6. Coloca-se a segunda questão: se o homem feliz necessita de amigos.

Algumas pessoas dizem que os homens felizes, sendo a si suficientes per se, não necessitariam dos amigos, porque, possuindo [já] a suficiência per se dos bens, de nenhum outro [bem] parecem necessitar. O amigo, [porém, lhes] parece ser mais necessário porque, sendo um outro si mesmo, tributa as coisas que o homem por si mesmo não poderia ter. De onde que parece concluir-se que o homem feliz não necessitaria de amigos.

[Quanto a isto devemos responder que o homem feliz necessita de amigos, o que pode ser mostrado através de dois argumentos].

[De acordo com o primeiro argumento], conforme foi explicado, mais pertence ao amigo fazer benefícios do que ser beneficiado. Porém, fazer benefícios é próprio da virtude, e a felicidade consiste na operação da virtude, conforme explicado no livro primeiro. Assim, é necessário que o homem feliz seja virtuoso, e por conseqüência, que beneficie. Entretanto, melhor é que o homem beneficie aos amigos do que aos estranhos, o resto sendo igual, porque isto o homem faz mais deleitável e prontamente. Portanto, o homem feliz, por ser virtuoso, necessita de amigos, aos quais beneficie.

[De acordo com o segundo argumento] parece ser inconveniente que o homem feliz seja solitário. De fato, isto é contra toda eleição de todos. Ninguém faria eleição de sempre viver sozinho, mesmo depois que tivesse todos os outros bens, porque o homem é naturalmente animal político e nascido para conviver com os outros. Portanto, já que o homem feliz possui as coisas que são naturalmente boas ao homem, segue-se que tenha com quem conviva. Porém, é evidente que é melhor conviver com os amigos e virtuosos do que com estranhos e quaisquer. Assim, portanto, é evidente que o homem feliz necessita dos amigos.