10. Sobre aqueles que colocaram a felicidade em algum bem separado.

Aristóteles pretende demonstrar que não existe um bem separado do modo como foi colocado pelos Platônicos, e depois disso, pretende demonstrar que mesmo que existisse, a felicidade humana não consistiria nesse [bem separado, entendido como] uma certa idéia comum de bem. De fato, deve- se considerar em primeiro lugar que Aristóteles não pretendeu reprovar a opinião de Platão, quanto ao fato que este colocava um bem separado, do qual dependem todos os bens. E isto porque o próprio Aristóteles no décimo segundo livro da Metafísica mostrou que existe um certo bem separado de todo o universo, ao qual todo o universo se ordena, como o exército ao bem do comandante. O que Aristóteles reprova é a opinião de Platão quanto ao fato dele colocar ser este bem separado uma certa idéia comum a todos os bens. [E isto Aristóteles demonstra que não pode existir, demonstração que, contudo, é omitida nesta compilação].

Porém, ainda que existisse um tal bem separado, a felicidade humana não poderia consistir nele, e o motivo disto é porque se existisse um bem univocamente predicado de todos os bens que existisse por si mesmo separado, não seria tal que pudesse ser operado ou possuído pelo homem. Mas a felicidade que aqui procuramos é algo assim. Buscamos, de fato, a felicidade que é fim dos atos humanos. Ora, o fim do homem ou é sua própria operação, ou alguma coisa exterior; [se for alguma coisa exterior], será fim do homem ou porque é o fim de alguma operação do homem, como a casa é o fim da operação de edificação, ou porque é possuído assim como as coisas que [são por ele] usadas. É manifesto, porém, que o bem separado como foi colocado pelos Platônicos não pode ser uma operação do homem, nem pode ser algo feito pelo homem, e nem pode ser possuído pelo homem como possuímos as coisas que usamos nesta vida. De onde se conclui que este bem comum separado colocado pelos Platônicos não pode ser o bem do homem que aqui buscamos.