8. As causas que dispõem indiferentemente à dissensão oculta e manifesta.

É bastante manifesto quanto poder possuem e como são causa de sedição a honra e o lucro. De fato, ocorre que os governantes injuriem aos cidadãos, e que os excedam pelas honras e pelo lucro, por causa do que os cidadãos promovem sedições contra o príncipe e contra a república. Contra o príncipe, porque injuria e possui a excelência de modo injusto, contra a república, porque é por ela que o príncipe possui o poder. Os homens, portanto, promovem sedições por causa da injúria e do lucro.

Quanto à honra, é manifesto também quanto poder tenha e como é causa de sedição. Quando alguns não são honrados e vêem a outros honrados, promovem sedições.

Os homens também promovem sedições por causa do excesso. Quando alguém é maior em poder, seja este um ou vários que tenham poder, estes promoverão a sedição. É a partir de homens como estes que ocorre às vezes fazer-se uma monarquia, o que é evidente, porque cada um de inclina à própria excelência. Quando, portanto, há alguém assim, que se sobressai sobre os demais em poder, ou em amigos, ou em riquezas, procurará mudar a república em monarquia ou, se não fizer uma monarquia, fará algumas vezes um potentado em que dominarão os [homens] muito ricos e poderosos, não segundo a lei, mas segundo as suas vontades. É este o motivo pelo qual em algumas cidades, como em Argos e Atenas, tais pessoas excelentes eram banidas. Teria sido melhor, todavia, que tivesse sido ordenado, desde o princípio, que não houvesse ninguém na cidade que tanto excedesse, e até que limite poderia exceder do que ter que baní-los, assim como nos remédios é melhor prevenir desde o princípio para que nenhuma doença se exacerbe, do que depois de crescida e ultra[passado limites perigosos, somente então expelir a mesma e curar o doente.

Os homens também promovem sedições na cidade por causa do temor. Quando, de fato, alguns causam injúrias a outros, temendo ser punidos e que se lhes arme uma vingança, passam a promover a sedição, para que pela sedição movida possam fugir e não ser punidos. Semelhantemente, se alguns hão de sofrer injustiças, ou temem que venham a sofrê-las, antes que venham a padecê-las, querendo prevenir-se, promovem a sedição e turbam a república, antes de sustentarem as injúrias. Assim sucedeu na Ilha de Rodes, onde os ricos se reuniram contra o povo, temendo as sentenças que deviam ser dadas contra eles, e turbaram a república.

Os homens também se dispõem à sedição por causa do desprezo. O Filósofo afirma que os homens, por causa do desprezo, fazem sedições e se insurgem. É manifesto que todos querem ser reputados como algo e, por isso, se forem desprezados, movem sedições, como ocorre no estado de poucos e na potência popular. No estado de poucos, no qual há muitos que participam do principado, aqueles que são ricos e possuem o principado desprezam os outros que não governam e por isso incitam os outros à dissensão, causa pela qual fazem-se sedições contra os ricos e mudam a república.

Semelhantemente ocorre no estado popular. Aqueles que são mais ricos desprezam os menores que são ou parecem ser destituídos de razão e ordem, como a pessoas indignas do principado, por causa do que incitam a que sejam dissolvidos. Foi assim que aconteceu em Tebas; depois da guerra que houve em Enofitis, passando o povo a governar, excedeu-se e governou mal, pelo que os ricos fizeram uma sedição e mudaram o estado popular.

A sedição pode também ser causada pelo [aumento ou] excrescência além das proporções. A excrescência que se dá além das proporções ocasionam às vezes sedições e corrupções das repúblicas. Se os ricos crescerem além das proporções, ou também os virtuosos ou os pobres, poderá ocorrer uma transmutação da república. Isto é evidente porque, assim como o corpo se compõe de muitas partes, assim também a cidade é composta de partes. Ora, isto é de tal modo que é necessário que o corpo composto do animal aumente segundo a proporção, de tal modo que se conserve a reta proporção e a comensuração de seus membros. Se as partes não aumentarem proporcionalmente, corromper-se-á o animal. Se o animal crescer improporcionalmente segundo a quantidade, a virtude ou a qualidade, transmutar-se-á na forma de outro animal. Semelhantemente ocorre na cidade, que é composta de partes. Por esse motivo, se esta deve salvar-se, importa que seja composta de partes comensuradas entre si. Às vezes, porém, a multidão excederá, como ocorre no estado popular e na república e, neste caso, corromper-se-á o estado de poucos e se fará o estado popular ou a república. Outras vezes a excrescência não é segundo a quantidade, mas segundo a qualidade, assim como quando há alguns ricos muito excelentes em poder e, neste caso, corromper-se-á o estado popular e far-se-á o estado de poucos. Esta excrescência, às vêzes, ocorre por causa da sorte, como ocorreu na cidade de Tarento. Tendo ela ido à guerra e muitos nobres e ricos sendo mortos pelos Iapigêncios, fêz-se de um estado popular uma potência de poucos e assim, por causa da sorte, além de qualquer intenção, o povo cresceu além das proporções e mudou a república.