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Que infelizes seremos se nossa esperança se limitar à vida presente! Rita havia-se
entregado ao seu esposo Fernando com todo o afeto de seu inocente coração, porque via nele
o homem que a Providencia lhe destinara. Fernando julgava-se feliz por haver unido sua
sorte a uma mulher que, adornada de tão singulares prendas, havia de ser o anjo tutelar de
sua casa, e para ele fonte de felicidade. Mas ai! quão inconstante é a condição humana! Não
passou muito tempo, e o esposo de Rita começou a mostrar o caracter iracundo que o
dominava. Quando falava era com enfado e com palavras ásperas, às vezes grosseiras. Nada
lhe agradava; de tudo se enfastiava e aborrecia. Não era amigo e companheiro de Rita antes
o verdugo de sua mansidão, e provação perpetua de sua paciência, permitindo-o assim o
Senhor para continua mortificação de sua serva.
O silencio, a humildade e a paciência eram a resposta de Rita aos maus tratos, às injurias e
desprezos de Fernando. Nada omitia para agradar ao marido, despendendo toda sua amorosa
solicitude para servi-lo, adivinhando suas necessidades, interpretando seus gostos e evitando
o menor motivo de queixa. Sempre disposta a fazer a vontade do esposo, até onde lhe
permitisse chegar a condescendência cristã, não empreendia coisa alguma sem o beneplácito
dele, chegando ao ponto de não sair de casa, nem para os ofícios divinos, sem prévia licença
do esposo. Mas nada bastava para contentar o animo iracundo e displicente de Fernando.
Oh! que esplendida, e com que aureola de santidade aparece Rita, a mártir esposa! Havendo
aprendido a praticar desde criança, na escola do divino Mestre, a mais fiel obediência e
abnegação de si mesma, sem dificuldade submetia-se às exigências do bárbaro marido,
carregando resignada a pesada cruz do matrimônio: e esse estado, que para muitas esposas é
manancial abundante de brigas, discordas e pecados, para Rita foi ocasião de praticar
excelentes virtudes. Os dias que contava de matrimonio não haviam sido senão de luta
continua entre a soberba e a humildade, entra o desabrimento e a mansidão, entre o
despotismo e a docilidade; numa palavra, entre o vicio e a virtude; luta medonha capaz de
fazer sucumbir o valor mais esforçado, se não estivesse protegido por uma paciência
invencível e um coração moldado no amor de Deus e do próximo.
A esposa mártir, cada dia mais firme em sua fé e levando sua paciência até o heroísmo,
multiplicava a oração e penitências, rogando ao Senhor que se apiedasse de seu esposo: e
Deus, que muitas vezes pelas súplicas de uma fiel esposa tem abrandado a dureza do marido
infiel e trocado seu coração rebelde, quis consolar sua serva Rita, fazendo do esposo, de
leão furioso que era, um mansa cordeiro.
Admirado Fernando da paciência e mansidão de Rita foi aos poucos moderando suas
tirânicas exigências, a ira e as palavras injuriosas com que freqüentemente a maltratava,
acabando por reconhecer-se culpado, desagravando ao Senhor das ofensas passadas e
procurando agradar a sua esposa.
Depois desta mudança radical de Fernando ponde Rita com mais liberdade dedicar-se aos
exercícios de devoção e piedade, quanto se lho permitiam os cuidados da casa e do marido.
Devotíssima de Jesus Sacramentado, visitava-o quantas vezes podia, e o receba
freqüentemente na Sagrada Comunhão, auferindo dela grande animo e desejos de sofrer até o
sacrifício.
Freqüentemente visitava os doentes e consolava-os sugerindo-lhes pensamentos de paciência
nos trabalhos e de resignação com a vontade de Deus. Socorria-os quanto podia, se eram
pobres, e aos mais necessitados ela mesma preparava e levava o alimento conveniente. Era
sobretudo cuidadosa com os que estavam em perigo de morte, procurando que recebessem os
últimos sacramentos, movida de grande misericórdia e caridade em que abrasava seu
coração. Finalmente, a mudança operada em seu esposo Fernando era novo estimulo para
avantajar-se nas praticas de devoção e penitência, e para cumprir melhor ainda os deveres
de esposa e as atenções de sua casa e família.
Odiava a murmuração e fugia dela como de doença contagiosa; e se alguma indiscreta amiga
ou vizinha fazia alguma referencia aos maus tratos de seu marido, logo mostrava Rita sinais
de desagrado, e com palavras repassadas de doçura desviava a conversa para outro
assumpto. Por este e outros motivos, todos viam nela a esposa cheia de virtude e o modelo
perfeito da esposa cristã.
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