6. Comparação do homem naturalmente servo ao animal bruto.

O Filósofo compara [e distingüe] o homem naturalmente servo ao animal bruto dizendo que aquele que é naturalmente servo comunica pela razão apenas quanto a que recebe o senso da razão como que ensinado por outro, mas não quanto a que tenha o senso da razão por si mesmo. Os outros animais, porém, servem ao homem não como que recebendo o senso da razão do homem, mas na medida em que são levados a servi-lo pela memória das coisas que passaram de bem ou de mal da parte do homem, ou também por amor ou temor. Quanto ao modo de servir, portanto, [há diferença entre o naturalmente servo e o animal], porque o que é naturalmente servo serve pela razão, enquanto que o animal bruto pela paixão, isto é, pelo temor ou amor adquiridos pela memória do padecer o bem ou o mal do homem.

A natureza, ademais, tem uma certa inclinação para produzir diferenças entre os corpos dos livres e dos servos, de tal modo que o corpo dos servos são fortes para exercer o uso necessário que lhes compete, a saber, o cultivo dos campos e outros ministérios semelhantes, enquanto que o corpo dos livres são bem dispostos segundo a natureza e inúteis para tais operações servis, devendo, todavia, ser úteis à vida civil, pela qual convivem os homens livres.

Embora, porém, a natureza tenha uma certa inclinação para causar a mencionada diferença de corpos, todavia às vezes falha na mesma, assim como também em todas as demais coisas que se geram e se corrompem, nas quais a natureza alcança o seu efeito na maioria mas falha em um menor número. Quando, portanto, a natureza falha nisto ocorre freqüentemente o contrário do que o Filósofo diz, isto é, haver homens que tenham almas de livres tendo corpos de servos, ou o contrário.

Deve-se também considerar [com cuidado as próprias premissas das quais o Filósofo se utiliza em seus argumentos]. Como o corpo é por natureza ordenado à alma, a natureza tenciona formar tal corpo tal qual seja conveniente à alma e por isso tenta, para aqueles que têm almas de livres, dar um corpo de livres, e assim também semelhantemente com os servos. Isto, porém, quanto às disposições [corporais] interiores sempre ocorre pois, de fato, não é possível que alguém tenha uma alma bem disposta se os órgãos do imaginário e das demais virtudes naturais e sensoriais sejam mal dispostas. Na figura, porém, na quantidade exterior e outras disposições exteriores, pode-se encontrar e encontram-se dissonâncias, conforme o Filósofo também o afirma.