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Deste ou de tais virtuosos talvez poderá dizer-se
retamente o que disse Antístenes sobre os leões "que para as
lebres, se quisessem possuir a igualdade ou serem iguais, não
seria bom ter como sócios os leões com os seus dentes, porque
os leões, por causa de seu poder, as devorariam". Assim
também, na cidade, não é bom para os cidadãos que busquem a
igualdade, que tenham um ou vários homens tão virtuosos como
concidadãos, porque por causa de seu poder e virtude seriam
oprimidos. Foi por causa disso que as cidades [onde a
política era a democracia ou o estado] popular estabeleceram
o ostracismo, isto é, a relegação, contra tais homens. Estas
cidades queriam possuir a igualdade, o povo nelas domina por
causa da liberdade, todos igualmente alcançam a liberdade;
por este motivo aqueles que excediam os cidadãos comuns nas
riquezas, nas amizades ou em algum poder civil, eram
relegados da cidade e exilados para fora da cidade durante
alguns tempos determinados. Segundo estes, é manifesto que
cidadãos que excedem a tal ponto os demais não convém que
permaneçam na cidade.
Por causa disto, a saber, que não convém que tais
homens que excedem outros permaneçam na cidade, mas que
convém que sejam exilados, alguns, querendo recriminar um
tirano, vituperaram o conselho de Periandro a Trasíbulo não
segundo a razão. De fato, tendo Trasíbulo enviado uma
mensageiro a Periandro sobre o que deveria fazer contra os
poderosos e os ricos e todos os que se sobressaiam na cidade
que turbavam o seu domínio, não querendo Periandro manifestar
o seu intento de um modo que fosse claro ao mensageiro,
disse-lhe em parábolas o que deveria ser feito, mandando
dizer que, removendo as espigas excedentes a seara se
tornaria uniforme. O mensageiro, ignorando o motivo daquilo
que fazia, comunicou a Trasíbulo o que lhe havia sido dito e
este imediatamente entendeu que deveria matar os homens
excelentes no virtude e no poder. O Filósofo afirma que não
foram apenas os tiranos que procedem deste modo, mas também
as democracias e as oligarquias agem semelhantemente, pois
nelas ordena-se a relegação para impedir que alguém se torne
tão excelente e, se suceder haver alguém assim, que este seja
exilado. Parece manifesto, por estes exemplos, que tais
homens não devem permanecer na cidade.
Em algumas cidades, aqueles que tinham domínio e
potência sobre eles fizeram o mesmo, como os atenienses
quando subjugaram Samos, Kios e Lesbos. Como estas cidades
excederam os atenienses, em várias coisas os atenienses as
humilharam e oprimiram, descumprindo inclusive pactos
anteriormente estabelecidos. Do mesmo modo procedeu o rei dos
Persas quando submeteu a si os Medos e os Babilônios,
dispersando os que eram mais prudentes e sagazes entre eles;
vendo, de fato, que tais homens eram prudentes e sagazes,
porque haviam governado e tinham vivido civilmente, temendo
que se permanecessem juntos pudessem encontrar pela sabedoria
os caminhos pelos quais se libertariam de seu jugo,
dispersou-os e assim estes [homens] excelentes por causa de
sua sabedoria foram transladados a outras regiões.
Este problema, portanto, universalmente diz
respeito a todas as políticas, isto é, que aqueles que
excedem os outros no poder e na virtude, não são cidadãos.
Nas políticas desviadas isto pode ser observado, porque os
que nelas governam, procurando apenas o bem próprio, exilam
da cidade aqueles que excedem os demais no poder ou na
virtude; mas não apenas as que buscam o bem próprio fazem
tais coisas, como também as que buscam o bem comum.
O mesmo se observa por semelhança nas artes.
Vemos, de fato, que se o pintor elabora uma imagem, não
pintará um pé que exceda as outras partes segundo a
proporção, mesmo que ele seja mais belo do que as outras. Da
mesma maneira, aquele que constrói um navio não fará a proa,
a parte da frente do navio, maior do que as outras além da
proporção, ainda que aquela parte seja otimamente feita.
Semelhantemente o maestro do coro, se alguém cantar mais alto
do que todos os outros além da proporção, ainda que cante
mais bela e deleitavelmente que os demais, não permitirá que
cante com os demais. Eis o motivo porque, de modo semelhante,
se há alguém na cidade que seja mais excelente do que todos
os demais na virtude e na potência, embora em si seja bom,
por ser improporcional aos demais, o legislador deverá exilá-
lo.
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