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A experiência nos mostra que todo homem que viveu uma vida plena sempre
teve um ideal em direção ao qual orientava os esforços de sua existência, isto é, um
horizonte que ele via despontando ao longe e em direção ao qual ele se dirigia. Não é difícil
para as pessoas entenderem isto, porque trata-se de um fato muito comum para todos.
Aqueles que não têm nenhum horizonte em direção ao qual caminhar são pessoas que na
prática aparentam parecem ter perdido a razão de viver e já terem morrido por antecipação.
Não é isto, porém, o que ocorre o mais freqüentemente. Ainda que não o consigamos
expressar com palavras exatas, quase todos nós temos no íntimo de nosso ser alguma meta
que escolhemos e em direção à qual dirigimos nossa existência. Quando ocorre que esta
meta é para nós mais clara, às vezes a chamamos de ideal.
Jesus, ao nos anunciar o Evangelho, disse ter vindo ao nosso encontro para
que nós pudéssemos ter uma vida abundante. A natureza humana, porém, é tal que Jesus não
poderia ter dito isso seriamente sem que, ao mesmo tempo, nos tivesse ensinado qual é o
ideal mais perfeito que a vida humana pode abraçar, aquele ideal sem o qual é impossível
alcançar a vida plena e abundante de que ele nos fala.
Muitos, quando ouvem o Evangelho falar a este respeito, percebem que o
ideal de Jesus é diferente, e freqüentemente muitíssimo diferente, dos seus próprios ideais.
Neste caso, se temos verdadeiro interesse em nossa própria felicidade, Jesus nos pede que
renunciemos aos ideais que erroneamente escolhemos e abracemos os que ele nos mostra.
Infelizmente para os homens, na grande maioria dos casos, senão mesmo na
quase totalidade dos casos, as metas da vida de cada um, aquelas coisas em função das quais
e para as quais todos vivem, se reduzem aos prazeres da vida sexual e às comodidades que
podem ser obtidas através do dinheiro. Algumas raras vezes há também alguma outra coisa
mais elevada, mas não muito mais do que estas duas de que acabamos de falar; de qualquer
maneira, trata-se praticamente sempre de horizontes muito menores do que aquilo para o qual
Deus nos quer chamar a atenção. Sexo e dinheiro, costumam ser os mais elevados ideais que
orientam a vida da quase totalidade dos seres humanos.
Ora, se quisermos ser verdadeiramente discípulos de Jesus, ele nos ensina
que, em primeiro lugar, além de renunciarmos ao pecado, temos que renunciar também a
estas baixíssimas metas como sendo o horizonte de nossas vidas. Estes dois ideais têm sido
os responsáveis por ter colocado a quase totalidade dos homens em uma trajetória cega ao
longo da qual não existe nenhuma possibilidade de despontar a verdadeira felicidade. Para
aqueles homens de boa vontade, que quiserem escutá-lo e quiserem confiar nele, Jesus nos
ensina dois outros ideais muito mais elevados do que estes, aqueles que podem efetivamente
nos conduzir à felicidade sem fim que ele nos promete.
Jesus nos apresenta seus dois grandes ideais quando nos fala dos dois
maiores mandamentos. Estes dois maiores mandamentos são muito mais do que apenas dois
mandamentos; são na realidade os dois grandes ideais da vida cristã, aqueles que devem
substituir o do sexo e o do dinheiro. São eles o amor a Deus e o amor ao próximo. No lugar
de sexo e dinheiro Jesus nos ensina que, se quisermos ser felizes e conquistar a verdadeira
vida, temos que fazer com que aquilo a que mais almejamos, aquilo que mais desejamos e
em função do qual tudo fazemos sejam amar a Deus e ao próximo. Este foi o assunto da
segunda aula deste curso sobre as Sagradas Escrituras.
Dissemos, ademais, que o amor a Deus se realiza na prática através do
trabalho de nossa santificação, sem o qual se torna impossível amar a Deus; e que o amor ao
próximo alcança sua verdadeira perfeição através do ensino, que é, para Jesus, a maior
prova de amor que ele quer de nós. Ensinar foi a última coisa que Jesus recomendou aos
seus discípulos quando se despediu definitivamente deles: "Ide, e ensinai a todos os
povos", disse então Jesus. Ora, nós costumamos sempre recomendar por último aquilo que
nos é mais querido ao coração.
Amar a Deus e ensinar, são, pois, os grandes ideais da vida cristã. Não há
modo de se amar a Deus senão buscando-se a santidade, e não há outra coisa que diga
respeito ao nosso próximo que Jesus nos tenha pedido tão entranhadamente quanto ensinar.
Há pessoas, como talvez possa ter sido o jovem rico de que fala o
Evangelho de São Marcos, que procuram cumprir os mandamentos da lei de Deus, como são
o honrar pai e mãe, o não matar, o não roubar, o não cometer adultério, e outros, e que
também contribuem com algum dinheiro para alguma obra de beneficiência, mas que, mesmo
assim, são movidos na maior parte das coisas importantes que fazem pela busca do prazer da
vida sexual e das comodidades que podem ser obtidas através do dinheiro. Não se pode
dizer que estas pessoas sejam cristãs no mais próprio sentido do termo. Elas ainda não
entenderam verdadeiramente o que Jesus ensinava. E é difícil inclusive que elas perseverem
até na simples prática dos mandamentos. Quando se buscam as coisas da terra, as coisas da
terra exigem mais coisas da terra; assim também, quando se buscam as coisas do céu, as
coisas do céu trazem consigo mais coisas do céu. "É mais fácil um camelo passar pelo
fundo de uma agulha", diz Jesus, do que uma pessoa como esta entrar no Reino de Deus
(Marc. 10,25).
O que vamos examinar em seguida é o modo pelo qual a nossa santificação e
a missão de ensinar podem se tornar realidade dentro do plano que Deus tem para os
homens. Um plano que Ele já havia preparado desde antes da criação do mundo. Ambas
estas coisas, conforme veremos, somente são possíveis mediante a graça do Espírito Santo.
Mas, para entender como através dela a santificação e o ensino são possíveis, precisamos
entender primeiro o que é a graça do Espírito Santo.
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