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Depois que o Filósofo determinou sobre a
república, e como ela é composta do estado de poucos e do
estado popular, passa a determinar sobre a tirania.
Diz o Filósofo que sobre a tirania não se deve
fazer um discurso prolixo, porque é uma república péssima.
Deve-se, ao contrário, dizer algo breve sobre a mesma para
que faça parte do presente tratado.
Já que a tirania é uma transgressão do reino, o
Filósofo retoma primeiramente certas coisas que foram
determinadas sobre o reino. De fato, nos livros precedentes
foi exposta [a natureza] da monarquia real, onde foi
considerada a própria monarquia, se às cidades convinha que
um só governasse ou não e, suposto que convinha, foi
considerado também como deveria ser este [único governante],
pois deveria ser ótimo e de onde deveria ser escolhido, isto
é, a partir dos homens ótimos, e de que modo.
[Declaradas estas coisas], deve-se dizer que há
duas espécies de tirania, sobre as quais já determinamos
anteriormente, quando determinamos o que diz respeito ao
reino, que são muito próximos da monarquia real. Os
governantes segundo estas duas espécies de tiranias governam
segundo as leis. Uma destas espécies é aquela segundo a qual
em algumas cidades de bárbaros eleva-se um monarca que a rege
segundo as leis e os costumes. É costume [entre estes
bárbaros] que tomam para si um monarca, ou por eleição, ou
por sucessão, que os governa segundo as leis.
A segunda espécie de tirania é aquela segundo a
qual alguns escolhiam para si um príncipe para afugentar os
inimigos, como ocorria junto aos gregos na antiguidade, entre
os quais eram escolhidos alguns que eram chamados de
Aesymnetas.
Estas duas espécies tinham em si certas coisas
opostas e diversas. Quando estes reis governavam segundo as
leis e imperavam sobre os que os queriam, eram monarquias
reais; quando, porém, abandonadas as leis segundo as quais
deveria reger, dominavam com pleno poder segundo o seu
arbítrio, reinavam tiranicamente e estas monarquias eram
tirânicas.
A terceira espécie de tirania, a qual é o próprio
e maximamente tirano é convertível com a monarquia real dita
de modo principal e primeiro. Não que seja igual a ela, mas
por oposição. Porque assim como no reino governa um só
segundo a sua vontade, a qual é ordenada pela razão para a
utilidade dos súditos, assim também nesta [terceira espécie
de tirania] governa um só segundo a sua vontade. Esta
tirania, que não se submete a nenhuma lei, é um principado
incorrigível dos semelhantes e dos melhores por causa de seu
próprio bem, não do bem dos súditos.
E dizemos que é incorrigível porque não tem a
capacidade de corrigir-se. Dizemos ser incorrigível aquele
que pode mudar de uma disposição má para uma disposição boa
de tal modo que preserve a sua própria natureza. Este
principado, porém, é tão péssimo que de sua má disposição não
pode mudar a uma boa disposição de modo que consiga preservar
a sua natureza. Ao contrário, se mudasse, corromper-se-ia [a
si mesmo]. O Filósofo, acrescentando os termos "dos
semelhantes e dos melhores", se refere à matéria deste
principado. Neste principado, de fato, há homens iguais,
livres e virtuosos. Ao acrescentar "por causa do bem próprio,
não dos súditos", o Filósofo se refere à causa final do
principado.
De tudo isto se segue que este principado não é
voluntário, porque ninguém, livro e voluntariamente, se
submeteria a um tal principado. A razão é clara, pois ninguém
que seja bem disposto segundo a natureza e que se incline à
virtude, quereria submeter-se a quem governa não segundo a
virtude, mas por causa de seu bem próprio.
Podemos concluir, portanto, que tais são as
espécies da tirania, e pelas causas já ditas.
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