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8. É característica do texto joanino que o Pai, o Filho e o
Espírito Santo sejam nomeados claramente como Pessoas, a primeira
distinta da segunda e da terceira e estas também distintas entre si.
Jesus fala do Espírito Consolador, usando por mais de uma vez o
pronome pessoal «Ele». E, ao mesmo tempo, em todo o discurso de
despedida, torna manifestos aqueles vínculos que unem reciprocamente o
Pai, o Filho e o Paráclito. Assim, «o Espírito ... procede
do Pai»[28] e o Pai «dá» o Espírito[29]. O Pai
«envia» o Espírito em nome do Filho[30], o Espírito «dá
testemunho» do Filho[31]. O Filho pede ao Pai que envie o
Espírito Consolador[32]; mas, além disso, afirma e
promete, em relação com a sua «partida» mediante a Cruz:
«Quando eu fôr, vo-lo enviarei»[33]. Portanto, o Pai
envia o Espírito Santo com o poder da sua paternidade, como enviou o
Filho[34]; mas, ao mesmo tempo, envia-o, com o poder da
Redenção realizada por Cristo — e neste sentido o Espírito Santo
é enviado também pelo Filho: «enviar-vo-lo-ei».
Aqui neste ponto, é preciso notar que, se todas as outras promessas
feitas no Cenáculo anunciavam a vinda do Espírito Santo para depois
da partida de Cristo, a que é referida por São João no capítulo
16 vv. 7-8 inclui e acentua claramente a relação de
interdependência, que se poderia dizer causal, entre as
manifestações de um e de outro: «Quando eu fôr,
enviar-vo-lo-ei». O Espírito Santo virá na condição de
Cristo partir, mediante a Cruz: virá não só em seguida, mas por
causa da Redenção realizada por Cristo, por vontade e obra do
Pai.
9. Assim no discurso da Ceia pascal de despedida, atinge-se — por
assim dizer — o ápice da revelação trinitária. Ao mesmo tempo,
encontramo-nos no limiar de eventos definitivos e de palavras
supremas, que por fim se traduzirão no grande mandato missionário,
dirigido aos Apóstolos e, mediante eles, à Igreja: «ide,
portanto, e ensinai todas as gentes», mandato que contém, em certo
sentido, a fórmula trinitária do Baptismo: «baptizando-as em nome
do Pai e do Filho e do Espírito Santo»[35]. A fórmula
reflecte o mistério íntimo de Deus, da vida divina, que é o Pai,
o Filho e o Espírito Santo, divina unidade da Trindade. O
discurso de despedida pode ser lido como uma preparação especial para
esta fórmula trinitária, na qual se exprime o poder vivificante do
Sacramento, que opera a participação na vida de Deus uno e trino,
porque confere a graça santificante ao homem, como dom sobrenatural.
Por meio dela o homem é chamado e «tornado capaz» de participar na
imperscrutável vida de Deus.
10. Na sua vida íntima Deus «é Amor»[36], amor
essencial, comum às três Pessoas divinas: amor pessoal é o
Espírito Santo, como Espírito do Pai e do Filho. Por isso ele
«perscruta as profundezas de Deus»[37], como Amor-Dom
incriado. Pode dizer-se que, no Espírito Santo, a vida íntima
de Deus uno e trino se torna totalmente dom, permuta de amor
recíproco entre as Pessoas divinas; e ainda, que no Espírito
Santo Deus «existe» à maneira de Dom. O Espírito Santo é a
expressão pessoal desse doar-se, desse ser-amor[38]. É
Pessoa-Amor. É Pessoa-Dom. Temos aqui uma riqueza insondável
da realidade e um aprofundamento inefável do conceito de pessoa em
Deus, que só a Revelação divina nos dá a conhecer.
Ao mesmo tempo, o Espírito Santo, enquanto consubstancial ao Pai
e ao Filho na divindade, é Amor e Dom (incriado) do qual deriva
como de uma fonte (fons vívus) toda a dádiva em relação às
criaturas (dom criado): a doação da existência a todas as coisas,
mediante a criação; e a doação da graça aos homens, mediante toda
a economia da salvação. Como escreve o Apóstolo São Paulo:
«O amor de Deus foi derramado nos nossos corações por meio do
Espírito Santo, que nos foi dado»[39].
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