12. Notas de Santo Tomás de Aquino sobre uma última objeção.

Houve, finalmente, quem quisesse subverter a outra raiz da contingência que o Filósofo coloca como sendo [a condição humana] de ser aconselhativo [em seu agir]. De fato, alguns quiseram mostrar que a vontade, ao escolher, é movida de modo necessário pelo apetecível.

[Disseram estes que], sendo o bem objeto da vontade, a vontade não pode afastar-se dele a não ser que apeteça aquilo que lhe pareça ser bom, assim como nem a razão pode afastar-se de algo sem assentir a algo que lhe pareça como verdadeiro. Deste modo, pareceria que a eleição que se segue ao conselho sempre provenha da necessidade e que, sendo assim, todas as coisas das quais nós [homens] somos princípio através do conselho e da eleição procedem [das mesmas] de modo necessário.

[A esta objeção deve-se responder] que é preciso considerar [haver] uma diferença semelhante acerca do bem assim como da verdade.

Há, porém, uma certa verdade que é conhecida por si mesma, como são os primeiros princípios indemonstráveis, aos quais o intelecto assente necessariamente. Há também outras verdades que não são conhecidas por si mesmas, mas através de outras. A condição destas pode ser de dois modos.

Algumas se seguem necessariamente aos princípios, de tal modo que não podem ser falsas, sendo verdadeiros os princípios. Estas são todas as conclusões das demonstrações. A estas verdades o intelecto assente necessariamente depois de ter apreendido a sua ordenação aos princípios, mas não antes [de tê-lo feito].

Há outras, ainda, que não se seguem necessariamente aos princípios, de tal modo que podem ser falsas ainda que os princípios [das quais procedem] sejam verdadeiros. Estas são os opináveis, aos quais o intelecto não assente necessariamente, embora por algum motivo se incline mais para uma parte do que para a outra.

[De um modo semelhante ao que ocorre com a verdade, ocorre também com o bem]. Há, [em primeiro lugar], um certo bem que é o apetecível por causa de si mesmo, como é [o caso da] felicidade, que possui razão de fim último. A este bem a vontade inere necessariamente; todos, de fato, apetecem ser felizes por uma certa necessidade.

Há outros bens que são apetecíveis por causa de [um] fim, os quais podem ser comparados ao fim como as conclusões aos princípios, como fica manifesto pelo que diz o Filósofo no IIº Livro da Física. Se, portanto, existirem alguns bens os quais, se não existissem, não se poderia ser feliz, estes bens também seriam apetecíveis necessariamente e maximamente junto a quem [fosse capaz de] apreender tal ordem. Tais talvez sejam o ser, o viver e o inteligir, e outros semelhantes, se houver. Mas os bens particulares, nos quais consistem os atos humanos, não são tais, nem podem ser apreendidos sob aquela razão tal que sem eles a felicidade não pode existir. São exemplos [destes outros bens] o comer esta ou aquela comida, ou abster-se dela; estes bens têm algo por onde mover o apetite, segundo algum bem que se considera neles. Por isto a vontade não é movida a escolhe-los por uma necessidade.

É por este motivo que o Filósofo, significativamente, apontou a raiz da contingência nas coisas que são feitas pelos [homens] a partir do conselho, o qual se refere às coisas que dizem respeito a um fim e que, todavia, não são determinadas. Nas coisas, de fato, em que os meios são determinados, não há lugar para o conselho, conforme se explica no IIIº da Ética.