6. As causas da corrupção das monarquias, reinos e das tiranias em geral.

Assim como já foi mencionado, o reino se estabelece [ao modo] do estado dos ótimos. Por isso, os princípios da corrupção do estado dos ótimos são também os princípios da corrupção da monarquia real.

A tirania, porém, estabelece-se segundo o estado dos poucos e segundo o último dos estados populares. Por este motivo, os princípios que corrompem estes estados são também os princípios que corrompem a tirania.

Ora, os princípios que, [considerados em geral], corrompem as monarquias, [reinos e tiranias], são três: a contumélia [ou injustiça], o medo [ou temor] e o desprezo. A contumélia pode ser por causa da injúria feita a alguma pessoa ou pela subtração de seus bens.

Às vezes levanta-se uma insurreição contra uma monarquia por causa de uma injúria. A insurreição que se levantou contra Felipe rei da Macedônia, pai de Alexandre o Grande, foi feita por um certo Pausânias, porque o rei Felipe havia permitido que Pausânias sofresse uma injúria por parte de Átalo que tinha vínculos com Felipe por consagüinidade ou por ofício.

Outras vezes as insurreições se devem a injúrias corporais. Muitos que foram flagelados em seus corpos, padecendo espancamentos e ferimentos, levantaram-se contra o monarca destruindo-o ou assassinando-o. Outros que foram injuriados deste modo invadiram o principado. Temos um exemplo disto na pessoa de Decamnico, que foi o condutor e a principal causa da insurreição que se levantou contra Arquelau, tendo sido o primeiro a exacerbar e comover aqueles que se insurgiram contra ele. A causa da ira pela qual estes e ele próprio se insurgiu foi que Arquelau entregou Decamnico para ser flagelado pelo poeta Eurípedes, o qual fervia de raiva contra Decamnico por ter este afirmado que o poeta possuía uma boca fétida. Foi por este motivo que, movido pela ira, Eurípedes flagelou a Decamnico. Isto fêz com que posteriormente ele se insurgisse por causas semelhantes. Por causa desta insurreição alguns foram mortos, outros tiveram que padecer graves insídias e turbações.

Outras vezes as insurreições se fazem por causa do temor. Assim como se fazem as insurreições por causa da injúria, assim às vezes se fazem por causa do temor [e medo]. O temor é uma das causas de insurreição contra os monarcas, assim como a injúria. Foi assim que Artabanes quis repelir Xerxes do principado monárquico, porque o temia devido ao crime que havia cometido contra Dario, a quem havia enforcado sem que Xerxes o tivesse ordenado.

As insurreições, [finalmente], poem levantar-se por causa do desprezo. Fazem-se certas vezes insurreições por causa do desprezo como ocorreu quando alguém, observando a Sardanapalo entregue aos prazeres e aos banquetes, sempre entretido com mulheres em seu palácio e nunca exercitando-se na luta nem na caça, insurgiu-se contra o mesmo. Poderá tratar-se de uma fábula; todavia, se tal não for verdade de Sardanapalo, poderá ser verdade acerca de algum outro. Semelhantemente Dion insurgiu-se contra Dionísio, porque desprezou-o ao vê-lo sempre ébrio e entregue aos prazeres, observando que os cidadãos o desprezavam.

Algumas vezes os amigos se insurgem contra os amigos por terem sido desprezados por eles. A excessiva familiaridade dá luz ao desprezo. Algumas vezes [os governantes], confiando nos amigos por terem sua familiaridade, desprezam-nos crendo que por causa desta inimizade esquecer-se-ão da injúria feita. Estes, porém, crendo poder obter o principado e tendo sido desprezados, insurgem-se não fazendo caso do perigo e finalmente invadem [a república], ora porque são movidos pela esperança do sucesso, ora porque possuem poder para tanto, como ocorre com os condutores dos exércitos que às vezes invadem uma monarquia por estes motivos. Os que maximamente se insurgem por tais motivos são os homens naturalmente audazes, como aqueles em que há uma abundância de calor e de espírito, possuem poder e são condutores dos exércitos das monarquias.