CAPÍTULO 3

Para que, porém, possamos entender mais comodamente as coisas que devem ser ditas sobre a contemplação e poder mais retamente julgá-las, devemos primeiro investigar o que ela seja determinando ou definindo como ela difere do pensamento ou da meditação.

Deve-se saber que um mesmo e idêntico assunto pode ser apreendido de um modo diverso pelo pensamento, trabalhado de outro pela meditação e admirado ainda por outro pela contemplação.

O pensamento vaga por caminhos impraticáveis, sem relação com um achado final, passo a passo, por um ou outro lugar.

A meditação se esforça com grande indústria de alma por caminhos freqüentemente duros e ásperos em direção a um determinado fim.

A contemplação, por um vôo livre, onde quer que seja conduzida, o faz pelo ímpeto de uma admirável agilidade.

O pensamento arrasta-se, a meditação caminha ou, quando muito, corre. Mas a contemplação voa e, se quiser, se eleva às alturas.

O pensamento é sem trabalho e sem fruto, a meditação possui trabalho com fruto, enquanto que a contemplação, sem trabalho, permanece com o fruto.

No pensamento temos divagação, na meditação investigação, na contemplação admiração.

O pensamento provém da imaginação, a meditação da razão, a contemplação da inteligência.

Eis três coisas diversas: a imaginação, a razão e a inteligência. A inteligência possui o lugar supremo, a imaginação o ínfimo, e a razão o intermediário. Todas as coisas que estão submetidas ao sentido inferior, é necessário que o estejam também ao sentido superior. De onde consta que todas as coisas que são abarcadas pela imaginação, esta e também muitas que estão acima delas sejam abarcadas pela razão. Semelhantemente, aquelas que a imaginação ou a razão abarcam, caem sob a inteligência, assim como também outras que aquelas não podem compreender.

Vede, portanto, quão amplamente se expande o raio da contemplação, que a tudo ilumina. E ainda que freqüentemente pessoas diversas se ocupem de um mesmo assunto, uma pelo pensamento, outra pela meditação e outra pela contemplação, o pensamento sempre transita por um movimento desordenado de uma coisa a outra, a meditação persevera intransigentemente em uma só coisa, enquanto que a contemplação sob um único raio de visão se difunde sobre inumeráveis.

Nunca a contemplação pode se dar sem a vivacidade da inteligência. Todas as vezes em que a alma que contempla se dilata para o mais alto, todas as vezes em que se eleva às coisas superiores, todas as vezes em que se torna aguçada para o indescritível, todas as vezes em que por uma admirável agilidade quase sem demora é arrebatada por inumeráveis coisas, não duvido que isto lhe acontece por uma certa força da inteligência. Estamos dizendo isto por causa daqueles que consideram indigno que as coisas inferiores possam cair sob o olhar da inteligência ou até mesmo pertencer à contemplação. Todavia, dizemos de modo próprio e especial ser contemplação aquela que diz respeito ao que há de mais sublime, onde a alma se utiliza da pura inteligência. A contemplação, de fato, sempre é de coisas manifestas por sua própria natureza, ou familiarmente conhecidas pelo estudo, ou transparentes pela revelação divina.