6.A causa da impossibilidade do intelecto enganar-se acerca das substâncias simples.

[De acordo com o que foi dito], nas substâncias simples a verdade [consiste na mente] atingí-las ou dizê- las. Não atingí-las, porém, não é o falso ou enganar-se, mas sim ignorá-las, e a causa disto está em que o intelecto não pode enganar-se acerca da essência, a não ser por acidente.

Conforme está explicado nos livros VII e VIII, nas substâncias simples a coisa e a essência são idênticas. Ora, acerca da essência o intelecto não pode enganar-se, a não ser por acidente: ou o intelecto atinge a essência e então verdadeiramente conhece o que é a coisa, ou não a atinge, e assim não apreende a própria coisa. Desta maneira, acerca das substâncias simples não poderá enganar- se. Isto acontece por causa daquilo que Aristóteles afirma no livro III do De Anima, que assim como o sentido acerca dos seus objetos próprios sempre é verdadeiro, assim o é também o intelecto acerca da essência, como a cerca de seu objeto próprio. E que o intelecto acerca da essência não se engana, não ocorre somente nas substâncias simples, mas também nas compostas.

Pode, porém, enganar-se por acidente.

[O intelecto, porém, pode enganar-se por acidente, acerca da essência das substâncias compostas e] devemos agora considerar como o intelecto pode enganar-se por acidente acerca da essência. Somente é possível enganar-se acerca da essência por composição ou divisão, e isto, nas substâncias compostas, pode acontecer de duas maneiras [distintas]. Pela primeira maneira, pela composição da definição à coisa definida. Este é o caso, por exemplo, de alguém que diz que o asno é um animal racional mortal, ou o homem não é um animal racional mortal. Em ambos estes casos há falsidade. Pela segunda maneira, quando a definição é constituída de partes que não são mutuamente componíveis. Este seria o caso de alguém que definisse o homem como animal insensível. Na segunda maneira de enganar-se, a falsidade é dita per se. Já na primeira maneira, a definição é dita falsa porque a definição posta não é correspondente ao sujeito.

Assim é que há dois modos de enganar-se acerca da essência das substâncias compostas.

Nas substâncias simples, porém, somente pode haver engano a respeito da essência delas pelo primeiro deste dois modos, porque na essência delas não há composição, a respeito de cuja composição ou divisão possa ocorrer engano.