7. Conseqüências da doutrina da felicidade.

O governante e o legislador da cidade deve tornar os cidadãos da cidade bons pelo estabelecimento de leis e costumes. Observando as partes da alma, deve estabelecer leis pelas quais os homens se disponham corretamente às virtudes e às ações, e por quais ações destas partes da alma se dirigem segundo a razão. Deve ser mais solícito para ordenar o melhor e o que possui razão de fim, como por exemplo, aquilo que diz respeito à parte mais principal da alma e às suas ações. É assim também que vemos a natureza ser mais solícita acerca do que é mais nobre.

Convém que o legislador e o governo façam o mesmo acerca das vidas, isto é, acerca da conversação [dos súditos] e acerca da divisão dos agíveis, por exemplo, acerca das coisas úteis e das coisas boas segundo se a serem dirigidas nelas. Convém que as cidades tenham o poder de operar as operações das virtudes práticas e que possam também dedicar- se à contemplação na tranquilidade. Mas para tudo isto são necessários hábitos e costumes inclinantes, ou leis que orientem pela razão.

Ademais, já que por operações semelhantes produzem-se hábitos semelhantes e as operações são dirigidas pelas leis, muito convém que na cidade ordenada as crianças sejam ensinadas acerca das intenções das leis e sejam acostumadas a obedecê-las e a operar segundo as mesmas. De fato, as coisas que provém do costume são mais deleitáveis e as coisas deleitáveis são feitas com mais prontidão e facilidade.

Muitos gregos que se dizem otimamente governados e seus legisladores pecaram contra estas coisas em dois pontos.

Em primeiro lugar, por não terem ordenado a ordem civil ao fim ótimo do homem. Em segundo lugar. porque não instituíram tanto as leis que significam a ordem civil como o ensino para as operações das virtudes ótimas, mas inclinaram tudo isto principalmente às coisas que lhes pareceram mais úteis, pelas quais poderiam enriquecer-se e dominar aos outros. Alguns filósofos também louvaram a intenção dos legisladores por terem ordenado todos os seus estatutos à dominação dos vizinhos e à guerra pelo qual poderiam submetê- los.

Estas repúblicas e leis assim estabelecidas podem ser facilmente questionadas pela razão e pelos fatos contingentes. Se a ordem civil, as leis e o ensino destas repúblicas fossem ótimas, então pela virtude das mesmas estas repúblicas dominariam sobre as outras, o que não é o que se observa hoje. Estas repúblicas dominavam não por causa da ordem civil por si mesmo, mas porque eram muito experientes na arte a no perigo da guerra, motivo pelo qual hoje muitas das mesmas não mais dominam e muitas das que ainda permanecem não são felizes. O legislador que, portanto, estabeleceu estas leis e ordenou estas repúblicas não foi um bom legislador.

Daqui se conclui ser manifesto nenhuma destas leis e nenhuma destas razões que se ordena a este modo de governar é civil, isto é, é otimamente ordenada, nem proveitosa para a sociedade, nem tampouco é verdadeira em si, porque não se ordenam ao fim ótimo, como pretendem.

É necessário que o legislador induza nas almas dos homens as mesmas coisas ótimas privadamente e publicamente e não ordenar o estudo dos cidadãos e também dos adversários para que submetam para servidão aqueles que não são naturalmente servis. Tal principado, sendo contra a inclinação natural, não pode ser contínuo nem amigo.

O legislador, ao contrário, deve procurar primeiro que os cidadãos não se tornem servos de outros homens, conduzindo uma vida indigna. Segundo, se apetecerem o principado, que o façam por causa da utilidade dos súditos e não da própria, e muito menos que governem sobre os mesmos dominativamente.