12. As causas intrínsecas.

Como causas dum ser material, devemos apontar primeiro a sua forma e a sua matéria. São causas intrínsecas, porque se unem para originar esse ser, e ficam a fazer parte dele como elementos constituintes.

A matéria é causa. Causa passiva, evidentemente; mas causa, visto que sem uma matéria preexistente não se pode produzir nenhum ser material, a não ser por criação. É, segundo a designação de Aristóteles, a causa material.

A forma, substancial ou acidental, é causa também; é causa formal. Como já disse, a forma é o principio pelo qual a matéria constitui aquele ser, a lei que a obriga a exprimir por aquela modalidade, e não por outra, a sua potencialidade. É portanto indispensável à existência do ser: é causa intrínseca.

Como já vimos, se o agente que produz o objeto considerado é inteligente, a forma preexiste nele como idéia; tem então o nome de causa exemplar. Mas, mesmo que ele não seja inteligente, a forma tem de existir de qualquer maneira no agente que a imprime à matéria, visto que ninguém dá o que não tem. Pode ser a própria forma do agente, que assim se reproduz; é o caso do corpo quente que comunica o seu calor a outro. Ou pode a forma do agente conter de maneira mais elevada, mais geral, todas as perfeições da forma que imprime; contê-la virtualmente, como se diz. É o caso do agente inteligente, que tem no seu intelecto com que produzir os exemplares de tudo o que pode fazer; é o caso, ainda, de muitos agentes naturais, por exemplo do Sol, que, de maneiras muito diversas, move tantos seres com a energia que irradia.

Na matéria, considerada em si mesma, pura, a forma, como já se viu atrás, existe em potência.

Analogamente ao que acontece nas substâncias materiais, há em muitas coisas que não são substâncias um elemento que faz de matéria, um elemento potencial, preexistente, que é a sua causa material, e outro elemento atual, determinador, que é a sua causa formal. Em sentido lato, há matéria e forma num discurso, numa ciência, numa demonstração, numa associação. Pode tirar-se um exemplo duma anedota de Mark Twain. O grande humorista americano, depois de ter ouvido um pregador de nome, foi felicitá-lo pelo sermão; "mas", disse, "tenho um livro em minha casa onde ele vem, palavra por palavra". Calcula-se a atrapalhação do pregador, que se apressou a afirmar que o seu sermão era original, e não podia compreender que se desse tal coisa. Mark Twain insistiu, e ofereceu-se para lhe mostrar o livro. "Mas que livro é esse?" a acabou por preguntar o pregador; "é o dicionário", respondeu Mark Twain. Está aqui posta em relevo, claramente, a distinção entre causa material e causa formal. A causa material, o que servia de matéria, neste caso as palavras, vinha de fato no dicionário; mas a forma, o elemento inteligível, a causa formal, não vinha; e por isso não era lícito, a não ser como graça, dizer que vinha lá o sermão, constituído por aquelas palavras dispostas de maneira a realizarem aquela idéia.