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O bem move o apetite na medida em que é
apreendido. Assim como o apetite ou inclinação natural segue
a forma que é inerente por natureza, assim o apetite animal
segue a forma apreendida. Portanto, para que algo seja
apetecido, pré exige-se que seja apreendido como bem. De onde
que cada um deseja aquilo que parece para si ser bem. Ora,
aqui alguém poderá dizer que não está em nosso poder que isto
[ou aquilo] nos pareça [como] bem, já que não somos senhores
da fantasia, mas tal como cada um é, tal ou tal coisa lhe
parecerá apetecível como bem e fim. Por exemplo, observamos
que nos animais cada animal apetece alguma coisa [diferente]
como bem e fim de acordo com a disposição de sua natureza, de
onde que diversos animais terão diversos atos e operações,
embora todos os animais de uma espécie tenham movimentos e
operações semelhantes. Já na espécie humana são encontrados
diversos homens tendo diversos movimentos e operações. Deste
fato alguns pensaram que isso fosse por causa de uma
disposição natural que a um homem isto lhe pareceria como
bem, enquanto que a outro homem esta outra coisa lhe
pareceria como bem, de tal maneira que quanto a isto o homem
não teria domínio ou poder.
Aristóteles discorda desta opinião dos filósofos.
Para mostrar isto, deve-se primeiramente considerar que algo
pode parecer a alguém como bem de duas maneiras. De uma
primeira maneira, universalmente, como através de certas
considerações especulativas. O julgamento do bem que provém
deste primeiro modo não é conseqüência de nenhuma disposição
particular, mas da força universal da razão silogizante [em
coisas tais como ] as operações que são pela natureza. Mas
nas operações que são contingentes, a razão não é coagida a
consentir nisto ou naquilo, como acontece nos [raciocínios]
demonstrativos, pois o homem tem poder de assentir a uma ou a
outra parte da contradição. Daí que de um segundo modo, algo
poderá parecer a alguém como bem através de um conhecimento
prático por comparação à obra [opus]. É deste tipo de
julgamento que Aristóteles aqui pretende falar. Segundo este
modo de julgamento, alguém pode ser levado [a reconhecer]
algo como bem de duas maneiras: de uma primeira maneira
[reconhecerá] algo como bem de modo simples e segundo se, e
de uma segunda maneira não de modo simples e segundo se, mas
enquanto o agora. [Estes dois modos correspondem a] dois
modos do apetite ser a algo inclinado: o primeiro segundo o
hábito, e o segundo segundo as paixões da alma. Segundo as
paixões da alma acontecerá que alguém julga algo como bem
[por causa] do agora. Por exemplo, aquele que teme o
afundamento do navio, por causa da paixão do temor lhe
parecerá bem por causa do agora, que joge a bagagem ao mar, e
o concupiscente que fornique. Segundo o hábito provém o juízo
pelo qual o homem julga ao ser bom segundo se e de modo
simples, e é deste que Aristóteles fala aqui. Como o homem de
alguma forma é causa de seu mau hábito por causa de seu
costume de pecar, por conseqüência também será causa de sua
fantasia conseqüente a tal hábito, isto é, das aparições
pelas quais a si lhe parecerá ser isto bem per se. [De onde
que não é verdade que o homem não tem domínio sobre o que a
si lhe parece como bem].
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