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1. Finalmente terminou esta terrível guerra que amarrou a Europa
com os laços do mais horrível e tremendo sofrimento, durante quase
seis anos. Uma profunda e humilde exclamação de gratidão ergue-se
do fundo de nosso coração para o "Pai das misericórdias e Deus de
toda consolação" (2Cor 1,3). Com nossos agradecimentos,
fazemos também uma prece fervorosa, implorando da bondade e
onipotência divina o fim, segundo justiça, das sangüinárias lutas
também no Extremo Oriente.
2. Ajoelhados diante dos túmulos e dos despenhadeiros revolvidos e
manchados de sangue, onde jazem os restos de inúmeros seres humanos
que tombaram vítimas das batalhas ou dos massacres desumanos ou presa
da fome e da miséria, em nossas orações, e especialmente no santo
sacrifício, lembramo-nos deles e oramos a Jesus Cristo, seu
salvador e seu juiz. Os que tombaram parecem admoestar os
sobreviventes deste conflito desumano e dizer-lhes: que os plasmadores
e arquitetos de uma Europa nova e melhor surjam de nossos túmulos e da
terra sobre a qual estamos espalhados, como sementes de trigo. Que
surja um mundo novo e melhor baseado no temor filial de Deus, na
fidelidade a seus santos mandamentos, no respeito à dignidade humana e
aos direitos comuns de todos os povos e de todos os estados, grandes ou
pequenos, fracos ou fortes.
3. A guerra criou um caos de ruínas, tanto no sentido moral como no
material, tão grande como nunca antes a humanidade testemunhara no
decorrer de toda sua longa história. Chegou agora o momento de
reconstruir o mundo. Como primeira pedra fundamental deste processo de
restauração, desejamos ver - após tão longa espera - até onde as
circunstâncias permitirem, um pronto regresso dos prisioneiros de
guerra e de outros internados, soldados ou civis, para seus lares, a
suas esposas, a seus filhos e ao nobre trabalho da paz.
4. Dizemos; portanto, a todos: não permitais que vossa coragem
vacile e que vossa energia decaia. Lançai-vos animadamente ao
trabalho de reconstrução. Permiti que vosso trabalho seja sustentado
pela divina Providência. Mãos ao trabalho, cada um em seu lugar;
resoluto e tenaz, com o coração animado por um indestrutível amor
por seu próximo. Certamente difícil, mas ao mesmo tempo santa, é
a tarefa que vos espera, de reparar os efeitos imediatos e desastrosos
da guerra, de transformar em bem seus mil e um desastrosos efeitos.
Queremos nos referir à decadência da ordem pública, à miséria e
à fome, à brutalização dos costumes e à falta de discïplina entre
os jovens. Fazendo isso, pouco a pouco preparareis para vossas
cidades e vossas aldeias, para vossas províncias e vossas pátrias,
um futuro mais aceitável e o vigor de um sangue rejuvenescido.
5. Com as ameaças ocultas de morte afastadas da terra, dos mares e
do céu, e, daqui por diante, assegurada pela deposição das armas,
a vida do homem, criatura de Deus e do que lhes resta de propriedade
privada e comum, os homens podem agora manter seu espírito e sua mente
livres para a edificação da paz.
6. Considerando a Europa isoladamente, encontramonos face a face
agora com problemas e dificuldades gigantescas que deverão ser vencidas
se desejarmos abrir caminho para uma paz verdadeira - a única paz que
pode ser duradoura. Esta não pode realmente florescer e prosperar
senão numa atmosfera de segurança e perfeita fidelidade, aliada a uma
confiança recíproca, à compreensão mútua e à benevolência. A
guerra fez surgir por toda parte a discórdia, a suspeita e o ódio.
Assim sendo, se o mundo desejar conquistar a paz, devem desaparecer
as falsidades e os rancores e em seu lugar devem reinar a verdade e a
caridade.
Acima de tudo, porém, em nossas preces diárias, devemos
constantemente suplicar ao Deus do amor que cumpra sua promessa feita
pela boca de Ezequiel: "Dar-lhes-ei um só coração, porei no
seu íntimo um espírito novo: removerei do seu corpo o coração de
pedra, dar-lhes-ei um coração de carne, a fim de que andem de
acordo com os meus estatutos e guardem as minhas normas e as cumpram.
Então serão o meu povo e eu serei o seu Deus" (Ez
11,19-20). Que o Senhor se digne criar esse novo espírito,
o seu espírito; nos povos e particularmente no coração daqueles aos
quais foi confiada a responsabilidade de estabelecer a futura paz!
Somente então o mundo renascido evitará a repetição do tremendo
flagelo e haverá um reinado de fraternidade verdadeira, estável e
universal, aquela paz garantida pelo Cristo, também aqui na terra a
quem quiser acreditar e esperar na sua lei de amor.
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