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Todos os nossos raciocínios se compõem de partes elementares que são
os conceitos. O conceito, também chamado noção, ou, mais
impropriamente, idéia, é a simples expressão intelectual dum
objeto. Representa, no nosso espírito, uma coisa real ou
possível. Em rigor, o nome de idéia devia reservar-se para a
noção duma coisa que pensamos realizar, e de que ela é, no nosso
espírito, o exemplar.
Há a considerar em todas as noções dois aspectos distintos, a
compreensão e a extensão. Fazem parte da compreensão as notas que
caracterizam os objetos representados pela noção; assim, o conceito
homem compreende as notas ser, corpóreo, vivo, sensível,
racional. À extensão do conceito pertencem todos os indivíduos a que
ele se estende ou pode estender; portanto, todos os homens à
extensão da idéia de homem. Facilmente se vê que a extensão e a
compreensão dum conceito crescem em razão inversa uma da outra.
Realmente, se compararmos os dois conceitos de homem e animal, vemos
que o primeiro é maior na sua compreensão, visto que inclui todas as
notas que caracterizam o animal, e mais a de ser racional; mas, em
compensação, é maior a extensão do segundo, por dela fazerem
parte, além dos homens, todos os animais. No limite, reduzida a
extensão a um só objeto, temos a noção representativa do
indivíduo, de compreensão praticamente infinita, por incluir todas
as notas que e particularizam; a ponto do conhecimento puramente
intelectual do indivíduo exceder a capacidade duma inteligência finita
como a nossa, motivo por que não podemos conhecer o individual senão
por reflexão sobre o sensível.
Quanto à extensão, as idéias classificam-se em singulares, se há
só um objeto que satisfaça ao exigido pela sua compreensão;
particulares, se a sua extensão é restringida a alguns dos objetos
que apresentam as notas que as caracterizam; coletivas, se se aplicam
a todos esses objetos, considerados em grupo; universais, se se
aplicam individualmente a cada um dos objetos do grupo. Assim,
Sócrates, por exemplo, ou este homem, são conceitos singulares;
algum homem, alguns homens, conceitos particulares; a humanidade é
conceito coletivo; e o homem, noção universal.
Quanto à compreensão, as noções podem ser simples ou complexas,
conforme só incluem notas relativas a uma essência, ou se compõem de
notas pertencentes a essências diferentes. Homem, por exemplo, é
uma noção simples; homem branco, uma noção complexa.
Considerando as idéias do ponto de vista das suas relações, podemos
dizer que sito idênticas se têm igual compreensão, como, por
exemplo, homem e animal racional. São correlativas se às notas duma
correspondem, num sujeito distinto, as notas da outra; exemplos: pai
e filho. Se vários conceitos se podem ordenar segundo o grau
crescente ou decrescente em que apresentam determinada característica,
dizem-se contrários os dois extremos opostos da série: branco e
preto, por exemplo, visto que entre os dois se estende toda a gama dos
cinzentos. Quando entre idéias opostas não há meio-termo, as
idéias são contraditórias; é o caso, por exemplo, de possível e
impossível, branco e não-branco.
Uma idéia não pode compôr-se de notas contraditórias. O absurdo
não é pensável; o lógico subordina-se ao ontológico. Podemos
pensar separadamente as notas contraditórias; podemos supor
realizável a sua união; mas quando tentamos fazê-la, verificamos
logo a sua impossibilidade. Expressões como círculo quadrado, por
exemplo, não traduzem nenhuma idéia; são pseudo-idéias, nomes em
que ninguém pode pensar, se compreende o que significam as palavras
que os compõem.
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