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Já que o lugar é a extremidade do continente, um
corpo estará num lugar per se quando for adjacente a um outro
corpo que o contém [pelo lado] externo.
Um corpo não está num lugar quando não for
adjacente a um outro corpo que o contém [a partir] do
exterior.
Nestas condições, existe apenas um único corpo,
que é a esfera última [do universo]. De fato, de acordo com
isso, a esfera última não está em nenhum lugar.
Isto, entretanto parece impossível, porque não
obstante isso a esfera última apresenta movimento em relação
ao lugar, mas nada que não está num lugar é movido em relação
ao lugar.
Esta dificuldade não existe para aqueles que
acreditam no espaço. Porque não é necessário, para eles,
afirmarem que a esfera última está contida em outro corpo
para ela estar num lugar. Mas esta posição é impossível,
[porque já foi visto que o espaço não existe como realidade].
[Aristóteles não ofereceu nenhuma explicação
última para esta aparente contradição. Dos vários
comentadores de Aristóteles, São Tomás de Aquino segue a
opinião de Themistius. [Themistius afirmou que] a esfera
última está num lugar de acordo com suas partes.
Para entender esta opinião [de Themistius], deve-
se considerar que Aristóteles afirmou que o lugar não seria
investigado se não fosse por causa do movimento. Um corpo não
precisa necessariamente ter um lugar, mas um corpo que se
move em relação ao lugar tem que necessariamente ter um
lugar. E isto na medida em que se considera no movimento uma
sucessão de diversos corpos no mesmo lugar. Isto é
perfeitamente claro no movimento em linha reta.
Mas no movimento circular [de uma esfera], o todo
não muda de lugar. Entretanto, as partes mudam de lugar.
Portanto, no movimento circular, deve-se focalizar a atenção
à sucessão no mesmo lugar, não do corpo inteiro, mas de parte
do mesmo corpo. De onde, para um corpo [esférico] movido em
círculo, um lugar em relação ao todo não é de necessidade,
mas apenas em relação às partes.
Mas, contrariamente a isso, parece levantar-se
afirmação precedente de que as partes de um corpo contínuo
não estão num lugar [e portanto], nem são movidas em relação
ao lugar.
Portanto, como a esfera última é um corpo
contínuo, não parece ser correto afirmar que o lugar pertence
à esfera última por razão de suas partes.
A isto deve-se responder que, embora as partes de
um corpo contínuo não estão num lugar em ato, elas estão
potencialmente num lugar, na medida em que um corpo contínuo
é divisível.
Desta maneira, é correto dizer que a esfera última
está num lugar acidentalmente por razão de suas partes, na
medida em que as partes da esfera última estão potencialmente
num lugar.
Esta maneira de algo estar num lugar já é algo
suficiente para que exista movimento circular, [como o de uma
esfera em torno de um eixo].
Poder-se-ia ainda objetar que o que está em ato é
anterior ao que está em potência e, desta maneira, parece
incorreto dizer que o primeiro movimento local, [que é o da
esfera última], é o movimento de um corpo existindo num local
através de suas partes, que estão apenas potencialmente num
local.
Quanto a isto deve-se responder que, [muito pelo
contrário], isto está em esplêndido acordo com o primeiro
movimento. Porque é necessário que se desça gradualmente de
um [motor imóvel e único, que movimenta a esfera última, que
é anterior à esfera última, e cuja existência será
demonstrada no final da Física e da Metafísica], até a
diversidade que existe nas coisas móveis. [E isto é
convenientemente realizado através deste tipo de movimento
local que existe na esfera última].
Deve ser entendido, portanto, que aquilo que não
apresenta algo exterior [a si] e continente não está num
lugar per se. Mas pode estar acidentalmente num lugar, na
medida em que um lugar pertence potencialmente para cada uma
de suas partes.
Daqui se tira a última conclusão.
O corpo mais alto, [que é a esfera última],
somente pode se mover em movimento circular porque ele não
está em lugar algum. Porque aquilo que está em algum lugar é
algo e tem algo fora de si mesmo que lhe é continente. Mas
fora do todo não existe nada.
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