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Humilde e confusa com a companhia daqueles celestiais mensageiros ia Rita resolvida a
segui-los aonde quer que a quisessem levar. Poucos passos havia dado e logo conheceu que
seus guias a dirigiam pela escabrosa senda que conduzia ao rochedo que ficava defronte a
sua casa, em cujos esconderijos costumava recolher-se freqüentemente para orar,
particularmente depois que ficou sozinha no mundo. Embora tão extraviada vereda não fosse
caminho para parte alguma, a piedosa viúva nem um momento duvidou de seguir seus guias.
Subiu intrépida com eles até o cume do rochedo; porém, fazem notar seus biógrafos, que
quando se viu naquela altura. onde nunca havia chegado - pois o lugar em que habitualmente
se ocultava para orar ficava um terso mais abaixo, - começou a tremer, porque viu a
impossibilidade de dar um passo mais para diante, a não ser para precipitar-se no abismo.
Os santos companheiros encorajando-a e estimulando sua fé, fizeram-lhe ver que para Deus
nada ha difícil; no mesmo instante, levada pelos ares, saltando cumes, ainda mais elevados, e
horríveis precipícios, encontra-se, como por encanto, antes do amanhecer do dia, dentro do
convento das Madalenas de Cássia, quando ainda estavam fechadas todas as portas e janelas,
e as religiosas gozavam do descanso da noite.
Alguns escritores, para explicar o grande temor e medo que se apoderou de Rita, vendo-se
sobre o cume daquele altíssimo rochedo, de onde foi transportada num vôo à Cássia, dizem
que, com a subida a lugar tão elevado, os santos guias pretendiam mostrar-lhe a elevada
perfeição a que havia de chegar, fazendo-lhe entender ao mesmo tempo o horrível que para
ela seria uma queda desde tão grande altura. Seja como for, o certo é que desde então aquele
rochedo teve o nome tradicional d.e Escolho de Santa Rita ou Monte do Perigo, e dele se faz
muitas vezes relação nos autos do Processo de Beatificação e Canonização da Santa.
Desde a admirável ascensão de Rita ao Escolho, acompanhada dos santos guias, aquele
rochedo, ficou por tradição consagrado à sua memória. Todos os moradores de Rocca
Porena sabem que naquele monte era onde Rita, desde jovem, e particularmente depois que
ficou viúva e sozinha no mundo, se ocultava para chorar suas penas e desabafar suas magoas
na oração. Todos igualmente sabem pela revelação de Rita aos Superiores, e destes aos
moradores do Lugar, que fôra miraculosamente transportada do cume do rochedo ao
convento das Agostinianas de Cássia pelos Santos Protetores, como consta nos autos do
Processo. Não é por tanto de admirar que conservados estes fatos pela tradição, o Prefeito
do lugar, no ano de 1718, com licença de Monsenhor Lascario, Bispo de Spoleto, fizesse
benzer uma grande cruz colocando-a no cume do monte, onde até hoje se conserva e se
venera.
Dentro já do sagrado asilo das Madalenas de Cássia desapareceram os santíssimos guias,
deixando Rita como que abismada num mar de reflexões e desencontrados afetos que
combatiam seu espirito, lembrando-lhe que em breve, pois b dia começava a clarear, ia ser
surpreendida ali pelas mesmas religiosas que lhe haviam negado a entrada naquela santa
casa. A lembrança das recusas e o acanhamento de se ver agora entre elas, como que
furtivamente, e, mais ainda, a necessidade que teria de revelar e explicar os prodígios feitos
por Deus naquela noite em seu favor, punham-na fora de si. Preocupava-se também pelo
conceito favorável que as religiosas pudessem formar de seus méritos, pois que ela em sua
humildade considerava-se a mais miserável de todas as criaturas.
Distraída estava com estes pensamentos quando o toque de um sino a fez voltar à realidade.
Era o sino do convento que chamava as religiosas ao côro para a oração e pára o cântico dos
divinos louvores. Aproximava-se o momento solene em que Rita e as religiosas, se bem que
por motivos diferentes, iam experimentar impressões verdadeiramente comoventes. As que
com resolução desdenhosa haviam feito oposição para que Rita, a pobre viúva, fosse
admitida na Comunidade, não tomando em consideração uma vida cheia de sacrifícios, iam
sem agora as primeiras a publicar suas virtudes, e em públicos testemunhos legariam à
posteridade noticia detalhada do portentoso ingresso de Rita no convento.
Com efeito: historias, tradições, depoimentos de testemunhas e lendas, todos concordam em
afirmar unanimemente essa maravilhosa entrada de Rita no convento das Madalenas de
Cássia, levada aí por São João Batista, Santo Agostinho e São Nicolau de Tolentino, com
todos os pormenores já referidos e outros que se mencionarão no capitulo seguinte.
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