CAPÍTULO 33

Eram, em grandes linhas, as orientações gerais das idéias pedagógicas no mundo civilizado até a Renascença. Foi então que estas idéias começaram a mudar.

A época em que foi concebida a seqüência do Trivium e do Quadrivium foi a época logo após Santo Agostinho, embora a primeira tivesse suas raízes na pedagogia dos oradores e a segunda no próprio Platão. A época em que se iniciou a formação das primeira universidades foi a época de Santo Anselmo e Hugo de São Vitor. A época em que foi introduzida a Filosofia nos estudos universitários foi a de São Boaventura e de Santo Tomás de Aquino. Esta foi a época dos primeiros Concílios da segunda coluna da tabela comentada na primeira parte desta Introdução, os Concílios de Latrão, do primeiro ao quarto e os dois de Lião.

A partir daí todo este sistema começou a decair. Esta decadência do sistema de ensino foi uma das primeiras causas que levaram ao Renascimento, um dos primeiros fatores que influíram em seu surgimento.

33. As primeira universidades haviam-se formado espontaneamente, sem iniciativa alguma por parte de governantes ou de autoridades. Eram corporações de alunos e professores que atravessavam o continente europeu apenas em busca da sabedoria das coisas de Deus.

Mas em torno do ano 1200 DC a Universidade de Paris foi reconhecida pelas autoridades; foram-lhe concedidas inúmeros privilégios, tanto por parte da Santa Sé como por parte dos reis. Aos poucos os professores passaram a gozar de uma posição conceituada na sociedade pelo cargo que ocupavam. No início, se eles eram pobres ou ricos, bem posicionados ou não perante a sociedade, isto se devia a fatores independentes de suas relações com a Universidade. Vários destes primeiros professores, assim como também muitos alunos, chegaram a pedir esmolas para sobreviverem e os alunos mais ricos eram quem freqüentemente os ajudavam. Mas à medida em que crescia o prestígio da instituição e em outras partes do mundo fundavam-se outras universidades, algumas das quais dedicadas ao estudo do Direito ou da Medicina, seus catedráticos passaram a ser pessoas de préstimos disputados pelas cortes. Gradualmente estes professores passaram a gozar de uma posição conceituada na sociedade em que viviam devido precisamente ao cargo que ocupavam; a cátedra se havia tornado um posto importante e a universidade passou a atrair pessoas pela posição social e não mais por causa da busca da sabedoria. Precisamente por este motivo, entre outros, tanto o nível como a concepção começaram a cair.

Um pequeno detalhe veio a se transformar em uma inovação capaz de provocar uma completa transformação nos pressupostos implícitos em todo o sistema educacional. Foi a invenção do diploma, o qual, sob a forma de "licentiae docendi" ou "licenças para ensinar", surgiu pela primeira vez na história humana no início dos anos 1200 DC. Conferidos pela Universidade, reconhecidos pela Santa Sé e pelas nações então emergentes na Europa, as "licentiae docendi" tiveram o mérito de contribuir poderosamente para a expansão quase exponencial que a instituição universitária teve em toda a Europa nos séculos seguintes. Mas poucos foram os que tiveram a perspicácia de perceberem que talvez houvesse algum motivo para que Platão, afinal de contas, jamais houvesse dado um diploma nem a Aristóteles, nem a nenhum de seus alunos, assim como também nem o haviam feito, nas instituições sobre as quais eram responsáveis, Pitágoras ou Hugo de São Vitor. Em meio ao sucesso que a nova instituição universitária conquistava rapidamente, poucos foram no século XIII os que perceberam com suficiente clareza que com isto passava-se a atrair para a parte mais nobre da educação humana um novo tipo de aluno conduzido por motivações bastante diversas daquelas que conduziam os homens dos séculos anteriores quando aspiravam ao conhecimento superior. Daí para a alteração de toda a orientação fundamental do ensino bastariam apenas mais alguns passos, com a perda de um patrimônio de consciência e conhecimento dificilissimamente reparável e já impossível de ser corretamente avaliado pelos que nele deveriam estar interessados.