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5. Remontando às origens da Igreja, aparece clara a
afirmação de que Cristo é o único salvador de todos,
o único capaz de revelar e de conduzir a Deus. As
autoridades religiosas judaicas, que interrogam os
Apóstolos sobre a cura do aleijado, realizada por
Pedro, este responde: «É em nome de Jesus
Nazareno, que vós crucificastes e Deus ressuscitou dos
mortos, é por Ele que este homem se apresenta curado
diante de vós (... ) E não há salvação em nenhum
outro, pois não há debaixo do céu qualquer outro nome
dado aos homens que nos possa salvar» (At 4,
10.12). Esta afirmação, dirigida ao Sinédrio,
tem um valor universal, já que, para todos — judeus e
gentios —, a salvação só pode vir de Jesus Cristo.
A universalidade desta salvação em Cristo é afirmada
em todo o Novo Testamento. S. Paulo reconhece, em
Cristo ressuscitado, o Senhor:
«Porque, ainda que haja alguns que são chamados
deuses, quer no céu quer na terra, existindo assim
muitos deuses e muitos senhores, para nós há apenas um
único Deus, o Pai de Quem tudo procede e para Quem
nós existimos; e um único Senhor, Jesus Cristo, por
meio do Qual todas as coisas existem, e igualmente nós
existimos também» (1 Cor 8, 5-6). O único
Deus e o único Senhor são afirmados em contraste com a
multidão de «deuses» e de «senhores» que o povo
admitia. Paulo reage contra o politeismo do ambiente
religioso do seu tempo, pondo em relevo a característica
da fé cristã: crença num só Deus e num só Senhor,
por Aquele enviado.
No Evangelho de S. João, esta universalidade
salvífica de Cristo compreende os aspectos da Sua
missão de graça, de verdade e de revelação: «o
Verbo é a Luz verdadeira que a todo o homem ilumina»
(Jo 1, 9). E ainda: «ninguém jamais viu Deus:
o Filho único, que está no seio do Pai, é que O deu
a conhocer» (Jo 1, 18; cf. Mt 11, 27). A
revelação de Deus tornou-se definitiva e completa, na
obra do Seu Filho Unigénito: «Tendo Deus falado
outrora aos nossos pais, muitas vezes e de muitas
maneiras, pelos profetas, agora falou-nos, nestes
últimos tempos, pelo Filho, a Quem constituiu herdeiro
de tudo, e por Quem igualmente criou o mundo» (Heb
1, 1-2; cf. Jo 14, 6). Nesta Palavra
definitiva da Sua revelação, Deus deu-se a conhecer
do modo mais pleno: Ele disse à humanidade Quem é. E
esta auto-revelação definitiva de Deus é o motivo
fundamental pelo qual a Igreja é, por sua natureza,
missionária. Não pode deixar de proclamar o
Evangelho, ou seja, a plenitude da verdade que Deus nos
deu a conhecer de Si mesmo.
Cristo é o único mediador entre Deus e os homens:
«há um só Deus e um só mediador entre Deus e os
homens, Jesus Cristo Homem, que se deu em resgate por
todos. Tal é o testemunho que foi dado no tempo devido,
e do qual eu fui con stit uido p reg ador, ap óstolo e
mestre dos gentios na fé e na verdade. Digo a verdade,
não minto» (1 Tim 2, 5-7; cf. Heb 4,
14-16). Os homens, portanto, só poderão entrar
em comunhão com Deus através de Cristo, e sob a
acção do Espírito. Esta Sua mediação única e
universal, longe de ser obstáculo no caminho para Deus,
é a via estabelecida pelo próprio Deus, e disso,
Cristo tem plena consciência. Se não se excluem
mediações participadas de diverso tipo e ordem, todavia
elas recebem significado e valor unicamente da de Cristo,
e não podem ser entendidas como paralelas ou
complementares desta.
6. É contrário à fé cristã introduzir qualquer
separação entre o Verbo divino e Jesus Cristo. S.
João afirma claramente que o Verbo, que «no
princípio estava com Deus», é o mesmo que «se fez
carne» (Jo 1, 2. 14). Jesus é o Verbo
encarnado, pessoa una e indivisa: não se pode separar
Jesus, de Cristo, nem falar de um «Jesus da história»
que seria diferente do «Cristo da fé». A Igreja
conhece e confessa Jesus como «Cristo, o Filho de
Deus vivo» (Mt 16, 16): Cristo não é
diferente de Jesus de Nazaré; e este é o Verbo de
Deus feito homem, para a salvação de todos. Em
Cristo, «habita corporalmente toda a plenitude da
divindade» (Col 2, 9) e «da Sua plenitude todos
nós recebemos» (Jo 1, 16). O «Filho
Unigénito, que está no seio do Pai» (Jo 1,
18), é «o Filho muito amado, no qual temos a
redenção e a remissão dos pecados (...) Aprouve a
Deus que n'Ele residisse toda a plenitude, e por Ele
fossem reconciliadas Consigo todas as coisas,
pacificando, pelo sangue da sua cruz, tanto as criaturas
da terra como as do céu» (Col 1, 13-14.
19-20). Precisamente esta singularidade única de
Cristo é que Lhe confere um significado absoluto e
universal, pelo qual, enquanto está na História, é o
centro e o fim desta mesma História:[7] «Eu sou o
Alfa e o Ómega, o Primeiro e o Ultimo, o Princípio
e o Fim» (Ap 22, 13).
Se é lícito e útil, portanto, considerar o mistério
de Cristo sob os seus vários aspectos, nunca se deve
perder de vista a Sua unidade. À medida que formos
descobrindo e valorizando os diversos tipos de dons, e
sobretudo as riquezas espirituais, que Deus distribuiu a
cada povo, não podemos separá-los de Jesus Cristo, o
Qual está no centro da economia salvadora. De facto,
como «pela encarnação, o Filho de Deus se uniu de
alguma forma a todo o homem», assim «devemos acreditar
que o Espírito Santo oferece a todos, de um modo que
só Deus conhece, a possibilidade de serem associados ao
mistério pascal»,[8] 0 plano divino é «recapitular
em Cristo todas as coisas que há no céu e na terra»
(Ef 1, 10).
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