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Sólon e outros legisladores antigos ordenaram que
a multidão tivesse poder de escolher e corrigir o principado.
Mas podem levantar-se objeções a este modo de ordenação.
De fato, a quem pertence medicar e curar de uma
doença presente, a ele também pertencerá julgar quem foi
corretamente curado. É isto o que faz o médico. A razão desta
afirmação se deve a que o mesmo que é capaz de fazer algo por
dedução a partir das causas e dos princípios, este também
será capaz de compreender o efeito, reduzindo-o até às suas
primeiras causas, considerando a partir de quais causas [o
efeito] é e possui o ser. Ora, isto é julgar. Portanto,
compete à mesma pessoa constituir algo e julgar sobre o mesmo
e semelhantemente ocorrerá nas demais artes. Assim como é o
médico, de fato, quem julga e corrige na arte médica, assim
também os demais em suas próprias artes.
Ora, assim como ocorre no julgamento, assim também
ocorre na eleição, porque a reta eleição pertence ao que
conhece, e esta é obra que lhe pertence, assim como a
geômetra julga retamente das coisas geométricas, o governador
das governativas e assim sucessivamente. A razão disto é a
seguinte: a eleição é um apetite pré aconselhado, e o
conselho é um raciocínio sobre as coisas que se ordenam a um
fim. Ora, raciocinar corretamente sobre as coisas que se
ordenam a algum fim pertence ao que possui ciência. É
manifesto, portanto, que a obra do que possui ciência é
julgar e fazer eleição correta. Se algum idiota alguma vez
escolhe corretamente, não o faz como os que possuem ciência,
nem melhor do que eles, mas elege ou julga por acaso, bem
diversamente dos sábios.
Destas duas considerações parece seguir-se que não
conviria que o povo tivesse poder de eleger e corrigir o
principado, pois é manifesto pelo que foi dito que eleger
pertence ao que possui ciência, corrigir ao que possui
prudência. A multidão, porém, é ignorante e imprudente, pelo
que não convém que ela domine ao escolher e corrigir.
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