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Se for colocado ser necessário que nas enunciações
opostas uma seja determinadamente verdadeira e outra seja
falsa, tanto nas enunciações singulares como nas universais,
de tal maneira que nenhuma das coisas que se fazem [tenha
inclinação para] ambas [as possibilidades], mas todas se
realizam procedentes da necessidade, seguir-se-ão ainda, [nas
coisas humanas], dois outros inconvenientes.
O primeiro é que não convirá que nos aconselhemos
de coisa alguma. Foi, de fato, demonstrado no III da Ética,
que o conselho não se refere às coisas que ocorrem
necessariamente, mas apenas as coisas contingentes, as que
podem ser e não ser.
O segundo inconveniente será que todas as ações
humanas que são por causa de algum fim, como as negociações
que se fazem para adquirir riquezas, serão supérfluas. Pois,
se todas as coisas ocorrem procedentes da necessidade,
operando ou não operando, sucederá aquilo que pretendemos.
Isto, porém, é contra a intenção dos homens, pois eles se
aconselham e negociam com a intenção de que se fizerem tal
coisa sucederá tal fim, se fizerem aquela outra, sucederá o
outro fim.
Quanto às coisas humanas, portanto, é manifesto
ser impossível [que de todas as enunciações singulares
futuras um dos opostos seja determinadamente verdadeiro],
porque o homem é manifestamente ele próprio o princípio das
coisas futuras que ele [produz] como senhor de seus atos,
possuindo em seu poder o agir e o não agir. Este princípio,
se removido, retira-se com ele toda a ordenação da
conversação humana e todos os princípios da Filosofia Moral.
Removido este [princípio], ademais, não haverá também nenhuma
utilidade para a persuasão, nem para as advertências,
punições ou recompensas, pelas quais os homens são
incentivados ao bem e afastados do mal. Esvair-se-ia, com
isto, toda a ciência da civilidade.
Estas palavras do Filósofo mostram que ele
considerou como princípio manifesto que o homem é princípio
das coisas futuras. O homem, porém, não é princípio das
coisas futuras senão na medida em que ele se aconselha e faz
algo. As coisas que agem sem conselho, efetivamente, não
possuem domínio de seus atos, não podendo julgar livremente
das coisas que devem ser feitas; ao contrário, são movidas à
ação por um certo instinto natural, como é evidente nos
animais brutos.
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