III. AS OBRAS DA AMIZADE EM PARTICULAR. A CONCÓRDIA


1. A concórdia e sua matéria.

A concórdia parece pertencer ao gênero da amizade. De fato, foi dito acima que aos homens [amigos] pertence que façam eleição das mesmas [coisas], no que consiste a razão da concórdia.

Disto fica evidente que a concórdia não é a unidade de opinião. De fato, pode acontecer que mesmo aqueles que não se conhecem mutuamente, sejam da mesma opinião. Entre eles, porém, não há concórdia, assim como também não há amizade.

[A concórdia também não é acerca do especulativo]. Os homens não são ditos concordarem por concordarem acerca de qualquer coisa, como aqueles que consentem entre si nas [coisas] especulativas, por exemplo, acerca do que pertence aos corpos celestes. De fato, consentir mutuamente nestas coisas não pertence à razão da amizade, porque a amizade o é por eleição, enquanto que o julgamento das coisas especulativas [não provém de eleição]. Portanto, nada impede que alguns amigos [pensem] coisas diversas acerca de tais assuntos, ou que alguns inimigos neles consintam. De onde que fica evidente que a concórdia, que pertence à razão da amizade, não é acerca das [coisas] especulativas.

De modo geral, [deve-se dizer que] a concórdia é acerca dos operáveis. Porém, a concórdia não é acerca de qualquer operável. [Os operáveis, para serem matéria de concórdia, devem estar dentro das seguintes duas condições].

A primeira condição para um operável ser matéria de concórdia é que tenha alguma magnitude. De fato, não se remove a concórdia entre pessoas, pelo fato de que estas discordem em coisas mínimas.

A segunda condição para um operável ser matéria de concórdia é que seja tal que possa convir a ambos os concordantes, ou também a todos os homens, ou a todos os cidadãos de uma cidade. De fato, se alguém consente com outra pessoa que a outra tenha aquilo que ninguém pode ter, isto não pertence muito à concórdia. Por exemplo, nas cidades é dito haver concórdia quando a todos os cidadãos lhes parece o mesmo, por exemplo, que os príncipes sejam tomados por eleição, e não por sorte ou sucessão.