28 DE MAIO DE 1969. AUDIÊNCIA GERAL.

Cristianismo fácil! Esta parece uma das aspirações mais óbvias e mais difundidas depois do Concílio. Facilidade é palavra sedutora. É também em certo sentido aceitável, mas pode ser ambígua. Pode constituir belíssima apologia da vida cristã, quando é entendida como se deve. Mas pode também ser uma adulteração, uma concepção utilitarista, uma fatal "minimização". É preciso prestar atenção.

Não há dúvida de que a mensagem cristã se apresenta na sua origem, na sua essência e na sua intenção salvadora, e no desígnio misterioso que a penetra inteiramente, como fácil, feliz, aceitável ou admissível. É uma das certezas mais seguras e confortadoras de nossa religião. Sim o cristianismo quando bem compreendido, é fácil. É preciso julgá-lo assim, apresentá-lo e vivê-lo. O próprio Jesus disse: "Meu jugo é suave e meu peso é leve" (Mt 11,30).

Deseja-se algo de semelhante para nosso tempo, orientado para as concepções espirituais simples e fundamentais, sintéticas e acessíveis a todos. Porventura o Senhor não resumiu no mandamento supremo do amor de Deus e no preceito que o segue e dele deriva, do amor do próximo "toda a lei e os profetas?" (Mt 22,40)

É a espiritualidade do homem moderno, especialmente dos jovens, que o exige. É a exigência prática do apostolado e da penetração missionária que o reclama. Simplificar e espiritualizar, isto é, tornar fácil a adesão ao cristianismo. Esta é a mentalidade que parece resultar do Concílio. Nada de juridicismo, nada de dogmatismo, nada de autoritarismo, nada de ascetismo, é que se apregoa com demasiado desembaraço. É preciso abrir as portas ao cristianismo fácil. E assim vai-se emancipando a vida cristã das chamadas "estruturas".

Tende-se a dar às verdades misteriosas da fé uma dimensão que pode estar contida na linguagem corrente e que pode ser compreendida pela forma mental moderna, desvinculando-as das formulações escolásticas tradicionais, sancionadas pelo magistério autorizado da Igreja. Tende-se a assimilar nossa doutrina católica à doutrina de outras concepções religiosas. Visa-se a abolir os vínculos da moral cristã, que são denominados vulgarmente como "tabus", e das exigências práticas de formação pedagógica e de observância disciplinar, para conceder ao cristão, apesar de ser ele ministro dos mistérios de Deus e seguidor da perfeição evangélica, uma assim chamada integração no modo de viver do homem comum. Procura-se um cristianismo fácil na fé e nos costumes.

Mas não estarão sendo superadas as fronteiras daquela autenticidade a que todos aspiramos? Aquele Jesus que nos trouxe seu Evangelho de bondade, de alegria, e de paz, não nos exortou também a "entrarmos pela porta estreita?" Porventura não exigiu de nós uma fé na sua palavra que supera a capacidade de nossa inteligência? E não disse igualmente que "quem é fiel no pouco é fiel também no muito"? Não fez com que a obra de sua redenção culminasse no mistério da cruz, loucura e escândalo para este mundo (1 Cor 1,23), e não determinou que a condição de nossa salvação fosse nela participar?

Aqui a lição se torna longa e difícil. Surge a pergunta: então o cristianismo não é fácil? Não é aceitável para nós modernos? Não é mais apresentável ao mundo contemporâneo? Além disso perguntemos: o cristianismo é feito para temperamentos fracos, no campo do valor humano e da consciência moral? É feito para tímidos, tíbios, conformistas? Para pessoas que não se preocupam com as exigências austeras do reino de Deus? Perguntemos se não é o caso de procurar entre as causas da diminuição das vocações ao seguimento generoso do Cristo, sem reservas e sem recuos, a apresentação superficial de um cristianismo adocicado, sem heroísmos nem sacrifícios, sem a cruz e por isso destituído da grandeza moral de um amor total. Indaguemos também se entre as motivações das objeções lançadas contra a encíclica Humanae Vitae, não está escondida esta idéia: abolir uma lei difícil para tornar a vida mais fácil. Mas tratando-se de uma lei que tem seu fundamento em Deus, como se pode proceder assim?

Vamos tornar a dizer: sim o cristianismo é fácil. É prudente e mesmo necessário aplainar todos os caminhos que conduzem a ele, procurando sempre facilitá-los. É exatamente o que a Igreja, depois do Concílio, se esforça por todos os meios por fazer, sem contudo trair a realidade do cristianismo. Este é fácil com uma condição: ser humilde, recorrer ao auxílio da graça, com a oração, os sacramentos, e a confiança em Deus "que não permitirá sejais tentados além das vossas forças, mas com as tentações até vos dará os meios de suportá-las e delas sairdes" (1 Cor 10,13). Ser corajoso em saber querer e amar, principalmente em saber amar. Digamos com santo Agostinho: "O jugo do Cristo é suave para quem ama, mas pesado para quem não ama. Amanti suave est, non amanti durum est".