4. O julgamento de Annie Besant e Charles Bradlaugh.

Desde 1834 The Fruits of Philosophy era vendido na Inglaterra numa média de aproximadamente setecentos exemplares por ano. Mas em 1876 a Corte de Justiça inglesa proibiu a circulação do livro sob a alegação de julgá-lo obsceno. Para pôr à prova a decisão da corte, Charles Bradlaugh e Annie Besant fundaram a Companhia Publicadora Livre Pensamento com o único intuito de publicarem o livro de Knowlton. Ambos foram presos e levados a julgamento três meses depois. Durante estes três meses o livro de Knowlton vendeu cento e vinte e cinco mil cópias, não incluído neste número uma verdadeira inundação de imitações e de edições piratas.

O julgamento durou quatro dias e a defesa não se restringiu em sua argumentação ao aspecto legal. Foram amplamente utilizados argumentos que procuravam trazer à luz aspectos sociais envolvidos na questão, como o que afirmava que seria desejável que os pobres fossem informados a respeito dos métodos de contracepção. O julgamento foi fartamente documentado tanto pela imprensa nacional como pela local, e freqüentemente nele se reproduziam longas passagens das declarações das testemunhas bem como do livro proibido de Knowlton.

Terminado o julgamento, os acusados foram condenados a seis meses de prisão e uma multa de duzentas libras; a justiça inglesa iniciou, ademais, uma série de outras perseguições contra outros proponentes do movimento. Tudo isto só veio para a alegria dos principais envolvidos, que apelaram e foram absolvidos no ano seguinte, mas conseguiram, justamente por causa disto, uma propaganda para a sua causa que nenhum dinheiro poderia ter pago. Como resultado direto da repercussão da causa neo malthusiana proporcionada pelo julgamento e pela prisão de Besant e Bradlaugh fundou-se a Liga Malthusiana, presidida por Charles R. Drysdale e tendo como secretária a própria Annie Besant.

A Liga Malthusiana cresceu rapidamente e recebeu uma simpática acolhida de uma boa parte da população inglesa, não apenas nas cidades grandes como também em vilazinhas remotas, do que resultou a conseqüente fundação de numerosos ramos da liga malthusiana em todo o país. Uniram-se ao presidente C. Drysdale o seu irmão, o médico George Drysdale e sua esposa Dra. Alice Vickery, que devotaram o restante de suas vidas a ensinarem e escreverem sobre a desejabilidade do casamento precoce e das pequenas famílias. Logo em seguida, em 1881, foi estabelecida a Liga Neo Malthusiana Holandesa, seguida por outras ligas similares na Bélgica, França e Alemanha.

Estima-se que a Liga inglesa conseguiu vender durante seus primeiros quinze anos de vida mais de um milhão de panfletos oferecendo informações e conselhos sobre a utilização de contraceptivos. O sucesso obtido pela Liga, devido basicamente à publicidade associada ao julgamento, foi tão grande que dois anos depois do mesmo, em 1879, a Liga Malthusiana já possuía seis subscrições de mulheres residentes em Wanganui, extremo sul da Nova Zelândia, e de várias damas de Sidney, na Austrália. A influência da Liga na Austrália chegou a ser tão grande que em 1904 o governo da Nova Gales do Sul, motivado por uma intensa preocupação popular, designou uma comissão real para investigar o problema do declínio da taxa de natalidade na Austrália. A comissão chegou à conclusão de que o declínio das taxas de natalidade não se devia a alterações nem nas idades dos casamentos nem no número das pessoas que se casavam, mas ao "egoísmo" destas pessoas que levava à utilização de práticas para a limitação das famílias, desde a contracepção até o aborto. Foi constatado que um dos motivos que levava a esta prática, à parte a não proibição das importações e da manufatura dos apetrechos necessários à contracepção, era a propaganda relacionada com o controle da natalidade, "repleta de objeções, tanto no que diz respeito à sua patente ou latente indecência", que aparecia nos jornais, livros e panfletos da época. Esta difusão de literatura em favor do controle da natalidade emanava particularmente da Liga Inglesa, encorajada por uma decisão judicial da Corte Plena de Nova Gales do Sul em 1888, que decidiu não proibir este tipo de publicação na colônia.