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A razão nos persuade que isto, bem de outra maneira, também é
verdade no Criador.
Cremos que ele sempre tenha existido; é necessário, pois,
confessarmos que Ele também sempre tenha possuído a sabedoria.
Será coisa impossível, se dissermos que alguma vez ele tenha
existido sem a sabedoria, descobrirmos quem depois o tornou sábio, ou
de onde recebeu ele a sabedoria, sendo o maior dos absurdos e coisa
alheia a toda a razão crer que aquele que é fonte e origem da
sabedoria pudesse alguma vez ter existido sem ela. Sempre, por
conseguinte, a sabedoria esteve nEle, sempre a sabedoria proveio
dele, sempre a sabedoria esteve com Ele.
Sempre a sabedoria esteve nele, porque sempre a possuiu; sempre foi
sábio. Sempre a sabedoria proveio dEle, porque a sabedoria que
possui, ele mesmo a gerou. Sempre a sabedoria esteve com Ele,
porque tendo-a gerado, esta não se dividiu de quem a gerou. Sempre
foi gerada, e sempre é gerada; não tem início sendo gerada, nem
fim tendo sido gerada; é sempre gerada, porque eterna; sempre tendo
sido gerada, porque perfeita.
Há, pois, quem gerou e quem foi gerado. Quem gerou é o Pai;
quem foi gerado é o Filho. Quem gerou, sempre gerou; é,
portanto, Pai eterno. Do mesmo, quem foi gerado, sempre foi
gerado; é, portanto, Filho coeterno ao Pai eterno.
Ademais, quem sempre possuiu a sabedoria sempre a amou. Aquele que
sempre amou, sempre possuiu o amor. Assim, o amor é co-eterno ao
eterno Pai e Filho. Todavia, o Pai não procede de ninguém, o
Filho apenas do Pai, e o amor simultaneamente do Pai e do Filho.
Estabelecemos, porém, acima, que o Criador de todas as coisas
possui verdadeira e suma unidade; é necessário, pois, que
confessemos em Deus estes três serem um só em sua substância. Por
outro lado, temos que quem foi gerado não pode ser o mesmo que aquele
de quem foi gerado; nem quem procede daquele que gera e daquele que foi
gerado pode ser o mesmo que o que gera ou o que foi gerado. Desta
maneira, somos coagidos pela inexpugnável razão da verdade a
reconhecer na divindade a trindade das pessoas e a unidade da
substância. Na divindade a substância é uma só e comum para todas
as três pessoas, assim como também é igual a eternidade e eterna a
igualdade, a substância não podendo ser diversa para com cada uma das
pessoas se é ela que lhes faz ser única e comum a divindade.
As três, portanto, são um, porque em três pessoas há uma só
substância, mas as três não são um, porque assim como a
distinção das pessoas não divide a unidade, assim a unidade da
divindade não confunde a distinção das pessoas.
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