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Voltemos ao ponto em que estávamos. Aqueles que já avistam a
virtude e seguem o Legislador em seu estilo de vida, quando abandonam
os limites do domínio dos egípcios, são perseguidos pelos ataques
das tentações que provocam ansiedades, medos e perigos em relação
ao êxito final. Assustada por estas coisas, a alma dos principiantes
na fé cai em completa desesperança em conseguir os bens. Porem, se
Moisés ou alguém como ele se encontra à liderança do povo, ao medo
se oporá o conselho, reconfortando a alma em seu desfalecimento com a
esperança da ajuda divina. Mas isto não ocorrerá se o coração de
quem está na liderança não fala com Deus. De fato, a muitos que
estão colocados nesta posição só preocupa a maneira como se encontra
organizado o que se vê, enquanto que as coisas que estão ocultas,
que só são vistas por Deus, lhes produzem um cuidado pequeno. Não
foi assim com Moisés. Quando exortava os israelitas a terem
confiança, mesmo não pronunciando exteriormente nenhuma palavra
dirigida a Deus, o próprio Deus testemunha que gritou (Ex 14,
13-15), ensinando-nos a Escritura - penso - que a voz que é
sonora e sobe aos ouvidos divinos não é o clamor que tem lugar com
vozes, mas o pensamento interior que sobe de uma consciência pura. A
quem se encontra nesta situação, parece pequeno o irmão como ajuda
para as maiores batalhas, refiro-me àquele irmão que saiu ao
encontro de Moisés quando, conforme o mandado de Deus, se dirigia
aos egípcios, e a quem nosso discurso apresentou em seu ministério de
anjo (Ex 4, 27). Agora tem lugar a manifestação do Ser
transcendente, que se mostra de modo que possa ser captado por quem o
recebe. Conhecemos pela história que isto aconteceu então e sabemos
pela interpretação espiritual que isto ocorre sempre. De fato, cada
vez que alguém foge do egípcio e, ao chegar fora de seus
territórios, se assusta ante os ataques das tentações, e quando o
inimigo rodeando com suas forças o perseguido só lhe deixa disponível
o mar, o guia, isto é, a nuvem, lhe mostra a salvação imprevista
que vem de cima. Até ali, ao mar, o conduz o guia, quer dizer, a
nuvem (Ex 13, 21). Os que nos precederam interpretaram este
nome dado ao guia como a graça do Espírito Santo que conduz ao bem
os que são dignos. O que a segue atravessa a água, enquanto o guia
lhe abre nela uma passagem estreita através da qual se realiza um
caminhar seguro até a liberdade, onde desaparece debaixo da água
aquele que o perseguia para escravizar. Quem ouve isto, talvez
reconheça o mistério da água a que alguém desce junto com todo o
exército do inimigo e da qual emerge só, depois de se afogar na água
o exército inimigo (Ex 14, 26-30). Pois quem desconhece
que o exército egípcio significa as diversas paixões da alma às
quais se escraviza o homem? Isto são os cavalos, isto são os carros
e os que estão montados neles; isto são os arqueiros, e os infantes
e o resto do exército dos inimigos (Ex 14, 9). De fato, em
que se diria que os movimentos de cólera ou os impulsos ao prazer, à
tristeza e à avareza diferem do exército que acabamos de mencionar?
A afronta é pedra lançada pela funda, e o ataque de cólera é
lança que agita sua ponta, enquanto que os cavalos que puxam os carros
com impulso irrefreável podem ser entendidos como o afã de prazeres.
Nos três homens montados no carro - a quem a história chama
tristates (Ex 14, 7) -, e que são levados por ele,
reconhecerás, instruído pelo simbolismo do montante e das ombreiras
das portas, a tríplice divisão da alma, pensando no racional, no
concupiscível e no irascível.
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