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38. A Igreja deve entrar em diálogo com o mundo em que vive. A
Igreja faz-se palavra, faz-se mensagem, faz-se colóquio.
Este aspecto capital da vida hodierna da Igreja será objeto de estudo
especial e amplo do Concílio Ecumênico, como todos sabem. Nós
não queremos entrar no exame concreto dos temas que esse estudo
apresenta, para deixarmos aos Padres conciliares a missão de os
tratar com toda a liberdade. Queremos só convidar-vos, Veneráveis
Irmãos, a antepor a esse estudo algumas considerações, para
ficarmos a conhecer mais claramente os motivos que levam a Igreja ao
diálogo, os métodos mais aconselháveis e os objetivos em vista.
Queremos dispor os ânimos, não tratar as matérias.
39. Nem podemos desinteressar-nos deste assunto, convencidos como
estamos que o diálogo deve caracterizar o nosso cargo apostólico.
Somos herdeiros do estilo e da diretriz pastoral, que nos foram
legados pelos nossos predecessores do último século a partir do grande
e sábio Leão XIII. Este Papa, quase personificando a figura
evangélica do escriba prudente, que, "...como pai de família,
tira do seu tesouro coisas antigas e coisas novas" (Mt 13,52),
exerceu com autoridade o magistério católico, tomando por objeto das
suas lições substanciosas os problemas do nosso tempo, considerados
à luz da palavra de Cristo. E o mesmo fizeram os que lhe sucederam,
como sabeis. Não é magnífico e opulento o patrimônio doutrinal que
nos deixaram os nossos imediatos predecessores, especialmente os Papas
Pio XI e Pio XII? É doutrina elaborada com o intento amoroso e
clarividente de unir o pensamento divino ao pensamento humano, este
considerado não em abstrato mas na linguagem concreta do homem
moderno. Ora essa tentativa apostólica que é senão diálogo? E
João XXIII nosso imediato predecessor de venerada memória, não
deu ao seu ensinamento uma direção ainda mais acentuada no mesmo
sentido? Pretendeu aproximá-lo quanto possível da experiência e
capacidade de compreensão do mundo contemporâneo. E ao próprio
Concílio não se quis dar, e com razão, orientação pastoral,
toda destinada a inserir a mensagem cristã no círculo do pensamento,
palavra, cultura, dos hábitos e tendências da humanidade, como ela
vive hoje e se agita sobre a face da terra? Antes de convertermos o
mundo, e precisamente para o convertermos, é necessário que nos
acerquemos e lhe falemos.
40. No que diz respeito à nossa humilde pessoa, ainda que não
desejamos falar dela nem atrair as atenções, não podemos, nesta
nossa espontânea apresentação ao colégio episcopal e ao povo
cristão, passar em silêncio o nosso propósito de perseverar, quanto
as nossas débeis forças no-lo permitirem e, sobretudo, quanto
no-lo tornar possível a divina graça, de perseverar na mesma linha,
no mesmo esforço de nos aproximarmos do mundo, em que a divina
Providência nos destinou a viver. Dele nos aproximaremos com toda a
reverência, cuidado e amor, para o compreendermos, para lhe
oferecermos os dons de verdade e de graça de que Jesus Cristo nos
constituiu depositário. Comunicar-lhe-emos a nossa missão
maravilhosa de redenção e de esperança. Profundamente gravadas no
nosso espírito estão as palavras de Cristo que desejamos fazer nossas
com humildade e perseverança: "Pois Deus no enviou o seu Filho ao
mundo, para julgar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por ele"
(Jo 3,17).
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