|
Assim como já foi mencionado, o reino se
estabelece [ao modo] do estado dos ótimos. Por isso, os
princípios da corrupção do estado dos ótimos são também os
princípios da corrupção da monarquia real.
A tirania, porém, estabelece-se segundo o estado
dos poucos e segundo o último dos estados populares. Por este
motivo, os princípios que corrompem estes estados são também
os princípios que corrompem a tirania.
Ora, os princípios que, [considerados em geral],
corrompem as monarquias, [reinos e tiranias], são três: a
contumélia [ou injustiça], o medo [ou temor] e o desprezo. A
contumélia pode ser por causa da injúria feita a alguma
pessoa ou pela subtração de seus bens.
Às vezes levanta-se uma insurreição contra uma
monarquia por causa de uma injúria. A insurreição que se
levantou contra Felipe rei da Macedônia, pai de Alexandre o
Grande, foi feita por um certo Pausânias, porque o rei Felipe
havia permitido que Pausânias sofresse uma injúria por parte
de Átalo que tinha vínculos com Felipe por consagüinidade ou
por ofício.
Outras vezes as insurreições se devem a injúrias
corporais. Muitos que foram flagelados em seus corpos,
padecendo espancamentos e ferimentos, levantaram-se contra o
monarca destruindo-o ou assassinando-o. Outros que foram
injuriados deste modo invadiram o principado. Temos um
exemplo disto na pessoa de Decamnico, que foi o condutor e a
principal causa da insurreição que se levantou contra
Arquelau, tendo sido o primeiro a exacerbar e comover aqueles
que se insurgiram contra ele. A causa da ira pela qual estes
e ele próprio se insurgiu foi que Arquelau entregou Decamnico
para ser flagelado pelo poeta Eurípedes, o qual fervia de
raiva contra Decamnico por ter este afirmado que o poeta
possuía uma boca fétida. Foi por este motivo que, movido pela
ira, Eurípedes flagelou a Decamnico. Isto fêz com que
posteriormente ele se insurgisse por causas semelhantes. Por
causa desta insurreição alguns foram mortos, outros tiveram
que padecer graves insídias e turbações.
Outras vezes as insurreições se fazem por causa do
temor. Assim como se fazem as insurreições por causa da
injúria, assim às vezes se fazem por causa do temor [e medo].
O temor é uma das causas de insurreição contra os monarcas,
assim como a injúria. Foi assim que Artabanes quis repelir
Xerxes do principado monárquico, porque o temia devido ao
crime que havia cometido contra Dario, a quem havia enforcado
sem que Xerxes o tivesse ordenado.
As insurreições, [finalmente], poem levantar-se
por causa do desprezo. Fazem-se certas vezes insurreições por
causa do desprezo como ocorreu quando alguém, observando a
Sardanapalo entregue aos prazeres e aos banquetes, sempre
entretido com mulheres em seu palácio e nunca exercitando-se
na luta nem na caça, insurgiu-se contra o mesmo. Poderá
tratar-se de uma fábula; todavia, se tal não for verdade de
Sardanapalo, poderá ser verdade acerca de algum outro.
Semelhantemente Dion insurgiu-se contra Dionísio, porque
desprezou-o ao vê-lo sempre ébrio e entregue aos prazeres,
observando que os cidadãos o desprezavam.
Algumas vezes os amigos se insurgem contra os
amigos por terem sido desprezados por eles. A excessiva
familiaridade dá luz ao desprezo. Algumas vezes [os
governantes], confiando nos amigos por terem sua
familiaridade, desprezam-nos crendo que por causa desta
inimizade esquecer-se-ão da injúria feita. Estes, porém,
crendo poder obter o principado e tendo sido desprezados,
insurgem-se não fazendo caso do perigo e finalmente invadem
[a república], ora porque são movidos pela esperança do
sucesso, ora porque possuem poder para tanto, como ocorre com
os condutores dos exércitos que às vezes invadem uma
monarquia por estes motivos. Os que maximamente se insurgem
por tais motivos são os homens naturalmente audazes, como
aqueles em que há uma abundância de calor e de espírito,
possuem poder e são condutores dos exércitos das monarquias.
|
|