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Temos a consolação de vos receber, amadas filhas em Cristo,
superioras maiores de todas as nações, que nos trazeis, com vossa
presença, como que um sinal sensível e um símbolo de vossas irmãs
de todas as congregações religiosas, que, espalhadas pelo mundo,
formam inumeráveis fileiras, verdadeiras multidões de "apes
argumentosae", como a liturgia de hoje chama a virgem mártir
Cecília - enxames de almas boas, almas generosas, almas fortes,
que deixam tudo por amor de seu esposo, Cristo Jesus, para se
debruçarem com afeto de irmãs e de mães sobre aqueles que esperam de
vós um testemunho de fé, e fim empenho de caridade: crianças,
adolescentes, alunas de escola de todos os graus e níveis, pessoas
velhas, doentes, leprosas, pessoas, enfim, que sofrem - prontas a
derramar sobre cada uma delas a vossa riqueza interior, alimentada na
oração, na contemplação, ao contato íntimo e santificante com o
Senhor vivo na Eucaristia, e Mestre de vida interior nas Escrituras
Divinas.
A todas, nossa saudação, nossa satisfação, nosso encorajamento.
Desejaríamos demorar-nos um pouco convosco, se o tempo o
permitisse, para vos pedir numa conversa familiar, informações e
notícias acerca de cada uma de vossas famílias religiosas.
Queríamos em particular saber: Como vão vossas irmãs? Como
trabalham? Como se sentem elas no momento presente, na mentalidade de
hoje, que investe como um vento impetuoso contra lodas as
instituições, mesmo aquelas que pareciam mais confirmadas, para
submetê-las ao crivo de uma crítica severa, de uma revisão total e
impiedosa? Deixar-se-ão elas influenciar também por essas
correntes? Em que sentido?
Se o descontentamento geral as leva a uma exigência de viver, mais
sentida e profundamente e com mais autenticidade, sua própria
vocação, em plena fidelidade ao Evangelho e às regras primitivas
das congregações, a que pertencem, seja bem-vinda a revisão
total. A Igreja não a impede nem desencoraja. Antes é já do
conhecimento de todos, como a própria Igreja deu início a esta
revisão, com o apelo que o II Concílio do Vaticano dirigiu a
todas as almas consagradas, para se renovarem interiormente, para se
atualizarem nas formas exteriores, para se apresentarem no mundo de
hoje, com a fisionomia genuína de sua vocação, no seguimento
autêntico do Cristo, sinal das realidades futuras e vértice da
vocação universal à santidade da Igreja.
A renovação, de que tanto. se fala, não teve nem tem outro fim
senão o de apresentar ao mundo uma imagem, quanto possível perfeita
do próprio Salvador. "Cristo, seja entregue à meditação no
monte, ou evangelizando o reino de Deus às multidões, ou curando os
enfermos e feridos, ou convertendo os pecadores, ou ainda abençoando
as criancinhas e fazendo o bem a todos, obedecia em cada atitude à
vontade do Pai que o enviou".
Bem-vinda seja esta renovação, que em tão alto modelo se inspira e
tende a tão nobre fim. Mas se, pelo contrário, a onda de
insatislação levasse a ceder à mentalidade do mundo, a secundar
modas e comportamentos mutáveis e efêmeros, a imitar o mundo em suas
formas, sem discernimento e critério, então o resultado seria
realmente deplorável, não vos parece? "Se o sal se torna
insípido, não serve para mais nada, senão para ser lançado fora e
pisado pelos homens" (Mt 5,13).
A religiosa, como aliás noutra perspectiva o padre e o religioso,
está diante de um terrível dilema: ou serem santos totalmente, sem
compromissos, para atingirem sua plena dimensão, ou caírem no
ridículo reduzindo-se a meras caricaturas, a seres fracassados e
direi abortivos. Os perigos da secularização são evidentes em
todos. os seus reflexos, e particularmente no campo da pobreza,
quando se procura uma autonomia econômica em contraste com o espírito
da renúncia própria do Evangelho e da vida religiosa. A tentação
do individualismo, hoje tão ciosamente sentido pelo homem moderno,
como propriedade sua intangível, pode também atingir vossas
comunidades, quando se formam pequenas "fraternidades", às vezes
compostas de elementos de diversas Congregações, com perigo de um
certo nivelamento e empobrecimento da vida religiosa. A obediência
pode também ser seriamente ameaçada, se faltar a devida colaboração
com o episcopado, numa visão orgânica de conjunto nos planos de
apostolado.
São simples pontos que oferecemos à vossa meditação, na certeza de
que mais do que quaisquer outras exortações, vos podem servir de
conforto. fazendo-vos ver e apreciar o valor inestimável de vossa
vocação, a necessidade de uma perfeição espiritual e profissional
de primeira ordem, a riqueza que vossa doação total representa para a
santa Igreja. Oh! A Igreja! Olhai para ela, vivei para ela,
doai-vos a ela, porque ela precisa de vós. Sede almas de Cristo e
da Igreja; para que vivendo para Cristo que é o chefe, vós o
possais servir sem perigo de vos enganardes, em seu Corpo místico,
que mediante vossa colaboração, consegue misteriosa e gradualmente
atingir o próprio crescimento, edificando-se na caridade (Ef
4,16).
A Igreja tem necessidade de vós e conta convosco. Não decepcioneis
sua esperança, mas correspondei-lhe para além de suas esperanças.
O fato de serdes religiosas, não vos priva do direito ao verdadeiro
progresso da pessoa humana, nem vos torna alheias às necessidades e
anseios da cidade terrena, antes pelo contrário, delega-vos
expressamente para trabalhardes em sua edificação, pois vossos
irmãos e irmãs do mundo têm necessidade, para se salvarem, do
exemplo de criaturas plenamente livres, inteiramente entregues a sua
salvação, totalmente despojadas de tudo quanto oprime ansiosamente os
outros, plenamente alegres em seu sacrifício, inteiramente humanas,
porque inseridas naquele que é o princípio e a medida do homem, Deus
Pai, que nos salva em Cristo e nos assinalou com o caráter
invisível e operante de seu Espírito.
Tais são os critérios que deverão guiar vosso apostolado e também
vossas relações de autoridades segundo as novas exigências e no
interior das várias comunidades e na escolha das vocações.
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