2. Que a felicidade não é hábito, mas operação.

A felicidade não é hábito. Para mostrar isso, vamos cnsiderar que se o fosse, seguir-se-iam dois inconvenientes.

O primeiro inconveniente está em que, como o hábito permanece no que dorme, seguir-se-ia, se a felicidade fosse hábito, que ela estaria também no dormente por toda a sua vida, ou pela maior parte. E isto é inconveniente, porque o que dorme não possui perfeitamente as operações da vida, a não ser as que pertencem à alma vegetativa, que é encontrada nas plantas, às quais a felicidade não pode ser atribuída. De fato, é certo que o sentido e os movimentos exteriores cessam no que dorme. Já as fantasias interiores são desordenadas e imperfeitas. E de modo semelhante, se houver alguma operação do intelecto no que dorme, esta é imperfeita. De onde que somente as operações da parte nutritiva são perfeitas.

O segundo inconveniente está em que nos infortunados permanecem os hábitos das virtudes, sendo, porém, as operações da virtude neles impedidas por causa do infortúnio. Se, portanto, a felicidade fosse hábito, seguir- se-ia que os que [perderam a fortuna] seriam verdadeiramente felizes, o que só não era visto como inconveniente pelos filósofos estóicos, que colocavam os bens exteriores como não sendo de nenhum modo bens do homem, de onde que, segundo eles, o infortúnio nada poderia diminuir ao homem de sua felicidade.