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O sertão de Canudos é um índice sumariando a fisiografia dos
sertões do Norte. Resume-os, enfeixa os seus aspectos
predominantes numa escala reduzida. É-lhes de algum modo uma zona
central comum. De fato, a inflexão peninsular, extremada pelo cabo
de S. Roque, faz que para ele convirjam as lindes interiores de seis
estados — Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Ceará e
Piauí — que o tocam ou demoram distantes poucas léguas.
Desse modo é natural que as vicissitudes climáticas daqueles nele se
exercitem com a mesma intensidade, nomeadamente em sua manifestação
mais incisiva, definida numa palavra que é o terror máximo dos rudes
patrícios que por ali se agitam — a seca.
Escusamo-nos de longamente a estudar, averbando o desbarate dos mais
robustos espíritos no aprofundar-lhe a gênese, tateantes ao través
de sem-número de agentes complexos e fugitivos. Indiquemos,
porém, inscrita num traçado de números inflexíveis, esta
fatalidade inexorável.
De fato, os seus ciclos — porque o são no rigorismo técnico do
termo — abrem-se e encerram-se com um ritmo tão notável, que
recordam o desdobramento de uma lei natural, ainda ignorada.
Revelou-o, pela primeira vez, o senador Tomás Pompeu, traçando
um quadro por si mesmo bastante eloqüente, em que os aparecimentos das
secas, no século passado e atual, se defrontam em paralelismo
singular, sendo de presumir que ligeiras discrepâncias indiquem apenas
defeitos de observação ou desvios na tradição oral que as
registrou.
De qualquer modo ressalta à simples contemplação uma coincidência
repetida bastante para que se remova a intrusão do acaso.
Assim, para citarmos apenas as maiores, as secas de
1710-1711, 1723-1727, 1736-1737,
1744-1745, 1777- 1778, do século XVIII, se
justapõem às de 1808-1809, 1824-1825,
1835-1837, 1844-1845, 1877-1879, do
atual. Esta coincidência, espelhando-se quase invariável, como se
surgisse do decalque de uma quadra sobre outra, acentua-se ainda na
identidade das quadras remansadas e longas, que, em ambas, atreguaram
a progressão dos estragos.
De fato, sendo, no século passado, o maior interregno de 32 anos
(1745-1777), houve no nosso outro absolutamente igual e, o
que é sobremaneira notável, com a correspondência exatíssima das
datas (1845-1877). Continuando num exame mais íntimo do
quadro, destacam-se novos dados fixos e positivos, aparecendo com um
rigorismo de incógnitas que se desvendam. Observa-se, então, uma
cadência rara perturbada na marcha do flagelo, intercortado de
intervalos pouco díspares entre 9 e 12 anos, e sucedendo-se de
maneira a permitirem previsões seguras sobre a sua irrupção.
Entretanto, apesar desta simplicidade extrema nos resultados
imediatos, o problema, que se pode traduzir na fórmula aritmética
mais simples, permanece insolúvel.
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