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O Filósofo, a seguir, responde à primeira das
questões levantadas, de cuja solução seguir-se-á a solução da
segunda.
Deve-se entender que a felicidade é a operação
humana segundo a inteligência. Na inteligência deve-se
considerar o intelecto especulativo, cujo fim é o
conhecimento da verdade, e o intelecto prático, cujo fim é a
operação.
Segundo isto pode-se assinalar uma dupla
felicidade para o homem. A [primeira] é a [felicidade]
especulativa que é a operação do homem segundo a perfeita
virtude contemplativa que é a sabedoria. A outra é [a
felicidade] prática, que é a perfeição do homem segundo a
virtude prática perfeita do homem que é a prudência.
Há uma certa operação segundo a prudência e uma
certa especulação segundo a sabedoria do homem apenas segundo
si mesmo. E há também uma certa operação da prudência e uma
certa especulação [da sabedoria] de toda a cidade. Por isso,
há uma certa felicidade prática e uma certa felicidade
especulativa do homem segundo si mesmo, e há uma certa
felicidade prática de toda a cidade e uma certa felicidade
contemplativa de toda a cidade.
A felicidade especulativa segundo um só homem é
melhor do que a prática que é segundo um só homem, conforme
evidentemente ensina Aristóteles no Décimo Livro da Ética, já
que a perfeição da inteligência que é preferível é aquela que
diz respeito ao objeto mais inteligível, porque a razão da
perfeição é tomada do objeto. Ora, esta é a especulativa. A
felicidade, de fato, é a perfeição da inteligência em relação
ao primeiro e maximamente inteligível. Já a felicidade
prática é a perfeição da inteligência em relação aos agíveis
do homem, o que é muito carente em relação à razão do
primeiro inteligível. Portanto, a felicidade contemplativa de
um só homem deve ser mais escolhida do que a felicidade
prática. Ademais, a felicidade contemplativa é também mais
contínua, suficiente e deleitável do que a prática.
Pela mesma razão, a felicidade contemplativa de
toda a cidade deve ser mais escolhida do que a felicidade
política ou civil, sendo a felicidade contemplativa de toda a
cidade mais elegível do que a felicidade contemplativa de um
só homem. Semelhantemente, o mesmo pode ser dito da
felicidade civil e prática de um só homem. E é isto o que
pretendia dizer Aristóteles no Primeiro Livro da Ética, ao
afirmar que se o mesmo é para um só homem e para a cidade,
maior e mais perfeito parecerá o que é tomado e salvo para a
cidade. Amável já o será para um só, melhor, porém, e mais
divino para um povo ou uma cidade. E a razão disto é que a
vida contemplativa e civil da cidade compara-se à vida
contemplativa [e prática] de um só homem como o todo se
compara à parte, e o todo possui razão de mais perfeito e de
maior bem do que a parte.
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