6. Pergunta-se como algo pode estar em si mesmo.

Algo estar em si mesmo pode ser entendido de duas maneiras.

- A primeira, primariamente e per se.

- A segunda, de acordo com um outro, isto é, segundo uma parte.

De acordo com a segunda maneira, algo pode ser dito estar em si mesmo.

Isto pode ser explicado assim: nós vemos que algo pode ser dito de alguma coisa por causa de uma parte. Assim, algo é chamado branco porque a sua superfície é branca. Um homem é chamado sábio porque há sabedoria em [sua] parte racional. Se nós tomarmos um jarro cheio de vinho como um certo todo cujas partes são o jarro e o vinho, nenhuma das partes, isto é, nem o jarro e nem o vinho, estarão em si mesmo. Mas o todo, isto é, o jarro de vinho, estará em si mesmo na medida em que cada uma destas é sua parte, tanto o vinho que está no jarro, como o jarro em que está o vinho. [Podemos generalizar este exemplo da seguinte forma]: quando duas partes de um todo estão relacionadas de tal maneira que uma parte é a parte na qual algo está contido e a outra parte é aquilo que estava contido na anterior, então segue-se que o todo pode ser dito ser tanto aquilo que está contido, por razão de uma parte, como aquilo que é continente, por razão de outra parte. E desta maneira um todo poder ser dito estar em si mesmo.

Já no que diz respeito à primeira maneira de algo estar em si mesmo, primariamente e per se, isto é impossível de se dar.

[O significado de algo estar em algum outro primariamente é o seguinte.] O branco se diz estar num corpo porque a superfície branca está no corpo. De onde segue-se que o branco não está primariamente no corpo, mas na superfície. Semelhantemente, a ciência é dita estar primariamente na alma, mas não no homem, na qual ela está através da alma.

O branco não está no homem primariamente, mas através do corpo, e está no corpo através da superfície. Entretanto, não está na superfície através de nenhuma outra coisa. Portanto, é dito estar primariamente na superfície. Aquilo no qual algo está primariamente, e aquilo que está neste algo primariamente, não são a mesma coisa. Por exemplo, o branco e a superfície.

Ora, que nada está primariamente em si mesmo per se, pode ser visto considerando indutivamente os modos já determinados pelos quais algo é dito estar em alguma outra coisa. Daí se vê claramente que nada é um todo, ou uma parte, ou um gênero de si mesmo, e assim sucessivamente de acordo com os oitos modos já considerados.

[S. Tomás observa que] deve ser entendido que algumas vezes algo é dito estar em si mesmo, não de acordo com um entendimento afirmativo, que Aristóteles rejeita, mas de acordo com um entendimento negativo. Neste sentido, estar em si mesmo significa apenas que este algo não está em algum outro.

Há ainda um outro motivo para que o lugar não possa ser nem matéria nem forma.] Já foi mostrado que nada está em si mesmo primariamente e per se. Isso significa que primariamente e per se aquilo que está em algo e aquilo no qual algo está devem diferir primariamente e per se. De onde que nem a matéria e nem a forma podem ser o lugar. Porque na verdade o lugar é algo diferente do que está localizado no lugar. Já no que diz respeito à matéria e à forma, são partes intrínsecas do que está localizado no lugar.