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É manifesto que na cidade o governante deve
conhecer as leis e deve fazê-las. Não convém, entretanto, que
seja senhor de todas as coisas; já que ele domina segundo a
lei, não convém que ele domine em tudo, mas convém que ele
domine naquelas coisas que não podem ser determinadas pela
lei, seja de modo simples, ou pelo menos [não perfeitamente].
Neste caso, porém, levanta-se uma dúvida sobre se mais convém
que um só governe julgando sobre casos particulares, sobre os
quais a lei não pode bem determinar, ou se convém que muitos
governem.
O Filósofo resolve a questão afirmando que é
melhor que neste caso muitos julguem em vez de um só por três
razões.
Em primeiro lugar [o Filósofo coloca que] quando
surge um caso particular que não pode ser determinado pela
lei, reúnem-se muitos [homens] e discutem sobre [o caso]
entre si e investigam sobre o mesmo pelo conselho, e depois
do conselho julgam. É assim que se dão todos os julgamentos
dos casos particulares sobre os quais a lei não pode
determinar. Assim podem fazer muitos e não apenas um, porque
muitos que se aconselham sobre algo podem ver mais coisas do
que um só. É manifesto, portanto, que um só, quando comparado
a muitos, é pior no julgar, e o seu julgamento, comparado ao
julgamento de muitos, é pior. Assim como uma cidade composta
de muitos é mais bela do que uma cidade composta por poucos,
assim também o julgamento de muitos é melhor do que o
julgamento de um. É manifesto, portanto, que melhor e com
mais acerto julgará uma multidão ou muitos do que cada um
desta multidão.
A segunda razão [colocada pelo Filósofo] diz que é
manifesto que muitos são mais indiferentes em relação às
paixões perturbantes e pervententes o reto julgamento de que
um só sem poucos e por isso um só mas pode ser ocupado pelas
paixões do que muitos. Quando, porém, um só for ocupado por
alguma paixão, corromper-se-á o julgamento. Onde há muitos,
porém, será difícil corromper-se o julgamento por causa do
ímpeto das paixões, porque se alguns estão dominados pela
paixão, suas paixões serão reprimidas pela razão dos outros e
por isso será difícil que eles pequem e isto principalmente
se se tratar de uma multidão não vil, mas se for uma multidão
de homens livres segundo a virtude. Estes, de fato, nada
farão além da lei, senão onde a lei falhar.
A terceira razão [colocada pelo Filósofo] diz que,
se for afirmado que não é fácil que muitos julguem bem em
tais coisas, se se tratarem de homens quaisquer
indiferentemente, todavia, se se tratarem de homens bons e
cidadãos bons, ainda deveria se investigar se um só
governante mais dificilmente possa ser pervertido e
corrompido do que muitos bons homens em número. E é manifesto
que muitos homens bons mais dificilmente se perverterão e
corromperão do que um só homem bom. Ora, é melhor que o
julgamento se realize por aquele que mais dificilmente pode
ser corrompido e pervertido. Portanto, como é mais difícil
que muitos se corrompam e se pervertam do que um só, segue-se
que é melhor que o julgamento seja feito por muitos do que
por um só.
De tudo isto Aristóteles conclui a preeminência do
estado dos ótimos [ou aristocracia] sobre o reino. E diz que
se é assim conforme foi declarado, isto é, que é melhor que
muitos homens bons julguem do que um só, e a política em que
muitos sábios governam é o estado dos ótimos [ou
aristocracia], enquanto que a política em que um só homem
sábio governa é o reino, é manifesto que o estado dos ótimos
[ou aristocracia] é melhor do que o reino.
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