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9. Com viva e angustiosa ansiedade temos infelizmente de contemplar,
sob os Nossos olhos, as ruínas espirituais que se vão acumulando por
causa duma vasta aluvião de idéias, que mais ou menos voluntária e
veladamente obscurecem e deformam a verdade no espirito de tantos
indivíduos e povos, arrastados ou não pela guerra; e assim pensamos
no imenso trabalho que será preciso dispender - quando o mundo,
cansado de guerras, quiser restabelecer a paz - para derruir as
muralhas ciclópicas da aversão e do ódio que se levantaram no ardor
da luta.
10. Conscientes dos excessos, a que abrem caminho e arrastam
inelutavelmente as doutrinas e obras duma política que não faz caso da
lei de Deus, Nós, como sabeis, desde que estalaram as ameaças de
conflitos, com todo o ardor da Nossa alma, esforçamo-Nos até ao
fim por evitar o pior e persuadir os homens, que tinham nas suas mãos
a força e sobre os ombros uma pesada responsabilidade, de que
evitassem um conflito armado e poupassem o mundo de desgraças não
fáceis de prever. Os Nossos esforços e os que Nos chegaram doutras
partes influentes e respeitadas não alcançaram o efeito que se
esperava, sobretudo porque pareceu irremovível a profunda
desconfiança, desmesuradamente desenvolvida nas almas durante os
últimos anos, a qual levantara barreiras espirituais intransponíveis
entre os povos.
11. Não eram .insolúveis os problemas, que se agitavam entre as
nações; mas aquela desconfiança, oriunda de uma série de
circunstâncias particulares, impedia, quase com força
irresistível, que ainda se tivesse fé na eficácia de eventuais
promessas e na duração e vitalidade de possíveis convenções. A
recordação da vida efêmera e agitada de semelhantes negociações ou
acordos acabou por paralisar todos os esforços capazes de conduzir a
uma solução pacifica.
12. Não Nos resta, Veneráveis Irmãos e queridos filhos,
senão repetir com o profeta: Exspectavimus pacem, et non est
borram, et tempos curationis, et ecce turbatio (Jer 14, 19),
e trabalhar, tanto quanto pudermos, em aliviar as desventuras que
nascem da guerra, ainda que tal ação seja muito difícil por causa da
impossibilidade, não vencida ainda, de levar o socorro da caridade
cristã às regiões, onde a necessidade é maior e mais urgente. Com
inexprimível angústia, desde há quatro meses, vemos esta guerra,
que começou e prossegue em condições tão insólitas, acumular
ruínas trágicas. E se até aqui - excetuado o solo ensangüentado
da Polônia e da Finlândia - o número de vitimas pode
considerar-se inferior ao que se esperava, a soma de dores e
sacrifícios chegou ao ponto de inspirar viva ansiedade naqueles que se
preocupam com o futuro estado econômico, social e espiritual da
Europa, e não só da Europa. Quanto mais o monstro da guerra
procura, absorve e chama a si os meios materiais, que inexoravelmente
vêm sendo todos postos ao serviço das necessidades da guerra cada vez
maiores, tanto mais direta ou indiretamente as nações feridas peto
conflito correm o perigo, diríamos, de uma anemia perniciosa: e
vem-Nos então a pergunta torturante: - como poderá uma economia
exausta e extenuada achar, depois da guerra, os meios necessários
para a reconstrução econômica e social, no meio das dificuldades que
aumentarão enormemente por toda parte, e das quais as forças e a arte
dos inimigos da ordem, sempre alerta, tentarão aproveitar-se, na
esperança de poder dar à Europa cristã o golpe decisivo?
13. Semelhantes considerações do presente e do futuro devem
prender a atenção, até na febre da luta, dos governantes e da parte
sã de todos os povos, e movê-los a examinar os efeitos e a refletir
sobre os fins e as finalidades justificáveis da guerra.
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