7. Considerações gerais sobre o conhecimento sensível.

Com os sentidos externos e os quatro sentidos internos, ice estudada a parte cognitiva da sensibilidade, naquilo que interessa à teoria do conhecimento. Por seu meio, conseguimos um conhecimento sensível do objeto, isto é, o conhecimento da sua existência, da sua localização, das suas dimensões, de muitas das suas qualidades, das suas relações com os outros objetos concretos. O conhecimento realiza-se pela formação de uma imagem, que apresenta as propriedades do objeto na medida em que nos são acessíveis, e o representa no nosso espirito; imagem que a imaginação conserva, e a memória pode fazer reviver.

Mas não nos iludamos. O que conhecemos é o objeto, não a imagem ou as sensações de que ela nasce. A sensação é o meio pelo qual o conhecimento do objeto chega à nossa consciência sensível. Sentidos, senso comum, imaginação, todas as faculdades sensíveis, pertencem ao homem; são interiores ao homem. O homem, em conjunto, a pessoa, o todo, conhece os objetos. O resto é análise do que se passa nele, quando conhece. Se não fosse o objeto exterior a nós, nem sequer saberíamos que temos uma sensibilidade externa. Primeiro conhecemos o objeto que sentimos; só depois é que conhecemos a sensação. Conhecemos a sensibilidade reflectindo sobre o seu ato; é preciso, antes de mais nada, que esse ato exista, e portanto, que exista o objeto. É isto o que observamos; qualquer hipótese contrária é puramente gratuita.

Não há diferença essencial entre o conhecimento sensível do homem e o dos animais, embora, como é natural, o fato da alma sensível do homem não ser autônoma, mas parte dum todo coroado pela inteligência, traga consigo diferenças no seu modo de operar. Num caso e noutro, é conhecimento do ser individualizado, tal como existe na matéria. Os sentidos revelam-nos um objeto concreto; o senso comum forma dele uma imagem que o reproduz, imagem que, à sua maneira, tem todos os caracteres do ser concreto. A imaginação conserva essa imagem, ou, na atividade criadora, gera outras, mais ou menos imprecisas, de seres possíveis, concretos também, ou do seres fantásticos, mas que se lhe apresentam como possíveis, e concretos. A razão particular, instintiva ou reflectida mente, liga o objeto com outros objetos, por meio de casos particulares de relações gerais, mas que não conhece na sua generalidade A memória desperta o passado concreto, com as particularidades que individualizam o momento em que ele foi vivido. Em toda esta atividade sensível, não há nada que, pela sua generalidade, exceda o modo por que a forma existe na matéria. A imagem pode ser vaga; não pode ser geral.

Por isso mesmo, no homem como nos animais, a sensibilidade não exige uma faculdade imaterial. As faculdades sensíveis são orgânicas, do composto, do corpo animado. Conhecer, é identificar-se o sujeito como o objeto. No conhecimento sensível, o homem, por uma faculdade que é da alma e do corpo, identifica-se intencionalmente com o objeto, forma e matéria. Tudo se passa no plano da matéria. A matéria do corpo, que, pela alma, constitui um homem, recebe, como forma intencional, a do objeto conhecido pelos sentidos. Porque a imagem sensível é ato duma faculdade orgânica, essa forma existe na matéria em ambos os casos, embora de modo diferente; em ambos, é individual, particular, limitada. O conhecimento sensível é marcado pela passividade da matéria, por isso os escolásticos davam à sensibilidade cognitiva o nome de intelecto passivo. Se, por ele, o homem, como os animais, trasborda dos limites do seu corpo, não excede o mundo dos corpos, o mundo material.