|
Confirmada deste modo a dimensão pessoal do trabalho humano, deve-se
passar depois para a segunda esfera de valores, que com ele anda
necessariamente unida. O trabalho constitui o fundamento sobre o qual
se edifica a vida familiar, que é um direito fundamental e uma
vocação do homem. Estas duas esferas de valores — uma conjunta ao
trabalho e a outra derivante do carácter familiar da vida humana —
devem unir-se entre si e compenetrar-se de um modo correcto. O
trabalho, de alguma maneira, é a condição que torna possível a
fundação de uma família, uma vez que a família exige os meios de
subsistência que o homem obtém normalmente mediante o trabalho.
Assim, trabalho e laboriosidade condicionam também o processar-se da
educação na família, precisamente pela razão de que cada um «se
torna homem» mediante o trabalho, entre outras coisas, e que o facto
de se tornar homem exprime exactamente a finalidade principal de todo o
processo educativo. Como é evidente, entram aqui em jogo, num certo
sentido, dois aspectos do trabalho: o que faz dele algo que permite a
vida e a manutenção da família, e aquele outro mediante o qual se
realizam as finalidades da mesma família, especialmente a educação.
Não obstante a distinção, estes dois aspectos do trabalho estão
ligados entre si e completam-se em vários pontos.
Deve-se recordar e afirmar que, numa visão global, a família
constitui um dos mais importantes termos de referência, segundo os
quais tem de ser formada a ordem sócio-ética do trabalho humano. A
doutrina da Igreja dedicou sempre especial atenção a este problema e
será necessário voltar ainda a ele no presente documento. Com
efeito, a família é, ao mesmo tempo, uma comunidade tornada
possível pelo trabalho e a primeira escola interna de trabalho para
todos e cada um dos homens.
A terceira esfera de valores que se apresenta, na perspectiva aqui
mantida — a perspectiva do sujeito do trabalho — abarca aquela grande
sociedade de que o homem faz parte, em virtude de laços culturais e
históricos particulares. Tal sociedade — mesmo quando não tenha
ainda assumido a forma completa de uma nação — é não só a grande
«educadora» de cada um dos homens, se bem que indirectamente (pois
cada pessoa recebe na família os conteúdos e os valores que
constituem, no seu conjunto, a cultura de uma determinada nação),
mas é também uma grande encarnação histórica e social do trabalho
de todas as gerações. Tudo isto faz com que o homem ligue a sua
identidade humana mais profunda ao facto de pertencer a uma nação, e
encare o seu trabalho também como algo que irá aumentar o bem comum
procurado juntamente com os seus compatriotas, dando-se conta assim de
que, por este meio, o trabalho serve para multiplicar o património da
inteira família humana, de todos os homens que vivem no mundo.
Estas três esferas conservam de modo permanente a sua importância
para o trabalho humano visto na sua dimensão subjectiva. E esta
dimensão, ou seja, a concreta realidade do homem do trabalho, tem
precedência sobre a dimensão objectiva. Na dimensão subjectiva é
que se realiza, antes de mais nada, aquele «domínio» sobre o mundo
da natureza, que o homem é sempre chamado a exercer, desde o
princípio, segundo as palavras do Livro do Génesis. O próprio
processo de «submeter a terra», quer dizer, o trabalho sob o aspecto
da técnica, é caracterizado no decorrer da história, e
especialmente nestes últimos séculos, por um imenso desenvolvimento
dos meios produtivos à disposição; e isso é um fenómeno vantajoso
e positivo, contanto que a dimensão objectiva do trabalho não tome o
predomínio sobre a dimensão subjectiva, tirando ao homem ou
diminuindo a sua dignidade e os seus direitos inalienáveis.
|
|