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Para se entender mais corretamente os ensinamentos contidos nas palavras
de S. Serafim e nas questões da Summa Theologiae, devemos observar que no diálogo com
Motovilov o padre Serafim não explicou, nem procurou fazer com que seu amigo
experimentasse os principais efeitos que o Espírito Santo produz na alma daqueles que
caminham de coração aberto em busca do Reino de Deus. Os efeitos principais que o
Espírito Santo produz na alma daqueles que se aproximam de Deus pelo trabalho de
santificação que nos é descrito nas Sagradas Escrituras são mais profundos do que os
apontados por S. Serafim e são difíceis de serem compreendidos por aqueles que não
passaram por eles. Este trabalho de santificação é, ademais, normalmente muito longo e
exige, além do auxílio da graça divina, sem o qual se torna impossível, muita renúncia e
muitos anos de perseverança. Por isso, o que padre Serafim mostrou ao seu amigo foram
alguns efeitos secundários da graça do Espírito Santo, apenas para que ele, e para que nós
junto com ele, tivéssemos um ponto de referência para poder nos orientar melhor na
condução da vida cristã. A luz que brotava dos olhos do padre Serafim, a paz inexplicável
que enchia o coração dos amigos, a alegria indescritível que Motovilov diz estar sentindo,
não são os efeitos principais do Espírito Santo na alma humana quando esta procura se
aproximar de Deus através de Cristo. Os principais efeitos do Espírito Santo no processo de
santificação do homem se manifestam gradativamente e são os seguintes.
Primeiro, o temor de Deus e a fuga do pecado.
Segundo, uma prontidão cada vez maior para buscar as coisas do alto e não
pensar nas coisas da terra, bem de acordo com o que está escrito na Epístola aos Romanos:
"Os que são segundo a carne, gostam das coisas que são da carne; mas os que são
segundo o Espírito, gostam das coisas que são do espírito" (Rom. 8,5).
Terceiro, uma vida em que a virtude da fé é sempre mais firme, isto é, em
que a certeza da fé é sempre mais profunda, e sempre mais constante, isto é, em que a
vivência da fé é sempre mais freqüente.
Quarto, uma clareza cada vez maior no conhecimento de Deus e no
entendimento das verdades da fé, tanto quanto é possível ao homem.
Quinto, e o principal de todos, um amor para com Deus sempre crescente.
Depois que os efeitos anteriores se manifestaram e amadureceram suficientemente, este amor
começa a aumentar de um modo que as próprias pessoas que amam assim a Deus sequer
supunham que seria possível à natureza humana a vivência de um amor tão grande.
Finalmente, em sexto lugar, pelo efeito deste amor tão grande que é
infundido na alma humana, quando este se torna de uma ordem de magnitude como o que
havia na alma de S. Serafim, -e um amor assim não pôde ter sido vivido por Motovilov
naqueles breves momentos em que durou o diálogo- , este mesmo amor leva aquele
conhecimento de Deus e aquele entendimento das verdades da fé que havia na alma para um
plano superior de vivência. Este plano superior de vivência não é a visão de Deus, que
talvez além de Jesus mais ninguém o teve na terra, mas é um conhecimento de Deus da
mesma natureza que aquele que nos é dado pela fé, porém situado num plano bem mais alto.
Trata-se daquela verdade que Jesus disse que seria conhecida por aqueles que seguissem os
seus mandamentos, e que é a forma de conhecimento mais alta que um ser humano pode
alcançar na terra se ajudado a tanto por Deus.
De onde que se deduz que os principais efeitos do Espírito Santo na alma
que se santifica na busca de Deus são um amor extraordinariamente elevado, muito maior do
que o comum das pessoas concebem que possa existir, e o conhecimento da verdade. Estes
dois efeitos não foram manifestados a Motovilov no diálogo com padre Serafim porque se
isso tivesse acontecido, Motovilov teria alcançado em questão de momentos aquilo que
ordinariamente a graça só concede aos homens depois de muitos anos de perseverança na
vida das virtudes, as quais são também efeitos dela. Mas Deus concedeu-lhe vivenciar
aqueles efeitos secundários do Espírito Santo para que, tendo estes por referência, pudesse
compreender quão grandes coisas Deus prepara para aqueles que o amam, às quais todos nós
somos convidados por meio do Evangelho de Jesus.
Muito tempo antes de Jesus, Isaías havia tratado deste assunto em uma
célebre profecia de que vamos tratar a seguir.
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