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Respondo dizendo que, assim como já foi dito anteriormente, tanto
mais nobremente algo é colocado sob a ordem da providência quanto mais
próximo estiver do primeiro princípio.
Ora, entre todas as criaturas, são as substâncias espirituais as
que mais se aproximam do primeiro princípio, de onde que são ditas
terem sido assinaladas pela sua imagem; e por isso obtiveram da divina
providência que não apenas sejam provistas, mas também que
provejam, sendo esta a causa pelas quais as substâncias espirituais
podem eleger os seus atos, e não as demais criaturas, que são
somente provistas, sem serem providentes.
Importa, porém, que a divina providência, na medida em que diz
respeito à ordenação ao fim, seja feita segundo a regra do fim. O
primeiro providente, porém, é ele próprio como o fim da
providência; possui, portanto, a regra da providência a si unida,
de onde que é impossível que por parte dele próprio possa ocorrer
algum defeito nas coisas provistas pelo mesmo. Neles, deste modo,
não pode haver defeito a não ser por parte dos provistos.
Mas as criaturas, às quais a providência foi comunicada, não são
fins de sua providência, mas se ordenam a outro fim, a saber,
Deus. São ordenadas, portanto, na medida em que tomam da regra
divina a retidão de sua providência. Origina-se daqui que, em sua
providência, possa ocorrer defeito não somente por parte dos
provistos, mas também por parte dos providentes.
Segundo, todavia, que alguma criatura esteja mais unida à regra do
primeiro providente, segundo isto a ordenação da sua providência
terá uma retidão mais firme. Como, portanto, tais criaturas podem
apresentar defeitos em seus atos, e elas próprias são causas de seus
atos, surge daqui que seus defeitos tenham razão de culpa, o que não
era o caso dos defeitos das outras criaturas.
Porque, porém, tais criaturas espirituais são incorruptíveis em
seus indivíduos, também os seus indivíduos são provistos por causa
de si mesmos, e por isso os defeitos que neles ocorrem ordenam-se à
pena ou ao prêmio na medida em que lhes compete, e não somente na
medida em que são ordenados a outros. E entre estas criaturas está o
homem, porque pela sua forma, isto é, a alma, é uma criatura
espiritual, da qual vem a raiz dos atos humanos, e pela qual o corpo
do homem possui ordenação à imortalidade.
E por isto os atos humanos caem debaixo da divina providência de modo
que eles próprios são provisores de seus atos, e seus defeitos
possuem uma ordenação para com si próprios e não somente para com os
outros, assim como o pecado do homem possui uma ordenação dada por
Deus para o bem do homem para que este, ressurgindo após o pecado,
se torne mais humilde, ou pelo menos para o bem que se realiza nele
pela justiça divina, na medida em que é punido pelo pecado. Mas os
defeitos que ocorrem nas outras criaturas possuem uma ordenação
somente para com outros, assim como a corrupção deste fogo se ordena
à geração daquele ar.
E por isto, para designar este modo especial de providência, pela
qual Deus governa os atos humanos, está escrito no livro da
Sabedoria:
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"Dispõe de nós
com reverência".
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