10. A inteligência.

Todas as faculdades de que falei até aqui, o crescimento, a nutrição e a reprodução, o conhecimento e o apetite sensíveis, estão estreitamente dependentes da matéria e se exercem por meio do corpo. O homem tem também uma atividade intelectual, independente da matéria, operação duma faculdade, a inteligência, que tem por sujeito unicamente a alma.

Os sentidos dão-nos das coisas conhecimento individual, concreto; a inteligência conhece o universal que nelas se concretiza. A sensibilidade conhece a existência, de maneira espontânea, sem consciência do que é existir; á inteligência estuda a essência, e, reflectindo sobre a sensibilidade, atinge a compreensão do que a existência significa. A inteligência é por isso, das faculdades humanas, a mais elevada em categoria. Torna o homem capaz de conhecimento no seu mais alto grau; faz da alma humana um microcosmos, segundo a expressão de Aristóteles, um pequeno resumo do grande Universo. Eleva o homem acima de si mesmo; habilita-o a julgar-se como parte de um todo, de que compreende a harmonia. Dá-lhe um caráter único, e o primeiro lugar, entre os seres dotados de corpo material. Faz dele um ser racional, o ponto de contacto do mundo dos corpos e do dos espíritos, o intérprete e a imagem, de certo modo espiritualizada, do primeiro.

Na próxima lição trataremos, em especial, da inteligência e da sua operação. Basta aqui lembrar que, na sua atividade normal, tal como a exerce a alma unida ao corpo, a inteligência depende da sensibilidade para a elaboração das idéias. É nas imagens formadas pelas faculdades sensíveis que a inteligência procura os elementos do conhecimento; o seu raciocínio é acompanhado dum constante movimentar de imagens, que servem como que de suporte às idéias de chie se ocupa. Mas a operação da sensibilidade, embora acompanhe a da inteligência, mantém-se sempre num plano inferior ao desta. Na imagem sensível, que inevitavelmente apresenta os caracteres dum ser concreto, embora diluídos e vagos, a inteligência vê a idéia geral. É inteligência dum ser composto de alma e corpo, e tem, na atividade de corpo, um auxiliar. Mas o seu mundo é o do inteligível, e, sem o corpo, nem por isso deixará de aderir ao inteligível, com que então ficará em contacto imediato.