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O governante e o legislador da cidade deve tornar
os cidadãos da cidade bons pelo estabelecimento de leis e
costumes. Observando as partes da alma, deve estabelecer leis
pelas quais os homens se disponham corretamente às virtudes e
às ações, e por quais ações destas partes da alma se dirigem
segundo a razão. Deve ser mais solícito para ordenar o melhor
e o que possui razão de fim, como por exemplo, aquilo que diz
respeito à parte mais principal da alma e às suas ações. É
assim também que vemos a natureza ser mais solícita acerca do
que é mais nobre.
Convém que o legislador e o governo façam o mesmo
acerca das vidas, isto é, acerca da conversação [dos súditos]
e acerca da divisão dos agíveis, por exemplo, acerca das
coisas úteis e das coisas boas segundo se a serem dirigidas
nelas. Convém que as cidades tenham o poder de operar as
operações das virtudes práticas e que possam também dedicar-
se à contemplação na tranquilidade. Mas para tudo isto são
necessários hábitos e costumes inclinantes, ou leis que
orientem pela razão.
Ademais, já que por operações semelhantes
produzem-se hábitos semelhantes e as operações são dirigidas
pelas leis, muito convém que na cidade ordenada as crianças
sejam ensinadas acerca das intenções das leis e sejam
acostumadas a obedecê-las e a operar segundo as mesmas. De
fato, as coisas que provém do costume são mais deleitáveis e
as coisas deleitáveis são feitas com mais prontidão e
facilidade.
Muitos gregos que se dizem otimamente governados e
seus legisladores pecaram contra estas coisas em dois pontos.
Em primeiro lugar, por não terem ordenado a ordem
civil ao fim ótimo do homem. Em segundo lugar. porque não
instituíram tanto as leis que significam a ordem civil como o
ensino para as operações das virtudes ótimas, mas inclinaram
tudo isto principalmente às coisas que lhes pareceram mais
úteis, pelas quais poderiam enriquecer-se e dominar aos
outros. Alguns filósofos também louvaram a intenção dos
legisladores por terem ordenado todos os seus estatutos à
dominação dos vizinhos e à guerra pelo qual poderiam submetê-
los.
Estas repúblicas e leis assim estabelecidas podem
ser facilmente questionadas pela razão e pelos fatos
contingentes. Se a ordem civil, as leis e o ensino destas
repúblicas fossem ótimas, então pela virtude das mesmas estas
repúblicas dominariam sobre as outras, o que não é o que se
observa hoje. Estas repúblicas dominavam não por causa da
ordem civil por si mesmo, mas porque eram muito experientes
na arte a no perigo da guerra, motivo pelo qual hoje muitas
das mesmas não mais dominam e muitas das que ainda permanecem
não são felizes. O legislador que, portanto, estabeleceu
estas leis e ordenou estas repúblicas não foi um bom
legislador.
Daqui se conclui ser manifesto nenhuma destas leis
e nenhuma destas razões que se ordena a este modo de governar
é civil, isto é, é otimamente ordenada, nem proveitosa para a
sociedade, nem tampouco é verdadeira em si, porque não se
ordenam ao fim ótimo, como pretendem.
É necessário que o legislador induza nas almas dos
homens as mesmas coisas ótimas privadamente e publicamente e
não ordenar o estudo dos cidadãos e também dos adversários
para que submetam para servidão aqueles que não são
naturalmente servis. Tal principado, sendo contra a
inclinação natural, não pode ser contínuo nem amigo.
O legislador, ao contrário, deve procurar primeiro
que os cidadãos não se tornem servos de outros homens,
conduzindo uma vida indigna. Segundo, se apetecerem o
principado, que o façam por causa da utilidade dos súditos e
não da própria, e muito menos que governem sobre os mesmos
dominativamente.
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