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Quantas saudades consoladora despertam em nossa alma os nomes de paz e mãe tão doces ao
coração de todo filho! Nada ha no mundo que se possa comparar ao amor que os pais
dedicam aos filhos. Quantos desvelos, cuidados, atenções, trabalhos e angustiosas
diligências têm de suportar para instruí-los, educá-los e provê-los do necessário,
assegurando-lhes a felicidade relativa a que se pode aspirar neste mundo, tanto na ordem
moral como na material! Depois que a morte arrebatou-os de nosso lado, ou quando a dôr
nos oprime, ou nos visita a desgraça, mais sentimos a falta de sua companhia e com maior
carinho evocamos a sua lembrança e o delicado alivio de seu amor. Por isso a sua perda é
para nós uma surpresa dolorosa, embora saibamos que, pula avançada idade, estejam os seus
dias contados.
Chegou para Rita a hora de perder os pais. É fácil compreender a pena e a dor que
experimentaria neste doloroso transe como filha amantíssima que era. Ela, que sempre fôra
toda ternura filial, e que com grande submissão e docilidade submetera-se em tudo à vontade
dos pies, sacrificou os afetos mais puros do seu coração e suas santas aspirações, só com o
fim de agrada-los, e ajudai-os nos trabalhos, consolai-os na velhice, receber a ultima benção
e, entre beijos e lagrimas, recolher o ultimo suspiro, fechando com mão piedosa seus olhos
na morte!
Chorou Rita a morte dos pais. E como não havia de chorar, se aos benefícios materiais devia
também juntar os morais, e o exemplo de muitas virtudes que em vida praticaram? Eles
foram seus guias e mestres na virtude e nos exercícios piedosos aos quais desde cedo se
entregara.
Amavam a filha como um dom especial do céu; e no empenho que mostraram em casar Rita
contra a vontade desta, sem dúvida assim fizeram porque eram guiados por Aquele que
dispõe todas as coisas - in pondere et mensura -. em peso e medida, para mais altos fins.
Sim; chorou Rita a morte dos país, apesar de resignada com a vontade de Deus que lhe
privava daquela tão doce companhia, quando mais necessitava dos seus conselhos. Aos
sufrágios ordinários acrescentou penitencias, orações e lagrimas, e, como piedosa filha,
conservou durante toda a vida as mais gratas recordações dos pais queridos.
Mas este e outros sofrimentos pelos queres vinha passando Rita não eram senão .o inicio de
outros maiores que se avizinhavam, e que lhe haviam de fazer beber o cálix de amargura até
as fezes.
Não havia enxugado ainda as lagrimas pela perda dos pais, quando lhe trouxeram a horrível
noticia de que um grupo de homens malvados, não esquecendo antigas contendas e ofensas
ocultas, havia assassinado traiçoeiramente o seu esposo Fernando. A funesta nova gelou o
coração da Santa e o submergiu num profundo finar de amarguras. Ela que, semelhante a
solicita e habilidosa abelha, vinha lavrando o rico favo do lar domestico, colhendo
excelentes flores de virtudes, auxiliando os pais, educando os filhos no santo temor de Deus,
e, com o mel de seus exemplos e conselhos adoçava o amargo caracter do esposo; justamente
agora que via frutificar seu trabalho produzindo frutos abençoados de paz, agora que
esperava alivio às suas penas e dolorosas recordações..., mãos pérfidas acabavam de
desfazer num instante a sua grande obra, labor de tantos anos e sonho de tantas esperanças,
trazendo o luto e a desolação para si e para aqueles seres queridos de seu coração.
Muda, e como fora de si, ficou a amante esposa quando lhe trouxeram o cadáver de Fernando
esfaqueado e ensangüentado. Cheia de espanto pensava na sorte futura do esposo querido
que, nem ao menos pudera alcançar o beneficio da absolvição sacramental e os últimos
auxílios da Igreja, que são viático para a eternidade.
Mil vezes abraçou o corpo, ainda quente e jorrando sangue: beijou-o dominada pela
angustia, e de joelhos, e com as mãos entrelaçadas, contemplando o céu rogou ao Senhor de
bondade que tivesse misericórdia daquele ente idolatrado. É geral a crença de que o Senhor
escutou suas súplicas, pela especial predileção com que olhava para sua fidelíssima serva.
Sofreu resignada o duro golpe. Triste e angustiada procurava Rita conformar-se com sua
sorte aos pés de Jesus crucificado. Curvada, diz o P. Tardi, pelo peso da dor, não tardou em
levantar-se, fazendo-se superior a si mesma e a tudo o que havia sucedido. Elevou sua
contemplação ao céu, e, conhecendo que, tanto os bens que dele procedem, como os males
que o homem causa, todos entram nos desígnios da Providencia, que respeitosamente
devemos aceitar, Rita, virtuosa e santa, curvou-se humilde e adorou estes desígnios do
Altíssimo, tirando deles o consolo que necessitava seu coração angustiado. Abraçou os
filhos, chorou cone eles, multiplicou os sufrágios, e, aos pés do Redentor crucificado, aquela
imagem viva de dor, achou consolo para si e para os filhos, alargando o coração à
esperança, sobre a sorte do esposo querido, que tão só e triste a deixava neste mundo.
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