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Deve-se saber que, conforme diz o Filósofo no
livro primeiro da Metafísica, o homem livre é aquele que é
causa de si mesmo. Esta afirmação não pode ser entendida no
sentido de que alguém seja a causa de si mesmo por primeiro.
De fato, nada pode ser causa de si mesmo. A sentença deve ser
entendida no sentido de que é livre aquele que segundo algo
próprio a si mesmo é causa de sua operação. Neste sentido
será verdade dizer que o homem livre é causa de si mesmo
segundo dois gêneros de causa, pela razão do agente, e pela
razão do fim. Pela razão do agente, na medida em que opera
por meio de algum princípio que nele é principal. Pela razão
do fim, na medida em que opera ao fim que lhe é devido
segundo aquele princípio.
E porque o homem maximamente é constituído no ser
pelo intelecto, sendo ele inteligência ou maximamente segundo
a inteligência, conforme diz o Filósofo no Décimo Livro da
Ética, por isso é dito homem livre aquele que, vivendo pela
virtude do intelecto, nela opera não recebendo de outro a
razão de operar, nem tendo impedimento para tanto por parte
da matéria, e que opera para o fim que lhe é devido segundo a
natureza mencionada. E quanto mais for capaz de operar
segundo aquilo que é mais perfeito na inteligência que há
nele, e a um fim mais excelente segundo [a inteligência],
tanto mais será livre. E, por isso, aquele que opera de modo
simples segundo a virtude da inteligência, e a um fim segundo
a inteligência, este será perfeitissimamente livre.
Ao contrário, porém, o homem é dito servo quando
não é capaz de operar segundo a virtude e a razão de operar
de outro e, obedecendo, opera. E porque o fim corresponde ao
agente, é servo também aquele que opera principalmente para o
fim de outro e por isso, assim como o homem livre é aquele
que é causa de si mesmo, tanto segundo a razão do fim como
segundo a razão do agente, assim também é servo aquele que de
nenhum destes modos governa a si mesmo, e isto por causa da
imperfeição da inteligência que há segundo si, ou pela
disposição da matéria.
A vida do homem livre, portanto, é dita ser a vida
segundo a razão própria, enquanto que a vida do servo é dita
ser a vida segundo a razão de outro.
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