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Bem por vir estava o cargo de provincial em que entrou, quando muito antes
o disse, como também que São Jorge Soares o havia de ver depois de sua
morte, e que havia de ser enterrado junto do Padre Gregório Serrão, o que
tudo assim se cumpriu como no livro segundo fica dito.
QUE ESCAPARIA DE UMA CÓLICA O PADRE INÁCIO TOLOZA – PROFECIAS
Acrescentemos outros exemplos. A muitas pessoas que estavam mal de
graves doenças, profetizou a vida e saúde como depois se viu; um deles, foi o
Governador Geral Lourenço da Veiga, como me contou Nuno do Amaral que
então servia de seu veador.
Vindo do Rio de Janeiro para o Colégio da Bahia, com o Padre Visitador
Cristovão de Gouveia, e outros padres, no Cabo Frio adoeceu um deles de tão
aguda e apressada cólica, que tratavam já de o enterrarem ali, ou tornarem a
levar seu corpo para o Colégio do Rio.
Neste comenos o Padre José chamou um irmão que entendia de cura, e lhe
disse que aplicasse ao enfermo alguma mezinha dissimuladamente, como de si,
e acrescentou: “não há de morrer desta, mas não digais isto a ninguém”. E hoje
em dia vive o enfermo da cólica que é o Padre Inácio Toloza.
DE OUTRO IRMÃO
Chegando de São Vicente ao Rio de Janeiro, foi logo visitar ao Irmão João
Marinho, que estaca mui mal; e saindo-se foi ao coro visitar ao Santíssimo
Sacramento, e descendo disse lhe que não dessem a Santa Unção (que lhe
andavam aparelhando), que não havia de morrer daquela. Assim se fez, e o
irmão sarou e viveu depois mais de vinte anos.
QUE NÃO MORRERIA UMA DOENTE
Foi o padre um dia confessar fora da cidade uma mulher que estava muito
no cabo, cujo marido chamado Domingos Saraiva, muito choroso, saiu a
receber ao padre, que vendo-o tão sentido, lhe disse: “não vos desconsoleis,
bom velho, que vos não há de morrer desta, vossa companheira”. E isto foi
antes de chegar à casa onde a doente estava. O padre o disse e Deus o
confirmou, e a doente viveu depois muitos anos.
O MESMO DE OUTRA
Tinha Manuel de Oliveira Gago, uma filha, na vila de Santos, para morrer, e
já pranteada de toda a família. Chegou o Padre José, e disse ao pai e mãe que
não chorassem, que a enferma não havia de morrer daquela doença, e que
havia de casar, mas que eles se aparelhassem, porque primeiro haviam ambos
de morrer que não a filha, e o pai não duraria mais que um ano. Deu à doente
um pouco de vinho e mandou-a sangrar, e logo tornou em si. E quanto o padre
disse tudo foi verdade sem faltar coisa alguma.
QUAL HAVIA DE SER O MARIDO DE UMA MOÇA
A mãe da dita enferma por nome Felipa da Mota, sendo moça em casa de
seu pai, estava apalavrada para casar com certo homem honrado; mas desfez-se
o casamento, com muito sentimento do pai e mãe.
Foi-os consolar o Padre José, e lhes disse e não desconsolassem, porque não
era sua, e seu marido havia de vir de Lisboa, e a capa que trouxesse aos
ombros havia de ser sua própria, sem dever nada a ninguém mais que a Deus;
e que havia de ter tantos filhos que não saberia quais eram as camisas de uns e
de outros. O que tudo assim sucedeu.
DA FILHA DE DIOGO DE AMORIM
Sendo morador na cidade da Bahia, Diogo de Amorim, casado com Andreza
Dias, lhe nasceu uma criança de sete meses, por causa de uma queda que deu a
mãe, de que correu muito risco de vida e a mãe padeceu muito trabalho.
Foi-a ver o Padre José, e por a criança vir muito fraquinha, rogaram ao
padre que a batizassem; escusou-se dizendo que não morreria então, e que mais
honra seria batizá-la na Sé, mas que lhe não tirassem o nome de Maria, pois
nascera em dia da Assunção de Nossa Senhora; que a criassem muito bem,
porque havia de ser alegria daquela casa, e que morreria em dia de Nossa
Senhora dali a onze anos, mas não na Bahia onde nascera.
Depois se mudaram seus paris para o Rio de Janeiro, onde a menina faleceu
no mesmo dia, ano e idade. Isto referiu a mãe ao Padre Pantaleão dos banhos,
dizendo que juraria quando lh’o mandassem.
AIRES FERNANDES
No tempo que o Padre José andou entre os tamoios, esteve também com ele
um amigo seu, por nome Aires Fernandes, a quem os inimigos tinham retido
como preso para o matarem e comerem. Deu conta disso ao padre que lhe
respondeu: “não vos gasteis que vos não hão de matar; amanhã a tais horas há
de vir um barco a tal porto, e nele vos podeis pôr em salvo”. E assim sucedeu.
DO QUE PEDIA SER RECEBIDO NA COMPANHIA E DEPOIS SE ARREPENDEU
Concluirei este capítulo referindo um triste caso que o Padre José
prognosticou a um homem, que se não quis aproveitar de seu conselho. A
história foi esta: sendo o Padre José provincial, e estando no Rio de Janeiro,
um homem viúvo lhe pediu o recebesse na Companhia; o padre lhe deu
palavra que sim, mas que seria na Bahia, para onde ambos estavam de
caminho, tanto que ele concluísse seus negócios.
Veio o homem primeiro com aquela boa intenção, e depois chegou o padre
dali alguns dias, e acertaram ambos de se encontrarem na praia; e com o padre,
seu companheiro, que notou bem o que ali passaram; perguntou-lhe o padre:
“pois, Belchior Gomes, como estais de vossos negócios, não vos acabastes
ainda de desembaraçar?” Respondeu: “já, sr. Padre, mas mudei o conselho,
porque quero ir morrer a Portugal e lá pedirei a Companhia e morrerei nela”.
O padre se chegou a ele, e batendo-lhe com a mão no ombro lhe disse estas
palavras, com semblante severo, como que lhe denunciava uma sentença
divina: “Belchior Gomes, ir a Portugal ireis, mas o morrerdes e acabar, não
será lá nem na Companhia, mas cá no Brasil, e de maneira que merece quem
vira as costas ao chamamento de Deus”.
Este pobre homem dali a alguns anos se foi a Portugal, e tornou com
provisões para fazer uma nova povoação no Cabo Frio, onde, andando pelo
mato, se perdeu dos companheiros, e ali acabou sem mais aparecer, senão que
dali a um ano o foram achar mirrado, debaixo da lapa de um penedo.
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