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Está manifesto, então, que a operação própria de
cada coisa é aquilo que lhe compete segundo a sua forma. Ora,
a forma do homem é a alma, cujo ato [correspondente] é dito
viver. Viver, porém, é dito ser o ato [ correspondente] à
forma do homem que é a alma, não na medida em que viver é ser
vivente, mas na medida em que alguma obra da vida é dita
viver, como por exemplo, intelegir ou sentir. De onde fica
claro que a felicidade do homem consiste em alguma obra da
vida.
De fato, não pode ser dito que a felicidade diz
respeito ao homem segundo qualquer viver, porque viver [no
homem] é comum com as plantas, porque a felicidade é buscada
como um certo bem próprio do homem. Pela mesma razão, a
felicidade não pode consistir na espécie de vida chamada
nutritiva e aumentativa, porque esta também é comum às
plantas. Depois da vida nutritiva e aumentativa se segue a
vida sensitiva, a qual também não é própria do homem, mas
convém a qualquer animal. Portanto, a felicidade também não
pode consistir na vida sensitiva. Daqui pode-se concluir que
a felicidade humana não consiste em nenhum conhecimento ou
deleitação sensível.
Após a vida nutritiva e sensitiva nada resta a não
ser a vida que é operativa segundo razão, a qual é própria do
homem. De fato, o homem é dito animal racional.
Mas racional pode ser entendido de duas maneiras.
De uma primeira maneira, podemos entender racional
participativamente, na medida em que [algo] é persuadido e
regulado pela razão. De uma segunda maneira, podemos entender
racional essencialmente, como aquilo que por si mesmo é
raciocinar e intelegir. Este segundo modo é dito a parte
principal do racional, porque aquilo que é per se é mais
principal do que aquilo que é por outro. Portanto, porque a
felicidade é o bem principalíssimo do homem, conclui-se que
ela mais consiste naquilo que é racional essencialmente do
que naquilo que é racional por participação. De onde se
conclui finalmente que a felicidade mais principalmente
consiste na vida contemplativa do que na ativa, e no ato da
razão ou do intelecto, do que no ato do apetite regulado pela
razão.
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