2. Origem e educação de S. Tomás.

Tomás nasceu e cresceu na Itália do século XIII. Vejamos de que circunstâncias o rodearam o tempo e o lugar.

O século XIII foi o mais brilhante da Idade Média, e um dos mais brilhantes de toda a civilização cristã. Quando começou, a reconquista de quase toda a Península e as Cruzadas tinham libertado a Europa dos perigos duma nova invasão árabe; a instituição da Cavalaria, apoiada pela influência da Igreja, tinha conseguido vencer a rudeza dos costumes que vinha desde as invasões dos Bárbaros; por outro lado, não tinham caído ainda sobre o mundo cristão as calamidades que o afligiram nos séculos XIV e XV: o Cisma do Ocidente, a Guerra dos 100 anos, a invasão dos turcos. Foi um século de paz e prosperidade, em que a cultura, até aí fechada nos mosteiros, se pôde desenvolver em pleno dia, e em que a civilização cristã atingiu alturas difíceis de ultrapassar na teologia e na filosofia, na arquitetura e na escultura, na poesia, e em muitos outros ramos da ciência e da arte.

Na Europa feudal, a Itália apresentava um aspecto muito particular. O feudalismo tinha aí uma feição menos ordeira, menos respeitadora da disciplina e da hierarquia que impunham os laços de suserania e vassalagem. Os ódios, as invejas, os conflitos de interesses, tinham dividido de cima abaixo a sociedade italiana, voltando família contra família, vila contra vila, e, nas cidades, facção contra facção. Estas questões, de caráter local muito marcado, tinham-se por assim dizer polarizado em volta da velha luta entre o Império e o Papado; se uma terra, uma família, se batia pelos Guelfos, partidários do Papado, a terra ou a família inimiga punha-se ao lado dos Gibelinos imperialistas; e assim, as disputas locais e as rivalidades dos partido formavam uma rede inextricável que dominava toda a vida italiana.

Os Condes de Aquino, pais de S. Tomás, eram primos do Imperador da Alemanha Frederico II de Hohenstaufen, e gibelinos resolutos. Próximo do seu castelo de Rocca-Secca, a Abadia do Monte Cassino, a mais gloriosa das Abadias beneditinas, fundada pelo próprio S. Bento, era um baluarte da causa papal. Como S. Tomás, desde muito pequenino, mostrava grande disposição para as coisas religiosas, os pais formaram o projeto de o educar no mosteiro, com que havia pouco tinham concluído uma paz. Dada a influência de que dispunham, não lhes seria difícil conseguir que ele fosse, mais tarde, eleito abade do Monte Cassino; o que daria à família o domínio dos bens temporais do mosteiro, e faria passar para o partido gibelino uma das posições mais importantes do partido contrário na região. Este plano, que reunia a honra e o proveito, foi transtornado pela sinceridade da vocação de S. Tomás; o que explica a oposição que ela encontrou da parte da família. Educado no mosteiro, como oblato, de 1230 a 1239, (dos 5 aos 14 anos, portanto, visto que tinha nascido em 1225). S. Tomás teve de voltar para casa dos pais quando Frederico II expulsou os monges do Monte Cassino. Os pais mandaram-no para Nápoles nesse mesmo ano, para aí completar a sua educação na Universidade que o Imperador tinha acabado de fundar. Em Nápoles, travou conhecimento com os frades da Ordem de S. Domingos, criada poucos anos antes; convenceu-se de que a sua vocação o chamava a professar nessa Ordem; e, chegado à maioridade, em 1244, tomou o hábito dominicano.

O pai de S. Tomás tinha morrido no ano anterior. Mas a mãe mantinha os mesmos projetos, e, vendo-os contrariados, resolveu opor-se por todos os meios a que ele professasse; por isso, quando, nesse mesmo ano, S. Tomás se dirigia para Bolonha, a caminho de Paris, aonde o Mestre Geral da Ordem o mandava continuar os seus estudos, foi assaltado pelos irmãos, que o levaram para o castelo de S. Giovanni, e aí o aprisionaram à ordem da mãe. Não pouparam nenhum esforço para dissuadirem S. Tomás do seu intento; indo a ponto de o fecharem em companhia duma mulher, julgando vencê-lo assim. Mas não conseguiram nada; segundo uma versão, quando abriram a porta, encontraram S. Tomás a rezar, sossegadíssimo; outra versão conta que S. Tomás, impacientado, pegou na primeira coisa que tinha à mão, uma acha de lenha tirada da lareira e ainda em brasa, e expulsou com ela mulher e irmãos. As duas versões não são talvez incompatíveis. João Ameal, baseando-se nos estudos de Mandonnet, reconstitui a cena mais ou menos assim: S. Tomás, compreendendo que os irmãos o querem fechar na sala grande do castelo com uma camponesa dos arredores, a quem, com promessas e ameaças, convenceram a desempenhar tão triste papel, e justamente indignado com o insulto, brande uma grande acha parcialmente inflamada que tirou do fogão, e expulsa todos da sala. Depois, com a ponta carbonizada da acha, traça uma grande cruz na pedra da parede; e, caindo de joelhos, fica perdido em oração.

Seja como for, depois de o terem preso um ano, a mãe e os irmãos acabaram por ceder, e S. Tomás pôde seguir a sua viagem para Paris, onde, nesse mesmo ano, professou.