|
Ao conhecimento intelectual, corresponde um apetite intelectual
também, isto é, uma tendência para o fim proposto como tal pela
inteligência.
Todo o ser é activo e tende para um fim. Se não conhece esse fim,
procura-o naturalmente, sem necessidade, como já disse, para esse
efeito, de existir nele alguma faculdade especial. Se conhece o fim
próximo da sua ação, mas não o escolhe, se o fim lhe é dado do
exterior, necessita duma faculdade que, a esse conhecimento do fim,
responda com um impulso activo: é o apetite sensível. Se é o
próprio ser que escolhe o seu fim próximo, porque sabe raciocinar e
pesar os prós e os contras dos vários caminhos possíveis, precisa
duma faculdade capaz de o impelir para o fim que escolheu: a vontade.
A vontade é por isso a contrapartida, no terreno da atividade, da
inteligência. Todo o ser intelectual é dotado de vontade, sob pena
de imperfeição, de impotência para procurar o fim conhecido e
escolhido. E, no homem, a observação confirma a existência dum
principio de ação que quer o que a inteligência lhe mostra ser
desejável; é a vontade intelectual, a vontade propriamente dita.
A vontade, portanto, procura atingir o fim; mas não delibera sobre
ele. Não raciocina; é um erro supô-la a raciocinar, ou a
inteligência a querer. Pensar assim é olhar a inteligência e a
vontade como dois seres distintos, e não como o que realmente são;
duas potências distintas dum mesmo ser, o homem, que pensa e age. A
vontade quer o que a inteligência escolhe, e fá-lo executar.
Acrescente-se que, assim como a inteligência não recebe as idéias
senão por intermédio dos sentidos, a vontade não move o nosso
organismo senão por intermédio do apetite sensível. A execução do
que ela determina é condicionada pela sensibilidade. E, como diz
Aristóteles [82], o poder da vontade sobre a sensibilidade não é
despótico, mas político. É agindo inteligentemente sobre as suas
faculdades animais, disciplinando-as, educando-as, que o homem pode
dominar o seu corpo e elevar a sua vida ao nível da sua humanidade.
|
|