B. A Crítica.


7. A tendência crítica.

Nota-se na filosofia moderna, uma tendência constante para criticar os primeiros princípios. Desde Descartes, todos os filósofos têm tido, mais ou menos, a preocupação da crítica. Esta é feita, quase sempre, com o estudo do processo de conhecimento; por isso lhe chamam, em geral, a critica do conhecimento. E toma a feição de critica prévia, trabalho preliminar a qualquer outro trabalho filosófico.

Duvidar dos princípios não é coisa nova. Já Pírron e os seus discípulos, na antiga Grécia, os punham em dúvida. Pretendiam assim extrair a certeza de todas as conclusões, que se fundam nos princípios; e calam no ceticismo absoluto.

É uma atitude possível, se bem que arbitrária; e os que a adotam não podem ser convencidos pela discussão. Com efeito, em que se haviam de basear os argumentos que os convencessem, se eles começam por não aceitar os primeiros princípios? S. Tomás nota expressamente: "Quem erra acerca dos primeiros princípios não pode ser persuadido; mas quem erra, respeitando os princípios, pode corrigir-se por esses mesmos princípios" [30]. Mas tal dúvida, para ser coerente, tem de ser puramente negativa. Quem a escolhe não pode afirmar nada, nem que nega, nem que duvida. Numa palavra, não pode raciocinar. Segundo a expressão forte de Aristóteles, quem toma essa atitude fica reduzido ao estado de vegetal [31]; porque o próprio animal funda a sua atividade no conhecimento sensível de que é dotado, e que, instintivamente, aceita como verdadeiro.

No entanto, os filósofos modernos, que duvidam dos princípios, pretendem edificar; querem conclusões certas, depois de terem minado a base de toda a certeza. Com persistência digna da melhor aplicação, têm procurado, por todos os meios, de todas as maneiras, esta coisa paradoxal: atingir, no fim dos seus esforços, o que começaram por afastar no princípio.

Seja como for, a tendência crítica é um fato; e como tal merece ser estudada e criticada por sua vez.