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Verdadeira responsabilidade
83. Neste momento, o nosso coração volta-se com amor paterno,
com ansiedade e grande mágoa para aqueles infelizes, mas sempre muito
queridos e saudosos irmãos no sacerdócio, que, mantendo impresso na
alma o caráter sagrado que lhes foi conferido na ordenação
sacerdotal, foram ou são desgraçadamente infiéis às obrigações
assumidas quando se consagraram ao serviço do Senhor.
A sua deplorável situação e as conseqüências particulares ou
públicas que dela derivam, levam alguns a duvidar se não será
precisamente o celibato responsável de algum modo por tais dramas e
tais escândalos que afligem o Povo de Deus. Na realidade, a
responsabilidade não recai sobre o próprio celibato, mas sobre o fato
de se não terem avaliado a tempo de modo satisfatório e prudente as
qualidades do candidato ao sacerdócio, ou ainda, sobre a maneira como
os ministros sagrados vivem a sua consagração total.
Motivos para as dispensas
84. Sendo muito sensível à triste sorte destes seus filhos, a
Igreja julga necessário fazer todo o esforço para prevenir ou
cicatrizar as chagas que estas defecções lhe trazem. Seguindo o
exemplo de nossos imediatos antecessores de saudosa memória, também
nós quisemos e determinamos que a investigação das causas que têm
por objeto a ordenação sacerdotal fosse ampliada a outros motivos
gravíssimos que não estão previstos na legislação canônica atual
(cf. CIC, can. 214), motivos que podem dar ocasião a
dúvidas reais e fundadas sobre a plena liberdade e responsabilidade do
candidato ao sacerdócio e sobre a sua idoneidade para o estado
sacerdotal, de modo a libertarem-se todos aqueles que um processo
judiciário cuidadoso demonstre não serem realmente aptos.
Justiça e caridade da Igreja
85. As dispensas que vêm a ser concedidas, numa percentagem
verdadeiramente mínima em relação ao grande número de sacerdotes
sãos e dignos, ao mesmo tempo que provêem com justiça à saúde
espiritual dos indivíduos, demonstram também a solicitude da Igreja
pela defesa do celibato e pela fidelidade integral de todos os seus
ministros.
Ao fazer isto, a Igreja procede sempre com amargura no coração,
especialmente nos casos particularmente dolorosos nos quais a recusa de
levar dignamente o suave jugo de Cristo se deve a uma crise de fé ou a
fraquezas morais, e é por isso, muitas vezes, responsável e
escandalosa.
Doloroso apelo
86. Oh, se estes sacerdotes soubessem quanta dor, quanta desonra,
quanta perturbação causam à santa Igreja de Deus, se refletissem
na solenidade e beleza dos compromissos assumidos, e nos perigos que
enfrentarão nesta vida e na futura, seriam mais cautelosos e
reflexivos ao tomar suas decisões, mais solícitos na oração e mais
lógicos e corajosos em prevenir as causas do seu colapso espiritual e
moral.
Interesse materno da Igreja
87. A Igreja volta-se com particular interesse para os casos dos
sacerdotes ainda jovens que tinham iniciado com entusiasmo e com zelo a
sua vida de ministros de Cristo. Não será talvez fácil que hoje,
no meio da tensão dos deveres sacerdotais, tenham eles momentos de
desconfiança, de dúvida, de paixâo, de loucura? É por isso que a
Igreja deseja que se tentem, sobretudo nestes casos, todos os meios
persuasivos, para levar o irmão vacilante à calma, à confiança,
ao arrependimento, à perseverança, e só quando o caso não
apresenta nenhuma solução possível, permite que o infeliz ministro
seja demitido do ministério que lhe tinha sido confiado.
Concessão de dispensas
88. No caso em que ele demonstrasse ser irrecuperável para o
sacerdócio, mas apresentasse ainda algumas boas e sérias
disposições para viver cristãmente como leigo, a Sé Apostólica,
estudadas todas as circunstâncias de acordo com o Ordinário ou o
Superior Religioso, deixando ao amor vencer a dor, satisfaz algumas
vezes os pedidos de dispensa, mas não sem acompanhá-la da
imposição de obras de piedade e de reparação, a fim de que
permaneça no filho, infeliz mas sempre caro, um sinal salutar da dor
maternal da Igreja e uma lembrança mais viva da necessidade comum da
divina misericórdia.
Encorajamento e aviso
89. Tal disciplina, ao mesmo tempo severa e misericordiosa,
inspirando-se sempre na justiça e na verdade, em suma prudência e
reserva, contribuirá sem dúvida para confirmar os bons sacerdotes no
propósito de vida intemerata e santa, e será aviso aos aspirantes ao
sacerdócio, para que, sob a sábia direção dos educadores, avancem
para o altar com plena consciência, com sumo desinteresse, com desejo
ardente de corresponderem à graça divina e à vontade de Cristo e da
Igreja.
Consolações
90. Não queríamos, enfim, deixar de dar graças ao Senhor, com
profunda alegria, ao reconhecermos que muitos daqueles que infelizmente
foram infiéis por algum tempo às suas obrigações, reencontraram,
com a graça do Sumo Sacerdote, o caminho justo e, para alegria de
todos, voltaram a ser ministros exemplares, depois de terem recorrido
com boa vontade comovedora a todos os meios idôneos e principalmente à
intensa vida de oração, de humildade e de contínuos esforços
sustentados pela freqüência do sacramento da penitência.
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