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Os desígnios de Luís VI se cumpriram; os cônegos de São
Vítor, enriquecidos pela liberalidade de seus poderosos e generosos
protetores, puderam se dedicar em paz aos seus estudos e aos
exercícios da vida religiosa. Estas riquezas, porém, fariam elas
próprias nascer entre eles a dispersão e a desordem, se não
estivessem submetidos a uma sábia disciplina e se uma forte
constituição não houvesse mantido no mosteiro uma perfeita
regularidade. Esta foi a obra de Guilduino.
A constituição e suas regras nos foram conservadas até aos dias de
hoje, mas neste trabalho somente alguns de seus detalhes serão de
nosso interesse.
O superior dos cônegos era o abade, que devia ter entre eles o lugar
de pai. Sua eleição se fazia com uma grande solenidade; quando de
sua morte, os irmãos jejuavam e guardavam silêncio até seus
funerais.
Após as cerimônias das exéquias, o prior tocava um sino convocando
a todos para o capítulo. Sete entre os membros mais distintos eram
escolhidos então para formarem um conselho; entre eles deliberariam e
escolheriam o religioso que julgassem mais capaz de governar a
comunidade; os demais permaneceriam em oração. Era proibido que os
cônegos se reunissem antes disso entre si para tratarem da próxima
eleição. Se os eleitores não podiam chegar a um acordo,
aumentava-se o seu número.
Assim que a escolha do conselho caía sobre um dos cônegos,
reunia-se o capítulo e o membro mais velho anunciava haver sido eleito
tal homem, prelado de tal ou qual casa. O eleito era conduzido à
cadeira do abade onde recebia a homenagem de todos os irmãos.
No dia seguinte, todos os que faziam parte de sua obediência
dirigiam-se ao capítulo e, prostrados diante do novo abade, este
lhes dirigia a pergunta:
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"Prometeis a mim a obediência que me deveis,
segundo as regras de Santo Agostinho,
e segundo as promessas que fizestes
no dia de vossa profissão?"
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No capítulo geral seguinte à eleição o abade por sua vez fazia
também a sua promessa:
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"Eu, fulano de tal,
humilde abade de São Vítor,
salvo a liberdade, os privilégios
e os demais direitos de nossa igreja,
prometo obediência ao capítulo geral
e fidelidade por mim e por nossa casa".
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A eleição terminada, o prior, o sub prior e alguns irmãos
dirigiam-se ao bispo, apresentando-lhe o abade eleito e marcando o
dia em que iria receber de sua mãos a bênção abacial.
O dia fixado, os religiosos permaneciam no coro e esperavam em
silêncio o retorno do abade. Este voltaria entrando pela porta da
igreja maior, atravessando o coro enquanto todos se prostravam.
Estas cerimônias imponentes eram naturalmente próprias para estimular
a imaginação e despertar a fé daqueles homens simples. Eles viam na
pessoa do abade o representante de Deus. O respeito que lhe era
tributado lhes tornava a obediência mais segura e mais fácil.
Este respeito deveria manifestar-se também após as cerimônias.
Ninguém poderia passar diante do abade sem saudá-lo. Com exceção
do coro, levantava-se quando o abade entrava e não se sentava
enquanto o próprio abade não o tivesse permitido.
O que se deve admirar aqui é a delicadeza que os pensamentos da fé
inspiravam a estes bons religiosos que viviam ainda no meio de uma
sociedade mal saída da barbaridade e que não se tinha ainda depurado
da violência de seu caráter e da grosseria de seus costumes.
Exemplos como estes não eram de fato inúteis para o próprio
progresso da civilização.
A autoridade do abade era doce e soberana, mas não era nem
arbitrária, nem sem controle. Ela devia ser exercida de acordo com
as leis da ordem e sob a vigilância do capítulo geral e do bispo.
Embora o cargo de abade fosse vitalício, ele poderia ser deposto ou
mesmo expulso da comunidade se abusasse de seu poder.
O prior substituía o abade ou o auxiliava no exercício do cargo.
Era escolhido pelo abade o qual deveria, para tanto, ouvir primeiro o
conselho dos mais velhos. Era o prior o encarregado principal de
vigiar a disciplina, e exercia esta vigilância sobre todos os demais
cargos inferiores, embora não tivesse o poder de elegê-los ou
destituí-los.
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