9. Não é ótimo dominar sobre todos de qualquer modo.

Diz o Filósofo que talvez alguém poderia opinar, devido ao que já foi dito acerca da vida ótima, isto é, que ela é uma operação, que o ótimo seria dominar sobre todas as coisas de qualquer modo. O ótimo, de fato, é alcançar a vida ótima; se a vida ótima é alcançar a operação ótima, e aquele que domina a tudo é também o senhor de muitas e belíssimas operações, por isso parece que se deveria dizer quer o ótimo é dominar a tudo.

Mas o Filósofo responde a esta objeção dizendo que não é ótimo dominar a tudo de qualquer modo. Isto talvez seria verdade se fosse possível que aquele que dominasse, privando os demais de sues direitos, de suas inclinações naturais e inferindo-lhes excelência, pudesse inerir naquilo que fosse elegibilíssimo no homem. Mas talvez isso seja impossível, pelo que o Filósofo acrescenta que os grandes opinaram o contrário.

[De fato, é impossível que o ótimo seja dominar a tudo de qualquer modo]. As ações do governante somente serão ótimas se o próprio governante diferir tanto daqueles que são governados em suas disposições naturais e adquiridas quanto o homem dista da mulher, o pai do filho ou o senhor do servo. Se, portanto, alguém transgredir [esta regra], querendo dominar a outros sem possuir esta diferença para que os súditos tal como a que existe do homem para com a mulher, ou do pai para com o filho ou do senhor para com o servo, não poderá operar otimamente ao governar, nem também poderá operar tão retamente em suas ações posteriores quanto tiverem sido suas transgressões no início ao querer governar sem possuir as disposições para tanto, pois um pequeno erro no princípio torna-se grande quando se chega às conseqüências deste princípio.

Por isso aqueles que são semelhantes e iguais, tanto segundo a natureza quando segundo a virtude, é bom e justo que governem todos não de modo simples, mas segundo a parte. Por exemplo, um em um tempo, e outro em outro tempo, ou um em um principado e outro em outro principado. É justo que os que são semelhantes e iguais tenham o semelhante e o igual, que os desiguais, tanto segundo a virtude como segundo a natureza, tenham o igual, enquanto que ao contrário que os iguais tenham o desigual e os não semelhantes tenham o semelhante, isto é contra a natureza. Os semelhantes e os iguais inclinam-se segundo a natureza para [coisas] iguais e semelhantes, e nada do que é além da natureza é bom, já que aquilo que está além da natureza é excelente e nenhuma excelência é boa. Portanto, que alguém domine sobre todos de qualquer modo não é bom.

Isto, porém, não significa que alguém governar sobre todos de algum modo seria além da natureza. Se assim o fosse, isto seria contra a razão do reino, que é a república ótima.

De fato, se é justo que os semelhantes e iguais tenham o semelhante e o igual ao governar segundo a parte, se, [por outro lado], alguém for encontrado na cidade que seja melhor do que os outros tanto nos bens da virtude quanto na potência ativa ao governar, pelo que pudesse coibir os maus, seria bom submeter-se a este, porque é natural que o deficiente se submeta ao perfeito em qualquer gênero, e também será justo submeter-se [a este único] governante.

O justo é, de fato, que cada um possua segundo a sua própria dignidade e um tal homem é suposto ser melhor do que os demais segundo a virtude e segundo o poder. Convém ao que deve bem governar que possua não somente a virtude pela qual se incline ao bem e saiba dirigir as ações dos súditos, mas também convém que ele possua o poder pelo qual possa agir de tal modo que coiba os que declinam da retidão da razão.