A PERFEIÇÃO DA PESSOA HUMANA.

Pode-se agora compreender melhor, na ótica da filosofia do ser, em que radica a perfeição da pessoa humana.

Em primeiro lugar, deve afirmar-se que se ser pessoa já supõe uma certa perfeição, essa é uma perfeição totalmente recebida, sem cooperação alguma por parte da própria pessoa. A perfeita bondade do ente-pessoa, sua consolidação no ser, se alcançará quando o ente acrescentar, à sua bondade substancial, a bondade adquirida com a sua operação própria[15]. É então que o ente-pessoa atingirá sua última perfeição ou bondade interna[16], seu fim. Será já bom simpliciter[17], por ser essa bondade uma bondade já por ele causada[18].

Afirmou-se linhas atrás que um ente será tanto mais perfeito quanto mais ser tiver. Portanto, a perfeição última do pessoa humana, essa perfeição que ainda não se possui mas que a ciência moral deve indicar e a moral vivida deve atingir, corresponderá à perfeição do seu próprio ser, e se alcançará mediante atos livres de suas potências operativas[19]. Mas não com qualquer um deles: somente com aqueles atos que intensifiquem e como que condensem o ser da pessoa, ou em outras palavras: com aqueles atos que se realizem mediante aquelas potências operativas que se tenham mantido ou aperfeiçoado na linha originária do ato de ser, segundo a essência humana.

Só com esses atos a pessoa poderá ao mesmo tempo expressar o que ela é e conseguir aproximar-se de seu fim. A perfeição das potências operativas -inteligência e vontade- torna-se pois necessária para que a pessoa humana possa realizar atos ou operações, completos no seu conteúdo, que o façam ser aquilo que ele é.

Por conseguinte, a última perfeição se alcançará com uma operação. Mais estritamente: é com a última atuação própria operada pelo seu ato de ser -via potência operativa aperfeiçoada- que alcançará também a última perfeição a que o ente está destinado, de tal modo que se pode afirmar que os entes são para a sua operação[20].

E no domínio da essência, a pessoa humana estaria impossibilitada de se aperfeiçoar? Para responder a esta questão basta lembrar que a pessoa tem a natureza humana ou essência apenas como parte formal. Certamente, nessa parte formal radica também a possibilidade de uma perfeição ulterior, mas qualquer perfeição que se venha a acrescentar a uma natureza será sempre acidental. Além do mais, esse acréscimo de perfeição acidental[EJP2] -acidente qualidade- só poderá ser alcançado pelo ato de ser da pessoa -ato de todos os atos e de todas as perfeições-, que a integrará na unidade pessoal. O homem, portanto, quando se aperfeiçoa mediante os seus atos, não se torna "mais homem" senão acidentalmente, tornando-se mais prudente, mais justo, mais forte, etc. Porém, quando se diz de alguém que é um bom homem, ou que se tornou melhor, ou mais verdadeiro, etc. esta-se falando já no domínio do ser.

Como se vê, a causalidade eficiente intrínseca domina toda a filosofia do ser. É causalidade eficiente intrínseca de um "ato de ser" finito que, participando[21] na perfeição infinita que o ser tem de por si -e que ao mesmo tempo é o primeiro ato da essência, emerge nela e a intensifica-, possibilita o dinamismo do ente e a preservação de sua unidade.

O que a pessoa "é" ou "pode" resulta da atuação do seu único ato de ser, que, por sua vez, tem como causa única e efetiva o Ipsum Esse Subsistens, O Ser por essência.