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O Filósofo declara a seguir as causas da
transmutação da república sem sedição oculta.
Em primeiro lugar afirma que as repúblicas alguns
vezes se transmutam sem sedição, isto é, sem oculta
dissensão, e isto por causa da infâmia, como aconteceu na
cidade de Herea. Aconteceu de fato naquela cidade que alguns
que cometeram alguma coisa torpe, pela qual padeceram
infâmia, foram eleitos para o principado. Outros, porém, não
querendo sustentar que estes infames governassem, fizeram uma
sedição e instituíram que os principados que antes eram
feitos pela sorte passassem a ser feitos por eleição. Deste
modo, por causa da infâmia, fêz-se a sedição e a transmutação
da república.
Por causa do desprezo às vezes faz-se uma mutação
da república e uma sedição, como quando alguém é assumido ao
principado principal que não o ama, mas o despreza como coisa
pouca. Então ocorre que aquele que diminui e despreza o
principado mude a república. Foi assim que ocorreu na cidade
de Horeus, onde os cidadãos elegeram como príncipe a
Heracleodoro. Este [homem] não amava a república deles e por
isso mudou o estado dos poucos que havia naquela cidade e
instituíu a república e o estado popular.
A república também pode ser mudada por causa da
negligência para com o pequeno. Há negligência para com o
pequeno quando negligencia-se alguma pequena transgressão e,
semelhantemente, também outras. Ocorre então que de todas
estas faz-se uma grande transgressão que no princípio não era
manifesta e, por causa desta grande transgressão que foi
causada de muitas outras pequenas que haviam sido
negligenciadas, ocorreu que a república fosse mudada.
Uma outra causa da sedição é a dessemelhança.
Quando os que habitam uma cidade não possuem os mesmo hábitos
e costumes, [estes] movem sedições, a não ser que tenham
conspirado ou viveram muito tempo juntos. A primeira
afirmação é evidente, porque aqueles que possuem diversos
costumes inclinam-se a fins diversos. Disto se segue uma
divisão da vontade, o que é causa de dissensão, pelo qual
fica manifesto que a dessemelhança é causa de dissensão. A
segunda afirmação é também evidente porque se aqueles que
possuem diversos costumes viveram [muito tempo juntos]
ocorrerá que um trará o outro [para os seus costumes] e no
fim [todos] terão os mesmo costumes e se inclinarão a um
mesmo fim, e então não mudarão a república. É, portanto,
manifesto que até que não tenham vivido juntos por muito
tempo, moverão sedição aqueles que tiverem costumes diversos.
O Filósofo manifesta o que foi dito dizendo que porque a
dessemelhança é causa de sedição ocorre que aquelas cidades
que receberam os estranhos indiferentemente passaram por
muitas sedições e divisões.
O Filósofo trata também de uma causa mais
acidental das sedições. Diz que em algumas cidades fazem-se
sedições por causa da disposição do lugar. Ocorre, de fato,
que uma região não está bem disposta para que uma cidade seja
una, mas mais para que seja outra. A unidade da ordem para
com o fim é que faz a cidade ser una e por isso requer-se
para a unidade da cidade aquilo que dispõe para esta [unidade
da ordem]. Ora, esta boa disposição do lugar concorre para
tal. Se, portanto, o lugar não é bem disposto para que haja
uma cidade una, far-se-ão sedições, como aconteceu em
Clazômenas. Aqueles que habitavam em Citro, que é uma parte
da cidade, eram contra aqueles que habitavam na Ilha, isto é,
na outra parte da cidade, e queriam fazer diversas repúblicas
e a cidade principal [cada um] na sua parte.
Assim, portanto, é manifesto que a diversidade
promove a divisão e a sedição na cidade. Mas deve-se
considerar que a dessemelhança que maximamente causa a
sedição é a dessemelhança da virtude e da malícia, porque
inclina imediatamente a fins diversos. Depois desta vem a da
riqueza e da pobreza, e assim sucessivamente uma
dessemelhança depois da outra, as quais podem ser
consideradas sob diversos [aspectos].
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