II. FRAGMENTOS DO DIÁRIO ESPIRITUAL DE SANTO INÁCIO [52]

"As lágrimas que hoje verti pareceram-me diferentes das outras. Eram doces, lentas, sem ruído nem grande comoção, e tão íntimas que não encontro palavras para as explicar. Um entretenimento, ao mesmo tempo interior e exterior, arrastava-me ao amor de Deus e tinha uma harmonia cheia de doçura que me é impossível exprimir.

"Hoje ainda, muitas lágrimas durante e depois da missa; depois, uma profunda felicidade produzida por uma voz do interior, que parecia uma palavra ou uma música descida do céu. A devoção e o enternecimento cresciam em mim à medida que eu observava a inteligência sobrenatural que me era dada...

"Hoje mesmo abundância de lágrimas e uma palavra interior verdadeiramente maravilhosa. Enquanto eu pedia à Santíssima Virgem que me ajudasse junto de Deus, Pai de seu divino Filho, e suplicava também ao Filho que me fosse favorável com sua Mãe Santíssima junto de seu Pai, senti-me como levado à sua presença. Os cabelos eriçaram-se-me na cabeça, experimentei um abalo geral e um ardor candente em todo o corpo; depois redobraram as lágrimas e tive mais ardente devoção e um conhecimento sobrenatural da Santíssima Trindade. Há tanta doura nestas luzes e nestas visões, que a língua humana as não pode exprimir..."

"Sempre a mesma abundância de luzes sobrenaturais, de visões celestes, de consolações indizíveis, de lágrimas inestancáveis... Bastam os nomes de Deus e de Nosso Senhor para me penetrarem dum respeito e duma humildade inexprimíveis... Depois da oração, novos movimentos interiores, completamente desacostumados, lágrimas e soluços, grande amor para com Nosso Senhor Jesus Cristo, ardente desejo de morrer por ele e com ele antes que viver com qualquer outro."

" ...Ao aproximar-me do altar, vindo-me o nome de Jesus ao pensamento, senti-me arrastado para ele, e compreendia que a mais forte razão para nos dedicarmos à extrema pobreza, era precisamente porque temos a Jesus por chefe da Companhia... Recordo-me de que, no momento em que Deus me reuniu a seu Filho, experimentei um ardente desejo de gravar no meu coração o nome de Jesus, e este desejo era acompanhado de grande cópia de lágrimas..."

"...Quando conversava com a divina Majestade, senti para com ela uma afeição tão viva, que me parecia que ela correspondia ao meu amor; nunca tinha recebido uma visita celeste tão excelente; jamais tinha experimentado amor tão doce, tão sensível... Na capela, novas lágrimas, nova devoção. Paramentado e no altar, foi uma superabundância de lágrimas e de soluços acompanhados de ardente amor para com a Santíssima Trindade. Celebrando missa, as mesmas impressões, os mesmos choros, apesar da dor que sentia num dos olhos; veio-me ao pensamento que o perderia se as lágrimas não parassem. A estas palavras: Placeat tibi, sancta Trinitas, experimentei um aumento nessas inenarráveis comoções... Todas estas delícias espirituais tinham por objecto a Santíssima Trindade, que me atraía a si e ao seu amor."

"Depois da missa, pus-me em oração junto ao altar... sempre lágrimas e soluços causados por esse atrativo para a Santíssima Trindade. Experimentei delícias tão inefáveis que me foi impossível distrair-me durante todo o dia, quer em casa, quer na rua. Estes sentimentos impetuosos e esta disposição para as lágrimas renovaram-se pensando na Santíssima Trindade."

"...Fui dizer uma missa do Espírito Santo; dirigi-me ternamente a esse Mestre divino: então pareceu-me senti-Lo e vê-Lo no meio duma claridade singular, sob a forma duma chama brilhante e duma maneira desacostumada, e isto enquanto se preparava o altar e eu me revestia. Celebrei com grande comoção interior; por momentos perdia a palavra... Senti e vi em seguida que Nossa Senhora me era propícia junto do eterno Pai. Durante as orações dirigidas, quer ao Pai, quer ao Filho, e no momento da consagração, vi que ela era como a porta da fonte das graças; mostrando-me a sagrada carne do seu divino filho, mostrava assim a sua, e eu concebia estas coisas em espírito, com uma inexplicável clareza..."

"...Na minha oração ordinária, tive muitas luzes e muita devoção..."

"...Na igreja e mais tarde fora de casa, vislumbrei a Pátria. celeste e no meio o seu soberano Senhor, como teria podido antever três pessoas distintas, e no Pai, a segunda e a terceira pessoa... "

"Quando entrei na capela para orar, senti, ou para falar com mais exactidão, vi por uma virtude sobrenatural, a Santíssima Trindade e Jesus Cristo Nosso Senhor, que me era. apresentado como meu mediador junto dela, ou como o meio pelo qual esta visão intelectual me era comunicada. Fez-me: verter rios de lágrimas e experimentar uma superabundância. de amor."

"Dizendo a missa com muita devoção, tive um momento esta mesma visão da Santíssima Trindade, e ela aumentou mais. o meu amor para com a divina Majestade."

"Ao Te igitur, sentimento e visão, não obscuros, mas uma percepção claríssima do próprio Ser ou da essência divina.. sob o aspecto dum sol. Dessa essência parecia sair o Pai, e, quando eu disse estas palavras: Te igitur, clementissime Pater, representava-se-me antes a essência divina que o Pai. E, representando-se-me também o ser divino ou a essência da Santíssima Trindade sem distinção das três Pessoas, apoderou-se de mim uma profunda devoção por essa essência divina assim figurada..."

Além disso, enternecimento, lágrimas e sentimento de amor ardente.

"Depois da missa orava no altar quando a mesma essência divina se me mostrou de novo sob uma forma esférica, e eu via, de alguma sorte, as três Pessoas como a primeira, isto é, que o Pai, o Filho e o Espirito Santo pareciam derivados dessa essência divina, sem sair todavia dos limites dessa visão esférica, a qual me levou a novas e brilhantes aspirações e a abundantes lágrimas."

"...Estava na capela e cheio de piedade para com a Santíssima Trindade: não vi, assim como nos dias precedentes, as três Pessoas distintas, mas vi, como numa brilhante claridade, uma essência que me abrasava de amor. No princípio da missa, o ardor dos meus sentimentos impedira-me de pronunciar In nomine Fratris..., e durante todo o Santo Sacrifício senti essa devoção com as suas manifestações habituais. Essas vivas comoções referiam-se à Santíssima Trindade. Por momentos experimentava os mesmos sentimentos para com Nosso Senhor; parecia-me estar sob a sua sombra e sob a sua direção, o que, longe de diminuir a minha união com a divina Majestade, não fizera senão aumentá-la..."

"...Preparava-me para celebrar a missa: de repente apoderou-se de mim o pensamento de que, para o fazer dignamente, devia ser um anjo, e doces lágrimas correram dos meus olhos... Num outro momento, a visão da Santíssima Trindade representou-se primeiro: após a do Ser, depois a do Pai, indo assim do conjunto a cada uma das Pessoas. Noutros momentos, esta percepção chegava-me doutra maneira e com menos clareza..."

"Durante a missa frequentes interrupções, luzes concedidas pela Santíssima Trindade esclareceram a minha inteligência... Parece-me que os mais longos estudos nunca me poderiam ensinar estas coisas..."

"Durante a missa, lágrimas abundantes detiveram-me a palavra; depois, comunicações espirituais tão claras, que eu cria nada mais ter a compreender a respeito da Santíssima 'Trindade. Durante esta missa, conheci, senti que, falando do Pai, e crendo que Ele era uma das pessoas da Santíssima Trindade, empenhava-me tanto mais em amá-lo, que as outras pessoas estavam encerradas nele. Experimentei um efeito semelhante orando ao Filho e ao Espírito Santo, adorando cada uma das Pessoas divinas, consagrando-me a elas, regozijando-me de pertencer a todas três, o que era para mim uma grande felicidade; não cessava de dizer a mim mesmo: Quem és tu? Que mereces? Por que recebes tantas graças?"

"Ainda uma terna devoção, lágrimas na missa, perda da palavra... Parecia-me, orando ao Pai, que o Salvador Jesus lhe apresentou as minhas orações. Eu via-o e sentia-o duma maneira que me é impossível explicar... Quer em casa, quer fora, Jesus oferece-se de novo a mim... Então as minhas lágrimas corriam de novo e as comoções exteriores faziam-se vivamente sentir... Ouvir, ver Jesus Nosso Senhor abrasava-me de tal amor, que nada no mundo me parecia capaz de me separar dele...".