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Aqui se fundamenta especialmente a lógica da interpretação que
demos: que não é uma irresistível força do alto que leva um a estar
nas trevas e outro na luz, senão que nós homens temos dentro de
nós, na nossa natureza e em nossa livre escolha, as causas da luz e
da escuridão, convertendo-nos naquilo que queremos. Segundo a
história, os olhos dos egípcios não se encontravam nas trevas porque
estivesse interposta uma montanha ou uma muralha que obscurecesse a
vista ou os raios do sol, mas porque enquanto o sol iluminava todas as
coisas com seus raios, os hebreus gozavam da luz, e os egípcios eram
insensíveis a este dom. Assim, embora a vida luminosa se apresente
igualmente acessível a todos, os que caminham nas trevas são
empurrados à obscuridade do mal por suas práticas perversas, enquanto
os outros são iluminados pela luz da virtude. Depois de terem sofrido
três dias nas trevas, os egípcios também recebem parte na luz.
Talvez alguém, apoiando-se nisto, dirija sua interpretação à
restauração que, depois destas coisas, esperam o reino dos céus os
que estão condenados ao inferno. De fato, estas trevas que se pode
apalpar (Ex 10, 21) como diz a história, tem grande afinidade
na palavra e no sentido com as trevas exteriores (Mt 8, 12).
Dissipam-se uma e outra quando Moisés, como explicamos
anteriormente, estende as mãos sobre os que estão nas trevas. Da
mesma forma, aquela cinza de forno que, segundo a palavra produzia
dolorosas pústulas nos egípcios, poderia ser interpretada, dado o
simbolismo do termo forno, como o castigo do fogo do inferno com que se
ameaça e que só fere os que vivem à maneira dos egípcios (Ex 9,
8 e Mt 13, 42). Porem se alguém é verdadeiramente israelita
e filho de Abraão, e se assemelha a ele em seu estilo de vida a ponto
de mostrar por sua opção pertencer à família dos eleitos, este se
conserva livre daquela dolorosa cinza. O estender das mãos de
Moisés, segundo a interpretação que demos, se converteria,
inclusive para os outros, em cura da enfermidade e em afastamento do
castigo. E quanto àqueles leves mosquitos que atormentam os egípcios
com invisíveis picadas, aos insetos tavões que se cravam
dolorosamente nos corpos com suas mordidas, às lavouras destruídas
pelos gafanhotos, às tempestades que se precipitam do céu com pedras
de granizo, talvez ninguém, se seguiu as explicações das pragas
precedentes, encontre dificuldade para ajustar a interpretação
correspondente a cada uma destas pragas. Todas estas coisas são
causadas primeiramente pela livre decisão egípcia e são executadas
pela justiça imparcial de Deus que se acomoda ao que merecem as
diversas opções.
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