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Concorda esta interpretação com as coisas já ditas a respeito de
Aarão, quando, por ocasião de seu encontro com Moisés, o
reconhecemos como o que socorre e protege, o que realiza juntamente com
ele os prodígios contra os egípcios. O conhecemos justamente como
superior, já que a natureza angélica e incorpórea foi feita antes
que a nossa; como irmão, obviamente, pelo parentesco de sua natureza
intelectual com nossa natureza intelectual. Existe a objeção de como
se pode tomar em seu sentido melhor o encontro de Aarão, que se
converteu para os israelitas em servidor da idolatria? Porem, neste
lugar, o texto explica claramente o equívoco da "irmandade", pois o
significado desta palavra não é o mesmo em todos os lugares, já que
toma este nome em sentidos opostos. Um é o irmão que abate o tirano
egípcio, e outro o que faz uma cópia do ídolo para os israelitas,
ainda que seja idêntico o nome de ambos. Contra irmãos desta classe
impunha Moisés a espada. O que ordena aos demais, sem dúvida o
estabelece também para si mesmo. A destruição de um irmão desta
classe é a aniquilação do pecado. Com efeito, todo o que faz
desaparecer o mal metido dentro de si pela sedução do adversário,
este matou em si mesmo o que vivia pelo pecado. Nosso ensinamento em
torno disto se confirma ainda mais, se colocarmos a relação de alguns
outros elementos do relato com a interpretação espiritual.
Dissemos, de fato, que foi ordem daquele Aarão que eles se
desprendessem de suas arrecadas. O desprendimento destas se converteu
na matéria do ídolo (Ex 32, 2-3). Que diremos? Que
Moisés havia adornado as orelhas dos israelitas com adorno de
arrecadas, que é a Lei, e que o falso irmão, pela desobediência,
tira o adorno colocado nas orelhas e faz com ele um ídolo. A primeira
entrada do pecado foi o tirar as arrecadas, isto é, a decisão de
desobedecer ao preceito. Como julgar a serpente como amiga e vizinha
dos primeiros pais, a ela que sugeriu como coisa útil e boa
afastar-se do mandado de Deus? Isto é o livrar as orelhas das
arrecadas do preceito (Rm 10, 17). Portanto, quem tiver
matado tais irmãos, amigos e vizinhos ouvirá da Lei aquela palavra
que conta o relato que disse Moisés aos que haviam matado a estes:
Cada um de vós consagrou hoje as suas mãos ao Senhor, matando seu
filho, e seu irmão, para vos ser dada a benção (Ex 32,
29). Penso que a recordação daqueles que consentiram no pecado se
introduziu oportunamente no discurso. Aprendemos assim que as tábuas
feitas por Deus, nas quais havia sido gravada da lei divina, caíram
na terra das mãos de Moisés e, quebrando-se pela dureza do solo,
Moisés as refaz, embora não sejam inteiramente as mesmas, mas só o
escrito nelas. Com efeito, tendo tomado as tábuas da matéria daqui
de baixo, as apresenta ao poder de quem grava nelas a Lei, e assim
atrai de novo a graça levando a Lei em tábuas verdadeiras, ao haver
gravado Deus sua palavra na pedra. Guiados por estas coisas, talvez
seja possível alcançar alguma inteligência da providência de Deus
em nosso favor. Com efeito, se o divino Apóstolo disse a verdade
chamando tábuas os corações (2Co 3, 3), isto é, a parte
superior da alma - e sem dúvida diz a verdade aquele que sonda pelo
Espírito as profundezas de Deus (1Co 2, 10) -, pode-se
deduzir conseqüentemente que, no princípio, a natureza humana estava
sem fraturas e era imortal, moldada pelas mãos divinas e embelezada
com os caracteres não escritos da Lei, pois fisicamente estava dentro
de nós uma vontade conforme à Lei, no afastamento do mal e no honrar
à Divindade.
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