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Todos os que se aproximam da divina lição devem conhecer
primeiramente quais sejam os seus frutos. Nada, de fato, deve ser
buscado sem motivo; nem mesmo é possível desejar aquilo que não
promete algum tipo de utilidade.
Ora, o fruto da divina lição é duplo, pois ela ensina a ciência e
ornamenta a alma de virtudes.
A ciência diz respeito principalmente ao sentido literal e
alegórico; já a instrução dos costumes diz respeito mais ao sentido
tropológico. Tudo o que diz a Sagrada Escritura está ordenado a
estes fins (7).
Por isto aqueles que se dedicam ao estudo das Sagradas Escrituras
não devem desprezar aquilo que é significado pelas coisas manifestadas
pelo sentido literal. Os filósofos, em seus escritos, somente
conhecem a significação das palavras, mas nas sagradas páginas muito
mais excelente é a significação das coisas significadas pelas
palavras do que a própria significação das palavras. A
significação das palavras foi instituída pelos usos dos homens,
enquanto que a significação das coisas foi instituída pela própria
natureza. As primeiras são vozes humanas, as segundas são vozes de
Deus falando aos homens. A significação das palavras depende do
arbítrio dos homens, mas a significação das coisas depende apenas da
natureza, e da obra do Criador que deseja significar certas coisas
através de outras. Ademais, o número de significados das coisas é
muito maior do que o número de significados das palavras: poucas
palavras significam mais do que duas ou três coisas, enquanto que as
coisas podem ter significados tão variados quantas forem as
propriedades visíveis ou invisíveis que tiverem em comum com as demais
coisas (8).
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