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Todas estas coisas e quantas lhes são afins, precipitam-se na água
perseguindo os israelitas junto com o promotor do perverso ataque.
Porem a água, posto que o bastão da fé e a nuvem luminosa usam como
guia, se converte em fonte de vida para os que se refugiam nela e em
destruição dos perseguidores. A história nos ensina através
disto, como convém que sejam os que atravessam a água. Quando
alguém emerge da água não deve conservar consigo nada do exército
inimigo. Se o inimigo emergisse juntamente com ele, este permaneceria
em escravidão ainda depois da água, ao haver feito emergir vivo
consigo o tirano, ao que não afogou no abismo. Isto quer dizer, se
explicarmos abertamente o simbolismo aproximando-o de um significado
mais claro, que é necessário que quantos, no batismo, passam
através da água sacramental, façam morrer na água todo o exército
do vício: a avareza, o desejo impuro, o espírito de rapina, a
tendência à soberba e à prepotência, o impulso à violência, a
ira, o rancor, a inveja, os ciúmes e todas essas coisas. Posto
que, de alguma forma, as paixões seguem a natureza humana, devemos
afogar na água inclusive os maus movimentos da alma e suas seqüelas.
No mistério da Páscoa, este é o nome da vítima cujo sangue
preserva da morte quem se vale dela, sucede o mesmo. Recomenda-se
que coma pão ázimo na Páscoa. Ázimo é o que não está misturado
com o fermento do dia anterior (Ex 13, 6 e 1Co 5, 7-8).
Através disto a Lei nos dá a entender que não se deve misturar
nenhum resíduo de maldade com a vida nova, mas que comecemos a vida
nova com um começo novo, rompendo a cadeia dos pecados com a
conversão ao bem. Por esta razão quer que afoguemos no batismo
salvador - como no batismo do mar - toda pessoa egípcia, isto é,
toda forma de maldade, e que devemos emergir sós, sem arrastar
conosco em nossa vida nenhum estrangeiro. Isto é o que aprendemos com
a história quando diz que na mesma água se distingue o inimigo e o
amigo com a morte e com a vida: o inimigo é destruído, o amigo é
vivificado (Ex 14, 27-30). Muitos dos que receberam o
sacramento do batismo, por desconhecimento dos preceitos da lei,
misturaram a levedura do vício, já abandonada, à vida nova, e,
depois de ter atravessado a água, em sua forma de viver levam
consigo, vivo, o exército egípcio. Com efeito, quem antes do dom
do batismo se havia enriquecido com a injustiça ou a rapina, ou
adquiriu alguma terra com perjúrio, ou coabitava com uma mulher em
adultério, ou qualquer das demais coisas proibidas, pensa que mesmo
que depois do batismo continue a gozar das coisas que adquiriu
perversamente, permanece livre da escravidão dos pecados, sem
perceber que se encontra escravizado por perversos senhores. Pois a
luxuria é um dano cruel e furioso, que atormenta a alma submetida a
sua escravidão com os prazeres como se fossem látegos. Um tirano
semelhante é a avareza, que não permite nenhum descanso a seu
escravo, senão que por muito que trabalhe obedecendo as ordens de seu
dono e ganhando para ele o que ambiciona, sempre o incita a mais. E
todas as outras coisas que se fazem impulsionados pela maldade
constituem uma serie de tiranos e donos. Se alguém lhes obedece,
ainda que haja passado através da água, apesar disso - é meu
parecer -, não tocou na água sacramental cuja obra é a destruição
dos perversos tiranos.
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