10. Nota de Santo Tomás de Aquino sobre a questão dos astros.

Houve alguns que disseram existir o destino, [colocando-o] na força dos corpos celestes. Segundo eles, nada mais é o destino do que a força da posição dos astros. Mas, [ainda que exista esta causa], dela nunca poderá provir a necessidade em todas as coisas que ocorrem.

De fato, muitas coisas são feitas a partir da inteligência e da vontade, as quais per se e diretamente não estão submetidas à força dos corpos celestes. O intelecto ou razão e a vontade, que está na razão, não são atos de um órgão corporal, conforme se demonstra no III do De Anima; é, portanto, impossível que o intelecto ou razão e a vontade esteja submetidos diretamente à força dos corpos celestes; nenhuma força corporal pode agir per se a não ser sobre uma coisa corpórea.

[Já o mesmo não ocorre com as] forças sensitivas [no homem]. Estas, na medida em que são atos dos órgãos corporais, podem submeter-se à ação dos corpos celestes. É por isso que o Filósofo, no III do De Anima, atribui aos que colocavam o intelecto não diferir do sentido a opinião dos que dizem que a vontade do homem estaria submetida ao movimento do céu.

Indiretamente, porém, a força dos corpos celestes [pode] redundar ao intelecto e à vontade, na medida em que o intelecto e a vontade se utilizam das forças sensitivas. [Mas, mesmo assim], é manifesto que as paixões das forças sensitivas não podem induzir necessidade à razão e à vontade; [temos como exemplo disto o caso] dos homens continentes, aqueles que possuem más concupiscências mas que, [ao contrário dos homens ditos incontinentes], [apesar de possuírem estas paixões más], não se deixam conduzir por elas, conforme diz o Filósofo no VII da Ética. Assim, portanto, da força dos corpos celestes não pode proceder a necessidade nas coisas que são feitas pela razão e vontade.

Algo semelhante a isto, porém, pode ser dita não apenas da razão e da vontade humana, como também dos demais efeitos corporais das coisas corruptíveis, nas quais ocorrem muitas coisas por acidente. Ora, o que é por acidente não pode ser reduzido como a uma causa per se em alguma virtude natural, porque a virtude da natureza [possui inclinação] a uma só coisa. O que, porém, é por acidente, não é uno, de onde que o Filósofo diz, no livro sobre "O Sono e a Vigília", que muitas coisas cujos sinais preexistem nos corpos celestes, como nas chuvas e nas tempestades, não ocorrem, porque são impedidas `per accidens', [isto é, por uma acidentalidade ou circunstancialidade]. E, embora mesmo este impedimento, considerado em si mesmo, possa ser reduzido a alguma causa celeste, todavia o concurso [ou a coincidência] deles, sendo uma acidentalidade, não pode ser reduzido a nenhuma causa naturalmente agente.