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O Filósofo retoma a consideração das causas da
sedição, alargando [seus comentários].
Em todos os lugares as sedições se fazem por causa
da desigualdade. [A desigualdade, porém, a que o Filósofo se
refere, é a desigualdade segundo a proporção, da qual ele
passa a explicar o que segue].
Não somente nos [desiguais segundo algo] pode
haver uma igualdade proporcional, mas também entre os
desiguais segundo algo pode haver uma desigualdade
proporcional. Por exemplo, se alguém é mais digno do que os
outros segundo a virtude, é digno de ser rei. Poderá, porém,
não ser digno de ser rei perpetuamente, porque talvez sua
dignidade em virtude não excederá tanto a dignidade dos
outros quanto a dignidade do reino perpétuo excede a honra
dos outros e, deste modo, também entre os desiguais pode
ocorrer haver desigualdade proporcional.
Ora, de modo universal, os que estimam dever ter o
igual [proporcional] e não o têm, movem sedições na
república.
A proporção é na relação de duas quantidades entre
si. Esta proporção pode ser considerada ou segundo a
igualdade da quantidade, ou segundo a igualdade da dignidade.
De fato, a igualdade [proporcional] pode ser dita segundo o
número [ou segundo a quantidade] e segundo a dignidade.
Um exemplo de igualdade [proporcional] segundo a
quantidade é [a igualdade segundo a proporção] do dois para p
um e do três para o dois. O excesso de cada um dos dois é
igual.
A igualdade [proporcional] segundo a dignidade
ocorre quando dizemos que assim como o quatro está para o
dois, assim o dois está para o um. Assim como, de fato, o
dois é a metade do quatro, assim o um é a metade do dois.
O Filósofo afirma, em seguida, que todos querem a
igualdade segundo a dignidade. O estado popular e o estado de
poucos querem ambos a igualdade segundo a dignidade, mas
diversamente.
Todos confessam que o justo é a igualdade segundo
a dignidade, mas diferem entre si. Os que promovem o estado
popular dizem que se alguns forem iguais segundo algo, por
exemplo, segundo a liberdade, serão simplesmente iguais e
deverão receber igualmente. Já os que promovem o estado de
poucos dizem que se alguns são desiguais segundo algo, por
exemplo, segundo as riquezas, serão simplesmente desiguais e
mais dignos, e segundo isto deverão receber desigualmente.
Ambas estas repúblicas, porém, são mal ordenadas,
isto é, o estado popular no qual se considera a igualdade
segundo a liberdade e o estado de poucos no qual se considera
a igualdade segundo as riquezas, pelo que ocorre que nenhuma
destas repúblicas é duradoura. A razão de sua pouca
durabilidade é ser impossível que naquilo que no princípio é
corrompido e desordenado no fim não ocorra o mal. Ora, ambas
estas repúblicas são desordenadas. Embora no princípio pareça
tratar-se de uma pequena desordem, todavia depois torna-se
grande, e o mal se torna evidente. Isto, porém, não pode ser
duradouro.
Como ambas as repúblicas são viciadas e
desordenadas, para que sejam mais duradouras é necessário que
ambas às vezes façam uso da igualdade segundo a proporção
aritmética, isto é, a igualdade que há do três para o dois e
do dois para o um, e às vezes façam uso da igualdade segundo
a proporção geométrica, isto é, a igualdade que há do quatro
para o dois e do dois para o um.
No entanto, dentre estas duas repúblicas, o estado
popular é mais seguro e menos propenso à sedição. [Diz o
Filósofo que], embora o estado dos poucos e o estado dos
muitos sejam mal ordenados, todavia o estado popular é mais
seguro e menos sedicioso do que o estado de poucos. A razão
disto é porque é mais segura aquela república na qual se
fazem menos sedições. No estado popular, porém, há menos
sedições do que no estado de poucos. De fato, no estado de
poucos há duas sedições: uma, a dos ricos entre si, a outra,
a dos pobres para com os ricos. No estado popular, porém,
apenas há uma única sedição, a dos ricos para com os pobres.
A sedição dos pobres entre si não é uma sedição que seja
digna de consideração, porque entre si os pobres mais estão
de acordo do que com os ricos.
A outra razão pela qual é manifesto que o estado
popular é mais seguro é porque a república que é constituída
[de cidadãos pertencentes ao termo] médio é mais próxima ao
estado popular do que ao estado dos poucos no qual poucos
dominam. A república média, porém, é a mais segura entre [as]
repúblicas [que se] afastam da ótima, [e o estado popular],
que está mais próximo dela [do que o estado de poucos], é
mais seguro do que [este último].
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