FORA DA PÁTRIA

Os novos expedicionários ao atingirem-no perceberam esta transição violenta. Discordância absoluta e radical entre as cidades da costa e as malocas de telha do interior, que desequilibra tanto o ritmo de nosso desenvolvimento evolutivo e perturba deploravelmente a unidade nacional. Viam-se em terra estranha. Outros hábitos. Outros quadros. Outra gente. Outra língua mesmo, articulada em gíria original e pinturesca. Invadia-os o sentimento exato de seguirem para uma guerra externa. Sentiam-se fora do Brasil. A separação social completa dilatava a distância geográfica; criava a sensação nostálgica de longo afastamento da pátria. Além disto, a missão que ali os conduzia frisava, mais fundo, o antagonismo. O inimigo lá estava, para leste e para o norte, homiziado nos sem-fins das chapadas, e no extremo delas, ao longe, se desenrolava um drama formidável...

Convinha-se em que era terrivelmente paradoxal uma pátria que os filhos procuravam, armados até aos dentes, em som de guerra, despedaçando as suas entranhas a disparos de Krupps, desconhecendo-a de todo, nunca a tendo visto, surpreendidos ante a própria forma da terra árida, e revolta, e brutal, esvurmando, espinheiros, tumultuando em pedregais, esboroando em montanhas derruídas, escancelada em grotões, ondeando em tabuleiros secos, estirando-se em planuras nuas, de estepes...

O que ia fazer-se era o que haviam feito as tropas anteriores — uma invasão — em território estrangeiro. Tudo aquilo era uma ficção geográfica. A realidade, tangível, enquadrada por todos os sucessos, ressaltando à observação mais simples, era aquela. Os novos campeadores sentiam-na dominadoramente. E como aquele povo desconhecido de matutos lhes devolvia, dia a dia, mutilados e abatidos, os companheiros que, meses antes, tinham avançado robustos e altaneiros, não haviam ânimo varonil que atentasse impassível para as bandas do sertão misterioso e agro...