CARTA DO PRESIDENTE ROOSEVELT A SUA SANTIDADE, O PAPA PIO XII, MENCIONADA NA RADIOMENSAGEM DE NATAL DE 1939

Santíssimo Padre: Estando, por esta festa do Natal, o mundo envolto em tristeza, é muito próprio que eu vos envie uma mensagem de saudação e de fé. O mundo criou para si mesmo uma civilização capaz de garantir à humanidade paz e segurança, firmemente assentes na base do ensino religioso. Apesar da nossa civilização ter conquistado a terra, o mar e até o próprio ar, vemo-la atualmente sofrendo guerra e dores. Apraz-me recordar que foi em tempos semelhantes que Isaías profetizou, em primeiro lugar, o nascimento de Cristo. Assim, muitos séculos antes da sua vinda, a condição do mundo não era diferente daquela que hoje vemos. Então como hoje, tinha rebentado uma conflagração, e as nações da terra caminhavam perigosamente à luz do fogo que elas próprias tinham ateado. Mas nesse mesmo momento se previu um novo dia em que os cativos seriam livres e em que os conquistadores desapareceriam no fogo ateado por suas mãos; aqueles que tomaram a espada pereceram pela espada. De novo, durante muitos séculos, a que damos o nome de idade das trevas, as chamas e a espada dos bárbaros acometeram a civilização ocidental; mas, então, reacendendo-se, mais uma vez, a centelha espiritual, inerente na humanidade, honre um novo renascimento, que ressuscitou a ordem, a cultura e a religião. Creio que os sofrimentos de hoje são uma nova forma desses velhos conflitos. Sendo tão acelerado, nos nossos dias, o tempo das coisas mundanas, é de esperar que também este Período de trevas e de destruição seja muito mais abreviado do que ,nos tempos antigos. Os homens recusam-se a aceitar, no seu íntimo, por muito tempo, a lei de destruição, que lhes é imposta pêlos defensores da força bruta. Procuram sempre encontrar de -novo, embora por vezes em silêncio, aquela fé sem a qual o bem das nações e a paz do mundo não podem ser reconstruídos. Tenho o privilégio raro de lei de milhares de pessoas humildes cartas e confidências que vivem em muitas nações da terra. Os seus nomes não entram nas páginas da história, mas é o seu trabalho e coragem cotidianos que sustentam a vida do mundo. Eu sei que estes e uma legião inumerável de outros, como eles, em todos os países da tetra, estão à espera de uma luz que os guie. Sabemos que a estrela de Belém foi vista primeiramente pêlos pastores das montanhas, muito antes dos chefes do povo terem visto a grande luz, que tinha aparecido na terra. Creio que talvez já exista no meio de nós, a nova ordem de coisas que os estadistas ainda mal divisam. Creio até que essa nova ordem já está sendo construída, silenciosa, mas inevitavelmente, nos corações das massas, cujas vozes não são ouvidas, mas cuja fé comum escreverá a última página da história do nosso tempo. Conhecem muito bem que, sem crença num princípio diretivo e sem confiança num plano divino, as nações ficarão nas trevas e os povos perecerão. Eles sabem que a civilização, herdada de nossos pais, foi edificada por homens e mulheres que conheciam, no seu íntimo, que todos éramos irmãos, porque todos éramos filhos de Deus. Eles criam que, pela sua vontade, as inimizades podiam ser curadas; que pela sua misericórdia os fracos podiam ser libertados, e que os fortes encontrariam graça, auxiliando os fracos. Se estas vozes silenciosas forem ouvidas, nesta hora de angústia e de horror, creio que nos poderão dizer coiro se há de reconstruir o mundo. E' próprio que o mundo pense .nisto, pela festa do Natal. Conhecendo perfeitamente o povo deste país que o tempo e a distância deixaram de existir, como noutras eras, sabe também que o que fere uma parte da humanidade, fere o resto do mundo. Só pela cooperação mútua e amiga daqueles que buscam a luz e a paz, poderá levar-se de vencida as forças do mal. Nas circunstâncias do momento presente, não há nenhum "leader" espiritual ou temporal que possa executar um plano determinado, capaz de pôr fim a esta destruição e reconstruir uma nova ordem. No entanto, esse tempo virá certamente. Estou, portanto, persuadido de que, embora não se veja ainda o modo nem o tempo de agir, é conveniente, desde já, trabalhar para uma união mútua de esforços de todos aqueles que, nas diversas partes do mundo - sejam líderes religiosos ou civis, têm a peito a mesma causa. Tomo, portanto, a liberdade de participar a Vossa Santidade que será para mim motivo de grande alegria enviar-vos o meu representante pessoal a fim de que os nossos comuns esforços pela paz e alívio dos que sofrem se tornem mais profícuos. Quando chegar o tempo para o restabelecimento da paz mundial, numa base mais segura, é de altíssima importância para a humanidade e para a religião que aqueles que têm a peites o mesmo ideal apresentem uma frente única de ação. Além disso, quando chegar esse dia feliz, todos nós teremos de resolver grandes problemas de importância prática. Milhões de pessoas de todas as raças, nacionalidades e credos religiosos deverão talvez Principiar uma nova vida, emigrando para outros países, ou regressando aos seus antigos lares. Neste ponto também, um ideal comum exige uma ação comum. Confio, pois, plenamente que todas as confissões religiosas do mundo, que crêem no mesmo Deus, envidarão todos os seus grandes esforços, em prol duma tão grande causa. A vós, a quem tenho a honra de chamar um bom e velho amigo, envio as minhas respeitosas saudações, por esta festa do Natal. Cordialmente vosso,

Franklin D. Roosevelt.