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O Filósofo afirma ter aprovado razoavelmente a
divisão das melodias musicais [tomando-a] segundo a divisão
de outros experientes na Filosofia que as dividiram dizendo
algumas serem morais ou disponentes aos costumes, outras
serem práticas, isto é, capazes de produzir as paixões [como]
a ira e a mansidão, enquanto que outras produzem o rapto, as
quais tornam o ouvinte como que imóveis e insensíveis, e mais
requintadamente assinalando uma melodia e harmonia
determinada a cada uma das mesmas, dizendo que naturalmente a
melodia frígia produz o rapto, a melodia lídia mista dispõe
ao pranto e à compaixão e a dórica ao costume.
Dissemos também que a música não deve ser
procurada de modo simples por causa de uma só utilidade, nem
deve ser usada por causa de uma só, mas por causa de muitas.
A música, de fato, deve ser usada por causa da atividade
lúdica, da purificação e para a dedicação, isto é, a
deleitação intelectual, e para os costumes.
O que o Filósofo entende por purificação é [neste
tratado de Política] simplesmente suposto, mas no tratado de
Poética Aristóteles trata mais manifestamente do mesmo. A
purificação é, de fato, a corrupção de alguma paixão nociva
existente. Ora, como a corrupção de algo se dá pela geração
de outro, deve-se entender que a purificação seja a corrupção
de uma paixão pela geração de [outra] contrária, assim como a
corrupção da ira se dá pela geração da mansidão.
Tudo isto suposto, o Filósofo declara quais
harmonias devem ser usadas na disciplina musical.
Para o abrandamento do trabalho e a distensão do
repouso deve-se usar universalmente de todas as harmonias
musicais para os homens que são bem dispostos segundo a
natureza. Todas as harmonias da música que consistem em uma
razão média quanto ao sentido, o qual semelhantemente
consiste em uma certa razão média, parecem induzir a
deleitação naqueles que possuem os sentidos bem dispostos
pela natureza.
Mas para a disciplina e os costumes deve-se usar
maximamente as [melodias] morais, [tanto] práticas [como]
raptivas, isto é, as que conduzem de alguma paixão ao seu
contrário ou ao termo médio.
As [melodias] que devem ser usadas na disciplina,
a qual é deleitável como uma atividade lúdica, são as
[melodias] morais e as harmonias que dispõe à mesma. Esta é a
que chamamos de [melodia] dórica, conforme dissemos antes e
ficará claro mais adiante. Portanto, para a disciplina deve
ser usada esta [melodia], acrescentando-lhes algumas, se
outras forem aproveitadas como convenientes por homens
experientes no exercício filosófico e na disciplina musical.
A melodia dórica é a maximamente moral. Todos
universalmente reconhecem que a melodia dórica é aquela que
entre todas as melodias é a que existe mais estavelmente. Por
este motivo convém com a virtude para a qual se requer a
constância da mente nas coisas que são segundo a razão, e
maximamente possui o costume viril, isto é, virtuoso. A
melodia dórica possui razão de termo médio em comparação com
as demais, pois não é tão aguda como a que é dita lídia
mista, que é a melodia de sétimo tom, nem tão profunda na
gravidade, como a hipodórica ou a hipofrígia, que são do
segundo ou do quarto tom. É, portanto, manifesto que é a
maximamente louvável e a que deve ser buscada, como algo
disponente à virtude, por causa do que os jovens devem ser
maximamente exercitados nela.
Não se deve usar, porém, de qualquer melodia moral
de qualquer modo por qualquer um, mas devem ser usadas
segundo determinações diversas segundo a diversidade das
idades. Há duas coisas pelas quais devem ser determinadas,
que são o possível e o adequado; de fato, entre todos os bens
operáveis importa mais operar aqueles que são possíveis ao
que opera, e aqueles que são mais condizentes com o próprio
operante. A possibilidade e a adequação se distinguem segundo
a diversidade das idades. Algumas coisas, de fato, são
possíveis ao homem perfeito e condizentes com ele, que não
seriam possíveis ao jovem nem condizentes com este.
Foi por este motivo que alguns músicos posteriores
reprovaram corretamente a Sócrates por ter este reprovado
toas as harmonias brandas dizendo que elas seriam como que
inebriativas dos homens. A ebriedade, porém, produz duas
coisas no homem, que são a impetuosidade do movimento e o
abandono da sobriedade e da disposição natural; Sócrates
certamente queria dizer que estas melodias eram inebriantes
não segundo a impetuosidade, porque tais melodias brandas não
induzem esta impetuosidade no homem, mas chamava-as de
inebriantes porque afastava o ouvinte da igualdade e do termo
médio.
Isto dizia Platão, [seguindo a Sócrates seu
mestre], como se todos os homens sempre existissem no estado
de igualdade média segundo a natureza e ninguém se afastasse
jamais do mesmo. Se, de fato, assim fosse, a ninguém conviria
usar de harmonias brandas. Mas porque alguns homens estão no
estado de igualdade, enquanto que outros declinam do mesmo
pela velhice ou por outro modo, e cada um se deleita naquilo
que lhe é conveniente segundo a natureza, conforme já
explicado anteriormente, não convém portanto que todos se
utilizem de melodias médias, mas a alguns convém usar de
melodias brandas médias, de tal modo que para os idosos que
se afastam da igualdade mencionada e são fracos de virtude
[corporal] convém usar melodias e harmonias brandas.
Quanto aos jovens, se há uma harmonia média não
branda que é adequada para a idade das crianças, que tenha
algum ornamento pela razão da consonância que deleita e pela
disposição à doutrina ou disciplina, a harmonia que
maximamente parece possuir esta força é a que é denominada de
lídia, que é a cantilena do quinto tom.
É manifesto que na música que dispõe à disciplina
é necessário preexistir três coisas: que tenha razão de termo
médio entre o agudo e o grave, que seja possível ao próprio
usuário e adequada à sua própria condição.
Se assim for a música, é manifesto que os que se
utilizam dela mais se inclinarão à virtude e aos costumes,
inclinados à virtude mais operarão segundo a razão e operando
segundo a razão facilmente alcançarão a felicidade que
consiste na perfeitíssima operação do homem segundo a sua
suprema virtude em relação ao seu perfeitíssimo objeto. Este
é Deus, bendito pelos séculos dos séculos.
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