17. Considerações gerais.

Deste ou de tais virtuosos talvez poderá dizer-se retamente o que disse Antístenes sobre os leões "que para as lebres, se quisessem possuir a igualdade ou serem iguais, não seria bom ter como sócios os leões com os seus dentes, porque os leões, por causa de seu poder, as devorariam". Assim também, na cidade, não é bom para os cidadãos que busquem a igualdade, que tenham um ou vários homens tão virtuosos como concidadãos, porque por causa de seu poder e virtude seriam oprimidos. Foi por causa disso que as cidades [onde a política era a democracia ou o estado] popular estabeleceram o ostracismo, isto é, a relegação, contra tais homens. Estas cidades queriam possuir a igualdade, o povo nelas domina por causa da liberdade, todos igualmente alcançam a liberdade; por este motivo aqueles que excediam os cidadãos comuns nas riquezas, nas amizades ou em algum poder civil, eram relegados da cidade e exilados para fora da cidade durante alguns tempos determinados. Segundo estes, é manifesto que cidadãos que excedem a tal ponto os demais não convém que permaneçam na cidade.

Por causa disto, a saber, que não convém que tais homens que excedem outros permaneçam na cidade, mas que convém que sejam exilados, alguns, querendo recriminar um tirano, vituperaram o conselho de Periandro a Trasíbulo não segundo a razão. De fato, tendo Trasíbulo enviado uma mensageiro a Periandro sobre o que deveria fazer contra os poderosos e os ricos e todos os que se sobressaiam na cidade que turbavam o seu domínio, não querendo Periandro manifestar o seu intento de um modo que fosse claro ao mensageiro, disse-lhe em parábolas o que deveria ser feito, mandando dizer que, removendo as espigas excedentes a seara se tornaria uniforme. O mensageiro, ignorando o motivo daquilo que fazia, comunicou a Trasíbulo o que lhe havia sido dito e este imediatamente entendeu que deveria matar os homens excelentes no virtude e no poder. O Filósofo afirma que não foram apenas os tiranos que procedem deste modo, mas também as democracias e as oligarquias agem semelhantemente, pois nelas ordena-se a relegação para impedir que alguém se torne tão excelente e, se suceder haver alguém assim, que este seja exilado. Parece manifesto, por estes exemplos, que tais homens não devem permanecer na cidade.

Em algumas cidades, aqueles que tinham domínio e potência sobre eles fizeram o mesmo, como os atenienses quando subjugaram Samos, Kios e Lesbos. Como estas cidades excederam os atenienses, em várias coisas os atenienses as humilharam e oprimiram, descumprindo inclusive pactos anteriormente estabelecidos. Do mesmo modo procedeu o rei dos Persas quando submeteu a si os Medos e os Babilônios, dispersando os que eram mais prudentes e sagazes entre eles; vendo, de fato, que tais homens eram prudentes e sagazes, porque haviam governado e tinham vivido civilmente, temendo que se permanecessem juntos pudessem encontrar pela sabedoria os caminhos pelos quais se libertariam de seu jugo, dispersou-os e assim estes [homens] excelentes por causa de sua sabedoria foram transladados a outras regiões.

Este problema, portanto, universalmente diz respeito a todas as políticas, isto é, que aqueles que excedem os outros no poder e na virtude, não são cidadãos. Nas políticas desviadas isto pode ser observado, porque os que nelas governam, procurando apenas o bem próprio, exilam da cidade aqueles que excedem os demais no poder ou na virtude; mas não apenas as que buscam o bem próprio fazem tais coisas, como também as que buscam o bem comum.

O mesmo se observa por semelhança nas artes. Vemos, de fato, que se o pintor elabora uma imagem, não pintará um pé que exceda as outras partes segundo a proporção, mesmo que ele seja mais belo do que as outras. Da mesma maneira, aquele que constrói um navio não fará a proa, a parte da frente do navio, maior do que as outras além da proporção, ainda que aquela parte seja otimamente feita. Semelhantemente o maestro do coro, se alguém cantar mais alto do que todos os outros além da proporção, ainda que cante mais bela e deleitavelmente que os demais, não permitirá que cante com os demais. Eis o motivo porque, de modo semelhante, se há alguém na cidade que seja mais excelente do que todos os demais na virtude e na potência, embora em si seja bom, por ser improporcional aos demais, o legislador deverá exilá- lo.