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Por tal razão, exactamente, a consciência da Igreja há-de andar
unida com uma abertura universal, a fim de que todos possam nela
encontrar «as imperscrutáveis riquezas de Cristo», das quais fala o
Apóstolo das gentes. Uma tal abertura, organicamente conjunta com a
consciência da própria natureza, com a certeza da própria verdade,
da qual o mesmo Cristo disse «não é minha, mas do Pai que me
enviou», determina o dinamismo apostólico, que o mesmo é dizer
missionário, da Igreja, professando e proclamando integralmente toda
a verdade transmitida por Cristo. E simultaneamente ela, a Igreja,
deve conduzir aquele diálogo que Paulo VI na sua Encíclica
Ecclesiam Suam chamou «diálogo da salvação», diferenciando com
precisão cada um dos círculos no âmbito dos quais ele deveria ser
conduzido.
Quando assim me refiro hoje a este documento programático do
Pontificado de Paulo VI, não cesso de dar graças a Deus, pelo
facto de este meu grande Predecessor e ao mesmo tempo verdadeiro pai
ter sabido — não obstante as diversas fraquezas internas, por que foi
afectada a Igreja no período posconciliar — patentear «ad extra» ,
«para o exterior», o seu autêntico rosto. De tal maneira, também
grande parte da família humana, nas diversas esferas da sua multiforme
existência, se tornou — na minha opinião — mais consciente do facto
de lhe ser necessária verdadeiramente a Igreja de Cristo, a sua
missão e o seu serviço. E esta consciência algumas vezes
demonstrou-se mais forte do que as diversas atitudes críticas, que
atacavam «ab intra», vindas «de dentro», a mesma Igreja, as suas
instituições e estruturas, e os homens da Igreja e as suas
actividades.
Um tal crítica crescente teve sem dúvida diversas causas e, por
outro lado, estamos certos de que ela não foi sempre destituída de um
sincero amor à Igreja. Manifestou-se nela, indubitavelmente,
entre outras coisas, a tendência para superar o chamado triunfalismo,
de que se discutia com frequência durante o Concílio. No entanto,
se é uma coisa acertada que a Igreja, seguindo o exemplo do seu
Mestre que era «humilde de coração», esteja bem assente também
ela na humildade, que possua o sentido crítico a respeito de tudo
aquilo que constitui o seu carácter e a sua actividade humana e que
seja sempre muito exigente para consigo própria, é óbvio igualmente
que também a crítica deve ter os seus justos limites. Caso
contrário, ela deixa de ser construtiva, não revela a verdade, o
amor e a gratidão pela graça, da qual principal e plenamente nos
tornamos participantes exactamente na Igreja e mediante a Igreja.
Além disto, o espírito crítico não exprime a atitude de serviço,
mas antes a vontade de orientar a opinião de outrem segundo a própria
opinião, algumas vezes divulgada de maneira assaz imprudente.
Deve-se gratidão a Paulo VI ainda, porque, respeitando toda e
qualquer parcela de verdade contida nas várias opiniões humanas, ele
conservou ao mesmo tempo o equilibrio providencial do timoneiro da
Barca. A Igreja que — através de João Paulo I — quase
imediatamente depois dele me foi confiada, não se acha certamente
isenta de dificuldades e de tensões internas. Entretanto, ela
encontra-se interiormente mais premunida contra os excessos do
autocriticismo; poder-se-ia dizer, talvez, que ela é mais crítica
diante das diversas críticas imprudentes, e está mais resistente no
que respeita às várias «novidades», mais maturada no espírito de
discernimento e mais idónea para tirar do seu perene tesouro «coisas
novas e coisas velhas», mais centrada no próprio mistério e,
graças a tudo isto, mais disponível para a missão da salvação de
todos: «Deus quer que todos os homens se salvem e cheguem ao
conhecimento da verdade».
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