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Muitos dos que acolheram a palavra que liberta da tirania e se
aproximaram da pregação são maltratados agora pelo inimigo com os
assaltos das tentações. Muitos destes se fazem mais provados e
firmes na fé, temperados pelo ataque dos que os combatem; ao
contrário, alguns mais débeis dobram o joelhos diante destes ataques
dizendo abertamente que é preferível para eles permanecer surdos à
chamada da liberdade que padecer tais dificuldades por causa dela.
Isto mesmo ocorreu então devido à pusilanimidade dos israelitas, que
acusaram os que os aconselhava o meio de escapar da escravidão. Porem
não por isso cessará a palavra de atrair para o bem, ainda que o
imaturo, infantil e imperfeito de entendimento, por sua
inexperiência, se assuste ante as tentações. Isto é o que o
demônio tenta contra os homens: busca ferir e corromper. Que quem
está sujeito a ele não olhe para o céu, mas que se incline para a
terra e faça ladrilhos com lama dentro de si mesmo. De fato, é
patente a todo mundo como o que pertence ao prazer material deriva da
terra e da água, quer se olhe para os desejos do ventre e da gula ou
quanto se refere à riqueza. A mistura destes elementos é - e se
chama justamente - barro. Quantos avidamente se enchem dos prazeres
do barro, não conseguem manter cheia sua ampla capacidade para receber
prazeres, pois uma vez cheia, de novo se torna vazia para aquilo que
flui para dentro. Quem faz ladrilhos sempre coloca de novo outro barro
no molde que ficou vazio; parece-me que quem considera o apetite
concupiscível da alma, compreenderá facilmente este exemplo. De
fato, quem dá satisfação a sua paixão em qualquer das coisas pelas
quais lutou, novamente se encontrará vazio com relação àquilo
mesmo, se é lançado pela paixão a alguma outra coisa. E ao
sentir-se satisfeito por esta coisa, se encontrará de novo vazio e
com capacidade de desejar alguma outra coisa. E isto não cessará em
absoluto de atuar em nós, até que nos subtraiamos da vida material.
A cana e a palha que provem dela e que quem está submetido às ordens
do tirano é obrigado a misturar ao ladrilho, interpretamos conforme o
Evangelho de Deus e às palavras profundas do Apóstolo: ambos
significam igualmente, a palha e a cana, matéria para o fogo (Mt
3, 12 e 1Co 3, 12-13). Quando algum dos que progridem na
virtude quer atrair para uma vida livre e plena de sabedoria aqueles que
estão escravizados pelo engano, aquele que, como diz o Apóstolo,
seduz com ciladas variadas nossas almas (Ef 6, 12), sabe opor os
sofismas do engano à lei de Deus. Tendo presente a Escritura, digo
isto referindo-me às serpentes do Egito, isto é, às diversas
maldades do engano, cuja aniquilação realiza a vara de Moisés (Ex
7, 10-12). Porem isto já está suficientemente considerado.
Assim pois, quem possui esta invencível vara da virtude que destroi
as varas enganosas, avança por um caminho contínuo até maiores
prodígios. A realização dos prodígios não tem lugar com a
finalidade de ser admirada pelos que os vêem, mas está dirigida ao
aproveitamento dos que se salvam (2Tim 3, 16). Com estes
prodígios da virtude, se afasta o que é inimigo e se reconforta o que
é da mesma estirpe. Conheçamos, em primeiro lugar, o significado
geral destes prodígios; depois talvez nos seja possível adaptar
analógicamente este conhecimento a cada um deles em particular.
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