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Em Deus, como já disse, não há qualquer composição de potência
e ato; Deus é Ato Puro. E só ele o é; porque é da essência
do Ato Puro o ter necessariamente de ser único.
Em todos os seres, exceptuado Deus, que é mais do que um "ser",
tem portanto de haver composição de potência e ato. Essa
composição manifesta-se, pelo menos, no seguinte: todos recebem de
Deus a existência; esta é portanto distinta da essência, que não
exige que eles existam sob pena de contradição; a existência é um
ato de que a essência é a potência.
Mas pode haver seres que, abstraindo dessa composição fundamental,
que faz deles seres criados, não tenham, na sua substância, outra
composição; que sejam atos puros quanto à essência. A sua
essência não exige que eles sejam feitos de qualquer coisa; basta,
para existirem, que Deus, que lhes conhece a essência como
possível, lhes queira dar a existência atual, sem necessidade de
utilizar para isso uma matéria preexistente, ou de a criar com eles.
Seres assim são seres simples; não têm matéria. Para os
distinguir do Ato Puro em absoluto, é costume designá-los por
formas puras, embora o nome de formas só se aplique propriamente ao
elemento formal dos seres materiais.
Esses seres, por não terem matéria, não podem transformar-se
substancialmente; já vimos que a matéria é a possibilidade duma tal
transformação, e o substrato da evolução das coisas. São,
são; não são, não são; não podem ser outra coisa em potência,
nem existir em potência noutra coisa. São imortais; visto que,
assim como só podem nascer por Criação, só poderiam desaparecer
por aniquilamento, e Deus não suprime um ser que criou senão para
dar lugar à formação doutro ser, o que é impossível neste caso.
Seres reais, existentes, independentes de lugar, que é atributo
exigido pela matéria, as formas puras são verdadeiros espíritos. A
sua existência é possível dentro da ontologia que expus; e é
natural a sua identificação com os Anjos de que fala a Revelação
cristã.
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