6. Um erro em que caíram alguns filósofos.

Já que o homem é o que é segundo a razão, pareceu a alguns que o homem somente faz voluntariamente e per se aquilo que ele faz segundo a razão. [Segundo o que pensaram os que colocaram isto], quando o homem faz algo contra a razão por causa da concupiscência de alguma deleitação, ou por causa do desejo de algum bem exterior, o homem está fazendo algo [movido pela] violência. Portanto, [segundo esta opinião], as coisas deleitáveis e os bens exteriores, como as riquezas, são fazedoras de violência, na medida em que, sendo exteriores, coagem o homem a agir contra a razão.

Segundo Aristóteles, a opinião precedente é errônea, o que irá ser evidenciado através de quatro argumentos.

[Primeiro argumento]. Se as coisas exteriores, na medida em que são deleitáveis e parecem bens, são [causas de] violência, seguir-se-á que tudo o que agimos é por violência e que nada é voluntário: porque todos os homens, qualquer coisa que operem, operam por causa de algo deleitável, ou por causa de algo que de algum modo [é um] bem.

[Segundo argumento]. Tudo o que é operado pela violência e de modo involuntário é operado com tristeza. De fato, já no quinto livro da Metafísica se dizia que a necessidade é contristante, porque contrária à vontade. Ora, aqueles que operam para alcançar algo de deleitável, operam com deleitação. Portanto, não podemos operar isto por violência e não querendo.

[Terceiro argumento]. É ridículo colocar a causa nos bens exteriores e não acusar a si mesmo por tornar-se volúvel e deixar-se vencer por tais deleitações. De fato, a nossa vontade não é movida por necessidade por tais deleitações, ao contrário, pode apegar-se ou não a elas, pelo fato que nenhuma delas tem razão de bem universal e perfeito, assim como a felicidade, a qual é querida por todos necessariamente.

[Quarto argumento]. É igualmente ridículo que alguém afirme que ele mesmo é a causa das operações boas e virtuosas, e que as [coisas] deleitáveis sejam a causa das operações torpes, na medida em que atraem a concupiscência. Isso é ridículo porque as operações contrárias se reduzem a uma mesma potência racional como a uma causa. Por isso, se o próprio agente é a causa das operações virtuosas, ele terá que ser também a causa das operações viciosas ao seguir [suas] paixões.