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Deferindo ao convite que lhe fora feito, o coronel Moreira César
seguiu a 3 de fevereiro para a Bahia, levando o batalhão que
comandava, o 7º de Infantaria, entregue à direção do major
Rafael Augusto da Cunha Matos; uma bateria do 2º Regimento de
Artilharia, comandada pelo capitão José Agostinho Salomão da
Rocha; e um esquadrão do 9º de Cavalaria, do capitão Pedreira
Franco.
Era o núcleo da brigada de três armas, que se constituiu logo com a
celeridade que as circunstâncias demandavam, ligando-se-lhe três
outros corpos, desfalcados todos: o 16º que estava em S. João
d’El-Rei, de onde abalou dirigido pelo coronel Sousa Meneses,
com 28 oficiais e 290 praças; cerca de 140 soldados do
33º; o 9º, de Infantaria, do coronel Pedro Nunes Tamarindo e
pequenos contingentes da força estadual baiana. O chefe
expedicionário não se demorou na Bahia. Recolhida toda a força que
lá estava, prosseguiu imediatamente para Queimadas, onde, cinco
dias apenas depois que partira da capital da República, a 8 de
fevereiro, estava toda a expedição reunida — quase 1.300
combatentes, fartamente municiados com quinze milhões de cartuchos e
setenta tiros de artilharia.
A mobilização fora, como se vê, um prodígio de rapidez.
Continuou rápida. Deixando em Queimadas, “1ª base de
operações”, sob o comando de um tenente, platônica guarnição de
80 doentes e 70 crianças, que não suportavam o peso das
mochilas, seguiu o grosso da tropa para a “2ª base de
operações”, Monte Santo, onde a 20 estava pronta para a
investida.
Chegara, porém, mal auspiciada. Um dia antes a inervação doentia
do comandante explodira numa convulsão epileptiforme, em plena
estrada, antes do sítio de Quirinquinquá; e fora de caráter tal
que os cinco médicos do corpo de saúde previram uma reprodução de
lastimáveis conseqüências. Os principais chefes de corpos,
porém, bem que cientes de um diagnóstico, que implicava seriamente a
firmeza e as responsabilidades do comando-geral ante as condições
severas da luta, forraram-se, cautelosos e tímidos, à menor
deliberação a respeito. O coronel Moreira César abeirava-se do
objetivo da campanha condenado pelos próprios médicos que comandava.
É natural que não fossem as operações concertadas com a
indispensável lucidez e que as inquinassem, desde o primeiro passo nos
caminhos, todos os erros e inexplicáveis descuidos e inexplicável
olvido de preceitos rudimentares, já rudemente corrigidos ou expostos
com a maior clareza nos desastres anteriores. Nada se resolveu de
acordo com as circunstâncias especialíssimas da empresa. Ficou
dominando todas as decisões um plano único, um plano de delegado
policial enérgico: lançar a marche-marche mil e tantas baionetas
dentro de Canudos. Isto no menor tempo possível. Os engenheiros
militares Domingos Alves Leite e Alfredo do Nascimento, tenentes
do estado-maior de 1ª classe, adidos à brigada, tiveram uma semana
para reconhecer a paragem desconhecida e áspera. Na exigüidade de
tal prazo não lhes era possível a escolha de pontos estratégicos,
que firmassem uma linha de operações indispensável. O vertiginoso
mesmo dos levantamentos militares estava aquém dessa missão de
afogadilho, adstrita a trianguladas fantásticas — bases medidas a
olho, visadas divagantes pelos topos indistintos das serras,
distâncias averbadas nos ponteiros dos podômetros presos às botas dos
operadores apresados. Estes esclareciam-se inquirindo os raros
habitantes dos lugares percorridos: era o arquivar longuras calcadas
numa unidade traiçoeira, a légua, de estimativa exagerada pelo
amor-próprio do matuto vezado às caminhadas longas; rumos
desesperadamente embaralhados ou linhas de ensaios em que um erro de
cinco graus era um primor de rigorismo; informes sobre acidentes,
contextura do solo e aguadas, de existência problemática e dúbia.
Subordinaram ao comandante o levantamento feito. Foi, sem maior
exame, aprovado.
De acordo com ele escolheu-se a nova estrada. Envolvente a do
Cambaio, pelo levante, e mais longa de nove ou dez léguas, tinha,
ao que se figurava, a vantagem de se arredar da zona montanhosa.
Largando de Monte Santo, as forças demandariam o arraial do Cumbe
no rumo seguro de ESE, e, atingindo este, inflectindo, rota em
cheio para o norte, fraldejando as abas da Serra de Aracati, em
marcha contornante, a pouco e pouco rumando a NNO, iriam interferir
no sítio do Rosário a antiga estrada de Maçacará. Escolhido este
caminho não se cogitou de o transformar em linha de operações, pela
escolha de dous ou três pontos defensáveis, garantidos de
guarnições que, mesmo diminutas, pudessem estear a resistência,
dado que houvesse um insucesso, um recuo ou uma retirada.
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