3.4. Nota sobre Festa, Amor e Arte

Para ajudar a compor o quadro da mundividência de Pieper, parece-nos oportuna esta breve nota sobre festa, amor e arte; na qual seguiremos o caminho do discurso Die musischen Künste und das Fest.

Como em outras ocasiões, propõe à consideracão a trágica pergunta do penetrante verso de Hölderlin: "Wozu Dichter in dürftiger Zeit? - Para que poetas em tempos de penúria?"[175]

Após esclarecer que a pergunta se refere a todas as artes (e não só à poesia) e que, na realidade, não se trata de uma autêntica pergunta mas de uma afirmação, Pieper assente às intuições expressas no poema:

Qualquer que seja a interpretação concreta que se dê, o sentido das estrofes (de Brot und Wein) é muito claro: a pobreza existencial do homem consiste na incapacidade de celebrar festivamente uma festa[176].

Mas a incapacidade para a festa é ainda algo de provisório:

Se analisarmos com precisão, Hölderlin diz algo ainda mais radical: ele fala de louvor de culto, de louvor a Deus, que é a forma extrema que existe de aprovação da realidade[177].

E só aí atinge-se a raiz não só do festejar como também da lamentada penúria dos tempos. A quem objetasse que é abusivo lançar mão da Teologia - a exigência de dizer "Sim e Amém" ao mundo e à totalidade da existência - para a compreensão de algo tão simples como uma festa, Pieper responde com uma pergunta: Poderia celebrar mesmo uma simples festa de aniversário quem estivesse seriamente convencido, com Jean-Paul Sartre, de que é absurdo que tenhamos nascido, absurdo que existamos?[178]

Toda verdadeira festa vive da afirmação, da aprovação, ou, o que é o mesmo (e com isso alcançamos um dos pontos mais reiterados por Pieper), do amor.

Pois amor, em todas as suas formas, significa precisamente afirmar e aprovar, por-se diante do que é amado e dizer: "Que bom que existes!"[179]

A fronteira da Teologia nunca está longe, especialmente no que se refere a esses temas: é uma velha verdade teológica que a Criação é obra de toda a Trindade. Do poder do Pai, sim, mas pela Inteligência do Verbo e pelo Espírito de amor que, já no início dos tempos, profere a sentença criadora: "É bom que existas!"[180]

Se não há amor, se não há essa sintonia de aprovação ao mundo, não só não há festa como também não há arte. As musas são companheiras de festa e a festa, um dom da divindade aos homens[181]. Pieper - parafraseando Hölderlin - ajunta: "Para que companheiras de festa se não há festa?"[182]

E em Zustimmung zur Welt: "É claro que o invisível da festa - o louvor de culto que brota do mais íntimo - só pode adquirir forma concreta no âmbito das artes e de nenhum outro modo"[183].