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[O ato da vontade é denominado pela sua própria
potência e por aquilo em que a potência por primeiro e per se
tende]. Como foi dito anteriormente, a vontade é mais do fim
do que daquilo que se ordena ao fim, porque as coisas que se
ordenam a um fim nós a queremos por causa do fim. [Por
vontade, aqui se pretende significar] o ato da potência da
vontade. Ora, o ato de qualquer potência é denominado pela
própria potência que diz respeito àquilo em que a potência
por primeiro e per se tende, assim como a visão é dita ato da
potência visiva por sua ordenação ao visível. Deste modo é
que o intelecto é dito por relação aos primeiros princípios,
os quais per se e por primeiro se comparam à potência
intelectiva. De onde que a vontade é dita propriamente dos
fins que como certos princípios por primeiro e per se dizem
respeito à potência da vontade. [Aqui então, coloca-se o
problema de se determinar quais sejam estes fins que por
primeiro e per se dizem respeito à potência da vontade].
[Os antigos filósofos colocaram duas opiniões
sobre os fins que por primeiro e per se dizem respeito à
vontade]. A primeira [pertence àqueles cujo parecer era] que
a vontade fosse daquilo que é bem per se. A segunda [pertence
àqueles cujo parecer era] que a vontade fosse daquilo que
aparece como bem [voluntas sit eius quod est apparens bonum].
Se fosse verdade a opinião daqueles que dizem que
nada é voluntabile, isto é, aquilo em que a vontade é
trazida, a não ser o que é bem per se, seguir-se-ia que não
seria voluntabile aquilo que alguém não corretamente
quisesse.
Se fosse verdade a opinião daqueles que dizem que
o voluntabile é o bem aparente, seguir-se-ia que nada seria
voluntabile segundo a natureza, mas para cada um seria
voluntabile aquilo que a si mesmo parecesse. Ora, a diversas
pessoas parecerão voluntabiles coisas diversas, e às vezes
coisas contrárias. [Se isto acontecesse com a cor], de tal
maneira que não fosse a cor o visível, mas aquilo que
parecesse cor, seguir-se-ia que nada seria visível [segundo a
natureza]. [Ora], isto é inconveniente, porque para qualquer
potência natural há um objeto determinado [segundo a
natureza]. Portanto, não pode ser verdade que a vontade é do
que aparenta ser bem [apparens bonum].
A solução dos inconvenientes que se seguem a ambas
as opiniões acima é conseguida distinguindo-se que, de modo
simples é voluntabile o bem per se, e segundo algo [secundum
quid] é voluntabile o bem aparente.
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