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[Existe uma outra questão a ser respondida que é],
se a alma não existisse, o tempo existiria ou não existiria?
A resposta a esta pergunta é que, se a alma não
existisse, dever-se-ia dizer que o tempo não existiria.
A resposta mais precisa, entretanto, é que, se a
alma não existisse, mas o movimento existisse, o tempo
[existiria sob uma forma] de um certo tipo de ser
[imperfeito].
Para se entender o que essa resposta significa,
devem-se compreender primeiramente certas outras coisas.
Se existem coisas numeradas, deve existir o
número, porque a existência das coisas numeradas não depende
do intelecto da alma. Somente a numeração em si mesma, que é
um ato da alma, depende do intelecto da alma. Portanto, pode
existir o número e as coisas numeráveis quando não existe
ninguém que numere.
[Mas], se for [intrinsecamente] impossível a
existência de alguém que numere [enquanto tal], então [isso
significa que] é impossível existir algo numerável.
Entretanto, [deve-se repetir que] não se segue que, se não
existe quem numere, não exista algo numerável.
[Baseados nisto, podemos dizer que], se o
movimento tivesse uma existência fixa nas coisas, como uma
pedra ou uma casa têm, poderia se dizer de modo absoluto que,
assim como há um número de pedras quando a alma não existe,
assim também existiria um número de movimento, que é o tempo,
quando a alma não existisse.
Mas acontece que o movimento não tem uma
existência fixa nas coisas. [Dizemos isso porque] nada
relacionado com o movimento é achado em ato nas coisas,
exceto uma parte indivisível do movimento. Mas, [quanto à]
totalidade do movimento, ele é estabelecido por uma
consideração da alma ao comparar uma disposição anterior do
objeto móvel com uma disposição posterior do mesmo objeto.
Desta meneira, o tempo não apresenta existência
fora da alma exceto em relação a uma parte indivisível.
[Dizemos isso porque] a totalidade do tempo é estabelecida
pela ordenação da alma que numera o antes e o depois no
movimento, como já foi explicado.
Portanto, se a alma não existisse, o tempo seria
algum tipo de ser, isto é, um ser imperfeito.
Da mesma maneira, se sucedesse haver movimento mas
não haver alma, o movimento também se diria existir
imperfeitamente.
Por causa disso, os argumentos que se davam no
início da teoria do tempo, que demonstravam que o tempo não
existe porque é composto de partes não existentes, [isto é, o
passado e o futuro], ficam respondidos. Porque, [através do
que foi dito], fica claro que o tempo não apresenta
existência perfeita fora da alma, como nem tampouco o
movimento apresenta.
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