|
É bastante manifesto quanto poder possuem e como
são causa de sedição a honra e o lucro. De fato, ocorre que
os governantes injuriem aos cidadãos, e que os excedam pelas
honras e pelo lucro, por causa do que os cidadãos promovem
sedições contra o príncipe e contra a república. Contra o
príncipe, porque injuria e possui a excelência de modo
injusto, contra a república, porque é por ela que o príncipe
possui o poder. Os homens, portanto, promovem sedições por
causa da injúria e do lucro.
Quanto à honra, é manifesto também quanto poder
tenha e como é causa de sedição. Quando alguns não são
honrados e vêem a outros honrados, promovem sedições.
Os homens também promovem sedições por causa do
excesso. Quando alguém é maior em poder, seja este um ou
vários que tenham poder, estes promoverão a sedição. É a
partir de homens como estes que ocorre às vezes fazer-se uma
monarquia, o que é evidente, porque cada um de inclina à
própria excelência. Quando, portanto, há alguém assim, que se
sobressai sobre os demais em poder, ou em amigos, ou em
riquezas, procurará mudar a república em monarquia ou, se não
fizer uma monarquia, fará algumas vezes um potentado em que
dominarão os [homens] muito ricos e poderosos, não segundo a
lei, mas segundo as suas vontades. É este o motivo pelo qual
em algumas cidades, como em Argos e Atenas, tais pessoas
excelentes eram banidas. Teria sido melhor, todavia, que
tivesse sido ordenado, desde o princípio, que não houvesse
ninguém na cidade que tanto excedesse, e até que limite
poderia exceder do que ter que baní-los, assim como nos
remédios é melhor prevenir desde o princípio para que nenhuma
doença se exacerbe, do que depois de crescida e ultra[passado
limites perigosos, somente então expelir a mesma e curar o
doente.
Os homens também promovem sedições na cidade por
causa do temor. Quando, de fato, alguns causam injúrias a
outros, temendo ser punidos e que se lhes arme uma vingança,
passam a promover a sedição, para que pela sedição movida
possam fugir e não ser punidos. Semelhantemente, se alguns
hão de sofrer injustiças, ou temem que venham a sofrê-las,
antes que venham a padecê-las, querendo prevenir-se, promovem
a sedição e turbam a república, antes de sustentarem as
injúrias. Assim sucedeu na Ilha de Rodes, onde os ricos se
reuniram contra o povo, temendo as sentenças que deviam ser
dadas contra eles, e turbaram a república.
Os homens também se dispõem à sedição por causa do
desprezo. O Filósofo afirma que os homens, por causa do
desprezo, fazem sedições e se insurgem. É manifesto que todos
querem ser reputados como algo e, por isso, se forem
desprezados, movem sedições, como ocorre no estado de poucos
e na potência popular. No estado de poucos, no qual há muitos
que participam do principado, aqueles que são ricos e possuem
o principado desprezam os outros que não governam e por isso
incitam os outros à dissensão, causa pela qual fazem-se
sedições contra os ricos e mudam a república.
Semelhantemente ocorre no estado popular. Aqueles
que são mais ricos desprezam os menores que são ou parecem
ser destituídos de razão e ordem, como a pessoas indignas do
principado, por causa do que incitam a que sejam dissolvidos.
Foi assim que aconteceu em Tebas; depois da guerra que houve
em Enofitis, passando o povo a governar, excedeu-se e
governou mal, pelo que os ricos fizeram uma sedição e mudaram
o estado popular.
A sedição pode também ser causada pelo [aumento
ou] excrescência além das proporções. A excrescência que se
dá além das proporções ocasionam às vezes sedições e
corrupções das repúblicas. Se os ricos crescerem além das
proporções, ou também os virtuosos ou os pobres, poderá
ocorrer uma transmutação da república. Isto é evidente
porque, assim como o corpo se compõe de muitas partes, assim
também a cidade é composta de partes. Ora, isto é de tal modo
que é necessário que o corpo composto do animal aumente
segundo a proporção, de tal modo que se conserve a reta
proporção e a comensuração de seus membros. Se as partes não
aumentarem proporcionalmente, corromper-se-á o animal. Se o
animal crescer improporcionalmente segundo a quantidade, a
virtude ou a qualidade, transmutar-se-á na forma de outro
animal. Semelhantemente ocorre na cidade, que é composta de
partes. Por esse motivo, se esta deve salvar-se, importa que
seja composta de partes comensuradas entre si. Às vezes,
porém, a multidão excederá, como ocorre no estado popular e
na república e, neste caso, corromper-se-á o estado de poucos
e se fará o estado popular ou a república. Outras vezes a
excrescência não é segundo a quantidade, mas segundo a
qualidade, assim como quando há alguns ricos muito excelentes
em poder e, neste caso, corromper-se-á o estado popular e
far-se-á o estado de poucos. Esta excrescência, às vêzes,
ocorre por causa da sorte, como ocorreu na cidade de Tarento.
Tendo ela ido à guerra e muitos nobres e ricos sendo mortos
pelos Iapigêncios, fêz-se de um estado popular uma potência
de poucos e assim, por causa da sorte, além de qualquer
intenção, o povo cresceu além das proporções e mudou a
república.
|
|