CAPÍTULO 38.

Afirma-se que a Divindade é o Bem essencial. Pois bem, o que tem uma natureza distinta do bem é alheio ao bem, e o que é alheio ao bem pertence à natureza do mal. Demonstra-se que o continente é maior que o contido. Segue-se necessariamente que os que julgam que a Divindade está contida em um limite, devem admitir também que está abarcada pelo mal. Sendo evidentemente menor a natureza do contido que a do continente, segue-se a superioridade do mais vasto. Portanto quem encerra a Divindade em um limite estabelece que o bem está dominada por seu contrário. Porem isto é absurdo. Não se pensará, pois, em nenhum limite da natureza infinita. O que não está limitado não tem uma natureza que possa ser compreendida. Eis aqui porque todo o desejo do bem, que atrai para aquela ascensão, cresce constantemente junto com a trajetória de quem se apressa para o bem. Isto é ver realmente a Deus: não encontrar jamais a saciedade do desejo. É totalmente inevitável que quem vir se inflame em desejos de ver ainda mais, precisamente por causa daquelas coisas que é possível ver. E desta forma nenhum limite interromperá o progresso na ascensão a Deus, por não haver limite no bm, nem ser interrompido por nenhuma fartura o aumento do desejo do bem. Qual é aquele lugar perto de Deus? Que é a pedra? E qual é novamente a fenda na pedra? Que é a mão de Deus que tapa a fenda da pedra? Que é a passagem de Deus? Que são suas costas, cuja visão promete Deus a Moisés quando pedia para ver sua face? É necessário que cada um destes dons seja verdadeiramente grande e digno da magnificência do doador, ao ponto de julgar uma promessa mais esplêndida e elevada que todas as teofanias outorgadas já ao grande servidor. Porem, como pode alguém deduzir destas palavras acima com que Moisés pede subir depois de tantas ascensões, e a cuja subida Aquele que faz cooperar todas as coisas para o bem de quem ama a Deus (Rm 8, 28) conduz dizendo: Eis aqui um lugar junto de mim (Ex 33, 21)? Eis aqui uma interpretação que se harmoniza facilmente com as coisas que já consideramos. Ao falar do lugar, não delimita quantitativamente o que lhe mostra, pois não existe medida do que carece de quantidade, mas conduz o ouvinte ao infinito ilimitado por meio da consideração do limitado por uma medida. O relato parece significar isto: Posto que o desejo te lança ao que está adiante e não tens nenhuma fartura em tua corrida, e o bem não tem limite algum, mas o desejo se orienta sempre àquilo que é ainda maior, há tanto lugar junto a mim, que quem corre nele jamais poderá alcançar o final da corrida. Porem, de outro ponto de vista, a corrida é quietude. Coloca-te - diz - sobre a fenda (Ex 33, 21).