3. A distribuição do principado não deve ser feita segundo o excesso de qualquer bem.

Alguém poderia dizer que o principado deve ser distribuído segundo a dignidade ou o excesso de qualquer bem, seja este bem segundo a alma ou segundo o corpo.

Não pode, porém, ser verdade que o principado deve ser desigualmente distribuído segundo o excesso de qualquer bem, o que é manifesto se considerarmos o excesso segundo a cor e a magnitude ou segundo o excesso de qualquer outro bem. É imediatamente evidente que o principado não deve ser distribuído segundo o excesso destes bens, o que é manifesto [não apenas na política] como também nas demais ciências e potências.

Se, de fato, houver duas pessoas igualmente possuidoras da arte de tocar a flauta, e se um excede o outro na nobreza, é manifesto que não deverão ser dadas mais ou melhores flautas ao que excede na nobreza. A razão disto é que as flautas não são dadas senão por causa da obra de tocar flauta; não devem, portanto, ser dadas senão àquele que nasceu para tocar. Portanto, mais e melhores flautas devem ser dadas àquele que mais é apto e melhor sabe tocar flauta. Conseqüentemente não devem ser distribuídas em maior número por causa das qualidades pelas quais o homem não é mais apto a tocar flauta, nem sabe melhor tocá-las. Tudo isso faz com que seja manifesto que, pelo excesso da nobreza, não devem ser distribuídas flautas em maior número.

Semelhantemente, se há alguém melhor disposto segundo a virtude e mais apto a governar do que outro, que é excedido todavia por outro pela nobreza e beleza, a distribuição do principado deve ser feita mais ao virtuoso do que a outro. A razão disto é que a distribuição do principado segundo o excesso não deve ser feita senão ao que é mais apto a governar. Este, todavia, é aquele que excede na virtude. Pelo que é manifesto que a distribuição do principado não deve ser feita segundo o excesso de qualquer bem.