9. As causas das transmutações da república sem sedição oculta.

O Filósofo declara a seguir as causas da transmutação da república sem sedição oculta.

Em primeiro lugar afirma que as repúblicas alguns vezes se transmutam sem sedição, isto é, sem oculta dissensão, e isto por causa da infâmia, como aconteceu na cidade de Herea. Aconteceu de fato naquela cidade que alguns que cometeram alguma coisa torpe, pela qual padeceram infâmia, foram eleitos para o principado. Outros, porém, não querendo sustentar que estes infames governassem, fizeram uma sedição e instituíram que os principados que antes eram feitos pela sorte passassem a ser feitos por eleição. Deste modo, por causa da infâmia, fêz-se a sedição e a transmutação da república.

Por causa do desprezo às vezes faz-se uma mutação da república e uma sedição, como quando alguém é assumido ao principado principal que não o ama, mas o despreza como coisa pouca. Então ocorre que aquele que diminui e despreza o principado mude a república. Foi assim que ocorreu na cidade de Horeus, onde os cidadãos elegeram como príncipe a Heracleodoro. Este [homem] não amava a república deles e por isso mudou o estado dos poucos que havia naquela cidade e instituíu a república e o estado popular.

A república também pode ser mudada por causa da negligência para com o pequeno. Há negligência para com o pequeno quando negligencia-se alguma pequena transgressão e, semelhantemente, também outras. Ocorre então que de todas estas faz-se uma grande transgressão que no princípio não era manifesta e, por causa desta grande transgressão que foi causada de muitas outras pequenas que haviam sido negligenciadas, ocorreu que a república fosse mudada.

Uma outra causa da sedição é a dessemelhança. Quando os que habitam uma cidade não possuem os mesmo hábitos e costumes, [estes] movem sedições, a não ser que tenham conspirado ou viveram muito tempo juntos. A primeira afirmação é evidente, porque aqueles que possuem diversos costumes inclinam-se a fins diversos. Disto se segue uma divisão da vontade, o que é causa de dissensão, pelo qual fica manifesto que a dessemelhança é causa de dissensão. A segunda afirmação é também evidente porque se aqueles que possuem diversos costumes viveram [muito tempo juntos] ocorrerá que um trará o outro [para os seus costumes] e no fim [todos] terão os mesmo costumes e se inclinarão a um mesmo fim, e então não mudarão a república. É, portanto, manifesto que até que não tenham vivido juntos por muito tempo, moverão sedição aqueles que tiverem costumes diversos. O Filósofo manifesta o que foi dito dizendo que porque a dessemelhança é causa de sedição ocorre que aquelas cidades que receberam os estranhos indiferentemente passaram por muitas sedições e divisões.

O Filósofo trata também de uma causa mais acidental das sedições. Diz que em algumas cidades fazem-se sedições por causa da disposição do lugar. Ocorre, de fato, que uma região não está bem disposta para que uma cidade seja una, mas mais para que seja outra. A unidade da ordem para com o fim é que faz a cidade ser una e por isso requer-se para a unidade da cidade aquilo que dispõe para esta [unidade da ordem]. Ora, esta boa disposição do lugar concorre para tal. Se, portanto, o lugar não é bem disposto para que haja uma cidade una, far-se-ão sedições, como aconteceu em Clazômenas. Aqueles que habitavam em Citro, que é uma parte da cidade, eram contra aqueles que habitavam na Ilha, isto é, na outra parte da cidade, e queriam fazer diversas repúblicas e a cidade principal [cada um] na sua parte.

Assim, portanto, é manifesto que a diversidade promove a divisão e a sedição na cidade. Mas deve-se considerar que a dessemelhança que maximamente causa a sedição é a dessemelhança da virtude e da malícia, porque inclina imediatamente a fins diversos. Depois desta vem a da riqueza e da pobreza, e assim sucessivamente uma dessemelhança depois da outra, as quais podem ser consideradas sob diversos [aspectos].