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25. Primeiro. A hora presente exige imperiosamente a
colaboração, boa vontade e recíproca confiança de todos os povos.
Os motivos de ódio, vingança, rivalidade, antagonismos de desleal
e baixa competência devem ser alheios às discussões e resoluções
políticas e econômicas. "Quem poderá dizer -perguntamos com a
Sagrada Escritura (Prov 29, 10) -: O meu coração está
limpo e estou puro de todo o pecado? Duplo peso e dupla medida são
duas coisas que Deus abomina". Assim quem exige a expiação de
culpas, como justo castigo de criminosos em razão dos seus delitos,
deve procurar com todo o empenho não fazer o mesmo que condena nos
outros como crime ou delito. Quem quer reparações deve pedi-las com
base na ordem moral, no respeito dos direitos naturais invioláveis,
que perduram até para os que se renderam sem condições ao vencedor.
Quem pede segurança para o futuro não deve olvidar que a sua única e
verdadeira garantia consiste na própria força interna, ou seja: na
proteção à família, aos filhos e ao trabalho, no amor fraternal,
na suspensão de todo o ódio, de toda a perseguição ou vexação
injusta de honrados cidadãos, na leal concórdia entre os Estados e
entre os povos.
26. Segundo. Para este fim é necessário que em toda a parte se
renuncie a criar artificialmente, com o poder do dinheiro, duma
arbitrária censura, de juízos unilaterais e falsas afirmações, o
que se chama opinião pública, que move o pensamento e a vontade do
eleitorado como canas agitadas pelo vento. Dê-se o devido valor à
verdadeira e grande maioria formada por todos aqueles que vivem honrada
e pacificamente dó seu trabalho e com suas famílias e desejam cumprir
a_ vontade divina. Aos seus olhos, as divergências por fronteiras
mais favoráveis, a luta pelos tesouros da terra, se não são
necessariamente e "a priori" imorais por si mesmos, constituem sempre
um jogo perigoso que não se pode afrontar senão com o perigo de
ocasionar um mundo de mortes e de ruínas. Esta é a grande maioria
dos bons pais e mães de família, que querem proteger e defender o
porvir de seus próprios filhos contra as pretensões de toda a
política de pura força, contra os arbítrios do totalitarismo do
Estado forte.
27. Terceiro. A força do Estado totalitário! Cruel e
sanguinária ironia. A superfície inteira do globo, manchada com o
sangue derramado nestes terríveis anos, proclama bem alto a tirania
desse Estado.
28. Os alicerces do edifício da paz ameaçariam sempre afundar-se
se não se pusesse fim a semelhante totalitarismo, para o qual o homem
não passa de uma ficha insignificante no jogo político e um número
nos cálculos econômicos. Com um traço de pena desfaz as fronteiras
dos Estados; por uma decisão perentória subtrai a economia de um
povo, sempre parte integrante de toda a vida nacional, às suas
possibilidades naturais; com uma mal dissimulada crueldade despoja das
suas casas e terras milhões de homens, lança centenas de milhares de
famílias na mais mísera indigência e destrói uma civilização e
cultura para cuja elaboração trabalharam muitas gerações. O mesmo
absolutismo põe também limites arbitrários à necessidade e ao
direito da migração e ao desejo de colonização. Tudo isto
constitui um sistema contrário à dignidade e ao bem do gênero
humano. E, sem embargo, segundo a ordenação divina, o senhor do
mundo não é nem a vontade nem a potência de fortuitos e mutáveis
grupos de interesses, mas o homem no meio da família e da sociedade,
com seu trabalho. Destarte, aquele totalitarismo falha no que é a
única medida do progresso, que é criar sempre maiores e melhores
condições públicas para. que a família possa existir e
desenvolver-se como uma unidade econômica, jurídica, moral e
religiosa.
29. Dentro das fronteiras de cada nação, como no seio da grande
família dos povos, o totalitarismo do Estado forte é incompatível
com uma verdadeira e sã democracia. Como um bacilo perigoso envenena
a comunidade de nações e torna-a incapaz de garantir a segurança de
cada um dos povos. Representa um contínuo perigo de guerra. A
futura organização de paz quer desterrar do mundo todo o uso agressivo
da força, toda a guerra de agressão. Quem deixará de saudar de
coração semelhantes propósitos e especialmente sua eficaz atuação!
Porém, para que se passe além de uma magnífica intenção, há que
excluir toda a opressão e todo o arbítrio, tanto de dentro como de
fora.
30. Em face deste :negável estado de coisas, só resta uma
solução: o regresso a Deus e à ordem estabelecida por Deus.
Quanto mais se desvendam e conhecem o surgir e o crescer das forças
que desencadearam a guerra, tanto mais claramente se vê que eram elas
as herdeiras, portadoras e continuadoras de erros, cujo elemento
essencial era o abandono, a subversão, a negação e o desprezo do
pensamento e dos princípios cristãos.
31. Se é esta, pois, a raiz do mal, o remédio é simples:
voltar à ordem posta por Deus nas relações entre Estados e povos e
regressar a um verdadeiro cristianismo no Estado e entre os Estados.
Nem se alegue que não é realista esta política. A experiência já
devia ter ensinado a todos que a política orientada pelas eternas
verdades e as leis de Deus é a mais real e concreta de todas as
políticas. Os políticos realistas que pensam diversamente não
semeiam senão ruínas.
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