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Um simples chamado de Jesus e a pronta acolhida de um rude pescador,
foi o bastante para que no lago do mar de Genesaré se iniciasse a
história de uma das mais fulgurantes figuras do cristianismo, aquêle
que fora constituído por Cristo a pedra sobre a qual edificaria êle a
sua Igreja: A história de Simão, cujo nome Cristo mudou em
Pedro (Kephas = a rocha).
Desde o chamado, permaneceu sempre, ao lado de Jesus Nazareno,
embora fraquejasse no momento da Paixão do Redentor e o negara diante
daqueles que o acusavam de comparsa do galileu. Nascera em
Betsáida, nas proximidades do lago de Genesaré e com seu irmão
mais moço, André, se dedicava ao ofício de pescador. Morava em
Cafarnaum e era casado.
Foi dos primeiros discípulos de Jesus atendendo ao seu convite:
"Segui-me e eu vos farei pescadores de homens" (Mat. IV,
19).
Abandonou sua profissão, sua família e o Senhor o pôs á frente
dos doze apóstolos. No Colégio Apostólico foi sempre o seu
porta-voz. Em São Mateus (XVI, 16) o vemos em nome dos
apóstolos professar a divindade de Cristo: "Tu és o Cristo,
Filho de Deus vivo!" E mais tarde, quando em Cafarnaum, diante
da promessa da Eucaristia feita por Cristo, muitos dos discípulos,
escandalizados com sua pregação, o abandonaram, a uma pergunta sua
aos apóstolos, se êles também não queriam se afastar, foi Pedro
quem tomando a palavra lhe respondeu: "Senhor, para quem havemos
nós de ir? Tu tens palavras de vida eterna." (João VI,
68-69). Acompanhando a Nosso Senhor, nêle encontramos o
apóstolo privilegiado: na ressurreição da filha de Jairo, na
Transfiguração do Tabor e na agonia do Horto das Oliveiras.
Homem rude, ignorante, quer nada conhecia além de seu ofício, suas
palavras irrefletidas e seus atos precipitados são conseqüência desta
sua pouca formação e de seu gênio irrequieto e vivo. A negação do
Senhor na Paixão foi uma sublime lição para ele, que se humilhou,
chorou amargamente sua culpa, e passou a dominar sua faqueza e seu
caráter, tornando-,e humilde e digno da confiança daquele a quem
negara.
Cristo lhe confiou, depois da Ressurreição, a missão de Pastor
Supremo, o primado em sua Igreja. Sem contestação, ocupa daí
para frente o primeiro lugar.
Rocha inabalável sóbre a qual edificou Cristo a sua Igreja, em
Pedro encontramos o homem admirável, que conduziu com segurança os
primeiros tempos do cristianismo.
Cheio do Espírito Santo, como os demais apóstolos, faz o primeiro
sermão de Pentecostes, de efeito maravilhoso, pois três mil pessoas
se converteram nesta ocasião e foram batisadas.
Agraciados com o dom dos milagres, os apóstolos realizavam fatos
prodigiosos, o que serviu para confirmar a sua missão apostólica e a
verdade daquilo que pregavam. Assim devia ser no início da Igreja,
para que a nova doutrina se difundisse mais facilmente, não obstante
as muitas perseguições e grandes obstáculos.
O Pentecostes foi o grande milagre que transformou inteiramente os
apóstolos. Já não eram mais os tímidos e rudes homens da
Galiléia, incrédulos e cheios de falsas noções acêrca do
Messias, mas homens espirituais, desprendidos do mundo, dispostos
ás mais árduas virtudes, ao perigo de suas vidas. O batismo do fogo
do amor de Deus consumiu nêles o velho homem e tudo o que era terreno
e os transformou em homens de Deus, outros "Jesus Cristos".
"Pedro e João subiam ao templo para a oração da hora de noa"
(Atos III, 1). Ainda traziam em seus corações as emoções
da primeira pregação de Pedro e o maravilhoso efeito com a conversão
de tantos judeus. Pelos caminhos, traçavam e combinavam as grandes
providências em relação aos milhares de fiéis que já viviam em
comunidade. A porta do templo, viram um coxo de nascimento que lhes
estendeu a mão, pedindo-lhes uma esmola. Não traziam dinheiro,
mas iriam socorrer aquêle pobre de um modo mais satisfatório,
restituindo-lhe a cura, a perfeição física, para que pudesse
ganhar a vida pelo seu trabalho. "E Pedro lhe disse: Não tenho
prata, nem ouro, mas o que tenho, isso te dou: Em nome de Jesus
Cristo Nazareno, levanta-te e anda." (Atos III, 6). Os
efeitos dêste milagre foram surpreendentes, pois Pedro se aproveita
do espanto e admiração da grande multidão que se convenceu do
prodígio e lhes fala de Jesus Cristo, em nome de quem fez o
milagre, o mesmo predito pelos profetas e crucificado em Jerusalém,
e os chama à penitência e à conversão. Os dois apóstolos são
conduzidos à prisão pelos sacerdotes, magistrados do templo e
saduceus, descontentes com suas pregações e seu anúncio.
No dia seguinte, admirados da constância dos apóstolos,
soltam-nos, reconhecendo o milagre realizado, notório a todos os
habitantes de Jerusalém, e que não poderiam negar.
E Pedro continuou a sua missão, dignificando o primado que lhe foi
conferido por Cristo, e conduzindo com fé e energia a barca da
Igreja que já lutava contra as ondas furiosas da incredulidade e da
violência de muitos.
De um lado, o povo que começava a reconhecer a missão divina dos
apóstolos, e muitos eram os que "traziam os doentes para as ruas, e
punham-nos em leitos e enxergões, a fim de que ao passar Pedro,
cobrisse ao menos a sua sombra alguns dêles e ficassem livres de suas
enfermidades. Concorria também muita gente das cidades vizinhas a
Jerusalém, trazendo enfermos e vexados dos espíritos imundos, os
quais eram curados todos" (Atos V, 15-17).
Do outro lado, os sacerdotes, os magistrados, os homens do poder que
não admitiam a influência dos apóstolos sôbre a multidão, a mesma
que exercera o Nazareno, e cuja liderança julgavam ter destruído com
a sua crucifixão e morte.
Dêste modo, são feitos prisioneiros várias vezes, açoutados, e
nada consegue fazer com que se calem: "Deve-se obedecer antes a
Deus que aos homens" (Atos V, 29).
"Porém, saíam da presença do conselho contentes por terem sido
achados dignos de sofrer afrontas pelo nome de Jesus. E todos os dias
não cessavam de ensinar e de anunciar Jesus Cristo no templo e pelas
casas." (Atos V, 41-42).
Pedro é novamente encarcerado por ordem de Herodes Agripa, terceiro
a tomar êste nome malsinado, que recrudesceu a perseguição que,
iniciada com a morte de Santo Estêvão, não cessara de todo.
Antes, o mesmo rei já maltratara alguns da Igreja e matara à espada
Tiago, irmão de João, que foi o primeiro apóstolo a dar o seu
testemunho de sangue.
Na prisão, Pedro estava constantemente guardado por um grupo de
soldados, e dormia, com as mãos ligadas por cadeias. Os guardas à
porta vigiavam o cárcere. Mas Deus, de um modo prodigioso, vai
libertar através de um anjo o seu apóstolo, cuja missão ainda não
estava terminada.
Reunidos, os fiéis faziam por ele incessantes preces. Na noite que
precedia o dia marcado para sua execução, o apóstolo foi de repente
despertado por um Anjo que lhe mandou levantar-se, "caindo-lhe as
algemas das mãos".
Acompanhando o Anjo, transpôs ele a porta de ferro da prisão e
chegou à rua, onde o anjo se afastou dele.
Pedro compreendeu que não era um sonho, mas, sim, uma realidade, e
apressadamente dirigiu-se à casa de Maria, uma das santas mulheres,
mãe de Marcos, o Evangelista, onde os fiéis ainda estavam
reunidos; admirados e cheios de alegria viram a Pedro que batia à
porta. Moradia afastada de Jerusalem, aí se ocultou Pedro,
gozando de tranquilidade neste recanto propício para um fugitivo.
Para onde teria seguido depois, os Atos não nos contam, e o autor
certamente não quis trair o seu esconderijo. Apenas se lê no cap.
XXII,17: "E tendo saído, foi para outra parte".
Herodes, que se decepcionara ao ver que seu prisioneiro desaparecera,
é pouco depois ferido por um anjo de Deus, e torturado de horríveis
dores, roído de vermes, o tirano morreu.
Pedro se dirigira várias vezes a Antioquia, cidade grega, uma das
primeiras do império, onde os cristãos buscavam abrigo, fugindo à
perseguição de Herodes. "A palavra de Deus crescia e
multiplicava-se" (Atos XII, 24). Antioquia tornava-se a
sede da nova fé. Daí se espalhará a Palavra de Deus em tôdas as
direções, e o cristianismo olhará para horizontes mais vastos e mais
largos, ultrapassando os limites da Terra Prometida e avançando
sempre até tornar-se universal.
Em Roma vai centralizar-se para sempre a doutrina cristã, e os
séculos vão conhece-la como a Cidade Eterna, a Capital do
Catolicismo. Talvez a semente evangélica para aí levada por
peregrinos piedosos que se converteram à fé cristã, ou por algum
missionário vindo de Antioquia, fizesse com que surgisse a primitiva
comunidade cristã, que depois se desenvolveu extraordinariamente. A
tradição católica, porém, atribui a Pedro a gloriosa fundação
da Igreja de Roma, e liberais como Harnack, protestantes como
Lietzmann, afirmam que muito antes que Paulo desembarcasse em
Pozzuoli, o homem que contribuiu para a fundação da comunidade
romana fôra Pedro, "'a velha rocha".
Já não mais se duvida de que o Príncipe dos Apóstolos tenha
estado em Roma como seu primeiro Bispo e de que aí tenha ocorrido o
seu martírio. Estudos dos citados historiadores comprovam a
concordância dos documentos literários de que Pedro tenha se
estabelecido em Roma, mais ou menos por espaço de 25 anos,
hipótese também dada por outros historiadores, católicos ou não,
do ano 42 a 67, quando de seu martírio, conforme Euzébio.
Juntamente com S. Paulo, vai Pedro coroar sua vida santa e
apostólica com morte gloriosa. O Senhor os reune no mesmo triunfo,
a êles que com tanta galhardia combateram o bom combate pela sua
causa. Vão ser martirizados êstes dois gigantes de apostolado e
santidade, no mesmo dia e na mesma cidade que com seus trabalhos
apostólicos ganharam para Deus. Ó Roma feliz, és consagrada pelo
sangue glorioso dos dois Príncipes!
Foi quando Nero, o hipócrita, cruel, covarde e corrupto Imperador
romano, movia atroz perseguição aos cristãos, acusados de terem
ateado um incêndio em grande parte da cidade, incêndio que se deveu
aos caprichos do próprio Nero, como a história o registra.
Fortificando e consolando os fiéis perseguidos, foram os dois
apóstolos lançados na prisão, para depois serem martirizados.
Pedro, que era judeu, condenado a ser pregado na cruz e Paulo,
cidadão romano, a ser degolado.
Julgando-se indigno de morrer como o Divino Mestre, pede e obtém
Pedro ser crucificado de cabeça para baixo. Assim morre Pedro, o
Príncipe dos Apóstolos, constituindo alicerce da Igreja de Nosso
Senhor Jesus Cristo. Sôbre êle se levantaram as grandes colunas
da cristandade e Pedro continua vivo na sucessão gloriosa e
ininterrupta dos Papas que continuam legìtimamente a sua missão na
Chefia da Igreja Católica, de amor, de verdade e paz; conduzindo
os povos à verdadeira vida e salvação que trouxe Cristo à
humanidade.
História simples e rica de encantos de um pescador do lago de
Genesaré que por ordem de Cristo lançou suas rêdes ao mar e elas se
encheram de peixes. Depois, Cristo pelo seu poder e amor o
transformou. Suas rêdes se estenderam ao mar, não mais do lago de
Genesaré, mas do mundo todo, e êle se tornou pescador de homens.
A barca da Santa Igreja está repleta de almas que êle conduz à
salvação em meio às tempestades, aos vendavais da travessia. Lutas
e conquistas de 20 séculos de cristianismo. A Igreja é divina, e
o poder humano não pode destrui-la. "'As portas do inferno não
prevalecerão contra ela" (Mat. XVI,18). Pedro é a rocha,
o fundamento da Igreja.
"Tu és Pedro, e sôbre esta pedra eu edificarei a minha Igreja"
(S. Mat. XVI, 18).
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