18. A inteligência dos Anjos.

Os mesmos motivos que nos levaram a atribuir a Deus a vida, a inteligência e a vontade, levam-nos a dizer que os Anjos são vivos, inteligentes e livres; não em grau eminente, como Deus, mas em grau superior àquele em que nós o somos.

Os Anjos são inteligências, e a sua vida consiste em conhecer. Vejamos, no entanto, que espécie de conhecimento pode ser o seu. Em Deus, a existência identifica-se com a essência, e a inteligência com o seu objeto. Nos Anjos, à distinção entre a existência e a essência corresponde uma distinção entre a inteligência e o seu objeto. Não existindo por essência, são causados; e, como é causado o seu ser, pode ser causado o seu conhecimento. Este não tem, necessariamente, de se ter a si mesmo por objeto, o que, num Anjo, seria conhecer-se só a si mesmo, visto que não é, como Deus, causa do ser das outras coisas.

Os Anjos, portanto, além de si mesmos, conhecem espécies distintas de si (para dar ao meio de conhecimento o nome habitual na Escola). Mas não podem, como os homens, extrair essas espécies das coisas sensíveis. A origem das nossas idéias está nas coisas materiais, a nossa própria essência só se pode realizar na matéria. Mas os Anjos são imateriais; não dependem da matéria para existir; da mesma forma, não dependem dela para conhecer. De resto, sem corpo, não têm órgãos que lhes permitam tomar contacto com os corpos materiais, nem portanto qualquer meio de comunicação com eles.

De acordo com a sua natureza espiritual, os Anjos devem receber as suas idéias do Mundo espiritual, por uma iluminação interior, vinda diretamente de Deus ou doutro Anjo de categoria mais elevada. E, visto que são simples, devem conhecer de maneira simples; não como nós, que retrogradamos do particular para o geral, mas nas próprias leis gerais conhecidas intuitivamente.

Como se vê, o conhecimento por idéias inatas, que Descartes, depois de Platão e S. Agostinho, atribuía ao homem, reserva-o S. Tomás para a inteligência angélica. De resto, os três filósofos citados são coerentes nesse ponto; todos tendem a ver no homem um puro espírito, associado a um corpo material por acidente, ou quase. O homem, para eles, é como que um ser híbrido, em parte anjo, em parte animal. S. Tomás, com Aristóteles, faz uma idéia mais justa da unidade da nossa natureza.