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Alguém poderia dizer que o principado deve ser
distribuído segundo a dignidade ou o excesso de qualquer bem,
seja este bem segundo a alma ou segundo o corpo.
Não pode, porém, ser verdade que o principado deve
ser desigualmente distribuído segundo o excesso de qualquer
bem, o que é manifesto se considerarmos o excesso segundo a
cor e a magnitude ou segundo o excesso de qualquer outro bem.
É imediatamente evidente que o principado não deve ser
distribuído segundo o excesso destes bens, o que é manifesto
[não apenas na política] como também nas demais ciências e
potências.
Se, de fato, houver duas pessoas igualmente
possuidoras da arte de tocar a flauta, e se um excede o outro
na nobreza, é manifesto que não deverão ser dadas mais ou
melhores flautas ao que excede na nobreza. A razão disto é
que as flautas não são dadas senão por causa da obra de tocar
flauta; não devem, portanto, ser dadas senão àquele que
nasceu para tocar. Portanto, mais e melhores flautas devem
ser dadas àquele que mais é apto e melhor sabe tocar flauta.
Conseqüentemente não devem ser distribuídas em maior número
por causa das qualidades pelas quais o homem não é mais apto
a tocar flauta, nem sabe melhor tocá-las. Tudo isso faz com
que seja manifesto que, pelo excesso da nobreza, não devem
ser distribuídas flautas em maior número.
Semelhantemente, se há alguém melhor disposto
segundo a virtude e mais apto a governar do que outro, que é
excedido todavia por outro pela nobreza e beleza, a
distribuição do principado deve ser feita mais ao virtuoso do
que a outro. A razão disto é que a distribuição do principado
segundo o excesso não deve ser feita senão ao que é mais apto
a governar. Este, todavia, é aquele que excede na virtude.
Pelo que é manifesto que a distribuição do principado não
deve ser feita segundo o excesso de qualquer bem.
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