2. Exame da primeira das ações.

Já que sentimos que vemos e, semelhantemente, sentimos que ouvimos, é necessário que isto aconteça ou pela própria vista ou por outra virtude

[Há uma razão a favor de que seja pela vista que nós sentimos que vemos]. Se existe um outro sentido pelo qual nós vemos que vemos, então por este sentido ou somente sentimos que vemos, ou sentimos que vemos e também enxergamos a cor.

[Se ocorre a segunda hipótese, isso seria incoerente], porque então haveria dois sentidos para o mesmo objeto, que é a cor, a saber, a vista e este outro sentido. [Se ocorre a primeira hipótese], e este outro sentido percebe que nós vemos, mas não percebe a cor, isto é irracional, porque se ele não conhece a cor, não pode conhecer o que seja ver, sendo que o ver nada mais é do que sentir a cor.

[Outra razão a favor de que seja pela vista que sentimos que vemos seria a seguinte]. Se o sentido pelo qual nós sentimos que vemos é outro que não a própria vista, deve- se questionar sobre o mesmo se porventura este sentido seria capaz de sentir que ele sente. Se ele não sente que ele sente, deve-se colocar um terceiro sentido que sentiria que o segundo sente e assim indefinidamente, até o infinito. Mas aqui proceder até o infinito é incabível, porque uma ação que depende de ações [em número] infinitas é impossível de se completar. Portanto, deve-se chegar algum sentido que perceba que ele [mesmo] sente. Ora, se isto se pode admitir, não há razão porque não poderia ter sido admitido logo no primeiro sentido, isto é, o admitir-se que a própria vista sente a si mesmo vendo. Portanto, não são diferentes os órgãos que percebem a cor e que percebem a visão da cor.

[Uma razão contra que seja pela vista que sentimos que vemos consiste em que] se pela vista sentimos que nós vemos, sentir que nós vemos nada mais é do que ver. Ora, nada pode ser visto exceto a cor ou o que tem cor. Se, portanto, alguém se vê que esteja vendo, segue-se que na vista existe a cor, o que é errado, porque a vista é susceptiva da cor, mas é sem cor.