17. Não basta usar as posses com temperança, mas também com liberalidade.

Importa considerar se é possível determinar melhor a quantidade de possessões que a cidade deveria ter em comum do que aquela que Sócrates determinou. Sócrates diz que tantas devem ser as posses da cidade quanto a partir delas os cidadãos possam viver com temperança. No entanto, seria melhor se ele tivesse dito que tanta deveria ser a posse da cidade quanto fosse necessária para que com ela os cidadãos possam viver bem. Esta determinação seria mais útil, pelo fato de que mais coisas abarca em si o viver bem do que o viver com temperança.

Ocorre que alguém viva com temperança, vivendo todavia na miséria, isto é, com grande penúria. E deste modo é evidente que a determinação anterior de Sócrates não é suficiente. Seria determinação melhor se ele tivesse dito que tanta deveria ser a possessão [quanto o necessário para] viver com temperança e liberalidade. Se qualquer uma destas coisas for determinada separadamente, seguem-se daí várias inconveniências. Se, por um lado, for dito que os cidadãos devem viver liberalmente, seguir-se-ia que o homem viveria em delícias supérfluas. Se, por outro lado, for dito que o homem deve viver com temperança, seguir-se-ia que o homem poderia viver na penúria e trabalhosamente. Por isso, para excluir ambos os inconvenientes, importa dizer que [o homem deve viver] com temperança e liberalmente, e esta determinação é suficiente, porque somente estas duas virtudes fazem o homem estar bem [disposto] acerca do uso da possessão, o que é manifesto nas demais virtudes. Não se pode dizer, de fato, que alguém use sua possessão com mansidão ou com fortaleza.

A mansidão, de fato, diz respeito às iras, e a fortaleza diz respeito aos temores e às audácias. Deste modo, em nada dizem respeito ao uso das possessões. Mas a temperança, que é acerca das concupiscências das comidas e do venéreo, por causa das quais muitos consomem as suas posses, e a liberalidade, que é acerca do doar e receber, manifestamente dizem respeito ao uso das posses, de onde que é possível dizer que alguém usa sua possessão com temperança e liberalidade. Portanto, como por ambas estas virtudes parece haver inconveniência sobre o uso das posses, é necessário ser estudioso [e aplicado] às mesmas, isto é, à temperança e à liberalidade.