CAPÍTULO 2.

Portanto, quando alguém tiver convivido com a rainha dos egípcios, embora não pareça excluído de suas magnificências, deve correr àquela que é a mãe por natureza, da qual Moisés não se separou no tempo de sua infância junto da rainha, uma vez que foi amamentado, como conta a história, com o leite materno. Isto ensina, a meu ver, que se no tempo de nossa educação convivermos estreitamente com os pensamentos pagãos, devemos não nos separar do leite da Igreja que nos alimenta. O leite são os preceitos e costumes da Igreja, com os quais a alma se alimenta e se fortifica, tomando daqui o ponto de partida para subir ao alto. É verdade que o pensamento de quem presta atenção aos ensinamentos pagãos e aos ensinamentos pátrios se encontrará entre dois inimigos (Ex 11, 12). O pensamento religioso estrangeiro resiste à palavra hebréia, disputando continuamente para aparecer mais forte que a de Israel. E assim pareceu a muitos dos mais superficiais, os quais, abandonando a fé paterna, se misturaram com os inimigos, convertidos em transgressores dos ensinamentos de seus pais. Porem quem é grande e nobre, seguindo o exemplo de Moisés, mostra com seu golpe de lança que é alma morta a doutrina que se levanta contra o discurso da verdade. Interpretando esta passagem de forma diversa, talvez alguém encontre esta luta dentro de nós. O homem se encontra, como o troféu de um certame, no meio daqueles competidores que o pretendem; faz vencedor do certame àquele a quem se inclina. Assim ocorre com a idolatria e o culto verdadeiro a Deus, a intemperança e a moderação, a justiça e a injustiça, a soberba e a humildade, e todas as coisas que se subentendem contrapostas na luta aberta de egípcio contra hebreu. Moisés nos ensina aqui com seu exemplo, a ajudar a virtude como a alguém da própria estirpe, e a repelir o adversário que a ataca. De fato, o triunfo da piedade é, ao mesmo tempo, morte e aniquilação da idolatria. Da mesma forma, a injustiça é destruída com a justiça, e mata-se a soberba com a humildade. A contenda entre os dois compatriotas tem lugar também entre nós (Ex 2, 13). Com efeito, não existiriam as invenções doutrinais das perversas heresias se não lutassem, em blocos contrapostos, as argumentações erradas contra as verdadeiras. E se somos demasiado débeis para dar por nós mesmos o triunfo ao que é justo, e o mal prevalece com seus argumentos e repele o primado da verdade, temos que fugir disto o mais rapidamente possível, partindo do exemplo da história de Moisés (Ex 2, 15) até um ensinamento melhor e mais sublime dos mistérios. E se for necessário viver de novo no estrangeiro, isto é, se houver uma necessidade que nos force a tratar com a filosofia pagã, façamo-lo depois de haver afastado os perversos pastores do uso injusto dos poços (Ex 2, 17), isto é, depois de haver refutado os mestres da maldade pelo mau uso da educação. Deste modo viveremos a sós com nós mesmos, sem chegar às mãos dos adversários ou nos colocar no meio deles, mas viveremos na companhia dos que estão apascentados por nós, iguais no sentir e no pensar: de todos os movimentos da alma que existe em nós, como ovelhas apascentadas pelo querer da razão que é a que dirige. E quando estivermos dedicados a esta paz e a este pacífico repouso, então brilhará a verdade, enchendo de luz com seus próprios fulgores os olhos da alma. Deus mesmo é a verdade que se manifestou então a Moisés através daquela inefável iluminação.