CAPÍTULO 29.

Quando o profeta considera o tabernáculo celestial, o contempla através destes símbolos. Se depois considera a tenda inferior, posto que muitas vezes a Igreja é chamada Cristo por Paulo, poderíamos entender, com todo o direito, que estes nomes designam os servidores do divino mistério, os que a palavra chama também colunas da Igreja, julgando que estes nomes designam os apóstolos, os mestres e os profetas (Col 1, 18 e 1Co 12, 12 e Ef 1, 23 e Ga 2, 9). Com efeito, não só são colunas da Igreja Pedro, João e Tiago, nem só João Batista foi lâmpada que ilumina, senão que todos os que com seu esforço sustêm a Igreja e os que, por suas obras, se convertem em luminárias, são chamados colunas e lâmpadas (Jo 5, 35). Vós sois a luz do mundo (Mt 5, 14), disse o Senhor aos Apóstolos. E o divino Apóstolo, dirigindo-se a outros, manda novamente que sejam colunas, dizendo : Sede firmes e inquebrantáveis (1Co 15, 58). E edificou Timóteo como coluna formosa, fazendo-o, como disse com suas próprias palavras, coluna e fundamento da verdade (1Tm 3, 15). Neste tabernáculo, vemos oferecidos perpetuamente, de manhã e à tarde, o sacrifício de louvor e o incenso da oração (Hb 13, 15). O grande Davi nos dá a entender isto dirigindo a Deus o incenso da oração em perfume e suavidade, e oferecendo o sacrifício com a elevação das mãos (Sal 140, 2 e Ef 5, 2). Ao ouvir falar de peles, se reconhecerá facilmente os que se purificam da mancha dos pecados na água sacramental. Piscina era João, purificando no Jordão com o batismo de penitência; piscina era Pedro, que conduziu até a água três mil pessoas, e isto de uma só vez; piscina de Candace foi Felipe, e todos os que causam a graça em quantos recebem a participação do dom (At 2, 41 e At 8, 27-40). Talvez não nos afastemos do conveniente se interpretarmos que os tapetes, que unidos entre si rodeiam circularmente a tenda, significam a unanimidade de amor e de paz entre os crentes, pois Davi o entende assim quando diz: Fiz da paz teus limites (Sal 147, 14). A pele tingida de vermelho e as cobertas de crinas para completar o adorno da tenda, poderiam ser entendidas respectivamente como a mortificação da carne de pecado (Rm 8, 3) - da que é símbolo a pele tingida de vermelho -, e a austeridade da vida em continência, coisas com as quais o tabernáculo da Igreja se embeleza especialmente. As peles, com efeito, que não têm em si mesmas a força vital que provem da natureza, se torna colorida com a imersão na tinta vermelha, a qual ensina que a graça que floresce por meio do Espírito não nasce senão naqueles que deram morte ao pecado em si mesmos. E se com o tecido vermelho se designa no relato o pudor casto, isto deixamos ao juízo de quem queira pensar assim. O trançado de crinas, que proporciona um tecido áspero e grosso, alude à áspera austeridade que debilita nossas paixões familiares. A vida em virgindade, que mortifica a carne de quem assim vive, mostra em si todos estes traços (1Co 9, 27). O fato de que o interior da tenda, que se chama Santo dos Santos, esteja vedado à maioria, não pensamos que destoe da coerência de nossa interpretação. Pois na verdade é coisa santa, e coisa santa entre as santas, intangível e inacessível à maioria, a verdade dos seres. Posto que está colocada na parte mais íntima e secreta da tenda do mistério, nós não devemos nos ocupar inoportunamente do conhecimento dos seres que estão alem de nossa compreensão, crendo sim que o procurado existe, ainda que não seja patente aos olhos de todos, mas que permanece inefável nas regiões secretas do espírito.