CAPÍTULO IX. VIRTUDES HERÓICAS DE RITA NO MATRIMONIO

Que infelizes seremos se nossa esperança se limitar à vida presente! Rita havia-se entregado ao seu esposo Fernando com todo o afeto de seu inocente coração, porque via nele o homem que a Providencia lhe destinara. Fernando julgava-se feliz por haver unido sua sorte a uma mulher que, adornada de tão singulares prendas, havia de ser o anjo tutelar de sua casa, e para ele fonte de felicidade. Mas ai! quão inconstante é a condição humana! Não passou muito tempo, e o esposo de Rita começou a mostrar o caracter iracundo que o dominava. Quando falava era com enfado e com palavras ásperas, às vezes grosseiras. Nada lhe agradava; de tudo se enfastiava e aborrecia. Não era amigo e companheiro de Rita antes o verdugo de sua mansidão, e provação perpetua de sua paciência, permitindo-o assim o Senhor para continua mortificação de sua serva.

O silencio, a humildade e a paciência eram a resposta de Rita aos maus tratos, às injurias e desprezos de Fernando. Nada omitia para agradar ao marido, despendendo toda sua amorosa solicitude para servi-lo, adivinhando suas necessidades, interpretando seus gostos e evitando o menor motivo de queixa. Sempre disposta a fazer a vontade do esposo, até onde lhe permitisse chegar a condescendência cristã, não empreendia coisa alguma sem o beneplácito dele, chegando ao ponto de não sair de casa, nem para os ofícios divinos, sem prévia licença do esposo. Mas nada bastava para contentar o animo iracundo e displicente de Fernando. Oh! que esplendida, e com que aureola de santidade aparece Rita, a mártir esposa! Havendo aprendido a praticar desde criança, na escola do divino Mestre, a mais fiel obediência e abnegação de si mesma, sem dificuldade submetia-se às exigências do bárbaro marido, carregando resignada a pesada cruz do matrimônio: e esse estado, que para muitas esposas é manancial abundante de brigas, discordas e pecados, para Rita foi ocasião de praticar excelentes virtudes. Os dias que contava de matrimonio não haviam sido senão de luta continua entre a soberba e a humildade, entra o desabrimento e a mansidão, entre o despotismo e a docilidade; numa palavra, entre o vicio e a virtude; luta medonha capaz de fazer sucumbir o valor mais esforçado, se não estivesse protegido por uma paciência invencível e um coração moldado no amor de Deus e do próximo.

A esposa mártir, cada dia mais firme em sua fé e levando sua paciência até o heroísmo, multiplicava a oração e penitências, rogando ao Senhor que se apiedasse de seu esposo: e Deus, que muitas vezes pelas súplicas de uma fiel esposa tem abrandado a dureza do marido infiel e trocado seu coração rebelde, quis consolar sua serva Rita, fazendo do esposo, de leão furioso que era, um mansa cordeiro.

Admirado Fernando da paciência e mansidão de Rita foi aos poucos moderando suas tirânicas exigências, a ira e as palavras injuriosas com que freqüentemente a maltratava, acabando por reconhecer-se culpado, desagravando ao Senhor das ofensas passadas e procurando agradar a sua esposa.

Depois desta mudança radical de Fernando ponde Rita com mais liberdade dedicar-se aos exercícios de devoção e piedade, quanto se lho permitiam os cuidados da casa e do marido. Devotíssima de Jesus Sacramentado, visitava-o quantas vezes podia, e o receba freqüentemente na Sagrada Comunhão, auferindo dela grande animo e desejos de sofrer até o sacrifício.

Freqüentemente visitava os doentes e consolava-os sugerindo-lhes pensamentos de paciência nos trabalhos e de resignação com a vontade de Deus. Socorria-os quanto podia, se eram pobres, e aos mais necessitados ela mesma preparava e levava o alimento conveniente. Era sobretudo cuidadosa com os que estavam em perigo de morte, procurando que recebessem os últimos sacramentos, movida de grande misericórdia e caridade em que abrasava seu coração. Finalmente, a mudança operada em seu esposo Fernando era novo estimulo para avantajar-se nas praticas de devoção e penitência, e para cumprir melhor ainda os deveres de esposa e as atenções de sua casa e família.

Odiava a murmuração e fugia dela como de doença contagiosa; e se alguma indiscreta amiga ou vizinha fazia alguma referencia aos maus tratos de seu marido, logo mostrava Rita sinais de desagrado, e com palavras repassadas de doçura desviava a conversa para outro assumpto. Por este e outros motivos, todos viam nela a esposa cheia de virtude e o modelo perfeito da esposa cristã.