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Ao considerar os direitos do homem do trabalho em relação com este
«dador de trabalho indirecto», quer dizer, em relação com o
conjunto das instituições que, a nível nacional e a nível
internacional, são responsáveis por toda a orientação da política
do trabalho, deve voltar-se a atenção antes de mais nada para um
problema fundamental. Trata-se do problema de ter trabalho ou, por
outras palavras, do problema de encontrar um emprego adaptado para
todos aqueles sujeitos que são capazes de o ter. O contrário de uma
situação justa e correcta neste campo é o desemprego, isto é, a
falta de lugares de trabalho para as pessoas que são capazes de
trabalhar. E pode tratar-se de falta de trabalho em geral, ou então
de falta de emprego em determinados sectores do trabalho. O papel das
aludidas instituições, que aqui são compreendidas sob a
denominação de dador de trabalho indirecto, é o de actuar contra o
desemprego, que é sempre um mal e, quando chega a atingir
determinadas dimensões, pode tornar-se uma verdadeira calamidade
social. E o desemprego torna-se um problema particularmente doloroso
quando são atingidos sobretudo os jovens que, depois de se terem
preparado por meio de uma formação cultural, técnica e profissional
apropriada, não conseguem um emprego e, com mágoa, vêem frustradas
a sua vontade sincera de trabalhar e a sua disponibilidade para assumir
a própria responsabilidade no desenvolvimento económico e social da
comunidade. A obrigação de conceder fundos em favor dos
desempregados, quer dizer, o dever de assegurar as subvenções
indispensáveis para a subsistência dos desempregados e das suas
famílias, é um dever que deriva do princípio fundamental da ordem
moral neste campo, isto é, do princípio do uso comum dos bens ou,
para exprimir o mesmo de maneira ainda mais simples, do direito à vida
e à subsistência.
Para fazer face ao perigo do desemprego e para garantir trabalho a
todos, as instituições que acima foram definidas como dador de
trabalho indirecto devem prover a uma planificação global, que esteja
em função daquele «banco» de trabalho diferenciado, junto do qual
se plasma a vida, não apenas económica, mas também cultural, de
uma dada sociedade; elas devem dispensar atenção, ainda, à
organização correcta e racional do trabalho que se desenvolve em tal
«banco». Esta solicitude global, em última análise, pesará
sobre os ombros do Estado, mas ela não pode significar uma
centralização operada unilateralmente pelos poderes públicos.
Trata-se, ao contrário, de uma coordenação justa e racional, no
quadro da qual deve ficar garantida a iniciativa das pessoas, dos
grupos livres, dos centros e dos complexos de trabalho locais, tendo
em conta aquilo que foi dito acima a respeito do carácter subjectivo do
trabalho humano.
O facto da dependência recíproca das diversas sociedades e dos
diversos Estados, bem como a necessidade de colaboração em diversos
domínios exigem que, embora mantendo os direitos soberanos de cada um
deles no campo da planificação e da organização do trabalho a nível
da própria sociedade, se aja ao mesmo tempo, neste sector
importante, no quadro da colaboração internacional, mediante os
tratados e os acordos necessários. Também aqui, é indispensável
que o critério de tais tratados e acordos se torne cada vez mais o
trabalho humano, entendido como um direito fundamental de todos os
homens, trabalho que dá a todos aqueles que trabalham direitos
análogos, de tal maneira que o nível de vida dos homens do trabalho
nas diversas sociedades seja cada vez menos marcado por aquelas
diferenças chocantes que, com a sua injustiça, são susceptíveis de
provocar violentas reacções. As Organizações Internacionais têm
tarefas imensas a desempenhar neste sector. E é necessário que elas
se deixem guiar por uma diagnose exacta da complexidade das
situações, assim como dos condicionamentos naturais, históricos,
sociais, etc.; é necessário, ainda, que elas, pelo que se refere
aos planos de acção estabelecidos em comum, procurem ter a maior
efectividade, isto é, eficácia na realização.
É em tal direcção que se pode pôr em prática o plano de um
progresso universal e harmonioso de todos, segundo o fio condutor da
Encíclica Populorum Progressio do Papa Paulo VI. É necessário
acentuar bem que o elemento constitutivo e ao mesmo tempo a
verificação mais adequada de tal progresso no espírito de justiça e
de paz, que a Igreja proclama e pelo qual não cessa de orar ao Pai
de todos os homens e de todos os povos, é exactamente a
revalorização contínua do trabalho humano, quer sob o aspecto da sua
finalidade objectiva, quer sob o aspecto da dignidade do sujeito de
todo o trabalho, que é o homem. O progresso de que se está a falar
aqui deve ser actuado pelo homem e para o homem e deve produzir frutos
no homem. Uma verificação do mesmo progresso será o reconhecimento
cada vez mais maturado da finalidade do trabalho e o respeito cada vez
mais universal dos direitos a ele inerentes, em conformidade com a
dignidade do homem, sujeito do trabalho.
Uma planificação racional e uma organização adequada do trabalho
humano, à medida das diversas sociedades e dos diversos Estados,
deveriam facilitar também a descoberta das justas proporções entre os
vários tipos de actividades: o trabalho dos campos, o da indústria,
o dos multiformes serviços, o trabalho de concepção intelectual e
mesmo o científico ou artístico, segundo as capacidades de cada um
dos homens e para o bem comum de todas as sociedades e de toda a
humanidade. A organização da vida humana segundo as múltiplas
possibilidades do trabalho deveria corresponder um sistema de
instrução e de educação adaptado, que tivesse como finalidade,
antes de mais nada, o desenvolvimento da humanidade e a sua
maturidade, e também a formação específica necessária para ocupar
de maneira rendosa um justo lugar no amplo e socialmente diferenciado
«banco» de trabalho.
Lançando o olhar para a inteira família humana espalhada por toda a
terra, não é possível ficar sem ser impressionado por um facto
desconcertante de imensas proporções; ou seja, enquanto que por um
lado importantes recursos da natureza permanecem inutilizados, há por
outro lado massas imensas de desempregados e subempregados e multidões
ingentes de famintos. É um facto que está a demonstrar, sem dúvida
alguma, que, tanto no interior de cada comunidade política como nas
relações entre elas a nível continental e mundial — pelo que diz
respeito à organização do trabalho e do emprego — existe alguma
coisa que não está bem, e isso precisamente nos pontos mais críticos
e mais importantes sob o aspecto social.
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