9. O que é o necessário, o possível e o impossível, segundo a posição de vários sábios.

Devemos considerar porém que, conforme escreveu Boécio no seu Comentário [ao De Interpretatione], vários [sábios] opinaram diversamente sobre o possível e o necessário.

Alguns, como Diodoro, distinguiram o possível do necessário segundo o evento, dizendo ser impossível aquilo que nunca é, necessário aquilo que sempre é, e possível aquilo que às vezes é e às vezes não é.

Outros, como os [filósofos] Estóicos, [distinguiram o possível do necessário] segundo os proibentes exteriores, dizendo que o necessário é aquilo que não pode proibir-se que seja verdadeiro, o impossível é aquilo que está sempre proibido de ser verdadeiro e o possível é aquilo que pode ser proibido ou não proibido [de ser verdadeiro].

Deve-se dizer, porém, que ambas estas distinções são incompetentes. A primeira distinção, por ser a posteriori; não é, efetivamente, porque algo sempre seja que é necessário mas, ao contrário, sempre será por ser necessário, e o mesmo pode ser dito desta primeira distinção quanto ao possível e ao impossível.

Já a segunda distinção procede do exterior e como que por acidente. Efetivamente, algo não é necessário porque não possui impedimento, mas por ser necessário é que não pode ter impedimento.

Por estes motivos houve outros, como Filão, que distinguiram [o possível do necessário] segundo a natureza das coisas, dizendo ser necessário aquilo que em sua natureza é determinado somente ao ser, o impossível aquilo que [em sua natureza] é determinado somente ao não ser e o possível aquilo que [em sua natureza] não é determinado [nem ao ser nem ao não ser], seja porque possui [uma inclinação] maior a um do que a outro, seja porque [tenha uma igual inclinação] a ambos. Boécio atribui esta sentença a Filão, mas [na passagem que estamos comentando agora do De Interpretatione] é evidente que esta também é a sentença de Aristóteles. De fato, Aristóteles aponta a natureza da possibilidade e da contingência nas coisas que procedem de nós por sermos utilizadores do conselho, nas demais coisas por sua matéria estar em potência a ambos os opostos.

Porém, [acrescenta Santo Tomás de Aquino], até mesmo [esta que foi a sentença de Aristóteles] não é [uma distinção] suficiente. De fato, assim como nos corpos corruptíveis a matéria encontra-se em potência ao ser e ao não ser, assim também nos corpos celestes encontramos uma potência para [situarem-se em] lugares diverso, e todavia nos corpos celestes nada ocorre contingentemente, mas apenas necessariamente. De onde que deve-se concluir que a possibilidade da matéria a ambos [os opostos], falando de modo geral, não é razão suficiente de contingência, a não ser que se acrescente da parte da potência ativa que ela não seja inteiramente determinada a um [dos opostos], pois, de outro modo, se for de tal modo determinada a um [dos opostos] que não possa ser impedida, por conseqüência reduzirá por necessidade do mesmo modo a potência passiva ao ato.