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Naturalmente, é impossível expor nestas breves linhas a doutrina
completa sobre o esse tomista, e para a finalidade deste trabalho nem
é algo necessário. Bastará apresentar aqueles textos de Tomás de
Aquino que respondam às exigências apresentadas pelo conceito de esse
desenvolvido na primeira parte.
Deve-se começar dizendo que Tomás, sempre que emprega a expressão
ser -a menos que explicitamente diga outra coisa-, deseja significar
por este termo o ato de ser, o actus essendi. Ora, ato significa
essencialmente perfeição: uma coisa é perfeita na medida em que
está em ato[24].
Portanto, o ser, em si mesmo considerado, é a perfeição
fundamental. Todas as perfeições estão nele incluídas e dele se
derivam[25]. O ser é o que há de mais nobre, de mais simples, de
mais formal; e quanto mais imaterial for um ato, mais nobre
será[26].
Por outro lado, o caráter de ato também expressa a profundidade
dinâmica do ser, pois ato é ação, atividade. O dinamismo do ser
torna-se claro quando Tomás de Aquino diz que todo agente age na
medida em que está em ato[27]. Além do mais, Tomás parece
trabalhou neste sentido uma vez que sua doutrina dos modos
transcendentais do ser revela uma estruturação ordenada e dinâmica no
caráter de perfeição do ser. Com efeito, dentre os atributos do
ente enquanto ente, os chamados transcendentais, há alguns que dizem
respeito à conveniência dos entes entre si, mais precisamente à
conveniência do ente com relação ao ente espiritual, que por
natureza está aberto a todos os outros. Assim, por exemplo, a alma
humana tem toda a realidade por objeto, ou, em outras palavras, toda
a realidade pode existir na alma com um modo de ser espiritual igual ao
ser da alma; ao mesmo tempo, a alma pode inclinar-se para toda a
realidade feita objeto nela[28]. Ora, essa dupla conveniência do
ente com a alma, que possibilita que o ente se possa denominar também
verdadeiro e bom, possui um caráter de atividade.
Tomás, deste modo, vê o movimento em sentido amplo, na própria
atualidade do ato de ser, ao menos no ato de ser do ser espiritual.
Na ótica da identidade entre a causa eficiente e a causa exemplar,
não ha dúvida de que Tomás de Aquino afirma também um movimento
circular, ao dizer que toda a realidade volta ao seu princípio: Tunc
enim effectus maxime perfectus est quando in suum redit principium[29].
Contudo, como a causalidade provém da atualidade do ser, a
insistência de Tomás de Aquino em salientar a estrutura circular da
causalidade deixa entrever que vislumbrara ser esta uma expressão da
estrutura circular do próprio ato de ser[30].
O esse tomista expressa, pois, movimento. É um ato perfeito,
espiritual, como um movimento estável pelo qual as coisas subsistem em
si mesmas.
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