9. As nossas palavras e Deus.

Se não podemos compreender Deus, ainda menos podemos falar dele dando às palavras o sentido que têm quando se aplicam às coisas que nos cercam. As palavras são sinais dos conceitos, e os nossos conceitos são tirados do mundo em que vivemos. Se as tomarmos tais quais, nenhuma, portanto, se pode aplicar a Deus. Por isso, quando dizemos, por exemplo, que Deus é bom, não devemos esquecer que a bondade de Deus é diferente da nossa; quando dizemos, simplesmente, que Deus é, deve ser com a reserva de que a maneira de ser de Deus não é a mesma das coisas criadas. Se quisermos manter às palavras o seu significado habitual, só podemos, de Deus, dizer isto: o Mundo existe, e não tem em si mesmo a razão suficiente da sua existência.

S. Tomás, ao falar dos nomes divinos, insiste neste ponto, e com razão, porque esquecê-lo é reduzir a teodicéia às proporções dum antropomorfismo muito mesquinho. Perfilha a opinião do Pseudo-Dionísio de que "tudo quanto afirmamos de Deus pode ser dele negado com tanta ou mais razão, porque", diz, "todas as palavras que empregamos, se as olharmos quanto ao seu modo de significação, incluem uma imperfeição que não se encontra em Deus, embora se encontre em Deus, de maneira eminente, a coisa que a palavra significa [53]".

Em poucas palavras: nada se pode dizer, de Deus e das criaturas, em sentido unívoco.