CAPÍTULO 65

Também de Anísio Teixeira temos mais o seguinte depoimento, que consta de seu livro publicado em 1935, “Educação para a Democracia”:

“Considerada a Educação nos seus objetivos presentes, ela importa em um plano de redistribuição dos homens pelas ocupações. A sua função é prepará-los, pela aquisição de conhecimentos e práticas de natureza técnica, para os diversíssimos tipos de trabalho da vida atual. Nem sempre, entretanto, foram assim as escolas, laboratórios e oficinas. No passado preparavam homens de cultura, que iam se devotar aos trabalhos da especulação e da imaginação, preocupados formar os sentimentos, as aspirações e os pensamentos de uma época ou de uma civilização. Desapareceu, por acaso, esta função da escola? A educação de todos os povos tem refletido, ultimamente, mais ou menos, a fase nova da humanidade. Foram revistos programas e cursos. Tudo entrou na ebulição de nossos dias. Dentro da grande variedade de técnicas da vida moderna, há lugar para a cultura de alguns que se dedicam à filosofia, à literatura e às artes. Apenas, enquanto no passado outra não era a formação universal do homem culto, hoje esta representa, estritamente, uma das muitas especialidades a que se podem dedicar os homens. De mil maneiras um homem hoje consegue ser culto. Tudo mudou com a cultura econômica e científica de nossos dias. A vida já não é governada pelos velhos índices de intelectualidade herdados da Idade Média, quando apenas se cogitava de preparar os poucos previlegiados que chegavam até à escola para as delícias de consumir e apreciar a vida literariamente. Hoje todos tem que produzir. Técnicas científicas e industriais sobrepuseram-se ao encantamento da vida do espírito. Passada a sofreguidão da conquista do novo estado de coisas , vai-se chegando, entretanto, às idealizações que nos darão também o lado imaginativo e poético da nova civilização. Esta nova cultura virá do amadurecimento da ordem de coisas que vai se implantando; será a nova civilização tornada consciente, interpretada e formulada em uma filosofia, uma arte, e quem sabe, uma nova religião. A técnica terá se identificado, então, com uma verdadeira cultura e desaparecerá o dissídio atual entre a cultura e a técnica. Mas no Brasil todos estes aspectos de luta entre as duas culturas são apagadas ou disfarçadas na própria inconsciência da educação nacional. Não chegamos a possuir verdadeiramente um sistema tradicional de educação e já o século XX nos bate à porta com as novas imposições técnicas e econômicas da vida contemporânea. Precisamos sair de nossas escolas, com seus problemazinhos de ordem e moralização, para sentirmos o problema da educação que é, conforme vimos, um problema de preparação de técnicos em todos os graus e ramos, destinados a servir um período da idade do homem de base profundamente científica e caracterização acentuadamente técnica”.