17. A obra capital: a "Suma".

Todo o fim da vida de S. Tomás é dominado pela "Suma Teológica". Desde 1265 até à morte, quase dez anos, apesar de envolvido em lutas tão ásperas, trabalhou nessa obra capital, que teve de deixar a meio da terceira e última parte. É a obra da maturidade, que condensa o esforço duma vida inteira. Tudo aquilo, pode dizer-se, de que S. Tomás se ocupou nos seus outros livros, é retomado na Suma, de maneira definitiva, mais concisa, mais geral. Tudo é enquadrado num plano amplo, notável pela unidade e pela simplicidade; e, diz Sertillanges, "uma das melhores maneiras de compreender o sentido que S. Tomás dá às suas teses é meditar a ordem por que as apresenta [3]".

Na Primeira Parte, trata de Deus como princípio: Deus uno e trino, a Criação, os Anjos, o homem. Na Segunda, subdividida em duas, ocupa-se de Deus como fim; na primeira secção, estuda o fim último do homem, os atos humanos, as paixões, os hábitos, as virtudes a os vícios em geral, a Lei e a Graça; na segunda secção, trata uma a uma das virtudes e dos vícios que se lhes opõe, e, no fim, dos diversos estados em que o homem pode viver. A Terceira Parte é dedicada à Redenção: o dogma da Encarnação, a vida de Jesus, os Sacramentos.

A parte escrita por S. Tomás termina a meio do Sacramento da Penitência. A Suma foi concluída, num suplemento, pelo seu discípulo Reinaldo de Piperno, segundo a doutrina exposta por S. Tomás no comentário do "Livro das Sentenças".

A obra está dividida em tratados, estes em questões (612 ao todo, para as três partes e o suplemento), e as questões subdivididas em artigos, cinco a dez, em regra, por questão. Cada artigo trata só dum ponto bem determinado, segundo uma disposição quase uniforme; a mesma das "Questões disputadas", que, aliás, não é original de S. Tomás de Aquino, porque já Abelardo tinha adotado uma disposição semelhante, depois melhorada por Alexandre de Hales. O artigo começa pela exposição das objeções contra a solução defendida, três ou quatro, em regra, na Suma. Segue-se uma citação favorável, da Bíblia ou dum Doutor considerado, geralmente S. Agostinho ou Pedro Lombardo em teologia, ou, em assuntos filosóficos, Aristóteles. Depois vem a conclusão, que, se é assunto que a filosofia pode resolver, nunca se funda num argumento de autoridade, mas no raciocínio; se o assunto só é acessível à teologia, a conclusão baseia-se na Revelação. E o artigo termina pela resposta às objeções, uma a uma.

S. Tomás aplica este esquema com grande elasticidade. Às vezes, cita mais do que um argumento favorável; outras vezes, acha que a citação, embora favorável, peca por excesso, e responde-lhe depois das respostas às objeções; muitas vezes, também, entende que a conclusão já resolve suficientemente todas as dificuldades, e então dispensa-se de lhes dar solução especial. Mesmo quando o aplica sem alteração, S. Tomás sabe utilizar as possibilidades que o esquema dá. Nunca repisa, nas soluções, os argumentos da conclusão; aproveita-as para completar o que disse no corpo do artigo. Muitas vezes, trata na conclusão só do aspecto geral da questão, deixando para as soluções os aspectos particulares. Sabe graduar as suas palavras conforme se trata dum artigo de fé, duma doutrina próxima da fé, duma verdade demonstrada, ou duma simples opinião mais ou menos provável. Em resumo, cada artigo da Suma é equilibrado, voluntariamente breve, e sempre preciso.

A repercussão que a Suma Teológica teve foi muito grande, no Ocidente como no Oriente, onde se espalhou em traduções gregas; e continua a sê-lo. No século XV os dominicanos adotaram-na como livro de texto para o ensino da teologia, em substituição do "Livro das Sentenças"; seguiram-lhes o exemplo outras Ordens religiosas e muitas escolas. E hoje, quase sete séculos depois de escrita, o Papa Pio X recomendou a sua adoção a todas as Universidades católicas.