CAPÍTULO 33.

Pois o erro da idolatria desapareceu completamente da vida, absorvido pelas bocas piedosas dos que realizaram em si mesmos o aniquilamento da matéria da impiedade por meio da confissão da fé. Os mistérios antigamente bem estabelecidos entre os idólatras se converteram em água que flui sem consistência, água que é bebida pelas mesmas bocas que em outro tempo eram seguidoras dos deuses. Assim pois, quando vês que os que antes se ajoelhavam ante esta vacuidade agora destroem e fazem desaparecer as coisas nas quais haviam posto sua confiança, não te parece que o relato anuncia abertamente que um dia todo ídolo será absorvido pelas bocas daqueles que se converteram do erro à piedade? Moisés arma os levitas contra seus compatriotas. E percorrendo o acampamento de um extremo ao outro, dão morte de forma indiscriminada aos que encontram, deixando à ponta da espada a escolha de quem partir ao meio. Ao causar a morte igualmente a todos os que encontra, o que decidia sobre a morte dos que eram suprimidos não era o ser inimigo ou amigo, estrangeiro ou vizinho, parente ou estranho; a mão acometia da mesma forma e atuava igual mente sobre todos os que atacava. Talvez a útil lição que nos oferece este relato seja a de que cai sobre eles um castigo indiscriminado porque todos foram cúmplices com o povo inteiro no mal, e todo o acampamento se havia feito um só homem no sentir. Da mesma forma, quem castiga com açoites alguém surpreendido em um delito golpeia com o chicote a parte do corpo que se lhe põe diante sabendo que a dor de uma parte se estende ao todo, assim também, posto que todo o corpo devia se castigado igualmente por ter estado unido na alma, o chicote atingiu o todo atuando sobre uma parte. Portanto, se a cólera de Deus, ao contemplar a mesma maldade em muitos, não atuou contra todos senão só contra alguns, convém ter em conta que a correção foi feita por causa do amor ao homem; ainda que nem todos tenham sido castigados, com os golpes de alguns todos foram corrigidos para que se afastem do mal. Esta consideração está feita ainda ao fio da literalidade do relato. O sentido espiritual talvez possamos aproveitar do seguinte modo. O Legislador disse a todos em uma exortação pública: Quem estiver a favor do Senhor, que venha a mim (Ex 32, 26). É a voz da Lei convidando a todos: Se alguém quer ser amigo de Deus, que se faça meu amigo, da Lei, pois efetivamente, se alguém é amigo de Deus, se faz também amigo da Lei. A todos os que se reuniram em torno dele por causa deste chamado, Moisés ordenou tomar a espada contra o irmão, o amigo e o vizinho (Ex 32, 27). Se tivermos presente o contexto da consideração espiritual, entenderemos que todo aquele que presta atenção a Deus e à Lei se purifica com a morte dos costumes que habitam perversamente nele. Com efeito, as palavras irmão, amigo ou vizinho nem sempre são usadas pela Escritura no bom sentido, mas há ocasiões em que o irmão é um estrangeiro, o amigo um inimigo, o vizinho alguém que se levantou como adversário. Entendemos por estes, nossos pensamentos íntimos, cuja vida causa nossa morte, e cuja morte causa nossa vida.