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O novo insucesso das armas legais, imprevisto para toda a gente,
coincidia com uma fase crítica da nossa história.
A pique ainda das lastimáveis conseqüências de sanguinolenta guerra
civil, que rematara ininterrupta série de sedições e revoltas,
emergentes desde os primeiros dias do novo regime, a sociedade
brasileira, em 1897, tinha alto grau de receptividade para a
intrusão de todos os elementos revolucionários e dispersivos. E
quando mais tarde alguém se abalançar a definir, à luz de
expressivos documentos, a sua psicologia interessante naquela quadra,
demonstrará a inadaptabilidade do povo à legislação superior do
sistema político recém-inaugurado, como se este, pelo avantajar-se
em demasia ao curso de uma evolução vagarosa, tivesse, como efeito
predominante, alastrar sobre um país que se amolentara no marasmo
monárquico, intenso espírito de desordem, precipitando a República
por um declive onde os desastres repontavam, ritmicamente, delatando a
marcha cíclica de uma moléstia. O governo civil, iniciado em
1894, não tivera a base essencial de uma opinião pública
organizada. Encontrara o país dividido em vitoriosos e vencidos. E
quedara na impotência de corrigir uma situação que não sendo
francamente revolucionária e não sendo também normal, repelia por
igual os recursos extremos da força e o influxo sereno das leis.
Estava defronte de uma sociedade que progredindo em saltos, da máxima
frouxidão ao rigorismo máximo, das conspirações incessantes aos
estados de sítio repetidos, parecia espelhar incisivo contraste entre
a sua organização intelectual imperfeita e a organização política
incompreendida. De sorte que lhe sendo impossível substituir o lento
trabalho de evolução para alevantar a primeira ao nível da última,
deixava que se verificasse o fenômeno inverso: a significação
superior dos princípios democráticos decaía — sofismada,
invertida, anulada.
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