22 DE JANEIRO DE 1969. AUDIÊNCIA GERAL.

A idéia ecumênica parece ser em nossos dias tão lógica e feliz que podemos dizer encontra por toda a parte admiradores e fautores. Devemos procurar, filhos caríssimos, não comprometer o caminho e o êxito de uma causa de suma importância como esta do autêntico ecumenismo com modos de agir superficiais, apressados e contraproducentes. Notam-se, de fato, fenômenos perigosos e nocivos, neste inesperado entusiasmo de reconciliação entre católicos e cristãos separados. Queremos lembrar alguns aspectos dessa incauta precipitação ecumênica, para que tantos desejos bons e tantas afortunadas possibilidades não venham a perder-se no equívoco, na indiferença e no falso irenismo.

Aqueles, por exemplo, que acham tudo belo no campo dos irmãos separados e tudo enfadonho e censurável no campo católico, não estão mais em condições de promover eficaz e utilmente a causa da união. Como observava com irônica tristeza um dos melhores ecumenistas protestantes de nosso tempo, "o maior perigo para o ecumenismo seria entusiasmarem-se os católicos por tudo aquilo que nós consideramos nocivo e abandonarem tudo aquilo que nós agora consideramos importante". Esta atitude servil não é corajosa nem decorosa.

O mesmo poderíamos dizer de outra atitude hoje muito difundida, que pretende estabelecer a unidade a custo da verdade doutrinal. Aquele Credo que nos faz cristãos e católicos e nos define como tais, parece, neste caso, o obstáculo insuperável para a restauração da unidade. É claro que tem exigências muito severas e muito graves, mas as dificuldades que dele derivam não podem consistir à custa de incompreensão e traição da causa, no sacrifício da fé, com a esperança ilusória de que a caridade baste para restabelecer a unidade. E neste caso, por caridade se entende a prática empírica sem escrúpulos dogmáticos e fora das normas disciplinares. Os episódios que se verificaram nestes últimos meses da assim chamada "Intercomunhão" estão na linha citada. Nós a julgamos não boa e por isso devemos lealmente reprová-la. Recordemos que o Concílio exorta os fiéis a "se absterem de qualquer leviandade ou zelo imprudente que possam prejudicar o verdadeiro progresso da unidade"

Isto não quer dizer que católicos e cristãos separados não possam discutir sobre os dogmas da fé. Pelo contrário, é de um comum exame teológico, objetivo e sereno da verdade revelada e vivida fielmente pela tradição genuína do ensino eclesiástico, que se pode conhecer qual é o patrimônio essencial doutrinal cristão, tudo o que dele se pode autenticamente enunciar juntos em termos diferentes substancialmente iguais ou complementares, e é possível e finalmente vitoriosa para todos, a descoberta daquela identidade da fé, na liberdade e na variedade das suas expressões, pela qual a união pode felizmente ser celebrada com um só coração e uma só alma (At 4,32).

Mas este exame abrange a responsabilidade primeiramente dos teólogos e estudiosos qualificados e depois do magistério eclesiástico. Não pode ser resultado de debates de opiniões de qualquer nível que seja.

Gostareis de saber que este exame sobre diversas frentes do ecumenismo já está em andamento. E não nos devemos admirar se ele exige cautela, tempo e progresso gradual. É o ecumenismo em marcha, ecumenismo para o qual a grande figura piedosa e eleita do saudoso cardeal Agostinho Bea encaminhou os passos do nosso Secretariado para a união de todos os cristãos. Prestemos homenagem à sua memória, conservando-nos fiéis a seu método tanto corajoso quanto prudente.