OS QUE PUSERAM A SUA ESPERANÇA NO GOZO DA VIDA TERRENA

20. Desventurados são também os que vêem falida a sua esperança de felicidade, sonhada e colocada unicamente no gozo da vida terrena transitória, imaginada exclusivamente ou como plenitude de energias corporais e beleza de forma e de pessoas, ou como opulência e superabundância de comodidades, ou como posse de força e poder.

21. Mas eis que hoje em dia, no torvelinho da guerra, o vigor e a formosura de tanta juventude, crescida e adestrada nos campos desportivos, se desfaz e desaparece nos hospitais militares, e muitos jovens, mutilados ou enfermiços física e moralmente, vagueiam pelas ruas de uma pátria desolada e reduzida a montão de ruínas, em várias cidades das suas melhores regiões, pelos bombardeamentos aéreos e pelas operações de guerra.

22. Se parte da juventude masculina já não tem força para a fadiga do trabalho, as futuras mães da próxima geração, forçadas como estão a um trabalho excessivo para além de toda a medida e todo o limite de tempo, vão perdendo o poder de subministrar ao povo sangrado aquele incremento são de corpo e de espirito que favorece a vida e a educação dos filhos, e sem o qual o porvir da pátria está ameaçado de triste ocaso.

23. A penosa irregularidade de trabalho e de vida, longe de Deus e da sua graça, lisonjeada e extraviada pelo mau exemplo, insinua e prepara um pernicioso relaxamento das relações conjugais e familiares, de modo que o tóxico da luxúria trata de envenenar agora, muito mais que antes, o manancial sagrado da vida. Destes dolorosos fatos e perigos se deduz com dura experiência como, quando por um lado o robustecimento da família e do povo se costumava considerar em muitas nações como um dos fins mais nobres, se difundam, em vez disso, e crescem espantosamente, um atrofiamento físico e uma perversão espiritual, que, só mediante ação curativa e educativa de várias gerações, poderão lentamente, pelo menos em parte, desaparecer. Se o conflito bélico causou, em tantos, ruínas tão vastas de corpo e de espírito, não perdoou aos ávidos da opulência e do mero prazer da vida, que estão agora mudos e perplexos perante as destruições que caíram também sobre os seus bens como furacão devastador: riquezas e lares exterminados a ferro e fogo, vida cômoda e de prazeres desaparecida, trágico o presente, e o porvir com poucas esperanças e muitos temores.

24. Mais triste é a visão que perturba e espanta os que aspiraram a possuir força e predomínio: agora contemplam com terror o oceano de sangue e lágrimas que banha o mundo, as sepulturas e fossas de cadáveres multiplicadas e espalhadas por todas as regiões da terra e ilhas dos mares, o lento extinguir-se da civilização, o progressivo desaparecer do bem-estar, mesmo material, a destruição de insignes monumentos e nobilíssimos edifícios de arte soberana, que podiam chamar-se patrimônio comum do mundo civilizado; os ódios que se acirram e aprofundam e inflamam os povos uns contra os outros, e não permitem esperar nenhum bem para o porvir.