23. Como não acontece que se possua muitos amigos segundo a amizade perfeita.

[Aristóteles coloca] três razões pelas quais não sucede que alguém tenha muitos amigos segundo a amizade perfeita, que é a amizade por causa do bem da virtude.

[Primeira razão: não é possível amar superabundantemente a muitos]. A amizade por causa do bem e da virtude, sendo perfeita e máxima, possui semelhança a uma certa superabundância no amar, se considerarmos a quantidade do amor. Se, porém, considerarmos a razão e amar, não pode haver superabundância, pois não pode aconteer que um homem de virtude, que ordena seus afetos pela razão, ame a um ou outro homem de virtude de modo [excessivo]. Porém, conforme dito, considerada pela quantidade, há uma certa superabundância no amar. Ora, o amor superabundante não pode sê-lo a muitos, ma a um somente. Portanto, [segundo] a perfeita amizade entre [homens] bons, [não podemos ter] muitos [amigos].

[Segunda razão: não há muitas pessoas em que não haja algo que desgoste ao amigo]. Segundo a perfeita amizade, os amigos se gostam imensamente. Não é fácil, entretanto, que simultaneamente muitos se gostem imensamente, porque não se encontram muitas pessoas nas quais não se encontre algo que desgoste ao homem de alguma forma, por causa dos muitos defeitos dos homens, e das contrariedades deles entre si. Portanto, não pode haver muitos amigos segundo a perfeita amizade.

[Terceira razão: é difícil conhecer por experiência a muitas pessoas]. Na amizade perfeita é necessário pelo costume ter experiência do amigo. Ora, isto é muito difícil, e assim não pode acontecer muitas vezes. Portanto, não pode haver muitos amigos segundo a amizade perfeita.