CRESCE A POPULAÇÃO DE CANUDOS

Eram certas as notícias.

Canudos aumentara em três semanas de modo extraordinário. A nova do último triunfo sobre a expedição Febrônio, avolumada pelos que a espalhavam, romanceada já de numerosos episódios, destruíra as últimas vacilações dos crentes que até então tinham temido procurar o falanstério de Antônio Conselheiro. Como nos primeiros tempos da fundação, a todo o momento, pelo alto das colinas, apontavam grupos de peregrinos em demanda da paragem lendária — trazendo tudo, todos os haveres; muitos carregando em redes os parentes enfermos, moribundos ansiando pelo último sono naquele solo sacrossanto, ou cegos, paralíticos e lázaros, destinando-se ao milagre, à cura imediata, a um simples gesto do taumaturgo venerado. Eram, como sempre, toda a sorte de gente: pequenos criadores, vaqueiros, crédulos e possantes, de parceria, na mesma congérie, com os vários tipos de mangalaça sertaneja; ingênuas mães de família, irmanadas a zabaneiras incorrigíveis e trêfegas. No couce dessas procissões, viam-se, invariavelmente, sem compartirem das litanias entoadas, estranhos, seguindo sós, como de sobre-rolda ao movimento dos fiéis, os bandidos soltos — capangas em disponibilidade, procurando um teatro maior à índole aventureira e à valentia impulsiva. No correr do dia, pelas estradas do Calumbi, de Maçacará, de Jeremoabo e de Uauá, convergindo dos quadrantes, chegavam cargueiros repletos de toda a sorte de mantimentos, enviados diretamente a Canudos pelos adeptos que de longe o avitualhavam, em Vila Nova da Rainha, Alagoinhas, em todos os lugares. Havia abastança e um entusiasmo forte. Como aguardam os jagunços a nova expedição

Logo ao apontar da manhã distribuíam-se os trabalhos. Não faltavam braços; havia-os até de sobra. Destacavam-se piquetes vigilantes, de vinte homens cada um, ao mando de cabecilha de confiança, para vários pontos de acesso — em Cocorobó, junto à confluência do Macambira, na baixada das Umburanas e no alto da Favela, a fim de renderem os que ali haviam atravessado a noite, velando. Seguiam para as insignificantes plantações, estiradas pelas duas margens do rio, os que na véspera já tinham pago o tributo de se entregarem ao serviço comum. Dirigiam-se para as obras da igreja, outros; e outros — os mais ardilosos e vivos — para mais longe, para Monte Santo, para o Cumbe, para Queimadas, em comissões delicadas, indagando acerca dos novos invasores, confabulando com os fiéis que naquelas localidades se afrontavam com a vigilância das autoridades, adquirindo armamentos, ajeitando contrabandos afinal fáceis de serem feitos, espiando tudo, de tudo, inquirindo cautelosamente.

E partiam felizes. Pelos caminhos fora passavam pequenos grupos ruidosos, carregando armas ou ferramentas de trabalho, cantando. Olvidavam os morticínios anteriores. No ânimo de muitos repontava a esperança de que os deixariam, afinal, na quietude da existência simples do sertão.