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Irmãos no episcopado, queridos sacerdotes,
É com grande alegria que hoje recebemos vossa visita, enquadrada nos
atos comemorativos da canonização de são João de Ávila, padroeiro
do clero secular espanhol. Sede bem-vindos, sacerdotes da nossa
querida Espanha, êmulos do novo santo, empenhados em encarnar a sua
figura exemplar nas vossas vidas sacerdotais. Achamos que a vossa
presença torna este encontro particularmente propício, para meditar
na vossa entrega a Cristo e à Igreja, partindo de uma realização
que, como a deste santo espanhol, mestre de vida sacerdotal, vos é
tão congenial.
Caríssimos filhos, permiti-nos reflitamos agora convosco, embora
por poucos instantes. Com o II Concílio do Vaticano, a Igreja e
com ela a hierarquia, os sacerdotes e o povo fiel estão em fase de
exercícios espirituais. Ele convida-nos a definir e a compreender
melhor o nosso sacerdócio. Este ato de reflexão sugerido -pelo
santo que canonizamos e pelo recente concílio, refere-se a dois
aspectos de nossa missão.
O primeiro é o da natureza do sacerdócio ministerial. Todos vós
sabeis quantas questões tem sido levantadas nestes últimos anos
sobre. o conceito de nosso sacerdócio, ao ponto de se ouvir dizer
freqüentemente que hoje o sacerdócio sofre uma crise na própria
consciência, daqueles que o escolheram como estado de vida e que nele
tiveram a ventura de ser admitidos sacramentalmente. Este é um dos
pontos que perturba hoje grandemente a Igreja, e que nos dá vo-lo
confiamos fraternalmente - maior preocupação e maior dor. Vós
sabeis que há quem abondone as santas fileiras do sacerdócio, por
decadência moral, por cansaço espiritual ou com receio de se ter
enganado na eleição do sagrado ministério. Além disso, alguns
profetas cia dúvida e da critica negativa contestam a existência do
próprio sacerdócio ministerial, sua existência e razão de ser,
não hesitam ataca-lo com contestações radicais. Certamente não
desconheceis as tendências que têm a propensão de assimilar o estado
clerical ao estado secular; e que pretendem "desclericalizar" o
sacerdócio, submergindo os que para ele se preparam ou já o
receberam, na vida profana, nas experiências mundanas e nas
profissões leigas. Sabemos que, às vezes, a origem destas
inquietações se encontra em aspirações legítimas e nobres do
clero, em necessidades especiais de rever algumas posições incômodas
da vida eclesiástica. Aspirações e necessidades a que os pastores
da Igreja procuram sábia e cuidadosamente prestar atenção e dar
remédio. Mas a questão fundamental é a que se refere à
consciência, que o sacerdote deve ter de si próprio, segundo a mente
da santa Igreja. Gostaríamos que essa questão fosse superada, por
meio da palavra, do exemplo e da intercessão de são João de
Avila. Superada sobretudo entre o clero espanhol, que pode dar
graças ao Senhor pela magnífica riqueza de fé, de fidelidade, de
virtude e exemplaridade que não só distingue a sua tradição
secular, mas em geral a sua própria atitude moderna, com enorme
satisfação para a Igreja, honra para a generosa nação espanhola,
e benefício espiritual para o mundo profano.
Escutemos, entre outras, umas palavras do novo santo. Ele escreve:
"Não conheço nada mais eficaz para os persuadir do que devem fazer
do que recordar-lhes a grandeza do benefício que Deus nos concedeu,
chamando-nos para o "elevado ministério sacerdotal. Porque havendo
tantos z quem podia fazer esta concessão, elegit nos ab omni vivente,
elegeu-nos dentre todo vivente" (Eclo 45,4).
Será, por acaso, necessário recordar-vos que são João de Avila
acompanha este chamado com uma autêntica consciência sacerdotal,
fazendo-se mestre de vida interior, especialmente insistindo na
necessidade da oração, sobretudo, da oração mental, sem o que o
sacerdote teria pobreza espiritual, e o pregador careceria da palavra
convincente?
O segundo aspecto refere-se à eficácia da missão sacerdotal. Não
vos escondemos. as dificuldades que o sacerdote encontra, quando
procura o modo para transmitir a mensagem de salvação ao homem
moderno. Sente o peso de uma sociedade que reclama, como próprios,
os princípios cristãos: a justiça, o respeito pela pessoa humana,
o desejo de paz e de unidade; mas talvez profundamente desviados do
sentido de Deus, do sentido do Cristo.
Para que o Concílio alcance seu objetivo é preciso tomar
consciência exata do mundo concreto, em que se exerce nossa
experiência sacerdotal particular. É necessária não só uma
atenção constante às faltas, às misérias, e, sobretudo, às
esperanças, que brotam à nossa volta, mas também uma prontidão de
ânimo para lhes ir ao encontro. É aí que, por meio do vosso
serviço, a Igreja pode travar um diálogo vivo com o mundo.
Ele também exige a vossa entrega total, sem reminiscências
profanas, de maneira que o anúncio da mensagem evangélica possa ser
contemplado, compreendido e imitado pelos irmãos, através do vosso
testemunho pessoal.
A figura de são João de Avila surge agora, quase poderíamos
dizer, com uma finalidade profética, para vos indicar uma regra.
Ele soube intuir os problemas de vossa pátria, que então se abria ao
mundo novo, recentemente descoberto. Soube assimilar, com espírito
da Igreja, as novas correntes humanistas. Soube reagir com visão
justa aos problemas dos sacerdotes, sentindo a necessidade de se
purificar e reformar para prosseguir o caminho com novas energias.
As características de seu sacerdócio não são difíceis de
descobrir, quer nos seus escritos, quer na sua vida. O sacerdote é
o ministro da palavra e dos sacramentos. Esta responsabilidade exige
dele uma santidade de vida não comum, um zelo opostólico sem
limites. uma fidelidade sincera à Igreja. Exortamo-vos a seguir o
seu exemplo e a adaptar os seus ensinamentos às vossas vidas e ao vosso
estilo sacerdotal. Permanecei unidos aos vossos pastores para serdes
fiéis à Igreja. O que o mundo exige de vós é um esforço comum
indispensável, para que a mensagem salvadora seja transmitida pura e
imaculada.
Esperamos, queridos sacerdotes, que estas breves reflexões produzam
no vosso coração um anseio constante de perfeição religiosa e
sacerdotal. Nutrimos a esperança de que a preocupação de o tornar
todos os dias vida, há de crescer em vós cada vez mais. Que são
João de Avila vos ilumine e ajude nestes propósitos.
Com estes desejos recebei, irmãos no episcopado e todos vós queridos
sacerdotes, uma especial bênção apostólica, que com muito prazer
fazemos extensiva a todos os sacerdotes espanhóis.
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