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Bendizemos ao Senhor ao verificar que o movimento litúrgico,
assumido e promovido pelo Concílio, invadiu a Igreja e conquistou as
consciências do clero e dos fiéis. A prece coral do corpo místico,
que é a Igreja, estende-se e anima o Povo de Deus. Torna-se
consciente e comunitária. Um aumento de fé e de graça perpassa por
ele. Assim desperta a fé sobrenatural, e a esperança escatológica
guia a espiritualidade eclesiástica, a caridade retoma seu primado,
vivificante e operante, e isto exatamente neste século, surdo às
vozes do espírito profano e quase pagão.
Desejamos encorajar todos aqueles que prestam o melhor de seus
talentos, trabalho e coração ao grande esforço, por infundir em
toda a comunidade católica um novo e vivo alento de sábia oração.
A revisão em curso das formas e dos textos litúrgicos, exige muito
estudo e trabalho da parte de quem a prepara, grande paciência e
assiduidade de quem a executa, não pequena confiança e colaboração
filial de quem a ela se deve conformar, modificando as próprias
devoções habituais e renunciando ao próprio gosto.
Esta reforma apresenta certos perigos especialmente o da
arbitrariedade. Assim nasce o perigo da desagregação espiritual da
sociedade eclesiástica, da excelência da oração e da dignidade do
rito. As múltiplas mudanças introduzidas na oração tradicional e
comum, podem servir de pretexto para tanto. Seria um grande dano se,
ao conceber o uso das línguas modernas, certas adaptações a costumes
locais, certa abundância de textos e de novos ritos e outros não
poucos desenvolvimentos do culto divino, se a solicitude da santa mãe
Igreja formasse a opinião de que não mais existe uma norma comum,
fixa e obrigatória da oração da Igreja, podendo cada um presumir
organizá-la ou desorganizá-la a bel-prazer. Não seria mais
pluralismo no campo lícito, mas deformidade e, algumas vezes não só
ritual como também substancial (assim a intercomunhão com quem não
possui sacerdócio válido).
Essa desordem que infelizmente se verifica em vários lugares traz
graves prejuízos à Igreja, pelo obstáculo a uma reforma
disciplinada, qualificada e por ela autorizada, pela nota dissonante
na harmonia formal e espiritual do concerto da oração eclesiástica,
pelo critério religioso subjetivo, que alimenta no clero e nos
fiéis, pela confusão e pela fraqueza que cria na pedagogia religiosa
das comunidades, exemplo que não é bom nem fraterno.
Pretexto para tais arbitrariedades pode ser o desejo de ter um culto
mais de acordo com o próprio gosto, um culto mais compreensível,
mais adaptado às condições daqueles que dele participam, quando não
se pretende até expressar um culto mais espiritual. Queremos entrever
em semelhantes tentativas algum sentimento, que a sabedoria dos
pastores saberá levar em conta. Nossa congregação para o culto
publicou uma instrução sobre a celebração da missa, em ambientes
reservados, fora dos lugares consagrados.
Mas queremos exortar as pessoas de boa vontade, sacerdotes e fiéis,
a não serem indulgentes com esse indócil particularismo. Ele
ofende, além das prescrições canônicas, o coração do culto
católico, que é a comunhão, a comunhão com Deus e com os
irmãos, da qual é mediador o sacerdócio ministerial, autorizado
pelo bispo. Tal particularismo tende a criar "igrejinhas", seitas
talvez. A saber, a distanciar-se da celebração da caridade total,
a prescindir da "estrutura- institucional" (como se diz), da
Igreja autêntica, real e humana, para entregar-se à ilusão de
possuir um cristianismo livre e puramente carismático. Mas na
realidade amorfo, diluído e joguete de todo vento (Ef 4,14) de
paixão, de moda ou de interesse temporal e político.
Essa tendência a livrar-se gradual e obstinadamente da autoridade e
da comunhão da Igreja, pode infelizmente ir longe. Não como foi
dito por alguns às catacumbas, mas para fora da Igreja. Por fim
pode constituir uma fuga, uma ruptura e, portanto, um escândalo e
uma ruína. Não constrói, mas destrói. Quem não se lembra das
repetidas e ainda impressionantes exortações de santo Inácio de
Antioquia, o célebre mártir do início do segundo século: "Um
só altar, como um só bispo", porque o bispo é o princípio e o
fundamento da Igreja local, como o papa o é da Igreja universal.
Vê-se assim a relação entre a Igreja e a oração. Disso não
falaremos no momento, mas pensamos que aqueles que têm, seja "o
senso da Igreja", seja também o desejo de orar de um modo válido e
vivo, facilmente farão uma idéia. É preciso, caros filhos, orar
com e pela Igreja.
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