2.2. A Questão Filosófica como "Quaestio Disputata"

Pieper está convencido, é aliás um tema de extraordinária importância em sua filosofia (e a ele ainda voltaremos), de que a Filosofia está dotada de uma "estrututura de esperança", isto é, jamais se poderá dar resposta cabal a uma indagação filosófica; que é, portanto, um assunto coletivo, a ser tratado em forma de diálogo ou discussão[62]. "E, precisamente por isso, (...um tema filosófico) há de ser examinado, desde o começo, como Quaestio Disputata, isto é, de modo tal, que a cada momento sinta-se a presença dos que pensam de outra maneira"[63].

O que afirmamos acima sobre o diálogo e a impossibilidade de dar resposta cabal, de esgotar um assunto filosófico não significa, evidentemente, que na quaestio disputata não se deva tomar uma posição e defendê-la: não se trata, de modo algum, de agnosticismo. Podemos conhecer a verdade, mas não podemos esgotá-la. E, já que o homem pode conhecer a verdade (e na medida em que o pode fazer) a discussão filosófica chega a uma determinatio, a uma conclusão.

Pieper considera tão importante o tema da quaestio disputata que chega a afirmar que nele se condensa e se põe em evidência o que há de paradigmático em S. Tomás[64].

Em seu ciclo de doze conferências, originalmente intitulado Introdução a S. Tomás de Aquino - onde explicitamente pretende mostrar em que e por que S. Tomás é o doutor universal da Cristandade[65] - dedica toda uma conferência - a sétima - exclusivamente ao espírito da quaestio disputata, princípio de renovação da Universidade de hoje[66].

Dentre as características da quaestio disputata de S. Tomás de Aquino (e que se torna em Pieper uma das constantes de seus livros), destacamos a de dar voz ao adversário com toda a honestidade, formulando sem distorções, exageros ou ironia (o que, em geral, nem sempre ocorre nas polêmicas e debates de hoje), as posições contrárias às que se defendem.

E - nessa sétima conferência - registra que em S. Tomás a objetividade chega a tal ponto que o leitor menos avisado pode tomar como do Aquinate aquilo que ele recolhe dos adversários a modo de objeção. A propósito, em outra obra[67] lembra o triste exemplo do tão celebrado Carl Prantl, que interpretou como se fosse a posição de S. Tomás objeções brilhantemente por ele apresentadas às suas próprias teses.

Torna-se dispensado dizer que, tal como S. Tomás[68], Pieper não entende por quaestio disputata nada que tenha a ver com sutilezas enfadonhas e estéreis[69].