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Conforme dissemos, importa que a cidade seja
suficiente per se, e para ser suficiente per se não pode ser
composta de poucos. É necessário que a primeira cidade
segundo a via da geração, menor do que a qual já não teria
razão de cidade, seja aquela que é composta de uma multidão
tão grande quanto a que seja per se suficiente para si
própria para bem viver segundo a comunicação civil pela
diversidade dos ofícios e dos artífices, menor do que a qual
já não seria per se suficiente.
Pode ocorrer que uma grande cidade exceda [este
tamanho que acabamos de descrever] segundo a multidão de
[seus] cidadãos e que, [ao fazê-lo], se torne uma cidade
maior. Mas este excesso não pode ser levado até o infinito de
tal maneira que a cidade que mais exceder [segundo a
multidão] seja também mais cidade. Qual é o limite deste
excesso, além do qual [a cidade] já não é mais cidade, pode
ser facilmente considerado pelas operações.
Deve-se entender que, conforme foi dito no
Primeiro Livro desta Política, tudo o que é segundo a
natureza e a arte, são definidos por uma certa virtude e
operação, segundo as quais, [quando tais virtudes e operações
lhes são] possíveis, [são correta e univocamente]
denominados, [mas quando estes já não lhes são possíveis],
são denominados apenas equivocamente.
A cidade, porém, pertence ao número das coisas que
segundo algo são pela natureza e segundo algo são pela arte.
Possuem, por isso, uma operação determinada, segundo a qual,
quando esta lhe é possível, pode ser chamada de cidade, e
quando não lhe é possível, já não pode mais ser chamada de
cidade.
Ora, a operação principal da cidade deve ser
considerada segundo a parte que há nela de principal, que é o
próprio governante. A principal operação do governante é
dirigir os súditos segundo a razão, ordenando e distribuindo
os bens comuns e julgando retamente, para a qual se pré exige
o conhecimento dos cidadãos. Há algumas operações da cidade,
algumas que são exercidas pelos governantes, outras que são
exercidas pelos súditos. A operação principal do governante é
julgar e preceituar retamente, e retamente distribuir os
principados; estas coisas lhe competem pela virtude da
prudência, que deve-lhe ser própria. Ora, para que retamente
julgue das coisas juntas e que retamente distribua os
principados e os bens comuns aos próprios cidadãos, é
necessário que ele conheça os cidadãos tais quais são segundo
a virtude e que diferença tem entre si segundo a virtude,
para que, segundo a exigência da dignidade da virtude
distribua os principados e julgue diversamente segundo a
diferença da dignidade dos mesmos. Se isto não puder ser
deste modo, necessariamente a distribuição dos bens comuns e
os julgamentos serão maus.
É perigoso e injusto operar estas coisas segundo o
próprio ímpeto e não segundo a reta razão. Todavia, é isto o
que necessariamente acontecerá na cidade onde há uma
superabundância de multidão. De fato, nem todos os cidadãos
poderão ser bem conhecidos pelo governante. Tanta, portanto,
convém ser a multidão dos cidadãos a mais na cidade quanta
pode ser conhecida pelo governante.
O mesmo pode ser demonstrado de outro modo. Na
cidade onde há uma superabundante multidão ocorre haver
muitos estrangeiros e visitantes e outros que não amam a
república. Para os estranhos, os visitantes e outros que não
amam a república, será fácil mudarem a república se forem uma
multidão numerosa. Não lhes será difícil, por exemplo,
ocultar suas maquinações por causa do excesso de sua
multidão. Os que operam o mal mais facilmente se ocultam numa
multidão maior do que em uma menor. Ora, isto é um mal para a
cidade e é contra a sua natureza. Portanto, é mau e contra a
natureza da cidade haver nela uma superabundante multidão.
O Filósofo conclui dizendo ser manifesto pelas
coisas que foram expostas que o limite ótimo da cidade é o
máximo excesso de multidão que seja suficiente para a
suficiência per se da vida, e que seja facilmente auxiliável
e ordenável segundo a reta razão, de tal maneira que o limite
inferior da cidade seja tomado pela razão da suficiência per
se, enquanto que o seu limite superior pela razão da sua boa
ordenação. Assim, portanto, fica determinada a magnitude da
cidade.
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