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Que a serpente levantada no deserto é símbolo do mistério da cruz o
ensina abertamente a palavra do Senhor quando diz: Da mesma forma que
Moisés levantou a serpente no deserto, assim é necessário que seja
levantado o Filho do homem (Jo 3, 14). Novamente marcha o
pecado por seu caminho habitual, avançando regularmente em uma
concatenação malvada, com uma lógica perversa. E o Legislador,
como um médico, amplia a cura conforme o progresso do mal. Posto que
a mordida das serpentes se havia tornado ineficaz para os que olhavam
para a figura da serpente, pelo já explicado entendes bem o
simbolismo, aquele que maquina enganos tão diversos contra nós
inventa outro caminho para o pecado. Também agora podemos observar
que isto mesmo sucede a muitos. Com efeito, muitos que reprimem a
paixão da concupiscência por meio de uma vida mais sensata, cheios de
soberba, se lançam ao sacerdócio contra o plano de Deus, por
esforços humanos e intrigas para ser escolhidos. Aquele a quem o
relato acusa de fazer o mal aos homens é o que empurra a esta perversa
cadeia de pecados. Com efeito, depois que, por causa da fé naquele
que está elevado sobre o madeiro, cessou a terra de dar a luz
serpentes contra os que estavam cheios de concupiscência, e eles se
acreditaram mais fortes que as mordidas venenosas, então, quando se
ultrapassa a paixão relativa à concupiscência, se apresenta a
enfermidade do orgulho. Julgando que é pouco estar no lugar em que
foram colocados, se lançam à dignidade do sacerdócio, intrigando
para afastar aqueles que receberam por sorte esta função sagrada da
parte de Deus. Estes desaparecem deglutidos pelo abismo. Os que
haviam de seu grupo sobre a terra foram abrasados por raios (Nm 16,
31-35). Penso que com este relato a palavra ensina que o final
da exaltação própria do orgulho é a descida para debaixo da terra.
Talvez alguém, inspirando-se nestas coisas defina a soberba, não
sem razão, como uma subida para baixo. Não estranhes se este
pensamento está em contradição com o sentir de muitos. As pessoas
pensam que com o nome soberba se designa o estar acima dos demais. A
verdade do que foi aqui narrado confirma nossa definição. Com
efeito, se os que se elevaram a si mesmos acima dos demais se afundaram
no abismo da terra aberta debaixo deles, talvez ninguém repudie a
descrição que define o orgulho como uma caída ao mais baixo.
Moisés ensina a quem contempla estas coisas a ser comedidos e a não
envaidecer-se com os êxitos, mas a administrar sempre bem o
presente. Pois ainda que hajas sido mais forte que os prazeres, não
por isso estás isento de ser preso por outra forma de paixão. Toda
paixão é uma caída enquanto é paixão. Não há nenhuma diferença
de caída na diversidade de paixões: quem resvalou na suavidade do
prazer, caiu; e quem foi derrubado pelo orgulho, caiu. Para quem
tem inteligência não é desejável nenhuma forma de caída, pois toda
caída, enquanto caída, deve ser igualmente evitada. Por esta
razão, se agora vês em algum lugar alguém que se purificou da
debilidade dos prazeres, porem que se lança de novo com afã ao
sacerdócio por julgar que está acima dos demais, pensa que, na mesma
elevação do orgulho, o vês cair terra abaixo. No que segue a
continuação, a Lei ensina que o sacerdócio é um assunto divino,
não humano. O ensina desta forma: Havendo marcado as varas de cada
tribo com o nome dos que as haviam oferecido, Moisés as colocou sobre
o altar de Deus, de forma que a vara distinguida das outras por um
prodígio divino fosse o testemunho da eleição do céu (Nm 17, 6
-11). Feito isto, as varas dos demais permaneceram como estavam,
porem a vara do sacerdote, que havia lançado raízes em si mesma não
por uma umidade vinda de fora, mas pela força metida por Deus dentro
dela, germinou ramos e frutos, e o fruto, - era uma amêndoa-,
chegou a amadurecer. Este acontecimento ensinou a todo o povo a
permanecer submisso em boa ordem. No fruto que produziu a vara de
Aarão, podemos ver como a vida no sacerdócio deve ser continente,
severa e dura na manifestação externa da conduta, porem levando por
dentro, no oculto e invisível, o fruto que se come, o qual se mostra
quando, com o tempo, amadurece o comestível, parte-se a casca
rugosa e se abre a envoltura lenhosa do fruto.
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