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19. Embora Jesus não seja recebido como Messias na sua terra de
Nazaré, todavia, ao iniciar a sua actividade pública, a sua
missão messiânica no Espírito Santo foi revelada ao Povo por
João Batista, filho de Zacarias e de Isabel. Ele anuncia, junto
do Jordão, a vinda do Messias e administra o baptismo de
penitência. Ele diz: «Eu baptizo-vos com água, mas vai chegar
quem é mais forte do que eu, a quem eu não sou digno nem sequer de
desatar as correias das sandálias: ele baptizar-vos-á com o
Espírito Santo e com o fogo»[65].
João Baptista anuncia o Messias — Cristo, não apenas como
Aquele que «vem» com o Espírito Santo, mas como Aquele que
também «é portador» do Espírito Santo, como seria melhor
revelado por Jesus no Cenáculo. João torna-se, quanto a isto, o
eco fiel das palavras de Isaías; palavras que, proferidas pelo
antigo Profeta, diziam respeito ao futuro, ao passo que no seu
ensino, nas margens do Jordão, constituem a introdução imediata à
nova realidade messiânica. João é não só profeta, mas também
mensageiro: é o precursor de Cristo. Aquilo que ele anuncia
realiza-se diante dos olhos de todos. Jesus de Nazaré vem ao
Jordão para receber, também ele, o baptismo de penitência. A
vista do recém-chegado, João proclama: «Aí está o Cordeiro de
Deus, que vai tirar o pecado do mundo»[66]. E diz isso por
inspiração do Espírito Santo[67] dando testemunho do
cumprimento da profecia de Isaías. Ao mesmo tempo confessa a fé na
missão redentora de Jesus de Nazaré. Nos lábios de João
Baptista as palavras «Cordeiro de Deus» encerram uma afirmação da
verdade quanto ao Redentor, não menos significativa que as palavras
usadas por Isaías: «Servo do Senhor».
Deste modo, com o testemunho de João junto do Jordão, Jesus de
Nazaré, rejeitado pelos próprios conterrâneos, é elevado aos
olhos de Israel como Messias, ou seja «Ungido» com o Espírito
Santo. E o testemunho de João Baptista é corroborado por um outro
testemunho de ordem superior, mencionado pelos três Evangelhos
Sinópticos. Com efeito, quando todo o povo tinha sido baptizado e
no momento em que Jesus, recebido o baptismo, estava em oração,
«abriu-se o céu e o Espírito Santo desceu sobre ele em forma
corporal, como uma pomba»[68]; e, simultaneamente, ouviou-se
uma voz vinda do céu que dizia: Este é o meu Filho muito amado, no
qual pus as minhas complacências»[69].
É uma teofania trinitária, que dá testemunho da exaltação de
Cristo, por ocasião do baptismo no Jordão. Ela não só confirma
o testemunho de João Baptista, mas revela uma dimensão ainda mais
profunda da verdade acerca de Jesus de Nazaré como Messias. Ou
seja: o Messias é o Filho muito amado do Pai. A sua exaltação
solene não se reduz à missão messiânica do «Servo do Senhor».
A luz da teofania do Jordão, esta exaltação alcança o mistério
da própria Pessoa do Messias. Ele é exaltado porque é o Filho da
complacência divina. A voz do Alto diz: «o meu Filho».
20. A teofania do Jordão ilumina somente de modo fugaz o mistério
de Jesus de Nazaré, cuja actividade será toda ela desenvolvida com
a presença do Espírito Santo[70]. Este mistério viria a ser
gradualmente desvendado e confirmado por Jesus, mediante tudo o que
«fez e ensinou»[71]. Atendo-nos à linha deste ensino e dos
sinais messiânicos realizados pelo mesmo Jesus, antes do discurso de
despedida no Cenáculo, encontramos acontecimentos e palavras que
constituem momentos particularmente importantes dessa revelação
progressiva. Assim o evangelista São Lucas, que já tinha
apresentado Jesus «cheio de Espírito Santo» e «conduzido pelo
Espírito ao deserto»[72]. faz-nos cientes de que, após o
regresso dos setenta e dois discípulos da missão que lhes fora
confiada pelo Mestre[73], enquanto eles cheios de alegria lhe
relatavam os frutos do seu trabalho, nesse mesmo «momento Jesus
exultou de alegria sob a acção do Espírito Santo e disse: «Eu te
dou graças, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondeste
estas coisas aos sábios e aos inteligentes e as revelaste aos
pequeninos. Sim, ó Pai, porque isto foi do Teu
agrado»[74]. Jesus exulta pela paternidade divina: exulta
porque lhe foi dado revelar esta paternidade; exulta, por fim, por
uma como que irradiação e special da me sma paternidade divina sobre
os «pequeninos». E o Evangelista qualifica tudo isto como uma
«exultação no Espírito Santo».
Esta «exultação» impele Jesus, em certo sentido, a dizer ainda
algo mais. Ouçamos: «Todas as coisas me foram entregues por meu
Pai e ninguém conhece quem é o Filho senão o Pai, nem quem é o
Pai senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser
revelar»[75].
21. Aquilo que durante a teofania do Jordão veio, por assim
dizer, «do exterior», do Alto, aqui provém «do interior», isto
é, do mais íntimo do ser que é Jesus. É uma outra revelação do
Pai e do Filho, unidos no Espírito Santo. Jesus fala só da
paternidade de Deus e da própria filiação; não fala directamente
do Espírito que é Amor e, por isso, união do Pai e do Filho.
Não obstante, aquilo que ele diz do Pai e de Si-Filho brota
daquela plenitude do Espírito que está nele mesmo e se derrama no seu
coração, impregna o seu próprio «Eu», inspira e vivifica, a
partir da profundeza do que Ele é, a sua acção. Daqui esse seu
«exultar no Espírito Santo». A união de Cristo com o Espírito
Santo, da qual Ele tem uma consciência perfeita, exprime-se nessa
«exultação», que torna «perceptível», de certa maneira, a sua
fonte recôndita. Dá-se assim uma especial manifestação e
exaltação próprias do Filho do Homem, de Cristo-Messias, cuja
humanidade pertence à Pessoa do Filho de Deus, substancialmente uno
com o Espírito Santo na divindade.
Na magnífica confissão da paternidade de Deus, Jesus de Nazaré
manifesta-se também a si mesmo, o seu «Eu» divino: Ele é
efectivamente, o Filho «da mesma substância» (consubstancial);
e, por isso, «ninguém conhece quem é o Filho senão o Pai, nem
quem é o Pai senão o Filho, aquele Filho que «por nós, homens,
e para nossa salvação» se fez homem, «por obra do Espírito
Santo» e nasceu de uma virgem, cujo nome era Maria.
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