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[O magnânimo se deleita moderadamente nas honras
recebidas]. Se ao magnânimo são conferidas honras grandes e
boas por atos bons, ele se deleita nelas moderadamente. O
magnânimo considerará as honras por ele alcançadas como bens
próprios a si convenientes, ou mesmo inferiores ao que lhe é
devido, porque considerará que nenhuma honra exterior exibida
ao homem é prêmio condigno da virtude, porque o bem da razão,
pela qual a virtude é louvada, excede todos os bens
exteriores. Nem por isso, entretanto, o magnânimo se indigna,
mas recebe estas honras com equanimidade, considerando que os
homens não possuem algo maior com que lhe possam retribuir.
[O magnânimo despreza as honras que não são pela
virtude]. Se ao magnânimo são conferidas honras por causa de
coisas contingentes, ou se é honrado por quaisquer outras
coisas além da virtude, como por exemplo, se é honrado por
causa de riquezas, ou outras coisas tais, ou se é honrado por
algumas pequenas honras, o magnânimo desprezará tais honras,
por reputar-se não ser digno de tais [ honras].
[O magnânimo não se abala com as injúrias]. O
magnânimo se comporta com moderação perante as desonras.
Assim como o magnânimo não se exalta pelas grandes honras,
assim também o seu ânimo não se abate pelas injúrias, porque
considerará que as recebe injustamente.
[O magnânimo se comporta moderadamente em relação
às riquezas e ao poder]. Embora a magnanimidade esteja
relacionada principalmente com as honras, todavia também o
está secundariamente com as riquezas e o poder, na medida em
que por estas coisas alguém é honrado. De fato, tanto o poder
como as riquezas são desejadas por causa da honra, na medida
em que os homens que possuem tais coisas, desejam por elas
ser honrados. Acerca destas coisas, assim como dos
infortúnios [a ela contrários], o magnânimo se comporta
moderadamente qualquer coisa lhe aconteça, de tal maneira que
não se alegra superfluamente se lhe advém a boa fortuna, nem
se entristecerá superfluamente se lhe advém o infortúnio. Se,
[de fato], o magnânimo estima um pouco a própria honra, de
tal maneira que não se alegra superfluamente por ela, muito
mais considerará pequenas estas outras coisas, não se
alegrando superfluamente com elas. Daqui vem que alguns
consideraram os magnânimos [indiferentes], pelo fato de
desprezarem os bens exteriores, e apreciarem somente os bens
anteriores da virtude.
[O magnânimo não se expõe ao perigo por coisas
pequenas]. O magnânimo não se expõe ao perigo por coisas
pequenas, nem é amante dos perigos, expondo-se pronta e
facilmente aos perigos. Isto porque ninguém se expõe ao
perigo a não ser por causa de algo que muito aprecie. Ora, ao
magnânimo pertence poucas coisas somente apreciar, pelas
quais queira se expor ao perigo. De onde que não facilmente e
nem por poucas coisas enfrenta perigos. O magnânimo enfrenta
perigos por coisas grandes, porque se exporá a quaisquer
perigos por coisas grandes tais como pela salvação comum,
pela justiça, pelo culto divino e outras coisas tais.
[O magnânimo, quando se expõe aos perigos, o faz
com veemência]. Quando o magnânimo se expõe ao perigo o faz
com veemência, de maneira que não poupe de sua vida, por não
ser digno que mais queira viver do que conseguir um grande
bem pela morte.
[Em relação às riquezas], o magnânimo é pronto a
[doar dinheiro], mas se envergonha de recebê-lo dos outros.
Se o magnânimo aceita dinheiro, sempre estuda como retribuir
a mais. O magnânimo é de tal maneira que se deleita em [dar
dinheiro], mas o recebe constrangido. Pertence ao magnânimo
que se apresente como de nada caraente, [ou quase], na medida
em que não pede e não aceita, mas está pronto [a dar].
[O magnânimo se mostra em sua grandeza ao que tem
dignidade, mas é moderado para com os medíocres]. Ao
magnânimo pertence que se mostre grande e honorável a aqueles
que têm dignidade, mas aos medíocres mostra moderação, não
usando sua magnanimidade para com eles. Há dois motivos para
isto. O primeiro é que toda virtude se esforça para aquilo
que é difícil e honorável. Ora, que alguém exceda no bem aos
grandes homens, é difícil e venerável. Mas que alguém exceda
aos homens medíocres, é fácil. O segundo está em que exibir-
se entre grandes homens como venerável pertence a uma certa
virilidade da alma. Mas que alguém queira que uma grande
reverência lhe seja exibida pelas mínimas pessoas, isto
pertence àqueles que são pesados aos demais.
[O magnânimo não se intromete em muitos negócios].
Pertence ao magnânimo que seja ocioso, pelo fato de não se
intrometer em muitos negócios, e que seja tardo, isto é, que
não facilmente se introduza nos negócios. O magnânimo somente
insiste naqueles atos que pertencem a alguma grande honra, ou
ao fazer alguma grande obra. Assim, o magnânimo é operativo
de poucas coisas, mas opera grandes, e que são dignas de
grande nome.
[O magnânimo não esconde amizade ou inimizade]. É
necessário que o magnânimo seja manifestamente amigo e
manifestamente inimigo. Isto porque alguém amar ou odiar
escondidamente provém de algum temor. Ora, o temor repugna ao
magnânimo.
[O magnânimo mais se importa com a verdade do que
com a opinião dos homens]. Ao magnânimo pertence que mais se
importe com a verdade do que com a opinião dos homens. De
fato, não por causa da opinião humana se afastará daquilo que
deve fazer segundo a virtude.
[O magnânimo fala e opera manifestamente].
Pertence ao magnânimo que manifestamente fale e opere, por
desprezar os outros. De onde que ele mesmo divulga seus ditos
e feitos. Isto porque alguém ocultar o que faz ou o que diz
provém do fato de que teme os outros. Ora, ninguém teme os
que despreza. Não dizemos, porém, que o magnânimo despreza os
outros por [humilhá-los], como que privando-os de uma devida
reverência, mas sim porque não os aprecia mais do que deve.
[O magnânimo não é falso]. O magnânimo em suas
palavras não é falso, mas diz a verdade, a não ser que talvez
o faça por brincadeira.
[O magnânimo não dá familiaridade para com todos].
O magnânimo não se inclina a conviver com os outros a não ser
com os amigos. Que alguém mostre familiaridade com todos
pertence a uma alma servil. De onde que todos os
lisonjeadores, que desejam indiferentemente a todos agradar,
são [aptos para serem servos].
[O magnânimo não é pronto para admirar-se]. O
magnânimo não é pronto para admirar-se, porque a admiração é
de coisas grandes. Ora, para o magnânimo, as coisas
exteriores que possam ocorrer não são grandes, porque toda a
sua vida é acerca dos bens interiores, que são
verdadeiramente grandes.
[O magnânimo não muito se recorda dos males pelos
quais passou]. O magnânimo não muito se recorda dos males
pelos quais passou. Há duas razões para isto. A primeira está
em que não convém ao magnânimo recordar-se de muitas coisas,
assim como nem admirar-se. De fato, nós costumamos recordar-
nos das coisas que admiramos como grandes. A segunda razão
está em que ao magnânimo pertence de modo especial esquecer-
se dos males pelos quais passou, na medida em que os
despreza, como algo pelo qual ele não pôde ter sido
diminuído.
[O magnânimo não fala dos outros]. O magnânimo não
fala muito dos homens, porque não aprecia muito as coisas
particulares dos homens, mas toda a sua intenção diz respeito
aos bens comuns e divinos. Assim, nem fala muito de si mesmo,
nem dos outros.
[O magnânimo não murmura e nem exige coisas
necessárias à vida humana]. Acerca do que é necessário à vida
humana, ou quaisquer outras coisas, o magnânimo não murmura
se lhe faltam, nem exige que se lhe dêem. De fato, fazer
estas coisas pertence àquele que se [preocupa] com as coisas
necessárias à vida, como de coisas grandes, o que é contrário
à magnanimidade.
[O magnânimo prefere o que é honorável ao que é
lucrativo]. O magnânimo está mais pronto a possuir os bens
honoráveis que não dão lucro, do que os úteis e lucrativos.
[O magnânimo tem movimentos graves, voz grave e
falar tardo]. Os movimentos do magnânimo são graves, sua voz
é grave, e o seu falar é estável e tardio. A razão disto está
em que os movimentos do magnânimo não podem ser velozes,
porque sua intenção é operar poucas [coisas].
Semelhantemente, o magnânimo não é dado a controvérsias,
porque não estima por grande nenhuma das coisas exteriores.
De fato, ninguém contende a não ser por coisas grandes. Ora,
a agudez da voz, a velocidade do falar acontece por causa do
[espírito] de contenda. Fica patente, portanto, que a própria
afeição do magnânimo requer a gravidade da voz, a demora no
falar e nos movimentos. Aristóteles afirmou no Livro das
Categorias, que se alguém é inclinado por natureza a alguma
paixão, por exemplo, à vergonha, naturalmente possui por
natureza a cor que compete à vergonha. De onde que se alguém
apresenta uma aptidão natural à magnanimidade,
conseqüentemente, apresentará uma disposição natural para
tais acidentes.
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