar as nações estrangeiras à observância de suas leis
ou de suas afirmações, nem sequer ousaram começar a fazê-lo, para
que não ficassem conhecidos como imprudentes por semelhantes
iniciativas ineficazes e inexecutáveis.
São, no entanto, multidões inumeráveis, em toda a face da terra,
em toda a Grécia e em todas as demais nações estrangeiras, aqueles
que, abandonando as leis de sua pátria e aqueles que consideravam
deuses, se entregaram à observância da lei de Moisés e ao
discipulado e ao culto de Cristo, e isto não sem um grande ódio
levantado contra si por parte daqueles que veneram os simulacros, a
ponto de serem freqüentemente atormentados por parte destes e algumas
vezes inclusive conduzidos à morte. Mesmo assim, abraçam e observam
com todo o afeto a palavra do ensinamento de Cristo.
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