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Com os sentidos externos e os quatro sentidos internos, ice estudada a
parte cognitiva da sensibilidade, naquilo que interessa à teoria do
conhecimento. Por seu meio, conseguimos um conhecimento sensível do
objeto, isto é, o conhecimento da sua existência, da sua
localização, das suas dimensões, de muitas das suas qualidades,
das suas relações com os outros objetos concretos. O conhecimento
realiza-se pela formação de uma imagem, que apresenta as
propriedades do objeto na medida em que nos são acessíveis, e o
representa no nosso espirito; imagem que a imaginação conserva, e a
memória pode fazer reviver.
Mas não nos iludamos. O que conhecemos é o objeto, não a imagem
ou as sensações de que ela nasce. A sensação é o meio pelo qual o
conhecimento do objeto chega à nossa consciência sensível.
Sentidos, senso comum, imaginação, todas as faculdades
sensíveis, pertencem ao homem; são interiores ao homem. O homem,
em conjunto, a pessoa, o todo, conhece os objetos. O resto é
análise do que se passa nele, quando conhece. Se não fosse o objeto
exterior a nós, nem sequer saberíamos que temos uma sensibilidade
externa. Primeiro conhecemos o objeto que sentimos; só depois é que
conhecemos a sensação. Conhecemos a sensibilidade reflectindo sobre
o seu ato; é preciso, antes de mais nada, que esse ato exista, e
portanto, que exista o objeto. É isto o que observamos; qualquer
hipótese contrária é puramente gratuita.
Não há diferença essencial entre o conhecimento sensível do homem e
o dos animais, embora, como é natural, o fato da alma sensível do
homem não ser autônoma, mas parte dum todo coroado pela
inteligência, traga consigo diferenças no seu modo de operar. Num
caso e noutro, é conhecimento do ser individualizado, tal como existe
na matéria. Os sentidos revelam-nos um objeto concreto; o senso
comum forma dele uma imagem que o reproduz, imagem que, à sua
maneira, tem todos os caracteres do ser concreto. A imaginação
conserva essa imagem, ou, na atividade criadora, gera outras, mais
ou menos imprecisas, de seres possíveis, concretos também, ou do
seres fantásticos, mas que se lhe apresentam como possíveis, e
concretos. A razão particular, instintiva ou reflectida mente, liga
o objeto com outros objetos, por meio de casos particulares de
relações gerais, mas que não conhece na sua generalidade A memória
desperta o passado concreto, com as particularidades que individualizam
o momento em que ele foi vivido. Em toda esta atividade sensível,
não há nada que, pela sua generalidade, exceda o modo por que a
forma existe na matéria. A imagem pode ser vaga; não pode ser
geral.
Por isso mesmo, no homem como nos animais, a sensibilidade não exige
uma faculdade imaterial. As faculdades sensíveis são orgânicas, do
composto, do corpo animado. Conhecer, é identificar-se o sujeito
como o objeto. No conhecimento sensível, o homem, por uma faculdade
que é da alma e do corpo, identifica-se intencionalmente com o
objeto, forma e matéria. Tudo se passa no plano da matéria. A
matéria do corpo, que, pela alma, constitui um homem, recebe, como
forma intencional, a do objeto conhecido pelos sentidos. Porque a
imagem sensível é ato duma faculdade orgânica, essa forma existe na
matéria em ambos os casos, embora de modo diferente; em ambos, é
individual, particular, limitada. O conhecimento sensível é
marcado pela passividade da matéria, por isso os escolásticos davam
à sensibilidade cognitiva o nome de intelecto passivo. Se, por ele,
o homem, como os animais, trasborda dos limites do seu corpo, não
excede o mundo dos corpos, o mundo material.
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