3. O segundo modo de corrupção do estado dos poucos, que é subdividido em sete.

[O segundo modo pelo qual se corrompem os estados de poucos] se deve à divisão dos ricos entre si. Este modo pode ser dividido em sete outros, na medida em que são sete modos.

No primeiro modo, ocorre que às vezes os ricos que não estão no principado corrompem a república. Isto ocorre quando aqueles que governam são poucos, como sucedeu em Massalia, em Istro, em Heracléia e em algumas outras cidades. Ocorreu nestas cidades que aqueles ricos que não governavam saíram da cidade, ou por causa da injúria que lhes havia sido feita ou por causa da inveja, e ficaram fora da cidade até que puderam mudar os governantes mais antigos e depois os mais jovens dentre [poucos irmãos]. Foi assim que aconteceu em Istro onde por causa da dissensão dos ricos e pelas causas já mencionadas o estado de poucos foi mudado em popular e, em Heracléia, onde o estado de poucos foi mudado para um governo de seiscentas pessoas pela mesma causa.

O segundo modo [de corrupção do estado de poucos pela divisão dos ricos teve um exemplo na cidade de] Gnido. Nesta cidade a república foi mudada de um estado de poucos por causa que os ricos entraram em dissensão entre si. Como havia poucos governantes e muitos ricos, os que não governavam promoveram dissensões. Estando estes em desacordo, a multidão oprimida insurgiu-se contra eles [aproveitando-se] de sua dissensão e tomou para si um príncipe dentre eles próprios. Como os ridos estavam divididos, não puderam conseguir nada contra a multidão, pois o que está dividido por dissensão torna-se débil, já que toda força dividida é menor do que ela mesma quando unida.

O terceiro modo [de corrupção do estado de poucos pela divisão dos ricos] se dá como por um princípio intrínseco quando ocorre a dissensão e a disputa entre os próprios que governam ao quererem cada qual um poder maior. Há dois modos pelos quais tais prepotentes mudam seu regime de poucos. O primeiro ocorre quando eles unem a si outros provenientes do próprio número dos poucos e, desta maneira, por esta divisão mudam a república. O segundo modo ocorre quando poucos prepotentes conciliam a plebe consigo; neste caso, as próprias pessoas que detém o poder não escolhem a si mesmos como magistrados, mas permitem a eleição dos cidadãos ou da plebe. Para que depois possam merecer o sufrágio do povo, já que a eleição [passa a] pertencer à plebe, muito favorecendo o povo acabam por mudar a república, transformando-a de estado de poucos em popular.

O quarto modo [de corrupção do estado de poucos pela divisão dos ricos] ocorre quando há alguns ricos que governam e o principado se reduz a um menor número, de tal modo que um número menor do que antes passa a governar. Os ricos que assim foram expulsos do principado, vendo-se desprezados, e quereno uma igualdade e uma proporcionalidade maior do que serem submetidos a outros, convocam o povo em seu auxílio e com isto transmutam a república.

O quinto modo [de corrupção do estado de poucos pela divisão dos ricos] ocorre quando se faz a mudança do estado de poucos costumeiro a outro estado de poucos mais comum. Isto ocorre quando há poucos governantes e há outros homens ricos e insignes que não participam dos principados. Vendo estes que não alcançam o principado e considerando-se desprezados, movem sedições e reduzem aquele estado de poucos a outro mais comum em que mais ricos do que antes governam. Esta e outras transformações podem ocorrer tanto em tempos de guerra como em tempos de paz.

No tempo de guerra ocorrem porque os ricos desconfiam da multidão. A multidão, de fato, inveja os ricos e considera-se desprezada por não ser considerada pelos ricos. Assim desprezados, passam a odiá-los, de onde que estes, presenciando estas coisas, desconfiam com razão da multidão. No entanto, por estarem em guerra contra os inimigos, necessitam da multidão que possui a potência [para a luta]. Os ricos consideram também que se a multidão elevar alguém para governá-los, dando-lhe poder, este os governará e que, se elevar a vários, estes terão maior senhorio e facilmente alcançarão maior poder. E como os ricos temem tudo isto, acabam por entregar o domínio da república à multidão, para que não o percam de todo. De fato, por causa da guerra, é-lhes necessário usar a multidão, pois poderia acontecer que os inimigos prevalecessem e que perdessem as suas posses.

No tempo de paz [estas transformações que corrompem o estado de poucos] ocorrem por causa da desconfiança dos ricos entre si. Como os ricos desconfiam uns dos outros mutuamente previnem-se armando-se militarmente uns contra os outros. Com isto ocorre que o povo, oprimido por causa da dissensão que há entre eles, insurge-se contra os mesmos, e ocorre que um é assumido para governar e se torna príncipe dos ricos e do povo.

O sexto modo [de corrupção do estado de poucos] ocorre quando aqueles que governam iludem os outros. Quando o povo se vê então enganado pelos ricos, indigna-se e move-se contra eles promovendo a sedição e assim acontece que aquela república é transmutada. [Este modo de] transmutação pode ocorrer semelhantemente por causa de dissensões que se fazem por causa de casamentos e de julgamentos. As dissensões que se fazem por causa de casamentos ocorrem quando alguém desposa outra pessoa que não o quer receber [como cônjuge], movido pelo conselho de terceiros. Na cidade de Heracléia ocorreu uma sedição semelhante por causa da sentença dada por um juiz contra alguém, e na cidade de Tebas houve uma sedição por causa de um julgamento sobre um adultério. Embora [os injustiçados se rebelassem com justiça], todavia agiam por meio de sedições e usando de violência.

O sétimo modo [de corrupção do estado de poucos] ocorre quando corrompe-se o estado de poucos por ser exageradamente dominativo e os que governam se tornam senhores, pois querem usar dos súditos como se fossem servos. Ao assim procederem, contristam-nos, pelo que estes se insurgem e, tomando um entre eles [para governá-los], expulsam os demais e corrompem a potência de poucos.