3. A primeira causa da sedição nos estados ótimos mesclados e na república.

A república e também o estado dos ótimos corrompe- se por causa da transgressão da justiça que há na república. De fato, somente é duradoura a república na qual observa-se o igual segundo a dignidade e dá-se a cada um segundo o que é seu. Se, portanto, na república denominada por este nome comum mais se atribui aos pobres do que aos ricos e aos ricos não se atribui segundo a dignidade, os ricos se insurgem contra a república e a transmutarão num estado de poucos.

A causa e o princípio pelo qual faz-se a transgressão do justo no estado dos ótimos e na república é porque não são bem mesclados a partir daqueles pelos quais nasceram para serem mesclados. Por exemplo, quando a república não é bem mesclada a partir da potência de poucos e do estado popular de que se compõe, ou quando o estado dos ótimos não é bem mesclado a partir do estado dos poucos, do estado popular e da virtude. As repúblicas maximamente declinam do justo quando não são bem mescladas e proporcionadas quanto às duas [primeira coisas], isto é, o estado de poucos e o estado popular; de fato, as repúblicas, e semelhantemente muitos estados de ótimos, são maximamente mesclados a partir destes dois. O estado dos ótimos difere das repúblicas porque as repúblicas são mescladas apenas do estado popular e do estado de poucos, enquanto que o estado dos ótimos é mesclado a partir do estado popular, do estado de poucos e da virtude, embora haja alguns estados de ótimos que são mais mesclados dos dois primeiros do que da virtude.

Por este motivo, porque as repúblicas e os estados dos ótimos são mesclados a partir destes [componentes] é manifesto que poderão ser mais e menos duradouros. Os que são melhor mesclados podem ser mais duradouros do que os que são pior mesclados.

As repúblicas que se afastam do estado de poucos são chamadas por alguns de estado de ótimos, enquanto que aquelas que se inclinam para a multidão são chamadas pelo nome comum de república.

Disto também é manifesto que a república denominada pelo seu nome comum é mais segura que o estado de poucos e do que o estado dos ótimos. Há duas razões para tal. A primeira é que na república domina a multidão, mas no estado dos poucos e no estado dos ótimos dominam poucos; ora, a multidão pode mais do que um pequeno número e é mais forte, pelo que as repúblicas mais podem ser conservadas do que as demais. A segunda razão é que na república a distribuição dos bens e dos principados é mais realizada segundo a igualdade do que nos demais estados. Ora, os homens comumente apetecem mais a igualdade; por isso os homens mais amam as repúblicas do que os demais estados, de onde que se segue que estas são mais conservadas e mais seguras do que os outros.

Algumas vezes a república é totalmente transmutada naquilo para o qual se inclina mais, que é o estado popular, pelo ímpeto dos que querem transmutar a república aumentando a inclinação da república e pela inclinação da república que aumenta o ímpeto dos que a querem transmutar.

Semelhantemente. algumas vezes o estado dos ótimos é transmutado ao estado dos poucos para o qual se inclina.

Outras vezes p estado dos ótimos pode ser transmutado ao seu estado contrário, que é o estado popular, assim como as repúblicas podem ser às vezes transmutadas ao estado dos poucos. [O estado de ótimos pode ser transmutado ao estado popular] quando os ricos se sobressaem muito e se inclina fortemente ao estado de poucos; os pobres, vendo-se deste modo agravados, e já tendo que sustentar injustiças, insurgem-se contra os ricos e transmutam o estado dos ótimos em estado popular.