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5. As condições presentes exigem de Nós um juízo franco e
sincero dos fatos. Estes, de fato, atingiram tal gravidade que nos
obrigam a ver o mundo dividido em dois campos opostos, e a humanidade
inteira dividida em dois grupos tão profundamente separados, que
dificilmente se permite a mínima liberdade de manter qualquer atitude
de neutralidade política entre as partes adversas.
6. Ora, os que erroneamente consideram a Igreja potência terrena
como as outras, uma espécie de império mundial, facilmente chegam a
exigir dela, como das demais, a renúncia à neutralidade e a opção
definitiva a uma das partes contrárias. Não é lícito todavia
pretender que a Igreja renuncie à neutralidade política, pela
simples razão de ela não poder vir a colocar-se ao serviço de
interesses puramente políticos.
7. Nem se vá crer que se está a jogar com palavras ou conceitos.
Basta possuir uma noção elementar do fundamento em que se baseia a
Igreja como sociedade, para compreender o Nosso pensamento, sem
necessidade de explicações ulteriores. O divino Redentor fundou a
Igreja para comunicar à humanidade a sua verdade e a sua graça, até
ao fim dos tempos. A Igreja é o seu "corpo místico". E' toda
de Cristo e Cristo de Deus (cf. 1 Cor 3, 23).
8. Políticos, e porventura até homens da Igreja, que
pretendessem tornar a Esposa de Cristo aliada sua ou instrumento das
suas combinações políticas, nacionais ou internacionais, iriam
contra a essência mesma da Igreja e prejudicar-lhe-iam a vida; numa
palavra, abaixá-la-iam até ao plano de debate dos conflitos movidos
por interesses temporais. E isto é sempre verdade, ainda quando se
realiza por fins e interesses em si legítimos.
9. Quem portanto quisesse apartar a Igreja da sua suposta
neutralidade, ou fazer pressão sobre ela na questão da paz, ou
diminuir-lhe o direito de determinar livremente se quer tomar partido
nos vários conflitos, quando e como, não lhe facilitaria com isso a
cooperação na obra da paz. A Igreja de fato não pode nunca
pronunciar-se em coisas políticas por motivos puramente políticos,
mas só "sub specie aeternitatis", à luz da lei divina, da sua
ordem, dos seus valores e das suas normas.
10. Potências e instituições puramente terrenas não raro saem da
neutralidade para declarar-se hoje por um campo e amanhã talvez pelo
oposto. jogo de combinações, que pode explicar-se pela variação
incessante de interesses temporais. Mas a Igreja mantém-se longe de
tais combinações mudáveis. Se é verdade que chega a
pronunciar-se, não o faz porque abandone a neutralidade anteriormente
observada, mas porque Deus não é nunca neutral a respeito das coisas
humanas e do curso da história, e portanto também o não pode ser a
sua Igreja. Se esta fala, é em virtude da sua missão divina,
imposta por Deus. Se fala e julga de problemas do dia, fá-lo com
clara consciência de antecipar, por virtude do Espírito Santo, as
sentenças que no fim dos tempos serão confirmadas e sancionadas pelo
seu Senhor e Cabeça, juiz do universo.
11. Esta é a função própria e sobre-humana da Igreja com
respeito às coisas políticas. Que quer, portanto, dizer essa frase
vazia que lhe exige renúncia à neutralidade?
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