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Todas as faculdades de que falei até aqui, o crescimento, a
nutrição e a reprodução, o conhecimento e o apetite sensíveis,
estão estreitamente dependentes da matéria e se exercem por meio do
corpo. O homem tem também uma atividade intelectual, independente da
matéria, operação duma faculdade, a inteligência, que tem por
sujeito unicamente a alma.
Os sentidos dão-nos das coisas conhecimento individual, concreto; a
inteligência conhece o universal que nelas se concretiza. A
sensibilidade conhece a existência, de maneira espontânea, sem
consciência do que é existir; á inteligência estuda a essência,
e, reflectindo sobre a sensibilidade, atinge a compreensão do que a
existência significa. A inteligência é por isso, das faculdades
humanas, a mais elevada em categoria. Torna o homem capaz de
conhecimento no seu mais alto grau; faz da alma humana um microcosmos,
segundo a expressão de Aristóteles, um pequeno resumo do grande
Universo. Eleva o homem acima de si mesmo; habilita-o a julgar-se
como parte de um todo, de que compreende a harmonia. Dá-lhe um
caráter único, e o primeiro lugar, entre os seres dotados de corpo
material. Faz dele um ser racional, o ponto de contacto do mundo dos
corpos e do dos espíritos, o intérprete e a imagem, de certo modo
espiritualizada, do primeiro.
Na próxima lição trataremos, em especial, da inteligência e da
sua operação. Basta aqui lembrar que, na sua atividade normal, tal
como a exerce a alma unida ao corpo, a inteligência depende da
sensibilidade para a elaboração das idéias. É nas imagens formadas
pelas faculdades sensíveis que a inteligência procura os elementos do
conhecimento; o seu raciocínio é acompanhado dum constante movimentar
de imagens, que servem como que de suporte às idéias de chie se
ocupa. Mas a operação da sensibilidade, embora acompanhe a da
inteligência, mantém-se sempre num plano inferior ao desta. Na
imagem sensível, que inevitavelmente apresenta os caracteres dum ser
concreto, embora diluídos e vagos, a inteligência vê a idéia
geral. É inteligência dum ser composto de alma e corpo, e tem, na
atividade de corpo, um auxiliar. Mas o seu mundo é o do
inteligível, e, sem o corpo, nem por isso deixará de aderir ao
inteligível, com que então ficará em contacto imediato.
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