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Cristianismo fácil! Esta parece uma das aspirações mais óbvias e
mais difundidas depois do Concílio. Facilidade é palavra sedutora.
É também em certo sentido aceitável, mas pode ser ambígua. Pode
constituir belíssima apologia da vida cristã, quando é entendida
como se deve. Mas pode também ser uma adulteração, uma concepção
utilitarista, uma fatal "minimização". É preciso prestar
atenção.
Não há dúvida de que a mensagem cristã se apresenta na sua origem,
na sua essência e na sua intenção salvadora, e no desígnio
misterioso que a penetra inteiramente, como fácil, feliz, aceitável
ou admissível. É uma das certezas mais seguras e confortadoras de
nossa religião. Sim o cristianismo quando bem compreendido, é
fácil. É preciso julgá-lo assim, apresentá-lo e vivê-lo. O
próprio Jesus disse: "Meu jugo é suave e meu peso é leve" (Mt
11,30).
Deseja-se algo de semelhante para nosso tempo, orientado para as
concepções espirituais simples e fundamentais, sintéticas e
acessíveis a todos. Porventura o Senhor não resumiu no mandamento
supremo do amor de Deus e no preceito que o segue e dele deriva, do
amor do próximo "toda a lei e os profetas?" (Mt 22,40)
É a espiritualidade do homem moderno, especialmente dos jovens, que o
exige. É a exigência prática do apostolado e da penetração
missionária que o reclama. Simplificar e espiritualizar, isto é,
tornar fácil a adesão ao cristianismo. Esta é a mentalidade que
parece resultar do Concílio. Nada de juridicismo, nada de
dogmatismo, nada de autoritarismo, nada de ascetismo, é que se
apregoa com demasiado desembaraço. É preciso abrir as portas ao
cristianismo fácil. E assim vai-se emancipando a vida cristã das
chamadas "estruturas".
Tende-se a dar às verdades misteriosas da fé uma dimensão que pode
estar contida na linguagem corrente e que pode ser compreendida pela
forma mental moderna, desvinculando-as das formulações escolásticas
tradicionais, sancionadas pelo magistério autorizado da Igreja.
Tende-se a assimilar nossa doutrina católica à doutrina de outras
concepções religiosas. Visa-se a abolir os vínculos da moral
cristã, que são denominados vulgarmente como "tabus", e das
exigências práticas de formação pedagógica e de observância
disciplinar, para conceder ao cristão, apesar de ser ele ministro dos
mistérios de Deus e seguidor da perfeição evangélica, uma assim
chamada integração no modo de viver do homem comum. Procura-se um
cristianismo fácil na fé e nos costumes.
Mas não estarão sendo superadas as fronteiras daquela autenticidade a
que todos aspiramos? Aquele Jesus que nos trouxe seu Evangelho de
bondade, de alegria, e de paz, não nos exortou também a "entrarmos
pela porta estreita?" Porventura não exigiu de nós uma fé na sua
palavra que supera a capacidade de nossa inteligência? E não disse
igualmente que "quem é fiel no pouco é fiel também no muito"?
Não fez com que a obra de sua redenção culminasse no mistério da
cruz, loucura e escândalo para este mundo (1 Cor 1,23), e
não determinou que a condição de nossa salvação fosse nela
participar?
Aqui a lição se torna longa e difícil. Surge a pergunta: então o
cristianismo não é fácil? Não é aceitável para nós modernos?
Não é mais apresentável ao mundo contemporâneo? Além disso
perguntemos: o cristianismo é feito para temperamentos fracos, no
campo do valor humano e da consciência moral? É feito para tímidos,
tíbios, conformistas? Para pessoas que não se preocupam com as
exigências austeras do reino de Deus? Perguntemos se não é o caso
de procurar entre as causas da diminuição das vocações ao seguimento
generoso do Cristo, sem reservas e sem recuos, a apresentação
superficial de um cristianismo adocicado, sem heroísmos nem
sacrifícios, sem a cruz e por isso destituído da grandeza moral de um
amor total. Indaguemos também se entre as motivações das objeções
lançadas contra a encíclica Humanae Vitae, não está escondida
esta idéia: abolir uma lei difícil para tornar a vida mais fácil.
Mas tratando-se de uma lei que tem seu fundamento em Deus, como se
pode proceder assim?
Vamos tornar a dizer: sim o cristianismo é fácil. É prudente e
mesmo necessário aplainar todos os caminhos que conduzem a ele,
procurando sempre facilitá-los. É exatamente o que a Igreja,
depois do Concílio, se esforça por todos os meios por fazer, sem
contudo trair a realidade do cristianismo. Este é fácil com uma
condição: ser humilde, recorrer ao auxílio da graça, com a
oração, os sacramentos, e a confiança em Deus "que não
permitirá sejais tentados além das vossas forças, mas com as
tentações até vos dará os meios de suportá-las e delas sairdes"
(1 Cor 10,13). Ser corajoso em saber querer e amar,
principalmente em saber amar. Digamos com santo Agostinho: "O jugo
do Cristo é suave para quem ama, mas pesado para quem não ama.
Amanti suave est, non amanti durum est".
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