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Devemos considerar porém que, conforme escreveu
Boécio no seu Comentário [ao De Interpretatione], vários
[sábios] opinaram diversamente sobre o possível e o
necessário.
Alguns, como Diodoro, distinguiram o possível do
necessário segundo o evento, dizendo ser impossível aquilo
que nunca é, necessário aquilo que sempre é, e possível
aquilo que às vezes é e às vezes não é.
Outros, como os [filósofos] Estóicos,
[distinguiram o possível do necessário] segundo os proibentes
exteriores, dizendo que o necessário é aquilo que não pode
proibir-se que seja verdadeiro, o impossível é aquilo que
está sempre proibido de ser verdadeiro e o possível é aquilo
que pode ser proibido ou não proibido [de ser verdadeiro].
Deve-se dizer, porém, que ambas estas distinções
são incompetentes. A primeira distinção, por ser a
posteriori; não é, efetivamente, porque algo sempre seja que
é necessário mas, ao contrário, sempre será por ser
necessário, e o mesmo pode ser dito desta primeira distinção
quanto ao possível e ao impossível.
Já a segunda distinção procede do exterior e como
que por acidente. Efetivamente, algo não é necessário porque
não possui impedimento, mas por ser necessário é que não pode
ter impedimento.
Por estes motivos houve outros, como Filão, que
distinguiram [o possível do necessário] segundo a natureza
das coisas, dizendo ser necessário aquilo que em sua natureza
é determinado somente ao ser, o impossível aquilo que [em sua
natureza] é determinado somente ao não ser e o possível
aquilo que [em sua natureza] não é determinado [nem ao ser
nem ao não ser], seja porque possui [uma inclinação] maior a
um do que a outro, seja porque [tenha uma igual inclinação] a
ambos. Boécio atribui esta sentença a Filão, mas [na passagem
que estamos comentando agora do De Interpretatione] é
evidente que esta também é a sentença de Aristóteles. De
fato, Aristóteles aponta a natureza da possibilidade e da
contingência nas coisas que procedem de nós por sermos
utilizadores do conselho, nas demais coisas por sua matéria
estar em potência a ambos os opostos.
Porém, [acrescenta Santo Tomás de Aquino], até
mesmo [esta que foi a sentença de Aristóteles] não é [uma
distinção] suficiente. De fato, assim como nos corpos
corruptíveis a matéria encontra-se em potência ao ser e ao
não ser, assim também nos corpos celestes encontramos uma
potência para [situarem-se em] lugares diverso, e todavia nos
corpos celestes nada ocorre contingentemente, mas apenas
necessariamente. De onde que deve-se concluir que a
possibilidade da matéria a ambos [os opostos], falando de
modo geral, não é razão suficiente de contingência, a não ser
que se acrescente da parte da potência ativa que ela não seja
inteiramente determinada a um [dos opostos], pois, de outro
modo, se for de tal modo determinada a um [dos opostos] que
não possa ser impedida, por conseqüência reduzirá por
necessidade do mesmo modo a potência passiva ao ato.
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