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Irmãos caríssimos, a Escritura nos testemunha que a palavra de
Deus é
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"lâmpada para os nossos passos
e luz para os nossos caminhos".
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Devemos, pois, entregar-nos todos ao estudo das Sagradas
Escrituras por todos os meios que nos forem possíveis, pela leitura,
pela meditação, pela escuta, pelo ensino e pela escrita, e isto
principalmente nós, que somos companheiros de claustro, que
renunciamos ao tumulto dos negócios e para cá viemos para atender
apenas à tranqüilidade da contemplação. De sua virtude a bem
aventurada Maria, irmã de Marta, nos oferece um exemplo muitíssimo
evidente, pois dela, sentada aos pés do Senhor com os ouvidos
atentos, bem diversamente de sua irmã muito ocupada com uma
diversidade de afazeres, lemos que, em sua sede pelas palavras que lhe
dizia, o próprio Senhor foi testemunha de haver escolhido a melhor
parte, exemplo louvável e admirável de virtude que muitos desprezam.
Entre estes encontramos alguns que em outro tempo foram capazes de
compreender a alegria que emana das Escrituras por um entendimento que
lhes havia sido dado do Céu; no entanto, agora ouvimos terem caído
em uma tal enormidade de vícios e imundície de costumes que as suas
almas desgostaram-se da Palavra de Deus a ponto de abominar este
alimento espiritual, aproximando-se assim das portas da morte. Estes
devem ser considerados hoje mais como estando entre os Egípcios do que
entre os Israelitas, e mais entre os cidadãos de Babilônia do que
entre os de Jerusalém. Vemos, porém, a outros que, pelo empenho
de seu estudo, com o auxílio da graça de Cristo, abandonaram uma
vida de depravação e alcançaram tanta bondade na virtude e tão
grande honestidade nos costumes que em sua luz podemos conhecer mais
claramente ter sido realizado o que estava escrito no Salmo:
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"Enviou o Senhor a sua Palavra,
e os curou,
e os livrou de sua ruína".
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Que todos nós, portanto, sejamos exortados ao estudo da Palavra de
Deus. Sejam exortados também, aqueles que a conhecem mais
profundamente, ao seu ensino. Aqueles que a conhecem menos sejam
exortados à sua escuta, mas que em todos nós se verifique o que havia
sido profetizado por Isaías, quando disse:
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"Será varejada a oliveira,
e ficarão umas poucas azeitonas,
e alguns rabiscos.
Estes, porém, levantarão a sua voz,
e cantarão louvores.
Por isto,
glorificai ao Senhor em sua doutrina".
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Em outra ocasião já tive a oportunidade de reunir para vós alguns
dos ensinamentos que florescem no verdejante campo das divinas
escrituras. Nos sermões que se seguem desejo agora propor-vos algo
através do que possais exercitar o vosso entendimento. Deveis,
porém, saber que não devemos entregar-nos em todo o nosso tempo
apenas ao estudo, pois, segundo Salomão,
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"Todas as coisas tem o seu tempo,
e todas elas passam debaixo do céu
segundo o termo que a cada uma foi prescrito".
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Há, portanto, um tempo para estudar, e há um tempo para meditar.
Há um tempo para investigar a verdade para que se enriqueça o
entendimento, há um tempo para exercitar a virtude para sanar os
nossos afetos, e há também um tempo para praticar a boa obra para que
se auxilie o próximo. Há um tempo para orar e um tempo para cantar,
há um tempo para assistir ao ofício divino e um tempo para dedicarmos
a qualquer outra coisa necessária. De todas estas coisas, como uma
abelha que retira o seu mel de flores diversas, devemos colher para
nós a doçura de uma suavidade interior, para que possamos consumar,
através de uma vida santa, o favo de uma melíflua justiça.
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