E. A escolástica depois de S. Tomás.


21. Duns Scot.

COMO disse, a vitória de S. Tomás sobre os averroístas provou definitivamente que o aristotelismo era compatível com o cristianismo; mas não pôde desarmar todos os seus adversários. Morto S. Tomás, o Bispo de Paris, Estêvão Tempier, e o Arcebispo de Cantuária, Roberto Kilwardby, condenaram várias teses tomistas de mistura com as teses dos averroístas latinos. Roma nunca aprovou essas condenações, que mais tarde foram expressamente revogadas pela Bula que canonizou S. Tomás. Mas elas não deixaram de influir para que o franciscano Duns Scot [23], querendo evitar toda a censura, e movido além disso pela tendência, constante entre os franciscanos, de dar preponderância à vontade sobre a razão, criasse o seu sistema filosófico, originalíssimo. Scot, que ficou conhecido pelo "Doutor sutil", toma por base a hipótese de que o Universo é constituído por elementos, correspondentes cada um a um conceito distinto, que se combinam entre si, segundo os decretos arbitrários da vontade divina, para formarem todas as coisas. Esses elementos não são seres; antes, o ser é um deles; também não são simples aspectos diversos das coisas; são distintos formalmente, por parte da coisa, diz Scot: "a parte rei". Assim, no homem, além da matéria e de duas formas substanciais, a de corporeidade que constituí o corpo, e a alma ou forma de humanidade, Scot encontra, distintas formalmente a parte rei: o ser, a vida, a animalidade, a individualidade (haecceitas, lhe chama Scot), do conjunto, as das formas e da matéria, etc.

Neste sistema não se pode demonstrar a imortalidade da alma, que passa a ser uma simples verdade de fé. A sua tendência natural é para o panteísmo, visto todas as coisas terem um ser comum. Mas, à força de talento, Scot conseguiu evitar esta conseqüência dos seus princípios; o seu sistema é susceptível de interpretação perfeitamente ortodoxa, e ensina-se ainda hoje nas escolas franciscanas, com autorização expressa da Igreja.

Scot notabilizou-se como teólogo, mais ainda do que como filósofo. Foi ele quem deu forma definitiva à doutrina da Imaculada Conceição, diante da qual o próprio S. Tomás tinha hesitado.